Perfil dos Povos Ribeirinhos da Amazônia

Por Reinaldo Bui | 14/04/2013 | Sociedade

 Introdução 

Quando estudamos a cultura de um povo, não podemos desprezar nenhum item que esteja diretamente ligado àquele povo, pois qualquer fator é relevante e certamente influencia no seu modo de agir, sendo importante para moldar a sua cultura.

Conhecer um pouco da realidade amazônica, o meio em que o povo ribeirinho está imerso, bem como aprender sua história, certamente nos capacitará a melhor entender o porquê eles vivem e agem de forma tão diferente da nossa. Não que seja errada, como muitos julgam, apenas diferente. 

I.  A Amazônia 

A Amazônia ( o Parauaçu dos indígenas, o Grão-Pará dos colonizadores) segue a ordem do dia do imaginário e das preocupações nacionais e internacionais.  Pesquisa revela ser ela o terceiro nome mundialmente mais conhecido, depois somente de Jesus Cristo e de uma marca de refrigerante. 

Abrangendo uma área total de 6.500.000 km2, a Bacia Amazônica situa-se ao sul do Planalto das Guianas, a norte do Planalto Central, a leste da Cordilheira dos Andes e a oeste do Oceano Atlântico. Somente a Amazônia brasileira se extende por quase 4.975.000 km2 ou cerca de 50% do território brasileiro. Drena terras de nove países sul-americanos. Ao longo dos rios, situam-se as planícies inundáveis (várzea e igapó) que permanecem quase inteiramente alagadas na época das cheias. Estima-se que somente no Brasil há entre 70.000 a 100.000 km2 de planices de inundação, e mais de 100.000 km2 de lagos e pântanos. Existem provavelmente uns 40.000 km de rios navegáveis e outro tanto em igarapés. Em outras palavras, a área total de ambientes aquáticos na Amazônia brasileira é maior que 300.000 km2.

A maior parte desta bacia não supera a altitude de 250 metros, sendo que as principais zonas úmidas, cerca de 5% a 10%, se econtram abaixo de 100 metros de altitude. O principal coletor dessa drenagem, o rio Amazonas, tem suas nascentes na vertente oriental da Cordilheira dos Andes, passando a correr, ainda em terras peruanas, por terrenos sedimentares de baixa declividade, em uma extensão aproximada de 6.520 km, até desaguar em forma delta ico-estuarina no Oceano Atlântico, caracterizando-se como um tipo de rio de planície. 

II.  Clima 

O clima predominante em toda a bacia Amazônica é o tropical chuvoso, com altos índices de pluviometria, de 2.250 a 2.750 mm anuais, e período chuvoso iniciando em setembro e prolongando-se até maio/junho. A temperatura média anual, varia em torno dos 24ºC. 

III.  Solos 

Nota-se que na Amazônia dominam os minerais de argila, o que reflete o adiantado estágio de intemperismo em que estes se encontram, devido aos elevados índices pluviométricos, levando a uma intensa lavagem do perfil de solo. Desta maneira, a maioria dos solos apresenta um potencial reduzido quanto ao fornecimento de nutrientes. Desta maneira, considerando-se toda a bacia, 90% dos solos apresentam deficiência de fósforo, 73% toxidez de alumínio, 50% déficit hídrico, 24% drenagem deficiente e risco de inundação e somente 7% em condições adequadas para atividades econômicas como a agricultura, os quais no entanto não formam um contínuo. 

IV.  Densidade populacional 

A bacia amazônica, com sua enorme biodiversidade é também caracterizada por uma grande diversidade socio-cultural, marcada pela presença de inúmeras tribos indígenas e de populacões tradicionais de ribeirinhos, seringueiros e pequenos agricultores e pecuaristas. As populações indígenas, com mais de uma centena de línguas diferentes estão, em grande parte, localizadas em reservas que hoje ocupam mais de 15% de todo o território amazonico. Até a década de 60, as principais atividades economicas estavam ligadas ao extrativismo, sobretudo o da borracha e à pesca. O povoamento se fez também ao longo dos rios e nas várzeas. A partir desse período se iniciou a ocupação da região, através de grandes projetos de colonização e posteriormente, através da grande mineração de ferro, bauxita e ouro. O impacto resultante dessa ocupação rápida e desordenada foi o aumento rápido do desmatamento à poluição dos rios por mercúrio. 

