PERFIL DOS PACIENTES HANSÊNICOS ATENDIDOS NO HOSPITAL AQUILES LISBOA

Por Daíse Dos Remédios Moraes Rêgo | 23/07/2010 | Saúde

PROFILE OF PATIENTS IN HOSPITAL HANSENICOS ATTENDED AQUILES LISBOA

Daíse dos Remédios Moraes Rêgo¹

Resumo
A hanseníase é uma doença infecciosa crônica causada pelo Mycobacterium leprae que acomete principalmente a pele e os nervos periféricos das extremidades do corpo isto confere características peculiares a esta moléstia tornando seu diagnósticos simples. O objetivo deste trabalho foi traça o perfil socioeconômico, demográfico e ambiental e as incapacidades físicas, em decorrência da doença, dos pacientes com hanseníase no Hospital Aquiles Lisboa trata-se de pesquisa descritiva, realizada a partir da coleta de dados de pacientes internados no hospital. Observa-se a predominância de casos no sexo masculino (75%); na faixa etária de 20 a 38 anos (40%), da forma virchuowiana (45%) e dimorfa (30%). Setenta (70%) por cento apresentavam incapacidade física, encontrando-se 46,7% desses casos com lesões nos pés, 20% nos olhos e 33,3% nas mãos. Ações junto aos serviços de saúde podem facilitar a detecção precoce dos casos.

Palavras-chave: Hanseníase; Mycobacterium lepare; Paciente Hansênicos.

1 INTRODUÇÃO

A hanseníase é uma doença infecciosa crônica e de longa duração causada pelo Mycobacterium leprae, que acomete principalmente a pele e os nervos das extremidades do corpo. Possui caráter endêmico, constituindo importante problema de saúde publica no Brasil. A transmissão se dá de pessoa a pessoa através do contato prolongado com doentes bacilíferos das formas dimorfas e virchuowiana sem tratamento; os serviços de saúde não tem levado em consideração esses aspectos no controle da transmissão da doença. O tratamento específico do paciente portador de hanseníase, indicado pelo MS, é a poloquimioterapia (PQT) padronizada pela OMS. A PQT mata o bacilo, tornando-o inviável, evitando assim evolução da doença, prevenindo as incapacidades e as deformidades por ela causadas, levando à cura quando realizada corretamente e de forma completa. 1,7,10
O Ministério da Saúde (MS) considera como caso de hanseníase para tratamento quando um ou mais dos seguintes achados: lesão de pele com alteração de sensibilidade, espessamento de tronco nervoso ou baciloscopia positiva da pele, encontram-se presentes. 1,10

¹Aluna do Curso de Graduação em Enfermagem do Centro Universitário do Maranhão. E-mail: daiserego@hotmail.com

A problemática da hanseníase se limita apenas ao grande número de casos devendo ser considerado também o seu alto potencial incapacitante que pode interferir no trabalho e na vida social do paciente, além de perdas econômicas e traumas psicológicos. Essas incapacidades tem sido responsáveis pelo estigma e descriminação dos doentes.15,21,22
As manifestações clínicas da hanseníase incluem tanto lesões neurais quanto cutâneas e variam de acordo com as formas de hanseníase. A predileção pela pele e nervos periféricos confere características peculiares a esta moléstia, tomando o seu diagnostico simples na maioria dos casos. Em contra, o dano neurológico responsabiliza-se pelas seqüelas que podem surgir. 7,11,20
Apesar da meta da Organização Mundial de Saúde (OMS) de reduzir a prevalência da hanseníase abaixo de um caso por 10.000 habitantes até o ano de 2005 não ter sido atingida em nível mundial, mais de 13 milhões de doentes foram curados em todo o mundo, e 112 dos 122 países com níveis superiores a 1 por 10.000 habitantes em 1985 conseguiram atingir os índices propostos pela OMS até o final de 2003.26
A OMS acredita que, no momento atual, definir as razões que impediriam em alguns paises o controle da doença, pode ajudar a conhecer os diferentes fatores envolvidos na transmissão da doença em cada região e possibilita gera eliminação.26
A hanseníase permanece como problema de saúde pública em 10 países, concentrando-se em seis países endêmicos: Índia, Brasil, Madagascar, Moçambique, Nepal e Tanzânia, que apresentam uma taxa de prevalência superior a 3,4 por 10.000 habitantes representando o total de casos registrados nesses países 83 % da prevalência global. Dos 621.000 novos casos comunicados a nível mundial em 2002, 13% ocorreram em crianças com menos de 15 anos, 39% eram multibacilares (MB), e mais de 35 apresentavam incapacidade grau 2 ao diagnóstico.26
Apesar de todo o empenho no diz respeito à eliminação da hanseníase, o Brasil detém o segundo lugar mundial em número absoluto de casos (77.676 casos ? 4.6/10.000 habitantes) e índice de detecção considerado muito elevado (2.41/10.000 habitantes ? 41.070 casos novos).1
Aproximadamente 56% dos casos de hanseníase registrados no Brasil provêm das regiões Norte e Nordeste do país, assim como 40% dos casos novos.10
Destas observações decorre o objetivo da presente pesquisa, que foi traçar o perfil socioeconômico demográfico e ambiental e as incapacidades físicas dos pacientes hansênicos no hospital.


