Possibilidades Interpretativas do Campo Religioso Brasileiro

Por José Mailson Marques da graça | 17/06/2015 | Religião

Possibilidades Interpretativas do Campo Religioso Brasileiro

 

Ao analisarmos a religiosidade mínima é preciso entender o papel da cultura na formação e manutenção das religiões no Brasil e no mundo. Segundo Mauro Ferreira de Souza “É impossível ignorar o papel da religiosidade do povo brasileiro na cultura e da cultura na religiosidade”. Desta forma é impossível a separação entre cultura e religião e a cultura é um elemento implementado nas religiões e permite um estado e evolução alcançando sempre um público maior e mais especifico. Desta forma este texto tem por finalidade analisar a religiosidade mínima e seus efeitos na sociedade brasileira apresentando sua importância na formação de uma nação com poucos conflitos religiosos. Para isto é preciso analisar os primeiros movimentos cristãos brasileiros e cruza-los com as religiões indígenas que são a base do cristianismo nacional. Posteriormente estudar os movimentos protestantes e seus efeitos no atual cenário religioso e diante da analise das religiões cristãs e então estudar as religiões de base africana e o espiritismo. Por fim, refletir sobre a importância dessas intersecções religiosas na evolução cultural-religiosa e os efeitos causando a estabilidade presente no Brasil.

Primeiro momento religioso e catolicismo

Desde o principio da colonização brasileira o catolicismo era muito presente e representou um papel fundamental a construção da cultura brasileira. Neste primeiro momento tínhamos a crença pagã dos povos pré-colombianos e o catolicismo do povo europeu, isso criou um conflito religioso onde era preciso que um vencesse sobre o outro, para isto iniciou-se então as missões de catequese para os indígenas. Estas missões iniciou o primeiro processo que cominou na cultura brasileira que observamos hoje.  Esta ideia é defendia por Mauro Ferreira de Souza que diz: “A religião e a cultura sempre andaram juntas, destacando que os grupos, sociedades tribais e os portugueses contribuíram para a formação da cultura”. Nesta época o catolicismo estava em um processo de reforma, Lutero na Alemanha tinha causado a igreja católica um problema que resultou na abertura da primeira igreja protestante e com isso um precedente para novas rupturas religiosas na Europa, este movimento também resultou na expansão do pensamento e negação de uma única igreja e permitiu a evolução do pensamento e possibilidade da fé ser ajustada a suas ideias e necessidades. É neste cenário que surge o Brasil com sua possibilidade e aumentar a fé católica a povos extra europeus, por isso a catequese era de fundamental importância para a igreja católica – Aqui não irei expor outras questões como a domesticação dos índios, escravidão, objetivos políticos e econômicos, estou abordando somente a questão religiosa - Foi neste cenário que a Igreja começou seu evangelismo sobre os índios. Partindo do pressuposto da teoria do filósofo grego Heráclito de Éfeso afirma a constante devir e é estudada também na psicologia que o indivíduo é um ser biopsicossocial, ou seja, ele é a parte genética, mas também é o pensamento e o meio em que está inserido, sendo assim, é impossível que esta troca de experiência não causou nenhum impacto no catolicismo neste primeiro momento. Já no decorrer do processo de catequese a igreja católica percebeu a necessidade de ajustar-se ou fazer os índios sentirem como membros da religião e em muitos locais do Brasil não por milagres ou coincidência índios achavam imagens católicas e começaram a cultua-las como santos, e santos católicos, resultando em uma aproximação de povos. Este fato foi de maior repercussão e é o surgimento de várias Virgens Marias e padroeiras de muitas cidades levando milhares de fiéis a igrejas e a cultuarem santas que surgiu a partir da necessidade de integração de povos indígenas a religião católica. É em torno dessa realidade que hoje os índios representam minorias em religiões protestantes, eles foram desde a catequese até o passado recente agregados a fé católica de forma que o pensamento rígido lhe coloca em um grupo de fiéis que contrario aos demais migram pouco entre as religiões. É portanto em torno deste fato que podemos encontrar a intersecção entre o catolicismo e os povos indígenas e esta interseção se estende a todos os fiéis que em determinado tempo se reunirem para festividades  religiosas, estes mesmos fieis fazem promessas e transmitem sua fé de gerações a gerações criando uma cultura-religiosa de peso imenso para a formação de identidades locais e que possibilita uma interpretação que a devoção católica como algo que independente dos movimentos protestantes que criticam veementemente a devoção a santos e imagens ainda é presente e é hábito comum para fieis que de forma oral tem recebido as instruções de devoção católica.

Protestantismo

            O protestantismo é o segundo maior segmento religioso brasileiro e representa mais de 22% da população. Possuem um peso muito importante nas discursões politicas, nos costumes e na chamada economia gospel representada principalmente por produtos como livros e produções musicais. Para entendermos como conseguiram este espaço em um pais onde a igreja católica foi membro do estado por 390 anos é preciso estudarmos um pouco o passado.

            Os movimentos que buscavam a separação da igreja católica eram movimentos de cunho religioso e politico, é impossível afirmar que foi somente um movimento religioso quando a igreja possuía uma influencia politica enorme e esta mesma influencia era vista de forma negativa pelos príncipes europeus. Segundo Alderi Souza de Matos:

Havia muita violência, baixa expectativa de vida, profundos contrastes socioeconômicos e um crescente sentimento nacionalista. Havia também muita insatisfação, tanto dos governantes como do povo, em relação à Igreja, principalmente ao alto clero e a Roma. Na área espiritual, havia insegurança e ansiedade acerca da salvação em virtude de uma religiosidade baseada em obras, também chamada de religiosidade contábil ou “matemática da salvação” (débitos = pecados; créditos = boas obras).

                Foi então neste cenário que a descoberta do Brasil trouxe para a igreja a possibilidade de continuar nas novas terras seu monopólio religioso. Contudo em 1557 já existiam protestante calvinista no Brasil, mas foi em 1630 através da colonização holandesa em Pernambuco que os movimentos protestantes conseguiram sucesso e deu-se inicio ao movimento de expansão ao protestantismo brasileiro. É interessante ressaltar que estas religiões eram diferentes em alguns dogmas e princípios mais de inicio não representavam oposição extrema aos ensinamentos católicos – isso acontece mais forte com o pentecostalismo – desta forma os protestantes já representavam uma identidade diferente mais não extremista, acredito que a maior contribuição desde episódio foi na evolução do pensamento que flexibilizou possibilidades escolha religiosa, inclusive a inciativa de indivíduos criarem suas próprias religiões baseadas na “sua hermenêutica” bíblica associada a seus ideais e princípios,  prova desta evolução é o cenário religioso atual onde qualquer um com a ajuda da mídia e bons discursos consegue fazer suas ideias religiosas prosperarem conquistando uma massa de pessoas - Foi então a partir desta abertura religiosa que os protestantes foram na história se ajustando a cultura brasileira. Claro que houve conflitos, mas estes conflitos são minimizados justamente pelo ajuste da religião a cultura associado ao sincretismo religioso. Falo na cultura pois ela é a base da transferência de experiência e construção do pensamento de um individuo, ninguém consegue cria-se sem um modelo, sem um exemplo e ideias que permitam a criação de opiniões e a partir disto a vivencia de princípios que este criou. Dentro desta cultura teremos então modelos e a matriz religiosa é um deles, desta forma o catolicismo foi fundamental na criação de uma matriz religiosa que em um estado de adequação e pensamentos de um ser, ou um grupo de pessoas levou a criar o protestantismo. Por isso não é possível isolar o protestantismo do catolicismo, principalmente o tipo de protestantismo tradicional (os primeiros), este contém em seus ensinamentos elementos em comum com o catolicismo como a salvação por meio da graça e boas obras, não aceitam santos mas chamam homens da igreja primitiva como “são Paulo ou santos católicos como São Francisco” é o caso da Igreja Adventista. Outras em sermões comentam e sobre anjos e a trindade divina a partir da interpretação católica. Desta maneira os “cristão católicos e cristão protestantes” conseguem desenvolver um diálogo e este causa uma aproximação impedindo que haja nas extremidades religiosas uma desavença tão grande que não seja possível encontrar intersecções religiosas.