A ocupação humana na Amazônia, inicialmente pelas tribos indígenas e posteriormente por colonizadores europeus e migrantes nordestinos, fixou-se na várzea, devido aos recursos oferecidos pelos rios e igarapés e a alta fertilidade dos solos aluvianais, desenvolvendo basicamente duas atividades: a lavoura e a pecuária. As várzeas foram, dessa forma, tradicionalmente habitadas por caboclos (ribeirinhos) que plantam em pequenas roças mandioca e banana. Estas atividades são complementadas pela caça, pesca, criação de animais e extração de produtos como a castanha-do-pará, a pupunha, o açaí entre outros. 

Em meados da década de 70, através de incentivos fiscais do governo, inúmeros empreendimentos agropecuários fixaram-se na Amazônia, transformando enormes áreas florestadas em pastos. Estes projetos agropecuários, que envolveram assentamentos ilegais, culturas empresariais, abertura de estradas e implantação indiscriminada de pastagens, provocaram nas duas últimas décadas na Amazônia, o desmatamento de centenas de quilômetros quadrados de áreas florestadas. As conseqüências dessa interferência são a alteração do regime hídrico, assoreamento dos rios, empobrecimento dos ecossistemas e alteração da economia da população local: ribeirinhos – qual estaremos focalizando, e indígenas. 

CULTURA MATERIAL 

I. CASAS E ARRUMAÇÃO DA ALDEIA 

A. Tipo de Comunidade

Sempre construída na beira de um rio, daí o nome ribeirinha, estas comunidades apresentam características bastante peculiares, como a disposição das suas construções, a homogeneidade física dos seus habitantes, suas rotinas e modo de viver.

 

B. Tipo de construção

Uma característica comum de todas as aldeias é que as casas são fabricadas de acordo com o recurso natural disponível mais próximo. Há três tipos de construção: casas de tábua, taipa ou de palha. A cobertura pode ser feita de dois modos: palha ou cavaco de madeira. Raramente encontramos construções ou coberturas de tijolo ou telha cerâmica, mas esta é uma tendência que tem afetado as vilas maiores.

 

 

II. ROUPA E ORNAMENTAÇÃO

 

A. Roupa comum

Homens e meninos: calção, camiseta e chinelo de dedo. Mulheres mais velhas: saia, camiseta e chinelo de dedo. As mais novas e as meninas usam shorts. Geralmente estas roupas são muito velhas e usadas. São muito usadas camisetas de campanhas políticas passadas.

 

B. Roupa especial

 Pouquíssimas pessoas das comunidades possuem algum tipo de roupa especial (para festas ou qualquer outra ocasião).

 

C. Ornamentação

Poucas bijuterias. Alguns ornamentos são feitos com material natural, como palha e sementes (anéis, pulseiras, etc.)

 

D. Cabelo

    Normalmente os homens usam cabelos curtos e as mulheres longos.

 

E. Banho

Diariamente tomam banho no rio. Lavam-se apenas com água, pois raramente conseguem um sabonete para usar.

 

 

III.  ALIMENTAÇÃO

 

A. Dieta

Basicamente caça, pesca e farinha. A farinha de mandioca é a base da alimentação. Ainda retiram desta mesma planta o tucupi e a goma para fazer tapioca (ou bijú).

 

B. Bebidas

Pode-se fazer suco com frutas regionais: carambola, cupuaçu, graviola, etc. o açaí também é muito valorizado, embora não o considerem uma bebida, pois toma-se de colher engrossado com farinha.  Não podemos esquecer da maldita cachaça, que está sempre presente neste país, por mais remota que seja a região.

 

C. Produção e aquisição de comida

Normalmente os homens caçam, pescam e somente dividem com as mulheres a produção de farinha.