2 METODOLOGIA


Este artigo acadêmico, dissertativo consiste numa pesquisa de campo, descritiva e explicativa, fundamentando-se em referencias bibliográficas, sob caráter prospectivo desenvolvido no Hospital Aquiles Lisboa.
O Hospital Aquiles Lisboa é referência para o tratamento de hanseníase no município de São Luís, atendendo a pacientes de diversas outras localidades.
A pesquisa foi realizada em maio de 2008, envolvendo 20 pacientes internados no Hospital. Para a participação na pesquisa, os responsáveis legais assinaram o termo de consentimentos livre e esclarecido, assim como à direção do hospital foi explanada a pesquisa desenvolvida e, então a autorização para a realização do trabalho.
O instrumento utilizado para coleta de dados foi um roteiro de entrevista elaborado pelas autoras, contendo questões relacionadas aos pacientes.
Os resultados foram analisados, utilizando-se o programa Epi Info versão 3.3.2. Após analise foram dispostos em forma de gráficos e tabelas comentadas conforme a literatura permite ao objeto estudado.


3 RESULTADOS E DISCUSSÃO


A pesquisa de campo, junto aos 20 pacientes atendidos no hospital Aquiles Lisboa, revelou que, houve predomínio do sexo masculino (75%), e da 70% cor parda. No tocante à cor, os resultados foram de acordo com o mostrado por Fonseca et al3. Que, ao analisarem 5.274 casos de hanseníase no Estado do Maranhão, verificaram o predomínio da cor parda. Deve-se levar em consideração que no Nordeste brasileiro, a cor parda (70%), tem predomínio em relação as demais (Tabela 1).
Lombardi & Suárez8 (1997) atribuem número maior de casos masculinos descritos à maior movimentação e oportunidade de contato dos homens e a exames clínicos menos cuidadosos em mulheres.


Tabela 1 ? Características demográficas dos pacientes com hanseníase no Hospital Aquiles Lisboa
Características N° %
Idade
20-38
43-55
63-71
8
7
5

40,0
35,0
25,0
Sexo
Masculino
Feminino
15
5
75,0
25,0
Cor
Parda
Negra
14
6
70,0
30,0
Moradia
Taipa
Alvenaria
11
9
55,0
45,0
TOTAL 20 100,0
N° número de observações

Em relação à escolaridade, verificou-se que 28% são analfabetos; 27% ensino médio, e 45% no ensino fundamental. Apesar de 28% serem analfabetos, observou-se um predomínio de pacientes com algum grau de escolaridade, fato similar aos relatos de Pedroso et al18 e Parra16. No entanto o percentual de pacientes analfabetos (30%) foi superior aos registrados por esses autores e ao da região Nordeste, onde a taxa de analfabetismo foi de 26,6%, a mais alta do Brasil.




















Figura 1 - Freqüência da escolaridade dos pacientes

Os resultados mostram predominância por diferentes faixas etárias (20-38, 43-55, 63-71) demonstrando que 40% dos pacientes se encontravam entre 20 e 38 anos, seguida das faixas etárias de 43 a 55 (35%) e 63 a 71 anos (25%). De acordo com Silva et al.23, 55,8% dos portadores de hanseníase atendidos no Maranhão encontravam-se entre 15 a 44 anos. Apesar do presente estudo ter mostrado uma redução dessa faixa etária, ainda sugere um maior acometimento de indivíduos na fase produtiva de vida. Resultado semelhante foi encontrado por Saho20 , em Salvador-Bahia, nordeste brasileiro.
No que diz respeito à renda expressou os seguintes resultados 50% ganham um salário mínimo; 35% ganham menos de um salário mínimo e 15% não possui renda, o que contraria os estudos de Serruya23, no Rio de Janeiro, Brasil.














Figura 2 ? Renda dos pacientes entrevistados


Dos resultados da freqüência do tipo de moradia, apresentou os seguintes percentuais: 45% possui moradia de alvenaria e 55% de taipa.
O estudo da freqüência da incapacidade física dos pacientes, mostrou que: 70% possuía algum tipo de incapacidade e 30% não possui. Dentre as pessoas que possuem 46,7% a lesão encontrava-se nos pés, 20% nos olhos e 33,3% nas mãos.

















