POLÍTICA INDUSTRIAL BRASILEIRA: diagnóstico, desafios e perspectivas.

Por Amanda Guimarães Guedes | 14/11/2016 | Economia

1 INTRODUÇÃO

O debate a cerca da evolução da produtividade vem ganhando cada vez mais espaço no âmbito econômico, uma vez que os países necessitam tomar decisões assertivas no que tange a competitividade dentro de um cenário globalizado. Neste contexto, um conjunto de políticas e aspectos é evidenciado para alavancar os ganhos de produtividade, via inovação e investimento nos métodos de produção, e os resultados desempenhados na economia, tanto em âmbito doméstico quanto internacional.  

Deste modo, ressaltam-se as políticas industriais, definidas como ações e instrumentos utilizados pelos países com o objetivo de fomentar o setor industrial e aumentar as taxas de crescimento econômico, colaborando desta forma para o aumento da competitividade industrial e impulsionando o uso mais eficaz dos recursos naturais (Campos et al., 2012).

O Brasil vem impondo diversas políticas industriais, principalmente após a implantação do Plano Real, mas essas medidas não estão suficientes para o país saltar tecnologicamente e aumentar sua competitividade. A partir daí, surge os desafios que o setor industrial brasileiro deve enfrentar como elementos de logística, carga tributária elevada e infraestrutura inadequada.

Seguindo esta temática, este estudo tem como objetivo discutir os fundamentos teóricos das políticas industriais e analisar a problemática dos seus desafios e suas perspectivas futuras. Para atingir tais objetivos, fez-se uma ampla análise das especificidades desses objetivos, traçando uma evolução histórica, caracterizando o cenário atual, além de identificar esses desafios e perspectivas do setor industrial brasileiro.

Esse estudo está estruturado em cinco seções, a partir desta introdução. Na segunda seção, faz-se uma discussão teórica sobre os fundamentos das políticas industriais e uma contextualização histórica acerca desta temática, esboçando uma evolução do cenário industrial nos últimos anos até alcançar este cenário atual; na seção seguinte, é abordada a participação do estado na política industrial, bem como definição das principais políticas aplicadas no contexto brasileiro; na quarta seção faz-se uma análise dos desafios e das perspectivas futuras da política industriais brasileiras; O quinto segmento pretende explicar o mecanismo de funcionamento e as projeções do mapa estratégico industrial brasileiro, e, finalmente, são apresentadas as principais conclusões.

2 CONTEXTO HISTÓRICO DA POLÍTICA INDUSTRIAL NO BRASIL

O contexto econômico brasileiro, recente, evidencia a adoção de políticas direcionadas ao fomento do setor industrial e, portanto, de política industrial. O processo de substituição de importações foi a principal característica da política industrial nacional no período compreendido entre as décadas de 1930 e 1980. Neste ínterim, a vigência de alguns aspectos estimulou este tipo de política no Brasil, como por exemplo: forte protecionismo direcionado para a indústria nacional por meio de barreiras não tarifárias; o privilégio governamental dado para alguns setores de infra-estrutura (energia elétrica, telecomunicações) e para a indústria de transformação (siderurgia, petroquímica) com significativa atuação das empresas estatais; incentivo para a entrada de capital estrangeiro, por meio da abertura de filiais de empresas multinacionais ou participação de joint-ventures com empresas brasileiras; além dos incentivos fiscais (empréstimo a juros menores, por exemplo) para determinados setores da indústria e regiões do Brasil (Ferraz et al, 2006).

Contudo, ressalta-se que entre as décadas de 1950 a 1980, a eficiência produtiva não era o objetivo principal. Aspectos importantes como pesquisa, desenvolvimento e engenharia (P&D & E), massivos investimentos em educação, além da integração entre a política industrial, tecnológica, de inovação e comércio exterior foram deixados em segundo plano, uma vez que apenas a produção física da estrutura fabril foi considerada (Ferraz et al, 2006). No Brasil, a política de distribuição de subsídios foi feita, na maioria das vezes, de forma indiscriminada. Ademais, os planos econômicos jamais tiveram um acompanhamento rigoroso; as proteções a setores eleitos como prioritários raramente eram retiradas, tornando-se direito adquirido, mesmo quando as prioridades eram revistas; os lobbies e os favores especiais para políticos ou grupos econômicos chegaram a tal monta que passaram a minar as decisões de longo prazo e corroer a capacidade de financiamento da economia.

Gonçalves (1998) aponta em contrapartida, que já estavam ocorrendo modificações na política industrial dos países desenvolvidos a partir da década de 70 devido ao impacto de alguns fenômenos, tais como: a globalização, que gerou a integração dos mercados financeiros e o aumento dos fluxos de comércio e investimento; a transformação na base técnica, unindo os segmentos de eletrônica e biotecnologia aos de metal-mecânica e química; além de várias inovações, que permitiram diminuir os custos com energia e mão de obra.

Desta forma, houve um ajustamento produtivo na Europa, Ásia e EUA. Este ajustamento ocorreu através da orientação da produção para o mercado externo, a reestruturação de segmentos maduros por meio de novas tecnologias e a forte preocupação destes países em criar um ambiente propício para o aprendizado e o desenvolvimento científico (Gonçalves, 1998).

As políticas industriais integravam os planos estratégicos de desenvolvimento. Os planos de maior êxito e, portanto, mais conhecidos, são os Planos de Metas, da segunda metade da década de 50 e o Plano Nacional de Desenvolvimento (PND), principalmente o II PND, na década de 70. Todos eles tiveram como ponto central o setor industrial e foram decisivos para o desenvolvimento e integração da indústria brasileira.

