Princípio Da Segurança Jurídica Em Matéria Tributária

Por Lucas De Almeida Maia | 21/05/2008 | Direito

BREVE ESBOÇO HITÓRICO

Ao longo dos séculos XIX e XX, todos aqueles ideais trazidos e implantados pela burguesia, na busca da direção política e cultural da época, foram sofrendo sucessivos abalos. Desde o Renascimento, passando pela transição do sistema feudal para o sistema capitalista mercantilista, conduziram a criação do jusnaturalismo. A concepção do homem, cristão, ocidental, assumia o status de "homem universal", em meio a uma natureza atemporal, eterna e imutável, fonte dos "valores universais".

O jusnaturalismo teve o seu apogeu na era napoleônica, principalmente com a criação do Código Civil, reconhecendo e institucionalizado os chamados direitos naturais que agora saiam da esfera filosófica para ganhar normatividade jurídica.

Neste contexto nasce o juspositivismo, quando o direito passa a ser concebido como um conjunto coerente e completo de leis positivadas, sem quaisquer ingerências de outros ramos do conhecimento.

Em assim sendo, o direito ganhava, à época, o aspecto de ciência autônoma, dotada de métodos e princípios próprios, nos moldes trazidos por Hans Kelsen, em sua Teoria Pura do Direito.

Com a derrubada dos sistemas nazi-fascistas na segunda guerra mundial, o juspositivismo tem o seu fim. Não mais seriam aceitos conceitos universais, tanto em relação aos homens quanto aos valores da sociedade.

Como fim da segunda guerra, a criação da bomba atômica, a guerra fria, a possibilidade concreta de um holocausto nuclear destruir definitivamente a humanidade, trazem a necessidade de alternativas à ciência do direito surgindo assim o pós-positivismo, em momento adverso da história da humanidade.

No decorrer dos anos 60, com o movimento feminista, as revoluções estudantis, a contracultura, a luta pelos direitos civis e os movimentos revolucionários no terceiro mundo apresentam novos sujeitos sociais, que fazem graves criticas à política das minorias trazendo a fragmentação dos discursos o que impõe o reconhecimento dos múltiplos pontos de vista e conseqüentemente, dos múltiplos sistemas epistemológicos.

 A normatização da vida social, não mais seria aceita sem um dialogo para uma construção de um sistema comunicativo. Nunca a democracia teria sido tão necessária para a validação do direito, no intuito de legitimar o exercício do poder estatal.

Neste contexto, surge um dos princípios basilares de um sistema Constitucional fundado em uma sociedade democrática, qual seja, o principio da segurança jurídica.

SEGURANÇA JURIDICA NA CONSTITUIÇÃO E NO DIREITO TRIBUTARIO

O principio da segurança jurídica vem exposto no artigo 5° inciso XXXVI[1], da constituição federal que prevê que a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada.

Nesse sentido, o referido princípio surge no intuito de proteger o individuo na construção e elaboração de normas novas, visando um mínimo de confiabilidade do individuo para com o estado, principalmente no que tange a impossibilidade de criação de normas retroativas e vedação à flexibilização da coisa julgada.

Trazendo o referido principio para esfera tributária, o Doutrinador, Humberto Ávila, faz uma analise conjunta do artigo 5 inciso XXXVI, com o artigo 37 caput[2] da Constituição federal, destacando o principio da moralidade como um principio geral da administração pública.

Segundo o Autor, do principio da moralidade decorrem outros dois princípios da administração pública, quais sejam o da boa-fé, e o da proteção à confiança. Este ultimo, por sua vez, esta relacionado ao dever do estado de estabelecer ou buscar um ideal de estabilidade, confiabilidade, previsibilidade e mensurabilidade na atuação do poder público.

Nesse sentido, conclui Humberto Ávila:

"... das condutas necessárias para garantia ou manutenção dos ideais de estabilidade, confiabilidade, previsibilidade e mensurabilidade normativa: quanto a forma, a moralidade constitui uma limitação expressa (art. 37), e a proteção da confiança e a boa-fé com limitações implícitas, decorrentes dos sobreprincípios do Estado de Direito e da segurança jurídica, sendo todas elas limitações materiais, na medida em que impõe ao Poder Público a adoção de comportamentos necessários à preservação ou busca dos ideais de estabilidade e previsibilidade normativa, bem como de eticidade e confiabilidade." ( Sistema Constitucional Tributário, 2ª edição, 2006, editora Saraiva, São Paulo)

Confiança e estabilidade estas que visam assegurar aos contribuintes, de qualquer natureza, uma maior segurança, de forma a facilitar previsões financeiras, sem que isto prejudique a contabilidade de uma grande empresa, ou até, de uma família de classe media.

Em matéria tributária, o principio da segurança jurídica funciona como uma proteção da confiança do cidadão no estado, ou administração publica, ou seja, protege o cidadão no intuito de que os atos praticados pela administração pública não serão alterados de forma repentina.

Em termos práticos, significa dizer que, com base na analise conjunta do principio da segurança jurídica, e do principio da proteção a confiança, não pode a administração publica mudar uma interpretação na aplicação de determinado tributo, querendo cobrar, de forma retroativa.

Para uma maior elucidação, pensemos em um caso hipotético de uma empresa que comercialize determinado produto pagando uma alíquota x de ICMS. Ocorre que em janeiro de 2008, a administração publica percebe que o recolhimento vem sendo realizado de forma equivocada, pois o referido produto deveria recolher o ICMS com base em uma alíquota maior. Feita essa analise o estado lança a diferença do que deveria ter sido recolhido, nos cinco anos anteriores.

É neste sentido que o principio da segurança jurídica em matéria tributaria atua, visto que não pode o Estado, ao mudar a sua compreensão da aplicação de determinado tributo requerer a cobrança retroativa.

Neste contexto, deve-se utilizar a flexibilização da aplicabilidade da lei no tempo, com base na aplicação do principio da segurança jurídica, como proteção ao principio da confiança do cidadão no estado.

REFERENCIA BIBLIOGRAFICA

ÁVILA, Humberto. Teoria dos Princípios. 3ª ed. São Paulo: Malheiros,2004.

ÁVILA, Humberto. Sistema Constitucional Tributário. 2ª ed. São Paulo: Saraiva, 2006.

FILHO, José dos Santos Carvalho. Manual de Direito Administrativo. 16ª ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2006.

MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 20 ed. São Paulo: Malheiros, 2006.



[1] Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: "..."XXXVI - a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada;

 

[2] Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: