Professor, Professora? Para Quê?

Por Isaura Oliveira | 08/09/2008 | Educação

professor, professora? para quê?

Isaura Francisco de Oliveira[1]

resumo

O artigo analisa a relevância da pesquisa nas instituições de ensino superior, dada sua importância para o desenvolvimento científico e tecnológico do sistema educacional responsável por grande parte da produção do conhecimento discutido nas universidades hoje. Examina o processo educacional e as dificuldades que enfrenta o aluno e os professores do ensino superior brasileiro, para a institucionalização da pesquisa, sobretudo nas instituições de menor tradição acadêmica e de pesquisa. Defende a idéia da institucionalização da pesquisa nas instituições de ensino superior e seu papel na formação científica dos alunos. Propõe, a reflexão sobre o papel do professor do ensino superior diante da massificação das metodologias utilizadas.

Palavras-chave: Professor, pesquisa, processo educacional, ensino superior.

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ABSTRACT

TEACHER, TEACHER? WHAT FOR?

The article analyzes the relevance of the research in the higher education institutions, given his/her importance for the scientific development and technological responsible education system for great part of the production of the knowledge discussed in the universities today. He/she examines the education process and the difficulties that it faces the student and the teachers of the Brazilian higher education, for the institucionalização of the research, above all in the institutions of smaller academic tradition and of research. It defends the idea of the institucionalização of the research in the higher education institutions and his/her role in the students' scientific formation. He/she proposes the reflection on the teacher's of the higher education paper before the massif cacao of the used methodologies.

key words:  Teacher, researches, education process, higher education.

professor, professora? para quê?

A idéia deste artigo surgiu associada à experiência que vivenciamos como alunas de curso de graduação e pós-graduação e atualmente professoras universitárias, na área de pedagogia, em cidades pequenas do interior do Estado da Bahia e da dificuldade em se implementar a pesquisa em educação. Neste, focalizaremos tanto à dificuldade do aluno, quanto a do professor, pois a pesquisa ainda não tem sido bem compreendida na comunidade acadêmica.   A presente discussão nos leva a refletir sobre a organização das instituições, e o entendimento de pesquisa ali construído, pelos professores e alunos, para encontrar respostas às dificuldades que ora enfrentamos.

Uma proposta educativa que tem como pressuposto assegurar a todos, a formação cultural e científica para a vida pessoal, profissional e cidadã, possibilitando uma relação autônoma, crítica e construtiva com a cultura em suas várias manifestações: a cultura provida pela ciência, pela técnica, pela estética, pela ética, bem como pela cultura paralela (meios de comunicação de massa) e pela cultura cotidiana precisa ter como requisito integrador a pesquisa.

A pesquisa no ensino superior

 A universidade se sustenta pelo tripé: ensino, pesquisa e extensão.  Devido às dificuldades que assolam nosso sistema de ensino superior no Brasil, à pesquisa sempre fica relevada o segundo plano. Essa realidade nos leva a questionar: Como formar cidadãos participantes em todas as instâncias da vida social contemporânea, pautados no desenvolvimento do pensamento autônomo, crítico e criativo, formador de qualidades morais, atitudes, convicções às exigências postas pela sociedade comunicacional, informatizada e globalizada sem a prática da pesquisa?

A pesquisa é o processo de aquisição de conhecimento novo e também ao mesmo tempo é o produto dessa aquisição. Ela é meio e fim. Somente assim será permitido que o aluno construa um saber que lhes será necessário a sua integração e ao seu desenvolvimento social e este saber inicia-se ao permitir que os alunos tenham espaço reservado à leitura e à pesquisa e que se inicia na biblioteca. (BAGNO, 2000, p. 18)