 

D. Preparação da comida

A farinha é preparada de antemão e armazenada em sacos. Ela vai sendo utilizada diariamente conforme a necessidade: quando há carne, como acompanhamento; quando não, com alguma fruta ou só com água (chibé).

 

E. Significação

Não há nenhuma conotação espiritual para a comida. Os ribeirinhos encaram-na apenas como um produto para sua subsistência. Porém, o dia de fazer farinha é sempre uma atividade que acaba envolvendo toda a comunidade.

 

 

IV.  VIAÇÃO E TRANSPORTE

 

A. Estradas, trilhos e pontes

Constróem trapiches para ancoragem dos barcos e trilhos (picadas no mato ou na capoeira) de curta distância.

 

 

B. Transporte

Exclusivamente fluvial. Utilizam embarcações de pequeno, médio ou grande porte para todos os fins.

1.trabalho:

-pesca

-caça (em igapós)

-transporte de passageiro

-transporte de alimento

-transporte de carga

-comércio

2.moradia: não é difícil encontrar famílias que moram em suas embarcações, mesmo que provisoriamente.

 

 

V.  FERRAMENTAS, ARMAS E MÁQUINAS

 

A. Ferramentas

Nas aldeias, usam ferramentas básicas para: agricultura - machado, enxada e terçado. Na construção - serrote, machado, martelo e terçado

 

B. Armas

Alguns homens possuem espingarda para caçar  (de carregar pelo cano). Também utilizam o terçado como arma de caça e a zagaia de pesca.

 

C. Máquinas

Os retiros (casas aonde se faz a farinha), são dotados de um maquinário todo construído de madeira, para processar a mandioca. 

 

D. Introdução de uso de ferramentas, máquinas e armas da civilização.

Algumas comunidades mais privilegiadas possuem motoserra, ferramenta muito valiosa entre eles. Outras maiores possuem, além da motoserra, geradores de energia, motores elétricos ou de combustão (para vários fins) e rabetas (motor de popa para pequenas embarcações).

 

 

VI. Uso de materiais básicos

 

A. Madeira.

Certamente a madeira é o material mais importante para a vida do ribeirinho É largamente utilizada nas construções de casas e barcos.

 

B. Cerâmica

Alguns fogareiros e outros utensílios são fabricados em argila, secos ao sol e cozidos em fornos bem rústicos.

 

C. Metalurgia

Pouco utilizado este recurso. Somente na fabricação ou concerto de ferramentas e de armas.

 

ORGANIZAÇÃO ECONÔMICA

 

I. PRODUÇÃO

 

A. Trabalho

Cada família, ou pai de família, é responsável por conseguir seu próprio alimento. Eventualmente é feito em grupo na roça, na caçada ou na pesca.

 

1.Agricultura: fazem o roçado apenas para o plantio da mandioca ou, quando muito, de banana. Praticam um tipo de agricultura bem rudimentar, sem animais ou qualquer outra técnica facilitadora.

2.Pesca: conhecem bem as marés, as luas e as estações de pesca. Sabem qual o tipo de isca ou técnica correta para pescar determinado peixe, bem como o melhor local para encontra-lo. Utilizam anzol, rede, tarrafa ou zagaia para pescar.

3.Artesanatos: pouquíssimo desenvolvido. Alguns ribeirinhos sabem tecer com fibra vegetal paneiros, cestas, tibitis (acessório para espremer a mandioca), chapéus, etc.

 

 

B. Liderança econômica

     Não há.

   

C. Costumes e filosofias

Algumas festas religiosas oriundas do catolicismo são tradicionais. Além das festas, a superstição exagerada e a crença em mitos e lendas, dirige os costumes deste povo.

 

II. COMÉRCIO

 

A. Compra e venda

Apenas as vilas comportam um armazém ou algum outro tipo de comércio. Quando os povos das comunidades precisam comercializar algo, precisam se deslocar à vila ou cidade mais próxima.

 

B. Fatores que determinam os valores

    A necessidade e o mercado.

 

III.  PPROPRIEDADE

 

A. Posse

     Possuem poucos bens: uma casa, um casquinho, suas armas e ferramentas...