Nestas extremidades “amenizadas pela interseção religiosa” que encontramos os grupos dos Pentecostais, estes trouxeram para o Brasil a negação a cultura tradicional. Ser pentecostal era não ser católico (Noaes,1985), o individuo convertido era convidado a diante de um discurso novo a oposição a igreja católica, contudo conforme abordado nada novo não é tão isolado que não tenha uma base para sua criação, por isso podemos achar facilmente intersecção entre os pentecostais, protestantes tradicionais e católicos, exemplo disso a negação dos santos católicos mas a aceitação do Espirito Santo e o evento de pentecostes. Estes eventos apresentam-se como secretismo religioso permitindo a intersecção religiosa. Há também o movimento neopentecostal que gostaria de abordar como um processo de adequação da religião a necessidade humana. Refiro-me a proposta teológica neopentecostal como produto do sincretismo religioso associado a secularização produzindo uma religião com princípios pentecostais, mas com flexibilidade. Segundo Jefferson Gomes Nogueira:

Distinguem-se dos pentecostais por assumirem uma postura mais liberal em relação aos costumes vigentes na sociedade e adotam uma postura que privilegia a chamada teologia da prosperidade.

            Os grupos neopentecostais e pentecostais representam hoje um grupo religioso no Brasil importantíssimo na produção de hábitos e costumes, suas intersecções religiosas permite um diálogo com outras religiões como os espiritas que utilizam igualmente de fatores sobrenaturais para a explicação de fenômenos diários ou não, sobretudo como atrativo para a expansão em numero fiéis. Seus hábitos tem reformulado a cultura brasileira como a tentativa de preservar a virgindade e preservação de tradições ora esquecida pela abertura da Igreja católica causada pelo Concilio Vaticano II, outro fato interessantíssimo a ser abordado é a reformulação do conceito de música religiosa, antes era limitado a música gregoriana e sacra, depois a músicas com letras e ritmos específicos (adotado por igreja católica e protestantes tradicionais), agora com as igrejas neopentecostais houve um movimento onde as religiões se adaptaram as necessidades e costumes humanos  criando um novo estilo musical gospel onde usam os mesmos ritmos de musicas seculares mas com letras diferentes.

A característica-chave de todas as situações pluralistas, quaisquer que sejam os detalhes de seu plano de fundo histórico, é que os ex-monopólios religiosos não podem mais contar com a submissão de suas populações. A submissão é volun­tária e, assim, por definição, não é segura. Resulta daí que a tradição religiosa, que antigamente podia ser imposta pela autoridade, agora tem que ser colocada no mercado. Ela tem que ser “vendida” para uma clientela que não está mais obrigada a “comprar”. Situação pluralista é, acima de tudo, uma situação de mercado (Berger, 1985, p. 149).

            Vejo então, que a secularização direciona as pessoas a uma pluralidade religiosa e esta pluralidade trás a opção de participarmos da religião e viver a cultura de acordo com o que pensamos ou queremos, criando com isso o mercado religioso onde cada religião trás consigo sua proposta e podemos aceitar ou não, lembrando que esta proposta já é fruto do pensamento de um grupo que como tal ajustou sua religião a sua realidade cultural agregando assim cultura e religião como base de seu principio de vida.

