Pesquisa e Racismo

Por Antonio Leandro | 28/11/2008 | Educação

A Folha de São Paulo trouxe, no Caderno Mais, do dia 23 de novembro, a pesquisa DATAFOLHA em que faz uma radiografia da questão racial brasileira. A análise explicita aquilo que nós, enquanto militantes e estudiosos do movimento negro, já conhecemos: o racismo à brasileira. Porém, não acredito que o racismo "perdeu força no país", como argumenta a redação desse jornal, pois são muitos os casos de racismos que acontecem diariamente contra os pretos e pardos brasileiros. Portanto, essa conversa de dizer que diminuiu de 11%, em 1995, para 3%, em 2008, o racismo contra o negro é algo que não devemos acreditar, porque estão querendo desviar a o foco da questão, isto é, jogando a sociedade contra o movimento negro. Tanto a Folha de São Paulo quanto O Estado de São Paulo são jornais reacionários e conservadores. Em outras palavras, trabalham para a manutenção das elites dominantes do país. Estes jornais somente divulgam os posicionamentos daqueles que são contra as cotas. Portanto, estes jornais são ideológicos e, politicamente, parciais em seus posicionamentos.

Percebemos também uma confusão terminológica que necessitaria de uma distinção melhor entre os termos "preconceito" e "racismo". Pois algumas falas parecem confundir comportamentos racistas com ações preconceituosas. Ou seja, discursos que as pessoas apontam como "preconceituosos", são, na verdade, "racistas". Isso demonstra o quanto nós estamos impregnados de um olhar relativizante, isto é, não vamos direto ao assunto. Escamoteamos o real, preferindo ficar com a aparência. Temos vergonha de nos declararmos racistas. Mas em todo caso, a pesquisa é importante porque novos dados sobre a questão são elucidados. Com certeza, teremos uma variedade de interpretações dos mesmos.

Importante frisar ainda que 51% dos entrevistados mostraram-se favoráveis ao sistema de cotas, isto é, de reserva de vagas nas universidades para negros. Contrários aos intelectuais reacionários, conservadores e extremamente hierárquicos que não mudam a cantilena de sempre, ou seja, repetem as mesmas coisas o tempo todo, como é o caso da antropóloga Yvonne Maggie e seu séqüito, segundo os quais as "cotas podem provocar racismo", tornando-nos uma "nação bicolor". Estas pessoas, ideologicamente, tornam-se porta-vozes da meritocracia e reprodutoras da manutenção do status quo das elites que sempre tiveram acesso às melhores escolas particulares e universidades públicas do país.

São intelectuais que, relativizando as relações raciais, comparando-as com as de outros países, como os EUA, acabam reforçando um tipo de racismo que, tácito, dissimulado e subliminarmente, permeia as estruturas institucionais e sociais do país. Tenho participado de alguns debates e escutado de estudantes, até de brancos, dizerem que esses intelectuais fazem um desserviço à instituição educacional. Não percebem que estão sendo ridicularizados pelos próprios alunos universitários.

Segundo essas pessoas contrárias às cotas, a saída seria o investimento do governo no ensino público de melhor qualidade, para que os negros e pobres ascendessem socialmente. Apoio, e deve ser isso mesmo; no entanto, esse modo ideológico de pensar é perigoso, porque reproduz e reforça as desigualdades sociais e raciais no país. E o Exame do Ensino Médio (Enem) mostrou que, no último ano, o ensino brasileiro piorou de qualidade. Por isso, não podemos esperar trinta ou quarenta anos até que tenhamos um ensino público de qualidade, pois há milhares de estudantes negros esperando uma vaga em alguma universidade, como são os 13 mil estudantes negros e brancos da Educafro. Queremos ensino superior para milhares de estudantes negros hoje.

Portanto, temos que refrescar a nossa memória, dizendo que a vitória da aprovação das Cotas 73/99, pela Câmara dos Deputados Federais, no dia 20 de Novembro, Dia da Consciência Negra, não foi uma benevolência dos deputados, mas deve ser tributada às lutas do movimento negro que, sistematicamente, vem combatendo o racismo e o preconceito contra o negro brasileiro. Nos últimos trinta anos, o movimento tem pautado um discurso politicamente correto em torno de ações afirmativas que favoreçam a mobilidade social dos afro-brasileiros em todos os seguimentos sociais.