Principio da vedação do retrocesso social.

Por MARCO AURELIO GUILHERME FLORES | 24/09/2010 | Direito

Vamos lá então...
É justo a alguém, após aposentar-se, voltar a ofertar para o custeio da previdência social, sem direito a quase todos os benefícios?
Não seria muito mais justo considerar-se, para fins de aposentadoria, todo o período trabalhado, mesmo aquele laborado depois da aposentadoria resultante do primeiro vínculo com a previdência social?
Será que é possível que algum aposentado volte a trabalhar apenas para ajudar a custear a previdência social e, assim, manter a sustentabilidade do sistema?
Durante o dia 16 de setembro de 2010, estava eu assistindo a pronunciamentos no STF, quando, fazendo uso constante e reiterado do controle remoto, me deparei com um pedido de vistas do ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal (STF), pedido este que interrompeu, o julgamento do Recurso Extraordinário (RE) 381367. Por meio do qual, cidadãos aposentados do Rio Grande do Sul que retornaram à atividade, depois da aposentadoria, buscam o direito ao recálculo dos benefícios que lhe são pagos pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), uma vez que voltaram, depois da aposentadoria, a "contribuir" para o custeio da Previdência Social normalmente, porém, vale frisar, até pelo caráter, ao que parece, a primeira vista, absurdo, a lei só lhes garante o acesso ao salário-família e à reabilitação profissional. Pois bem, me espantou o fato que, segundo a procuradora do INSS presente à sessão, há atualmente 500 mil aposentados que voltaram a trabalhar e contribuem para a Previdência. Caso o STF reconheça o direito ao recálculo dos benefícios, o impacto poderá chegar a R$ 3 bilhões, de reais, segundo dados do próprio INSS. No entendimento do relator, ministro Marco Aurélio, as aposentadas devem ter esse direito reconhecido.
Enfim, o que se discute no recurso extraordinário citado e ora estudado, é o direito reivindicado por aposentados pelo regime geral da previdência social (RGPS) que permaneceram ou retornaram a atividade laboral remunerada de ver as contribuições previdenciárias arrecadadas durante período de permanência ou retorno à atividade laboral, serem objetos de repercussão para fins de benefícios previdenciário, no caso a postulação formulada naquela petição inicial, dada a impossibilidade legal de dupla remuneração aos aposentados e, sim, uma nova aposentadoria possa ser deferida, e, ao final seja oferecida ao aposentado a possibilidade de opção entre a que mais lhe for favorável, considerados os valores objetos de contribuição. Ao fiel cabo, meus senhores, é o recalculo do valor do salário-de-benefício, tendo como fato gerador o montante do tempo que já fora utilizado para fins de aposentadoria, no primeiro vínculo com o "novo" tempo, ou seja, o tempo de permanência ou regresso às atividades laborais após aquela aposentadoria.
Pois bem, vale dizer que para se conseguir desiderato se cita inconstitucional o artigo 18, § 2º, da lei 8.213, tendo como parâmetro de controle o § 11º do artigo 201, da Constituição Federal, (alterado pela EC nº 20).

Art. 18. O Regime Geral de Previdência Social compreende as seguintes prestações, devidas inclusive em razão de eventos decorrentes de acidente do trabalho, expressas em benefícios e serviços:
§ 2º O aposentado pelo Regime Geral de Previdência Social?RGPS que permanecer em atividade sujeita a este Regime, ou a ele retornar, não fará jus a prestação alguma da Previdência Social em decorrência do exercício dessa atividade, exceto ao salário-família e à reabilitação profissional, quando empregado. (Redação dada pela Lei nº 9.528, de 1997)

X
Art. 201. A previdência social será organizada sob a forma de regime geral, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá, nos termos da lei, a: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998)
§ 11. Os ganhos habituais do empregado, a qualquer título, serão incorporados ao salário para efeito de contribuição previdenciária e conseqüente repercussão em benefícios, nos casos e na forma da lei. (Incluído dada pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998)

