Princípio do Pacta Sunt Servanda no Direito Internacional Público.

Por Steffani Carvalho de Santana | 17/05/2017 | Direito

Como sabemos, o Direito Internacional surgiu da necessidade em colocar fim aos conflitos entre os diversos ordenamentos jurídicos existentes de cada Estado. Portanto, nasceu com a finalidade de criar uma coexistência pacifica entre eles.

Desta forma, surgiram discussões que buscam determinar a posição hierárquica do Direito Internacional frente ao Direito Interno e solucionar os conflitos, porventura existentes, entre normas internacionais e as normas internas de cada ordenamento jurídico. A questão, embora seja de interesse global, não apresenta um regramento uniforme e universal, uma vez que recebe tratamento diferente de acordo com o Direito Constitucional de cada Estado.

Com isto surgiram propostas trazidas pela doutrina dualista e as propostas apresentadas pela doutrina monista e suas vertentes (monismo com primado do Direito interno e monismo com primado do Direito Internacional) para solucionar os questionamentos acerca da posição hierárquica a ser ocupada pelo Direito Internacional frente aos ordenamentos internos de cada Estado.

Na busca por solucionar tais questões estas teorias discutem se o Direito Internacional e o Direito interno dos Estados são duas ordens jurídicas distintas e independentes (teoria dualista) ou se o Direito Internacional e o Direito interno formam uma única ordem jurídica (teoria monista).

Para a corrente dualista o Direito internacional e o Direito interno são  distintos e independentes, pois enquanto o único sujeito do Direito Internacional é o Estado, no Direito interno temos como sujeitos aqueles que estão inseridos no Estado, ou seja, possuem como maior diferencial seus sujeitos.

Também apresentam fontes especificas, o Direito Interno é fruto da vontade do Estado Soberano, por outro lado, o Direito Internacional nasce da convergência da vontade coletiva de vários Estados e da convergência de interesses recíprocos.

Por fim, regulam matérias distintas, o Direito Internacional acerca das relações dos Estados, entre estes ou entre Organizações Internacionais. Já, por outro lado, cabe ao Direito Interno regular as relações dos Estados com seus indivíduos.

Com todas estas diferenças apresentadas a corrente dualista afirma que não poderia haver nenhum tipo de conflito entre os dois e nem o que se falar de supremacia de um sobre o outro.

Segundo esta corrente, para que uma norma internacional (Tratado, por exemplo) surta efeito em um Estado, ela deve ser transformada em norma de Direito Interno, através de processo de adoção ou transformação.

Portanto, pode-se afirmar que a lei interna prevalece sobre a lei internacional. O Estado, ao firmar um tratado internacional, obriga-se moralmente a incorporar os preceitos do tratado no seu ordenamento interno.

Para os dualistas, no caso de o Estado não proceder à incorporação legislativa do tratado no seu ordenamento interno, levando em consideração essa independência entra as duas ordens jurídicas, a consequência será a responsabilização do Estado tão somente no plano internacional.

A corrente monista, em total oposição à concepção dualista, sustenta a existência de uma única ordem jurídica. Para os monistas o Direito Internacional e o Direito interno são dois ramos do direito que compõem um só sistema jurídico; tal sistema jurídico uno está baseado na identidade dos sujeitos que o compõe e na identidade das fontes (sempre objetivas e não dependentes da vontade dos Estados).

Com a doutrina monista aparece um problema que não existe no âmbito da doutrina dualista: o de determinar, em caso de conflito, qual ordem jurídica deve prevalecer, se a ordem interna ou a ordem internacional.

A doutrina monista, neste ponto, divide-se em duas: uma parte que entende que, havendo um conflito, deverá prevalecer a ordem jurídica nacional de cada Estado – é o monismo com prevalência do Direito interno ou monismo nacionalista; outra parte da doutrina entende que a primazia é da ordem internacional em detrimento do Direito interno – monismo com prevalência do Direito Internacional ou monismo internacionalista.

Para o monismo nacionalista cada Estado, no exercício da sua soberania, só encontra limitação no arbítrio de outro Estado. As normas de Direito Internacional Público não representariam uma limitação ao Estado soberano, uma vez que a validade destas normas internacionais dependeria da vontade do Direito interno de cada Estado. A teoria monista com primado do Direito interno é bastante criticada principalmente pelo fato de reduzir o Direito Internacional a um Direito estatal e, desta forma, acaba negando a existência do Direito Internacional como um direito independente.

Os defensores do monismo com predomínio do Direito interno fundamentam sua posição em basicamente dois argumentos: a competência para concluir tratados internacionais é determinada pela Constituição de cada Estado, ou seja, a obrigatoriedade do Direito Internacional emana de uma norma interna; e a inexistência, no plano internacional, de uma autoridade que obrigue os Estados a cumprirem os compromissos internacionais, sendo assim, cada Estado estaria livre para determinar suas obrigações internacionais.

Por outro lado, de acordo com o monismo internacionalista o Direito interno deriva do Direito Internacional que representa uma ordem jurídica hierarquicamente superior, desta forma, o Direito Internacional limitaria o poder soberano dos Estados determinando, inclusive, a inaplicabilidade das normas estaduais contrárias às normas internacionais, qual seja, a norma costumeira pacta sunt servanda que determina que os contratos firmados pelos Estados tornam-se obrigatórias para as partes.

Como se sabe “pacta sunt servanda” é o Princípio da Força Obrigatória, segundo o qual o contrato obriga as partes nos limites da lei. É uma regra que versa sobre a vinculação das partes ao contrato, como se norma legal fosse, tangenciando a imutabilidade. A expressão significa “os pactos devem ser cumpridos”

Para a corrente monista internacionalista, havendo conflito entre as normas de Direito Internacional e normas de Direito Interno, o ato internacional irá prevalecer sobre a norma interna que lhe seja contrária.  Não há, portanto, duas ordens jurídicas coordenadas, mas sim uma relação de subordinação do Direito interno ao Direito Internacional que lhe é superior.

A existência de normas internas contrárias ao Direito Internacional resultam na responsabilização internacional do Estado. A responsabilização internacional é instituto utilizado pelo sistema jurídico internacional como forma de manter a supremacia do Direito Internacional frente às ordens jurídicas nacionais

Os Estados firmam tratados internacionais livremente e, diante da norma costumeira pacta sunt servanda deverão cumprir as obrigações assumidas, sob pena de responsabilização internacional. Todavia, é importante frisar que o Direito Internacional ainda não conta com mecanismos jurídicos internacionais de controle bem organizados e aptos para aplicar as sanções para os casos de descumprimento das normas internacionais.

Apesar de a jurisprudência internacional defender unanimemente a primazia do Direito Internacional sobre o Direito interno dos Estados, no âmbito do Direito interno esta supremacia do Direito Internacional não é uma concepção adotada de maneira uniforme; isto ocorre pelo fato de não existir uma regra internacional que defina expressamente a superioridade do Direito Internacional quando comparada com os ordenamentos internos. A questão da hierarquia entre as duas ordens é ainda resolvida à luz do que dispõe a ordem interna de cada Estado.

No caso brasileiro a Constituição não determina expressamente a posição hierárquica das normas de Direito Internacional. A jurisprudência brasileira passou então a conferir aos tratados em geral valor equivalente ao das leis infraconstitucionais e aos tratados de direitos humanos valor infraconstitucional, mas supralegislativo.