Placebo

Por Rodrigo Dobkowski Mandryk | 18/07/2016 | Crônicas

                Era uma vez o Efeito Placebo, contudo, seu nome nem sempre foi esse. Há muito chamou-se “Confiança”, em outros tempos tornou-se composto como “Maria José” e denominou-se “Confiança e Respeito”, em alguns lugares assumiu a alcunha de “Fé” e em diversas terras recebeu diferentes nomes, mas hoje chama-se Placebo, sim, pois como Albert Einstein torna-se apenas “Einstein” ele também se tornou simplesmente “Placebo”.

                Nos tempos de Confiança, ele era fruto do olhar cuidadoso e da gentileza do profissional assistente, que, ao examinar, tocava o indivíduo e, mesmo sem tantos conhecimentos, curava, se não o físico, a alma. E foi assim que o Pajé das tribos ameríndias ouviu e curou com seus chás, rezas e fumaças toda sorte de enfermidades e tristezas. Com ciências ocultas e Confiança nelas e no humano que as aplicava, o indivíduo melhorava de suas mazelas.

                Mas a história humana não é estática e as ciências cresceram. Nossos ancestrais pensaram sobre o que adoecia o homem e elaboraram muitas teorias, como foi a dos miasmas que emanavam do pântano, ou ainda a do castigo divino. Chegamos a um momento em que sabíamos que as doenças invadiam o corpo, como uma nação invade outra, então se oficializou o ofício de médico, ou seja, aquele que conhece o humano e as doenças e produz formas de eliminá-las. À Confiança somou-se o Respeito, mas infelizmente poucos podiam pagar pela assistência dessa Confiança tão Respeitosa, portanto, muitos permaneciam imersos nas doenças. Esse cuidador era muito pudico e seguia as normas espirituais da época que diziam não ser saudável estudar o interior das pessoas, mas a curiosidade seguia, assim como nosso amigo Placebo.

                A Confiança, outrora tão acessível, elitizou-se e passou a carregar pompas de “Confiança e Respeito”, nomes científicos e eventos para homenageá-la. Mas seu tempo também passou e muitos saudosistas ainda a reverenciam, pois, o paciente daqueles tempos reverenciava seu cuidador, já hoje isso não acontece. Entende-se que todos humanos são iguais, nem melhores nem piores, e por isso a reverência se faz desnecessária, mas a Confiança e o Respeito nunca se tornaram desnecessários, pelo contrário, intensificou-se sua necessidade, mas, ao invés disso, nessa relação específica, mudaram seu nome e se transformou no plebeu Placebo.

                Agora conhecemos, agora sem pudor, o interior físico do humano, de modo que podemos abrir, fechar, grampear, cortar, colar, jogar vide-game, digo operar complexos robôs cirúrgicos e prescrever fármacos – não mais rezas, chás e fumaça como nas épocas da Confiança. Apesar do desenvolvimento técnico-científico, as pompas da relação cuidador-enfermo agora são trocadas por curtos minutos entre quatro paredes nos quais um humano interroga outro e elabora, dentro dos fluxogramas aprendidos, quais exames serão necessários, ou quais fármacos são indicados para o caso. E o Placebo? Esquecido num canto da sala – marginalizado – retira-se cabisbaixo, ele, que outrora fora o fundamento da relação médico-paciente, que significava empatia, acolhimento, consideração, respeito mútuo e que gerava confiança na prescrição do profissional, agora é satirizado em estudos farmacológicos nos quais se diz:

                - Mas isso é apenas Placebo.