 

B. Atitudes gerais a respeito de propriedades.

Cada qual é responsável por seus bens. A comunidade reconhece e respeita o que é dos outros (inclusive animais, roçado e até árvores).

 

 

ORGANIZAÇÃO SOCIAL

 

 

I. COMUNIDADE

 

A. Relação entre as pessoas que moram na mesma comunidade ou outro local

Relação amistosa e familiar.

 

B. Fatores que determinam quem pode viver numa comunidade ou outro local.

Geralmente é o patriarca ou o presidente da comunidade que avaliam e autorizam a entrada de alguém de fora, bem como indicam e cedem a terra para a pessoa se assentar.

 

C. Razões para mudanças e reconstrução

O casamento pode ser um motivo. Além dele, pode ser por causa de alguma catástrofe natural, isolamento ou algum tipo de invasão.

 

D. Razões para o desenvolvimento de determinadas comunidades

Por ser um povo que vive basicamente do extrativismo, o seu desenvolvimento está sempre atrelado aos recursos disponíveis em torno do local da comunidade, seja na mata ou mesmo nos rios. JUNK (1983) determina três tipos de rios na região com características de produtividades distintas:

 

1.Rio de água branca: Os rios de água branca, como o Amazonas, Purus, Madeira e Juruá nascem na região andina e pré andina. Sua coloração branca, ou barrenta deve-se à alta carga de sedimentos transportados, oriundos dos intensos processos erosivos ocorrente nos Andes. A proporção de metais alcalinos encontrada nessas águas é relativamente alta, causando um pH quase neutro, contendo também quantidades altas de sais minerais em solução. São consideradas águas de elevada produtividade natural, com uma fauna e flora importantes.

2.Rios de água preta: Os rios de água preta, como o rio Negro, têm suas nascentes nos escudos arqueados das Guianas ou nos sedimentos terciários da bacia Amazônica, cujo relevo é suave. Aí os processos erosivos são pouco intensos, e conseqüentemente a carga de sedimentos é baixa. A presença de florestas inundáveis e imensos areais nas áreas de captação desses rios, contribuem para a produção de substâncias húmicas que, aliadas à falta de cálcio e magnésio, dão um caráter ácido às águas, causando um pH baixo. São consideradas águas biologicamente pobres.

3. Rios de água clara: São cursos de rio transparentes e com cor esverdeada, transportando poucos materiais em suspensão. A concentração de cálcio, magnésio e outros sais minerais nesses rios, varia em função da localização de seus mananciais. São também rios de produtividade natural variável.

 

II. FAMÍLIA

 

A. Definição

     Todos os parentes, até os mais distantes, são considerados parte da família.

 

 

 

B. Relações familiares

Os filhos aprendem o ofício,  as tradições e as artes com os pais. É costume dos mais novos (não importando o grau de parentesco), pedir "a bênção" dos mais velhos num sinal de respeito e  reconhecimento da autoridade.

 

III. CASAMENTO

 

A. Cerimônia

     Quando há, é feita segunda as tradições católicas.

 

B. Modo de casamento

Normalmente consiste simplesmente num "ajuntamento" (concubinato) para satisfazer interesses sexuais mútuos. Quando a união perdura, a sociedade reconhece-os como "casados".

 

C. Princípio de casamento

Não respeitam, necessariamente, a fidelidade nem a monogamia. O fato de haver uma "família" constituída, não pressupõe vínculos no relacionamento que garantirão a estabilidade do mesmo.

 

        

ORGANIZAÇÃO POLÍTICA

 

I. TERRITÓRIO

 

A.Restrições ou condições para a colonização deste território pelos nacionais e  outros

      grupos de fora

Aparentemente não há nenhuma restrição para a colonização. Quanto às condições, são determinadas pelos líderes das comunidades, dependendo muito da sua boa vontade.

 

B. Importância do território para o grupo

1. Aspectos culturais: a identificação do indivíduo com a sua comunidade.

2. Aspectos físicos: Apesar de ser do seu território que retiram todos os recursos

     para sua sobrevivência não há a preocupação de limpeza ou preservação.