Neste lanço, antes de entrar no objeto em questão que é a preservação do equilibrio financeiro aos aposentados que permaneçam ou retornem a atividade laboral depois de já aposentados.
Cabe deixar claro que o que se discute aqui não é a obrigatoriedade ou não do desconto do salário de contribuição do segurado aposentado, conforme se viu no julgamento da Ação direta de inconstitucionalidade nº 3105 (Ministro Peluzo) e, da mesma forma do RE 43640 do eminente ministro Pertence, porque não se discute a obrigação do segurado de contribuir, em outras palavras, não se nega a obrigatoriedade da contribuição, em suma, o enfoque é sob o ângulo do beneficio e não da contribuição, neste passo, trata-se de hipótese diversa, razão pela qual motiva-se o presente.
Em prosseguimento, vejamos o artigo 201, da Constituição Federal, "A previdência social será organizada sob a forma de regime geral, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial.
Ou seja, que a previdência será organizada com regime de caráter contributivo, filiação obrigatória, sempre observados os critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, objeto deste.
Assim, em harmonia com o caput do artigo 201, o parágrafo 11, da Constituição Federal, estabelece que os ganhos habituais, a qualquer título, serão incorporados para efeitos de contribuição previdenciária. Diretriz contemplada na legislação.
O inativo que retornar a atividade constitui-se em segurado obrigatório nos termos do artigo 12, § 4º, da lei 8.212/91, sucede que o parágrafo 11º, para alem de determinar essa integração para efeito de contribuição, determina também a repercussão em beneficio, é certo, logicamente, nos casos e forma da lei, neste lanço, vale esclarecer que ao estabelecer essa diretriz ao legislador o constituinte não lhe entregou um cheque em branco, determina ele, melhor dizendo, preordena e antecipa, custeio seguido da conseqüente repercussão em beneficio previdenciário.

Art. 12. São segurados obrigatórios da Previdência Social as seguintes pessoas físicas:
§ 4º O aposentado pelo Regime Geral de Previdência Social-RGPS que estiver exercendo ou que voltar a exercer atividade abrangida por este Regime é segurado obrigatório em relação a essa atividade, ficando sujeito às contribuições de que trata esta Lei, para fins de custeio da Seguridade Social. (Parágrafo acrescentado pela Lei nº 9.032, de 28.4.95).

O legislador tem assim precedido, tanto que ao determinar o cálculo para a aposentadoria, diz que para os benefícios que tratam as alíneas "b" e "c" do artigo 18, da lei 8.213/91, na média aritmética simples das 80 % maiores contribuições, portanto desprezando-se as 20% piores) de todo o período contributivo, seguida da conseqüente repercussão, em beneficio previdenciário.

Art. 29. O salário-de-benefício consiste: (Redação dada pela Lei nº 9.876, de 26.11.99)
I - para os benefícios de que tratam as alíneas b e c do inciso I do art. 18, na média aritmética simples dos maiores salários-de-contribuição correspondentes a oitenta por cento de todo o período contributivo, multiplicada pelo fator previdenciário; (Incluído pela Lei nº 9.876, de 26.11.99)
II - para os benefícios de que tratam as alíneas a, d, e e h do inciso I do art. 18, na média aritmética simples dos maiores salários-de-contribuição correspondentes a oitenta por cento de todo o período contributivo. (Incluído pela Lei nº 9.876, de 26.11.99)

Art. 18. O Regime Geral de Previdência Social compreende as seguintes prestações, devidas inclusive em razão de eventos decorrentes de acidente do trabalho, expressas em benefícios e serviços:
I - quanto ao segurado:
b) aposentadoria por idade;
c) aposentadoria por tempo de contribuição; (Redação dada pela Lei Complementar nº 123, de 2006)

Art. 18. O Regime Geral de Previdência Social compreende as seguintes prestações, devidas inclusive em razão de eventos decorrentes de acidente do trabalho, expressas em benefícios e serviços:
I - quanto ao segurado:
a) aposentadoria por invalidez;
d) aposentadoria especial;
e) auxílio-doença;
h) auxílio-acidente;

É bom dizer que essa interpretação do § 11º, do artigo 201, da Constituição Federal, nunca foi revestida de importância, pelo menos na Constituição Federal, de 1988, porque a lei 6. 6.243/75 (Regula a situação do aposentado pela Previdência Social que volta ao trabalho e a do segurado que se vincula a seu regime após completar sessenta anos de idade, e dá outras providências.), e a redação original da lei 8.213/91, estabeleceu o direito ao pecúlio, as somas dariam a ele o direito de vê-las revertidas após o cessar da atividade laboral, com a lei 8870/94 (Alterou dispositivos das Leis nºs 8.212 e 8.213, de 24 de julho de 1991, e dá outras providências.) houve a revogação do pecúlio, em contrapartida estabeleceu uma isenção ao aposentado que regressasse a atividade laborativa, somente com o advento da lei 9.032/95 (Dispõs sobre o valor do salário mínimo, alterou dispositivos das Leis nº 8.212 e nº 8.213, ambas de 24 de julho de 1991, e dá outras providências.) e da 9.528/97 (Altera dispositivos das Leis nºs 8.212 e 8.213, ambas de 24 de julho de 1991, e dá outras providências.) estabelecia que o aposentado pelo RGPS que permaneça ou retorne à atividade laboral não mais tinha direito a prestação alguma, em decorrência do exercício da atividade laboral, após a aposentadoria referente ao primeiro vínculo com a Previdência Social, logicamente, exceção fez ao salário-família e a reabilitação profissional, como visto, de forma restritiva na proporção da contribuição, haja vista que está obrigado a contribuir igualmente ao primeiro vinculo formado.
Pois bem, atendo-se ao universo de aposentados que regressam ou permanecem à atividade laboral, já se verifica uma restrição ao dispositivo constitucional, artigo 201, § 11, porque o salário-família é destinado a trabalhadores de baixa renda e aos filhos menores de 14 anos, assim, não abarca a totalidade dos aposentados que regressam a atividade, em resumo, tão-somente uma diminuta parcela, apenas uma diminuta parcela de aposentados é que podem gozar do referido benefício.