Poucos educadores discordam dessas tarefas da educação escolar. Com efeito, elas assumem uma importância crucial ante as transformações do mundo atual. Num mundo globalizado, transnacional, permeado por intensas transformações científicas e tecnológicas, nossos alunos precisam estar preparados para uma leitura crítica das transformações que ocorrem em escala mundial.   Neste sentido, tanto a educação básica, quanto o ensino superior, precisam dar conta de oferecer uma formação geral sólida, capaz de os alunos a desenvolver a capacidade de pensar cientificamente, de colocar cientificamente os problemas humanos, e essa formação se faz por meio da pesquisa. Contudo, André 2002 questiona:

Se fazer pesquisa significa produzir conhecimentos, baseados em análise e coleta de dados, de forma sistemática e rigorosa, o que requer do pesquisador um trabalho com um corpus teórico, vocabulário próprio, conceitos e hipóteses específicos, tendo para isso que dispor de tempo, de material e de espaço, não seria esperar demais que o professor, além de seu exigente trabalho diário, cumprisse também todos esses requisitos da pesquisa? (ANDRE, 2002, p.59)

 Por outro lado, diante da crise de princípios e valores, resultante da deificação do mercado e da tecnologia, do pragmatismo moral ou relativismo ético, é preciso que a universidade contribua para uma nova postura ético-valorativa.  É necessário, pois, repensar valores humanos fundamentais como a justiça, a solidariedade, a honestidade, o reconhecimento da diversidade e da diferença, o respeito à vida e aos direitos humanos básicos, como suportes de convicções democráticas.

Calouros universitários: entre o sonho e o vivido

Os educadores são unânimes em reconhecer o impacto das atuais transformações econômicas, políticas, sociais e culturais na educação e no ensino, levando a uma reavaliação do papel da escola e dos professores. Entretanto, por mais que a escola básica seja afetada nas suas funções, na sua estrutura organizacional, nos seus conteúdos e métodos, ela mantém-se como instituição necessária à democratização da sociedade. Mas até que ponto isso acontece?  Por que quando os alunos chegam ao ensino superior, sentem-se tão despreparados, principalmente em relação à pesquisa?

É mister relatar o quanto é grandioso o sonho de adentrar numa universidade, maior ainda, a conquista do diploma tão cobrado no atual momento. Bourdieu e Passeron fazem uma analogia a esse postulado, quando afirmam:

 (...) o ensino superior transmite privilégios, aloca status, e infunde respeito pelo status quo (...) numa sociedade estratificada, os grupos e classes dominantes controlam os significados culturais mais valorizados socialmente. Tais significados simbólicos medeiam às relações de poder entre grupos e classes. (Bourdieu e Passeron apud Konder, 2002, p. 38).

Enquanto estudantes, em nosso primeiro semestre universitário, sentimos um grande desestímulos, pois, a prática utilizada pelos professores era basicamente leitura, discussão em grupo, socialização e seminário.

Atualmente a queixa dos alunos é ainda maior, pois, além de tudo o que já citamos, eles somam a pesquisa, mas não há um preparo sobre o que é pesquisa e qual sua finalidade. A impressão que os alunos têm é que o professor universitário é desnecessário. 

Um dos depoimentos de uma aluna[2] do terceiro semestre do curso de pedagogia da UNEB[3], assim define o papel do professor:

Diante do que temos presenciado professor para quê? Para nos mandar ler textos, resumir, explicar, assistir vídeo, resenhar? Estudar e apresentar seminário? Os alunos é que dão aulas. E, o pior é que nem todos dominam o conhecimento do que precisa ser explicado. Tem aulas em que me pergunto: O que eu vim fazer aqui hoje?

A universidade trabalha com o princípio de que o aluno é o sujeito construtor de seu próprio conhecimento e, para tanto, precisa fazer uso não só dos conceitos aprendidos e apreendidos na universidade, mas do capital cultural que de acordo com Bourdieu e Passeron apud Gomes,

 ...capital cultural, que se refere à competência cultural e lingüística socialmente herdada, sobretudo da família e que facilita o desempenho na escola. Este conceito é usado no sentido de bens econômicos que são produzidos, distribuídos e consumidos pelos indivíduos, O capital cultural, obviamente, não é distribuído eqüitativamente entre os grupos e classes sociais, de tal modo que as possibilidades de sucesso na escola são também desiguais. (Bourdieu e Passeron apud GOMES 2002, p 38).