 

II. GOVERNO

 

A.  Liderança local

Muito diversificada. Algumas são patriarcais; outras, quando do falecimento do patriarca, a matriarca assume a liderança. Porém, em muitas outras comunidades, nem sempre este sistema predomina, então o líder é indicado num tipo de democracia, mas de maneira informal

 

B. Liderança nacional

Os povos ribeirinhos vivem tão à parte da sociedade comum, que muitas das leis nacionais não chegam a atingi-los. Nem para bem, nem para mau. Normalmente este povo só é lembrado em época de campanha eleitoral. A obrigatoriedade do voto é a única "lei nacional" que fazem valer sobre eles. Submetem-se sem complicações a esta lei.

 

III.  LEALDADE  (o que une um povo)

 

Além necessidade natural do homem de viver em grupo, outro fator importante para a união do povo ribeirinho é a luta pela sobrevivência. Outro fator muito forte de união são as observações religiosas da comunidade, mantidas simplesmente por causa das tradições católicas.

 

A. História da origem

    

1.Povos Indígenas: Quando os portugueses começaram a ocupar as terras amazônicas, muitas nações indígenas aqui habitavam há muitos anos. Alguns destes povos há milênios habitavam estas terras, outros chegaram mais tarde vindos das regiões do Centro-Sul, fugindo dos bandeirantes, caçadores de escravos e colonizadores. A agressão e o desrespeito aos povos indígenas datam do período colonial e ainda continua. O índio, por ser diferente, não foi tratado com encanto e admiração, com o interesse de descobrir sua cultura e suas riquezas humanas e históricas. Foi tratado como diferente, o outro, a criança, a quem caberia a escolha, ou de tornar-se igual ao branco europeu, assumindo sua língua, cultura e religião, ou de morrer. Esta mentalidade colonista continua até hoje, e continua agredindo e desrespeitando os primeiros donos destas terras.

 

2. Primeiras Entradas: A chegada dos primeiros portugueses na Amazônia, obedeceu aos seguintes objetivos:

a)Expansionismo português. Portugal sempre quis expandir suas fronteiras. Isto fez parte do programa colonial. E conseguiu, levando o seu domínio para além do tratado de Tordesilhas, firmado com a Espanha.

b)A busca do ouro. Tanto Espanha como Portugal procuravam em primeiro lugar o ouro. A conquista tinha como primeiro objetivo a conquista do ouro.

c) A catequese dos povos indígenas. As embarcações portuguesas subiram e desceram os rios da Amazônia além do intuito de expandir o território e buscar riquezas, tinham como intuito também a evangelização dos povos indígenas.

 

3.Fortificações:  Para proteger as fronteiras, Portugal construiu em alguns pontos estratégicos da Região Norte, fortes e fortalezas. Isso tanto junto ao mar a à foz do rio Amazonas, quanto no interior do território, ao longo dos rios. Foram 44 fortificações. Para a construção desses fortes e para a sua "manutenção", foram empregados migrantes. Foi o que aconteceu, por exemplo, quando a partir de 1962 começaram a construir os fortes do Amapá; na construção do Real Forte Príncipe da Beira, foram empregados 200 trabalhadores entre escravos e livres trazidos do Grão Pará. Assim aconteceu nos outros lugares. Ao redor dos fortes foram surgindo núcleos, constituído de portugueses, escravos e migrantes.

 

4.Imigrantes:  Em meados de 1700, no tempo do governo Marquês de Pombal, chegaram a Região Amazônica (Amapá), os primeiros colonos da ilha dos Açores, mais de 340 famílias, entre portugueses e escravos vindos da colônia portuguesa situada no atual Marrocos.

 

5.Ciclo da Seringa:  No fim do século passado, com o avanço da industrialização e o grande aproveitamento e valorização do látex da seringa, vai acontecer a primeira grande migração de nordestinos para a Região Amazônica. A maioria acabou ficando, constituindo os ribeirinhos, os amazonenses.