Art. 65. O salário-família será devido, mensalmente, ao segurado empregado, exceto ao doméstico, e ao segurado trabalhador avulso, na proporção do respectivo número de filhos ou equiparados nos termos do § 2º do art. 16 desta Lei, observado o disposto no art. 66.
Parágrafo único. O aposentado por invalidez ou por idade e os demais aposentados com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais de idade, se do sexo masculino, ou 60 (sessenta) anos ou mais, se do feminino, terão direito ao salário-família, pago juntamente com a aposentadoria.
Art. 89. A habilitação e a reabilitação profissional e social deverão proporcionar ao beneficiário incapacitado parcial ou totalmente para o trabalho, e às pessoas portadoras de deficiência, os meios para a (re)educação e de (re)adaptação profissional e social indicados para participar do mercado de trabalho e do contexto em que vive.

O mesmo ocorre, com a reabilitação profissional, visando o retorno ao mercado de trabalho, mas só aos estropiados, desta forma, igualmente, de excessiva restrição aos comandos do § 11º, do artigo 201, da Constituição Federal, em relação a contribuição e conseqüentemente ao beneficio, a mais, deste modo, a norma impugnada desvia-se da finalidade da norma tomada como parâmetro de controle de constitucionalidade, na medida que é bom que se diga que a previdência social não tem finalidade arrecadadora, haja vista que a sua finalidade é protetiva, ou seja, proteger o segurado ou dependentes de contingências elencadas no artigo 201, § 11º, da Constituição Federal, especialmente em relação a idade avançada,
Pois bem, vale frisar que o artigo 201, § 11º, estabelece que todos os ganhos habituais a qualquer título serão considerados incorporados não só para efeitos de contribuição, mas também para fins de benefícios, enfim, uma postura de equilíbrio entre a necessidade de arrecadação e a finalidade de proteção, e essa postura de equilíbrio, com a hipertrofia da necessidade arrecadatória com a necessidade de manter rígidas as contas da previdência social, se rompe.
O que provoca essa ruptura, nesse equilíbrio que o legislador quis estabelecer no dispositivo constitucional, não vem sendo satisfatoriamente atendida pela constituição, temos hoje mais de 21 milhões de idosos, numero este que existiu já no Brasil em 2008, segundo dados divulgados em 2009, destes 21 milhões, 58% são aposentados, deste universo de aposentados é significativo o número dos que voltam à atividade laboral, tanto é que, como se vê, os aposentados em idade de 60 ou mais é de 19% destes os que voltam a trabalhar, já na idade de 65 ou mais é de 18% que permanecem ou retornam ao trabalho, já na idade de 70 ou mais representam 15%, os que retornam à atividade, mas por que retornam ao trabalho? Por que não se dão ao luxo de curtirem o merecido e esperado ócio? Infelizmente, porque o valor médio de proventos é, segundo consta em boletim estatístico, da Previdência Social, divulgado em junho 2010, remonta em R$ 1.262,00, valor notoriamente insatisfatório às necessidades vitais básicas, sobretudo na idade avançada onde gastos com saúde e outros são elementos comprometedores, ou seja, são fatores notoriamente comprometedores do orçamento dos cidadãos aposentados.
Pois bem, para piorar o que já está ruim, vale dizer que, entre o universo popular, de 18 anos ou mais de idade, é expressivo o numero de idosos que se constituem como principais provedores das famílias, pessoas de referência, ou seja, constituem-se com aqueles que "sustentam" famílias, vale frisar que, deste universo 24%, daqueles com idade de 60 e 65 anos, já são 16%, os que contam com 65 anos ou mais de idade.
Deste modo, para fazer frente a essas contingências, a essa condição de provedor, sabidamente, são insuficientes tais benefícios, dado este motivo, resta claro que os já aposentados tem que retornar ao trabalho, acresça-se a esse fato ao fator previdenciário, ou seja, aqueles que se aposentaram com menor idade do que aqueles que se aposentaram como os mais velhos, quando recorreram à aposentadoria, em razão da expectativa de vida como divisor, formados no fator previdenciário, tiveram benefícios previdenciários formados em valores menores.