Figura 3 ? Local da incapacidade física

Na avaliação do grau de incapacidade, constatou-se através do exame físico, que a maioria (70%) dos pacientes apresentavam algum grau de incapacidade física, dados semelhantes aos encontrados por Oliveira14, Borges et el2, Pedroso et el18, Pedrazzani et al17 e Meima et al9, todos com níveis superiores a 55%. Divergiram, porém dos observados por Zambon et al27, Saha & Das19, Parra16 e Goulart et al5, nos quais os relatos de incapacidade físicas foram de 44%, 22,3%, 37% e 24%, respectivamente. Cabe ressaltar que, nos estudos onde houve predomínio de pacientes apresentando algum grau de incapacidade, a determinação do mesmo foi realizado a partir do exame físico pelos próprios pesquisadores. Naqueles, onde o número de pacientes foi inferior a 50%, utilizou-se dados secundários, ou seja: a partir dos registros nos prontuários dos pacientes.
Os dados do Ministério da Saúde são contrários aos achados de outros autores, pois 78% dos casos novos não apresentam incapacidades físicas, levando ? nos a crer que a avaliação do grau de incapacidade não vem sendo realizada de forma cuidadosa e, provavelmente, muitos pacientes que apresentam anestesia na córnea, mãos e pés, deixaram de ser identificados4.
Considerando-se a forma clínica, observou-se que a maioria dos pacientes pertencia à forma virchuowiana (45%), seguido da forma dimorfa (30%) e da forma indeterminada (20%). O fato de os pacientes diagnosticados como portadores de hanseníase tuberculóide representarem 5% dos casos estudados mostra que é pequeno o acometimento da população capaz de desenvolver imunidade celular mais intensa contra o Mycobacterium leprae, e portadora de resistência natural a este bacilo favorecendo a hipótese de não expansão desta endemia6,12.

























Figura 4 ? Freqüência da formas de hanseníase


Dos 20 pacientes entrevistados 75% tiveram conhecimento que portava a doença através de exames realizados devido às manchas ou insensibilidades local e 25% devido a atrofia dos nervos dos membros.
Quanto ao tratamento realizado fora do hospital expôs os seguintes percentuais: 35% realizavam e 65% não, e em relação às orientações recebida de como tratar a doença 45% sim, recebem orientações e 55% não recebem tais orientações.
Do total de casos examinados quanto à orientação sobre o tratamento, 85,7% dos que realizavam tratamento fora recebiam orientações e 14,3% não recebiam. E dos que realizavam tratamento somente neste hospital 23,1% recebiam orientações e 76,9% não recebiam.

Tabela 2 ? Cruzamento entre pacientes que recebiam orientação e os que realizavam tratamento fora dos hospital
Tratamento Recebiam orientações Não recebiam orientações TOTAL
Fora do hospital 85,7% 14,3% 100%
Somente neste hospital 23,1% 76,9% 100%
TOTAL 100% 100% 100%

O item pesquisado o qual interroga a existência de alguma patologias associadas à doença mostrou que: 65% sim e 35% não possuem patologias associadas.












Figura 5 - Existência de alguma patologia associada à doença

Ações de treinamento junto aos serviços básicos de saúde podem facilitar a detecção precoce efetiva dos casos existentes. Além disso, torna-se necessário maior o controle dos casos por parte das unidades de saúde para evitar o abandono ao tratamento, garantindo assim a cura aos pacientes com o mínimo de incapacidades.


CONCLUSÃO


A partir desses dados, pode ? se concluir que o Hospital Aquiles Lisboa apresentou um alto número de casos novos de hanseníase, em indivíduos de faixa etária economicamente ativa e tendo a forma multibacilar ainda predominante na região. Esses indicadores apontam para uma elevada circulação do bacilo na comunidade, mostrando a dificuldade de se atingir à meta de eliminação da hanseníase, visto que existem obstáculos, como irregularidade e abandono do tratamento pelos pacientes. Nesse sentido, acreditamos que é de grande importância o aprimoramento das condições operacionais de rede de serviços e a necessidade da criação de novos projetos e linhas de combate hanseníase no Brasil.



REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1 Araújo MG. Hanseníase no Brasil. Ver Soc Brás Méd Trop. 2003; 36:373-82.

2 Borges E, Gallo MEN, Alvim MFS, Bittencourt E. Determinação do grau de incapacidade em hansenianos não tratados. Caderno de Saúde Pública 3:266-271,1987.

3 Fonseca PHM, Cutrim Jr RJ, Carneiro SFM. Hanseníase no Estado do Maranhão. Análise de 5.274 casos. Arquivos Brasileiros de Medicina 57:175-177, 1983.