 

6.Madeira Mamoré: Iniciada pelos ingleses em 1872 e continuada pelos americanos em 1878, os trabalhos da construção da estrada de ferro Madeira-Mamoré, teria empregado 21.717 trabalhadores: brasileiros, espanhóis, norte-americanos, barbadianos, chineses, japoneses, russos, venezuelanos, ingleses, irlandeses, canadenses, turcos, Thecos, árabes, dinamarqueses, húngaros, portugueses e colombianos.

 

7.Soldados da Borracha:  Durante a 2ª guerra Mundial, o Oriente Trancou o fornecimento de borracha para os países aliados do Ocidente. Por isso, foi criado, no dia 1º de setembro de 1943 o Batalhão da Borracha. Estima-se que dos 56 mil migrante soldados da borracha, submetidos a condições infra-humanas, a metade morreu até o fim da guerra (dois anos) e cerca de 27 mil soldados da borracha, foram esquecidos e abandonados na floresta. Poucos conseguiram voltar para os estados de origem.

 

8.A última leva:  Com o golpe militar de 1964, a Amazônia foi vista a partir da ideologia da segurança nacional, como uma região dotada de riquezas e tendo que ser ocupada - integrar para não entregar. Para tanto foram iniciados vários projetos, como a abertura de estradas e incentivos no setor madeireiro, mineral e pecuário.  Milhares de famílias foram iludidas com promessas de melhoria de vida e terras no Pará, Acre, Rondônia, Roraima, etc. Esta situação jogou um mundo de gente (um milhão de famílias) no desemprego, na estrada e na miséria. Muitas famílias não resistiram. Muitas glebas fracassaram Para muitos a migração se tornou uma grande ilusão. Por isso, muita gente tomou caminho da volta, mas os que ficaram ajudaram engordar um pouco mais a população da região.

 

IV.  RELAÇÕES EXTERIORES (com grupos de fora)

 

A. Comércio

Quando há, é basicamente um sistema de troca, devida a baixa circulação de dinheiro.

 

B. Relações sociais

Ao contrário da nossa cultura, que valoriza o acúmulo de bens, títulos, conhecimento..., para o povo ribeirinho o relacionamento com o próximo é extremamente valorizado.

 

C. Uso e atitudes para com a língua nacional

Linguajar pobre. Não há uma preocupação em se aprimorar dentro da riqueza da língua portuguesa oferece. Utilizam apenas o mínimo de palavras necessárias para poder se comunicar. 

 

D. Relações com as religiões dos grupos de fora.

Em se tratando de evangelização destes povos, nota-se certa resistência da parte de alguns para aceitar o evangelho.

 

E. Atitudes para com os estrangeiros

Bastante interesseira. Geralmente os ribeirinhos vêem os estrangeiros como "aquele que tem algo a  nos oferecer".

 

 F. Atitudes dos grupos de fora para com eles.

Sempre são vistos como preguiçosos e indolentes por outras culturas (p.ex. pessoas do sul do país). Na verdade por conta de uma análise distorcida do seu modo de vida.

 

G. Guerra

Pode ser que haja algum tipo de rixa entre uma ou outra família.

 

 

CONTROLE SOCIAL

 

I. NORMAS DE CONDUTA

 

Não existem leis escritas dentro das comunidades. (Não estamos desconsiderando que estão debaixo das autoridades governamentais, apenas que vivem muito distantes destas). Caminham dentro do "tolerável".

 

II. MANEIRAS DE INDUZIR CONFORMIDADE

 

 Ensino

As tradições, as lendas e até a maneiras de se comportar diante das situações são ensinadas no dia-a-dia de maneira informal.

A educação escolar é muito precária, chegando no máximo ao ensino fundamental (primário)

 

 

COSMOVISÃO

 

Sua maneira de ver o mundo não vai muito além do meio em que estão inseridos: em cima o céu, em baixo a terra, à sua frente água e cercado de mato por todos os lados.  Sua visão de mundo é muito restrita. Não compreendem tempos muito distantes nem grandes distâncias. Tentar ensinar sobre grandezas astronômicas ou microscópicas se torna algo muito difícil.