Neste sentido, na universidade, aqueles que dispõem de uma grande quantidade de capital cultural são bem-sucedidos, enquanto os demais enfrentam barreiras, em virtude da descontinuidade entre a escola e suas origens sociais.

Diante desse fato é preciso considerar que a história da educação brasileira é a história da educação do colonizador. A pedagogia do colonizador forma gente submissa, obediente ao autoritarismo do colonizador. Nessa pedagogia, o educador tem por função policiar a educação para que não se desvie da ideologia do dominador.

Numa pedagogia oposta à pedagogia do colonizador (que na falta de melhor expressão chamamos de pedagogia do conflito), o educador reassume a sua educação e seu papel eminentemente crítico: à contradição (opressor--oprimido, por exemplo) ele acrescenta a consciência da contradição, forma gente insubmissa, desobediente, capaz de assumir a sua autonomia e participar na construção de uma sociedade mais livre. (GADOTTI, 1998, p. 62)

Porém, é preciso que haja conscientização: a educação está e sempre esteve a serviço das classes dominantes, e, para transpormos essa barreira, reflexão e a pesquisa representa o caminho da inconformidade.  É preciso, pois, que um novo jeito de fazer educação passe a permear o universo educacional, sendo esse, delineado a partir de uma nova visão de homem, escola e sociedade.

Conclusão

Diante dessas exigências, tanto a educação básica, quanto o ensino superior precisam oferecer serviços e produtos de qualidade, de modo que os alunos que participam do processo educativo formal, conquistem efetivas condições de exercício da liberdade política e intelectual. É este o desafio que a sociedade propõe à educação escolar neste final de século.

Para isso, professores e professoras são necessários, sim. Todavia, novas exigências educacionais pedem às universidades e cursos de formação para o magistério professores capazes de ajustar a sua didática às novas realidades da sociedade, do conhecimento, do aluno dos diversos universos culturais, dos meios de comunicação. O novo professor precisaria, no mínimo, de uma cultura geral mais ampliada, de capacidade de aprender a aprender, competência para saber agir em sala de aula, habilidades comunicativas, domínio da linguagem informacional, saber usar meios de comunicação e articular as aulas com as mídias e multimídias. Contudo, há muitas outras tarefas pela frente. É preciso resgatar a profissionalidade do professor e reconfigurar as características de sua profissão na busca da identidade profissional.

Para desenvolver tais habilidades é preciso antes de tudo, incentivar atitudes de investigação nos professores. Isso requer que se considere a existência de várias modalidades de articulação entre ensino e pesquisa na formação docente. Para tanto, é preciso criar condições mínimas para que o professor possa aliar a investigação a seu trabalho docente no cotidiano.

A pesquisa consiste num instrumento de ensino e num conteúdo de aprendizagem na formação, especialmente importante para a análise dos contextos em que se insere a situações cotidianas da escola, para construção de conhecimento que ela demanda e para compreensão da própria implicação na tarefa de educar. Nesta perspectiva o ensino superior deve proporcionar a formação necessária para desenvolver nos professores uma atitude indagativa, que os leve a tomar decisões sobre o que fazer e como fazer nas suas situações de ensino, marcadas pela incerteza.

REFERENCIAS

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[1] Pedagoga e especialista em metodologias – Professora de Didática  da UNEB (Campus XVII), e professora de Pesquisa em Educação da FACITE. Coordenadora de Estágio da Facite.

[2] Marcilene Cardoso – 23 anos. aluna da Uneb e professora da 4ª série, em uma escola rural.

[3] Universidade do Estado da Bahia – Campus XVII – Bom Jesus da Lapa.