4 Fundação Nacional de Saúde, Centro Nacional de Epidemiologia, Coordenação Nacional de Dermatologia Sanitária. Dados epidemiológicos de 1998. (Disponível em <Internet: http:// www.who.int/lep/index.html>. Acesso em 09 mar. 2001). Ministério da Saúde, Brasília, 1998.

5 Goulart IMB, Silva AA, Oliveira ACS, Quarasmin CR, Dias CM, Silva DP, Lopes MRF, Alves RR. Grau de incapacidade: indicador de prevalência oculta e qualidade do programa de controle de hanseníase. Revista da Sociedade Brasileira de Medicina Tropical 34:453,2001.

6 High WA. Man with na annular, dyspigmented, anesthetic plaque onthe right thigh. Medscape Dermatology. 2002;3:1.

7 Leprosy Info [homepage on the Internet]. Genve: Guide to Eliminate Leprosy as a Public Health Problem. World Health Organization [updated 2005 June 113; cited 2005 June 21]. Available from: http://www.who.int/lep/.

8 LOMBARDI, C. & SUARES, R., 1985. Secular trends in age at onset, sex ratio, and type index in leprosy observed during declining incidence rates. American Journal of Epidemiology, 4:695-705.

9 Meima A, Saunderson PR, Gebre S, Desta K, Oortmarssen GJV. Habbema JDF. Factores associated with impairments in new leprosy patients: that AMFES cohort. Leprosy Review 78:189-203,1999.

10 Ministério da Saúde. Sistema Nacional de Vigilância de Saúde. Relatório de situação: Santa Catarina. Brasília, 2005.

11 Ministério da Saúde. Guia para o controle da hanseníase. Cadernos de atenção Básica n° 10. Brasília;2002.

12 Newell K W. Na epidemiolost?s view of leprosy. Bull World Health Organ. 1966; 34:827-57

13 Oliveira MHP. Associação entre atividades ocupacionais dos hansenianos e incapacidades físicas. Revista Brasileira de Enfermagem46:279-285,1993.

14 Oliveira MHP. Incapacidades físicas em hanseníase. Tese de doutorado, Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo, SP, 1987.

15 Organizacion Panamericana de La Salud. Hacia la eliminacion de la lepra como problema de salud pública. Boletin de la Oficina Sanitária Panamericana. Washington, DC, EUA, 1995.

16 Parra MC. Caracterization sócio-economica de los leprosos atendidos em la unidade de dermatologia sanitária de Maracaibo, Venezuela: um estúdio de casos. Cadernos de Saúde Pública 12: 225-231,1996.

17 Pedrazzani ES, Maluf AS, Pedroso M, Toyada CY. Prevenção de incapacidades físicas em hanseníase: realidade numa unidade sanitária. Hanseníase Internationnalis 10:10-22,1985.

18 Pedroso M, Oliveira S, Baccarelli R, Vieira PCT, Gonçalves A. Incapacidade físicas em hanseníase. Estudo multicentrico da realidade brasileira. Anis Brasileiro de Dermatologia 64:301-306,1989.

19 Saha SP, Das KK. Disability pattern amongst leprosy cases in a urban área (Calcutá). Indian Journal Leprosy 65:305-315, 1993.

20 Saho M. Características epidemiológicas da hanseníase no município de Salvador. Revista Baiana de Enfermagem, Salvador, 11:9-18, 1998.

21 Sampaio SAP, Rivitti EA. Dermatologia. 2ª ed. São Paulo: Artes Médicas, 2001: 467-88.

22 Santos S. Em busca da cura hanseníase. Revista de Enfermagem da Universidade Estadual do Rio de Janeiro 2: 77-82, 1994.

23 Serruya J. Hanseníase no município no município do Rio de Janeiro. Anais Brasileiros de Dermatologia 56:251-254, 1981.

24 Silva AR, Costa JML, Silva MCP, Rodrigues KCA, Bárbaro J, Santos JS, Bastos JRM, Vieira JÀ, Mendes W. Projeto Buriticupu: relatório de 1993. Santa Luzia: UFMA (documento mimeografado), 1994.

25 Talhari S. Hanseníase: situação atual. Anais Brasileiros de Dermatologia 19:209-215,1994.

26 World Health Organization. Leprosy Elimination Project: Status Report. 2003 Dec. [on line]. Available from: http://www.cefpas.it/leprosy/s20042.pdf.

27 Zambon VD, Kaneko KA, Pedrazzani ES. Avaliação epidemiológica e operacional do programa de controle da hanseníase na região de São Carlos ? SP no período de 1983/1988. Revista Brasileira de Enfermagem 43:88-95,1990.