 

 

I. CONHECIMENTO

 

A. Recordação e comunicação (além de falar)

As tradições  são passadas de geração a geração por meio de narrativas. Este tipo de comunicação é muito valorizado por eles. São capazes de passar muitas horas ouvindo histórias, contos e lendas na maioria das vezes centradas em personagens folclóricos.

 

B. Medicina

A medicina deles é, em grande parte, praticada por pajés, curandeiros e benzedeiras. Fazem muito uso de plantas e ervas medicinais.

 

II. FILOSOFIA

 

A. Medo

Os ribeirinhos têm muito medo dos personagens de suas lendas. São dominados pelo temor a estes espíritos. Matinta Pereira, Mãe d'água, Boto e Cobra grande são alguns deles.

 

B. Ideais

Não almejam nada de grande na vida. Talvez o máximo de poder que alguns chegam a ambicionar é tornar-se um pajé, que desfruta de certa autoridade entre eles, ou ser um líder de comunidade.

 

III. SOBRENATURAL

 

Muito influenciados pela tradição católica somada às crenças animistas da floresta, carregam consigo explicações rotas sobre acontecimentos fundamentais a respeito da existência humana:

 

A. Origens e épocas

Não tem dificuldade alguma em crer num Deus criador de todas as coisas, porém dispensam qualquer tipo de argumentação.

 

B. Alma (espírito do homem)

Paira uma grande dúvida a respeito do destino de nossas almas depois da morte. Muitos afirmam com certeza que ninguém pode saber com certeza para onde irá depois desta vida...

 

C. Lugar dos mortos

Os ribeirinhos tem noção de céu e inferno, embora distorcida. Tem ainda a crença no purgatório...

 

D. Destino dos mortos

Praticamente a ideia católica popular é que predomina: Se a pessoa foi boa enquanto em vida, merece o céu. Já as pessoas más vão para o inferno. Agora, se a pessoa foi boa, mas cometeu alguns pecados, não tão graves para mandá-la para o inferno, então esta vai passar uns tempos purgatório até expiar aqueles pecados, afim de poder entrar posteriormente no céu.

 

E. Deuses ou heróis

Cultuam o "panteão" católico. Muitas comunidades levam o nome de algum santo em homenagem ao padroeiro, o santo protetor daquele lugar, com direito a festas, rezas, imagens, capela, etc.

 

G. Especialistas de rituais

Normalmente nas comunidades existe algum (a) puxador (a) de reza. Geralmente é esta pessoa que se incumbe de fazer cumprir o calendário religioso da comunidade, organizando as missas e comemorações dos dias santos.

 

H. Feitiçaria

Com forte ascendência indígena, os ribeirinhos herdaram muito dos rituais animistas de seus antepassados, seja para cura, prosperidade ou mesmo fazer o mal a um inimigo, os curandeiros e feiticeiros são sempre procurados.

 

 

ARTE E DIVERTIMENTO

 

I. PINTURA E ESCULTURA

 

Os métodos empregados na pintura e escultura.

As artes são praticamente inexistentes entre este povo. Pouco desenvolveram método algum de pintura ou escultura artística, salvo a construção de embarcações, que são feitas de maneira artesanal. Estas também são motivos para brinquedos e miniaturas.

 

 

II. MÚSICA

 

A. Ocasião para tocar

A musica é tocada geralmente em alguma festa ou apresentação de motivo religioso, sempre para homenagear algum santo católico.

 

B. Os tocadores

Poucos moradores destas comunidades sabem tocar algum instrumento.

 

C. Tipo de instrumentos

Geralmente são instrumentos de percussão. Poucos instrumentos de sopro (apitos de madeira) ou de corda (violão).

 

D. Forma de música e cantos usados para várias ocasiões.

Músicas folclóricas e tradicionais. Nos ritos religiosos elas são cantadas de maneira "chorosa", como se fosse um lamento, um pedido de misericórdia.

Depois desta etapa, começa 'rolar' o brega, que juntamente com a bebedeira, esquenta o rítmo da música.