Religiões Mestiças

            Neste trabalho irei considerar em um grupo denominado “religiões mestiças” a religião espirita, religiões de origem afro-brasileiras e semelhantes, considero mestiças pois estas são formadas por experiências vividas em religiões os culturas presentes em todas as demais religiões, elas também possuem uma característica diferente das demais pois nestas os traços culturais são mais marcantes que as evangélicas. Estas religiões não são consideradas cristãs no entanto não representam oposição ao cristianismo  e algumas até acreditam em jesus e santos católicos como a Umbanda.

            As igrejas indígenas, africanas e católicas segundo Filho “todas se misturam para formar o imaginário simbólico de um tipo humano verdadeiramente brasileiro”. É neste conceito que posso identificar que as religiões mestiças são formadas e criadoras de uma igreja brasileira formada a partir da cultura e principalmente de ideais que atendem a necessidade de povos brasileiros. Por isso tanto o espiritismo como as demais religiões possuem também uma intersecção religiosa com as demais religiões, isso é perfeitamente notada na interpretação de todas quando um corpo está possuído por um demônio, entidades ou espíritos de humanos falecidos. Outro fator em comum foi causado pela perseguição na igreja católica onde estas instituições para fazer conhecer por outro ângulo começaram a criar institutos de ensino e atitudes filantrópicas mantendo com isso uma cultura onde a religião, o ensino e a filantropia estão associados alterando o cenário social nos locais onde estes grupos estão instalados.

            Ainda expondo a interpretação das religiões mestiças é importante ressaltar que estas são produto final da necessidade de grupos que acreditam em paradigmas que as demais religiões não possuem criando com isso um vácuo religioso e cultural, por isso estes movimentos são não criadores mas sim criados a partir do pensamento e ideias desenvolvidas por indivíduos que buscam evoluir religiosamente em torno de suas ideias. A exemplo disso posso citar Allan Kardec e como o efeito da sua interpretação temos um formato do espiritismo que é na verdade veiculo importante na mudança de princípios religiosos que antes eram tabus como por exemplo a existência de um plano compartilhados por vivos e por mortos – antes era comum as pessoas terem medo, hoje alguns diante de situações de suposto contato querem na verdade perguntar e colher experiências – isso é fruto de um amadurecimento religioso e aceito também de forma até informal por outras religiões como a católica onde somos chamados  a celebrar missa destinado aos falecidos.

            É, portanto neste cenário que a cultura em seu movimento moldando as religiões de acordo com as experiências e necessidades humanas que a sociedade vem se transformando e em um processo de evolução continua.

 

 

            REFERÊNCIAS

BERGER. Peter. O dossel sagrado. São Paulo: Paulus, 1985.

Novaes, Regina Reyes. Os escolhidos de Deus – Pentecostais, trabalhadores e cidadania. Rio de Janeiro: Iser, 1985.

Paulo Bota

NOGUEIRA, Jefferson Gomes. Sincretismo religioso no Brasil em Casa Grande & Senzala: Influências na religiosidade brasileira (Parte 1). História e- hostória. Retirado do site:

<http://www.historiaehistoria.com.br/materia.cfm?tb=alunos&id=205#_edn>

acessado em 20/07/2014

SOUZA, Mauro Ferreira de. Retirado do site: <http://www.gostodeler.com.br/materia/11611/religiao_e_cultura.html>

acessado em 19/07/2014

BITTENCOURT, F. J. Matriz religiosas brasileira: Religiosidade e mudança social. Petrópolis, RJ: Vozes. 2003, P. 31-81

Enciclopédia Livre Wikipédia retirado do site:

<http://pt.wikipedia.org/wiki/Protestantismo_no_Brasil> acessado em 19/07/2014

 

MATOS, Alderi Souza de. A REFORMA PROTESTANTE DO SÉCULO XVI. Instituto Presbiteriano Mackenzie. Retirado do site:

<http://www.mackenzie.com.br/6962.html> acessado em 19/07/2014