A partir da década de 1980, os planos de desenvolvimento foram substituídos pelos planos de estabilização, que buscavam controlar a inflação e estabilizar a economia. Nesse novo contexto, pouco ou nada se fez em relação à política industrial. A exceção foi o Plano Collor que, reduzindo as alíquotas do Imposto de Importação, provocou uma abertura da economia que forçou a reestruturação produtiva de grande parte da indústria. Essa abertura, no entanto, não obedeceu a critérios que pudessem ser considerados como parte de uma política industrial consistente e conseqüente. Esse mesmo Plano iniciou o processo de desestatização, que consistia em transferir para a iniciativa privada, por meio de leilões públicos, as empresas estatais. À exemplo da abertura comercial, o processo de privatização não se relacionava a estratégias que fizessem parte de uma política industrial. Tanto a abertura comercial quanto as privatizações foram continuadas e aprofundadas no governo posterior, em toda a década de 1990 (Gonçalves, 1998).

Com o início dos anos 90, o fenômeno da globalização se intensifica. No Brasil, ocorrem mudanças significativas, como: liberalização econômica, abertura comercial iniciada no governo Collor (1990-1992), e a estabilização monetária, a partir de 1994. (Gonçalves, 1998). Com o objetivo de maximizar a taxa de crescimento da produtividade, em 15 de novembro de 1990 foi estabelecida a Medida Provisória número 158, que integrava objetivos governamentais estratégicos à política industrial; Modificações como elevação do salário real de forma sustentada, promoção de maior abertura e a desregulamentação do setor foram ocasionadas por tal associação.

Neste ínterim, é inaugurado um novo modelo de política industrial no país que visava à liberalização das importações com a redução das tarifas alfandegárias e exclusão do limite quantitativo de produtos importados. Ademais, foram privatizadas mais de 30 empresas estatais, investimentos de capital estrangeiros foram facilitados e também foram criados estímulos financeiros e fiscais ao investimento. (Hay, 1997).     

A estruturação de um ambiente favorável ao investimento e apoio as inovações tecnológicas buscavam inserir a indústria nacional no processo de globalização, uma vez que esta era uma das principais preocupações a respeito da dinâmica produtiva brasileira (Gonçalves, 1998; Lyra, 1996). Para isto, o foco era a criação de um ambiente favorável ao investimento e apoio às inovações tecnológicas. Com o objetivo de fomentar a competitividade nacional frente à economia internacional, medidas como revisão dos incentivos ao investimento, a produção e a exportação, o apoio maciço a capacitação tecnológica da empresa nacional e a definição de uma estratégia geral de promoção de industriais nascentes em áreas de alta tecnologia foram tomadas.

Ao longo da década de 1990, alguns fatores contribuíam positivamente para a evolução da indústria brasileira. Com a estabilização da economia e a inflação controlada ampliou-se o horizonte de planejamento, assim como a confiança dos investidores em relação ao retorno dos investimentos; com as privatizações, desregulamentação, concessão de serviços públicos, racionalização tributária, o “custo Brasil” podia ser atenuado. (Gonçalves, 1998). Contudo, apesar dos pontos positivos citados anteriormente, a indústria brasileira naquele momento ainda apresentava problemas em relação ao nível tecnológico de seus produtos, competitividade de alguns setores, assim como no mercado de trabalho.

De fato, houve a tentativa de transformar a pauta de exportações do país, direcionando-a para os itens de maior valor tecnológico. Porém, até fins da década de 1990, o país ainda não destacava suas exportações no quesito tecnológico, e, além disso, registrava déficit comercial. No setor automobilístico, por exemplo, as importações de veículos e autopeças atingiam um somatório bem superior ao das exportações: de 1991 a 1996 as importações atingiram US$ 2,4 bilhões contra US$ 1,5 bilhão de dólares de exportações. Em suma, a participação qualitativa e quantitativa das exportações brasileiras era pouco expressiva no comércio mundial. (Gonçalves, 1998).

Outro fator desfavorável era a diferença de competitividades entre os setores da matriz industrial: setores ligados a recursos naturais e energia, por exemplo, apresentavam alta competitividade; porém, setores difusores de progresso técnico, como eletrônicos de consumo, automobilístico, biotecnologia e bens de capital apresentam baixa competitividade. Coutinho e Ferraz citados por Gonçalves (1998) explicam que isso se deve a grande dependência do mercado doméstico e também devido à crise dos anos 80, que impediram que ocorresse a expansão produtiva e inovação tecnológica nestes setores.

É importante destacar também a redução do emprego formal na indústria neste período, devido ao comportamento das empresas que “têm-se concentrado em suas atividades-núcleo, cortando postos de trabalho, ampliando a terceirização e promovendo maiores compras de componentes e partes, por vezes mediante importação”. (Gonçalves, 1998):

Na segunda metade da década de 1990, a política indústria brasileira ainda apresentava alguns desafios relevantes. Segundo Gonçalves (1998), as principais metas a serem cumpridas na época eram: elevar o aprimoramento tecnológico da indústria, reduzindo custos de aprendizado e diminuindo o tempo para incorporar e difundir os avanços técnicos; ampliar o grau de internacionalização da economia brasileira, a fim de inserir o setor produtivo nas correntes do comércio, capitais e tecnologia; e aprofundar o ajustamento produtivo (facilitando a incorporação do progresso técnico, recompondo a pauta de vendas ao exterior com a priorização de bens de maior valor agregado, aumento da produtividade e da qualidade).

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