 

III.  DANÇA

 

A dança típica da região é o carimbó. Esta, porém, é preservada apenas pela tradição folclórica.

O brega tem predominado nas festas mais populares das comunidades.

 

IV. Divertimento

 

A. Jogos e brincadeiras

O futebol é a brincadeira preferida entre os meninos, indo até a idade adulta. Entre as meninas, as brincadeiras de roda  com suas cantigas são muito comuns.

 

B. Humor

Bastante simplório. Não compreendem uma anedota que necessite de certo raciocício para entender, mas divertem-se com a situações ridículas como uma queda ou algum erro do próximo. 

 

 

ENSINO E CULTURA

 

I. O QUE É ENSINADO?

 

Além de atividades práticas como caçar, pescar, construir casas, fazer farinha, etc., algumas comunidades (poucas) tem o privilégio de ter uma escolinha de ensino fundamental, que corresponde ao nosso primário. As professoras são da própria região e geralmente elas não passaram além desta formação básica. Se algum ribeirinho quisesse aprofundar mais os seus estudos, teria que mudar-se para alguma cidade grande.

 

 

A. Cultura material

Materialmente falando, que melhor caracteriza um povo é a sua comida. Mas além do seu hábito alimentar, a casa de palha e o casquinho, seu principal meio de transporte, é uma peça fundamental para a  identificação do povo ribeirinho.

 

B. Organização social

Organizam-se em aldeias, comunidades e vilas.

 

C. Arte e divertimento

Futebol, festas, um pouco de artesanato em madeira ou barro. Em comunidades maiores (de 100 a 150 pessoas) pode-se encontrar um televisor com uma antena parabólica. Este presente de político traz um pouco mais de entretenimento (às vezes não muito saudável) ao ribeirinho.

 

  

CONCLUSÃO

 

Esta é a realidade na qual está inserido o povo ribeirinho. Procuramos atentar para o máximo de informações possíveis durante nossa estada entre este povo, pois julgamos ser de grande importância conhecer bem a cultura e os costumes de quem almejamos alcançar.

Só que as barreiras não são poucas. Precisamos transpor, por exemplo, a barreira geográfica: a imensidão da região amazônica aliada à dificuldade de locomoção torna-se, talvez, um grande inimigo, pois o transporte fluvial além de lento é muito caro. Porém não é dos piores. O isolamento social dos ribeirinhos faz com que a aproximação, comunicação, identificação e aceitação de grupos forasteiros transforme-se em não pouca dificuldade. Além destes, podemos ainda lutar contra a falta de informações existentes sobre este povo, mesmo dentro dos órgãos governamentais, pois não há qualquer número oficial da população existente na bacia amazônica. Apenas estima-se que cerca de 2 milhões (!) de habitantes povoem esta região espalhados entre 33 a 38 mil comunidades ribeirinhas. Tampouco há qualquer dado oficial dentro dos meios evangélicos sobre trabalhos missionários entre elas, e novamente ficamos no campo da estimativa. Somando-se alguns dados oferecidos por algumas agências e denominações, como JMN, Jocum, Assembléia de Deus, chegamos a um total de cerca de 3 mil comunidades com um trabalho missionário evangélico. Isto representa apenas 10% de comunidades alcançadas, e, mesmo que toda a comunidade se convertesse (sendo bastante otimista), isto representaria menos de 1% da população evangélica.

Por último, eu citaria o fator tempo como sendo um grande inimigo. São preciso muitas horas, senão dias, para se locomover de uma a outra comunidade, e muito mais tempo para se ganhar a confiança a ponto de transmitir a mensagem do evangelho de forma que eles ao menos te escutem e considerem aquilo que você está transmitindo.

Geografia, acesso, desinformação, tempo e resistência. Eis o desafio dos povos ribeirinhos. Estas são apenas algumas barreiras, digamos “humanas” que encontramos pela frente... há ainda outras muito mais sérias! Mas estas são transpostas pelo poder e pela graça do nosso grande Salvador Jesus Cristo.

 

Reinaldo T Bui