Posto isso, vale lembrar que o objeto do pedido do RE 381367, é que seja afastada a norma do artigo 18, § 2º da lei 8.213, e ocorra a permissão de recalculo do valor do beneficio previdenciário, considerado também o tempo de contribuição do retorno a atividade laboral.
Desta forma, destaca-se o fato de que o equilíbrio financeiro estaria preservado, bem como, também, o teto dos benefícios mecanismo de preservação do equilíbrio, muito embora, valha esclarecer que não cabe menção no caso ao principio da solidariedade, haja vista que a previdência social, por ser diferente da saúde e da assistência social, onde a solidariedade incide de forma mais ampla, naquela é mais mitigada, de tal modo, dado esse cenário é que se requer, em relação aos benefícios da previdência social que sejam considerados também o tempo de contribuição ao retorno a atividade laboral.
É nosso entendimento de que não cabe invocar-se o diversamente com o que ocorre com a sistemática pela legislação que estabelecia o pecúlio e depois isenção a fim de viabilizar a pretensão pela associação dos trabalhadores aposentados principio da vedação do retrocesso social dado o caráter prejudicial e nefasto da legislação que ora se impugna.
Muito embora, se faz necessário o esclarecimento de que é entendimento da Previdência Social, sempre chamando a atenção para a importância do tema, mormente para aquela instituição, não só pelo impacto financeiro, pois são cerca de 500 mil aposentados que contribuem, no Brasil, ai reside o receio de que se uma vez declarada inconstitucional o artigo 18, § 2º, da lei 8.213, que, é bom lembrar, veda a possibilidade de renuncia a aposentadoria para obter numa nova, porque aos aposentados que retornam ou permaneçam no trabalho, já está prevista a cobertura previdenciária que são o salário-família e a reabilitação profissional, mais ainda, e se todos resolvessem pedir a renuncia as suas aposentadorias para que novo beneficio lhes fosse concedido, ou seja, uma nova aposentadoria dentro do RGPS, alega aquele instituto que haveria o incentivo a aposentadorias precoces dentro do RGPS, onde depois da obtenção deste tipo de aposentadoria poderia ocorrer a continuação da contribuição, por exemplo, como contribuinte facultativo, e, em decorrência disto, a reciclagem do pedido anualmente, além de considerar uma burla ao fator previdenciário, entre outras situações que poderão vir a ocorrer com tal declaração de inconstitucionalidade.
Da mesma forma, alega a Previdência social que a Constituição Federal garante ao segurado, que retorne a o trabalho, uma nova aposentadoria dentro do RGPS, alem disso não há problemas quanto ao alegado pelos aposentados, pois não há lei que vede, mais ainda, dada a natureza pública, onde só se pode fazer ou deixar de fazer alguma coisa em virtude de lei, diferentemente do direito privado, onde tudo se pode fazer ou deixar de fazer, desde que não seja proibido por lei, portanto como nada há que vede ou autorize, ou seja, dada a natureza publico e institucional, da matéria, entre entes institucionais e segurados haveria a necessidade da existência de uma norma que assegurasse tal intento e não existe.
Em conclusão, o que se vê e se pede em tal recurso, cujo destinatário é o Supremo Tribunal Federal, é que ao aposentado que permaneça ou que retorne à atividade laboral seja-lhe realizado um segundo cálculo, desta vez, somando-se no tempo que fora considerado para a aposentadoria o tempo trabalhado depois desta, assim, seja refeito o cálculo referente às melhores contribuições, no que tange a 80% por cento do período integral e não, apenas, do período contributivo, que deram azo a aposentadoria, depois disto, seja oferecido ao aposentado a opção por continuar com a aposentadoria ou o salário-de-benefício cuja base de cálculo seja o montante deste tempo majorado pelo tempo trabalhado depois desta.
Posto isto, com a palavra aquele que tem por competência, precipuamente, a guarda da Constituição Federal, vamos aguardar então...
Obrigado e até a próxima oportunidade....