Parto Anônimo

Por Ana Carolina Cunha Magalhães | 22/02/2015 | Direito

 

 

 

 

 

Parto Anônimo 

 

Alunos: Ana Carolina Cunha Magalhães, Daniel Lima Magalhães, Kadydia Barreto. 

 

Faculdade Luciano Feijão,  6 ° semestre, tarde. 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Resumo:   

 

O presente trabalho tratará a respeito da proposta de legalização do Parto AnônimoAbordaremos questões sociais, políticas preventivas, condições de saúde nos hospitais para o acolhimento das crianças, educação sexual, procedimentos para adoção. Falaremos sobre leis já existentes para prevenir o abandono de recém-nascidos. 

 

 

 

 

 

 

 

Palavras Chaves: parto anônimo, abandono, adoção. 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Introdução: 

 

 

 

O Parto Anônimo visa permitir à mulher, entregar o recém-nascido para a adoção no próprio hospital, sem se identificar, mantendo o seu anonimato. A entrega à adoção poderá ocorrer em dois momentos: depois do nascimento, quando a mãe deixa o filho no hospital, ou quando a mãe, antes do nascimento, comparece ao hospital declarando que não quer a criança. No último caso, a mãe realizará tanto o parto como o pré-natal sem ser identificada, porém terá acompanhamento psicossocial, bem como explicações das consequências jurídicas de seu ato. Após oito semanas a criança será encaminha á adoção, e a mãe biológica se isenta de qualquer responsabilidade. 

 

Durante essas oito semanas o hospital, onde a criança foi recebida, terá total responsabilidade sobre ela. 

 

Segundo o Deputado Federal Eduardo Valverde (PT-RO), se aprovada, a lei criará mecanismos para coibir o abandono materno. O objetivo é garantir o sigilo da identidade da mãe diante de uma gravidez não planejada  e que não quiser ou não puder assumir a responsabilidade do filho. 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

A Roda dos Expostos: 

 

De acordo com Fabíola Santos Albuquerque 

 

 

 

“o parto anônimo diz respeito a um instituto que busca equalizar dois 

 

interesses contrapostos, de um lado garantir que uma criança indesejada 

 

pela mãe não seja vítima de abandono, aborto ou infanticídio e, de outro, 

 

que à mãe, que não quer ser mãe, seja assegurada o direito ao anonimato e 

 

a não formação da relação materno-filial” 

 

 

 

em respeito a sua liberdade. (ALBUQUERQUE, 2007: 11). 

 

O parto anônimo , visa reinventar a chamada Roda dos Expostos, que era uma prática do ano de 1943, usada até o século passado. Aroda dos expostosconsistia num mecanismo utilizado para abandonar recém-nascidosque ficavam ao cuidado de instituições decaridade. O mecanismo, em forma de  portinhola giratória,embutido numaparede, era construído de tal forma que aquele que expunha acriançanão era visto por aquele que a recebia. 

 

O projeto já é lei em países como  Áustria, França, Alemanha, Luxemburgo, alguns estados dos Estados Unidos, África do Sul , Itália, Bélgica dentre outros. No Brasil, houveram três projetos sob o Parto Anônimo: IBDFAM, Instituto brasileiro de direito de família, (Projeto de Lei n° 3220/08),  outro do Deputado Sérgio Barradas Carneiro (Projeto de Lei nº 3320/08)  e outro Deputado Eduardo Valverde (Projeto de Lei nº 2747/08). 

 

 

 

  

 

 

 

O perfil das mães que abandonam seus filhos e a possibilidade de ser aplicado políticas preventivas para evitar o abandono. 

 

  

 

 Na pesquisa de campo ao Hospital Dr. Estevão, conversamos com a assistente social responsável pela maternidade: Lany . Segundo a mesma, maior parte das gestantes que não querem criar seus filhos,  possuem o mesmo perfil. A maioria das mulheres são usuárias de drogas, não usam nenhum método para evitar uma gravidez indesejada. Quando engravidam, não possuem nenhuma perspectiva para o filho que estão esperando. A droga não permite. A consequência disso, é a não realização de pré-natal, e a rejeição ao filho ao nascer. Elas querem abandonar os filhos o mais rápido possível para poder  consumir mais drogas. Por isso, os jogam no lixo, os abandonam no hospital, ou quando muito fazem, assinam um termo abrindo mão de sua responsabilidade, para que a criança possa ficar apta à adoção. Porém, o problema não é só a droga. Em outros casos, é muito comum a gestante abandonar seu filho quando ela é profissional do sexo, ganha seu dinheiro se prostituindo, e por isso não podem engravidar. Constatamos também, mas em menor frequência, a falta de condição econômica e a gravidez precoce, como ensejo de outros abandonos. A situação econômica de várias famílias no Brasil é crítica. Muitas famílias têm que sobreviver com apenas um salário mínimo, mulheres que vivem em situações assim, já possuem vários filhos e por conta da dificuldade, não querem ter mais um. Outra causa, é a gravidez precoce. A educação sexual e as políticas preventivas, no Brasil, ainda é precária, é necessário que assuntos sobre  sexo e como prevenir uma gravidez e doenças sexualmente transmissíveis, sejam conversadas abertamente na escola e no  seio familiar. 

 

Conforme a assistente social que entrevistamos, as gestantes que não querem criar seus filhos, demostram claros sinais de rejeição, de tal forma que despertam a atenção de médicos, enfermeiros e assistentes sociais. Muitas vezes não é preciso nem a  mãe falar que não quer a criança. Certos tipos de comportamento, por parte da parturiente, são suficiente para a equipe do hospital perceber que ela não quer criar o filho, como por exemplo: A não realização do pré-natal, uso de drogas, depressão, rejeição para amamentar. Esses tipos de comportamento, levam os psicólogos e assistentes sociais avisarem a mãe sobre as consequências do abandono, e tentarem convence-la a ficar com o bebê.   Segundo a assistente social, se houvesse uma maior equipe e uma melhor preparação, seria possível evitar o abandono, por meio de um acompanhamento com psicólogos e assistentes sociais. Acompanhamento esse, já é previsto em lei: 

 

ECA artigo 5°: “ A assistência referida no parágrafo 5° do referido artigo deverá ser também prestado à gestantes ou mães que manifestam interesse em entregar seus filhos para adoção.” 

 

ECA artigo 8°, parágrafo 4°: “ Incumbe ao poder público proporcionar assistência psicológica, à gestante, à mãe, no período pré e pós natal, inclusive como forma de prevenir  ou minorar as consequências do estado puerperal.” 

 

 

 

Estado Puerperal: 

 

Os estado Puerperal é um outro ensejo para o abandono e as vezes até o infanticídio. É uma alteração de hormônios no corpo da mulher, que ocorre durante ou  logo após o parto, podendo gerar rejeição ao filho que deu a luz. Muitas parturiente passam por um forte estado Puerperal, e nesse momento querem se desfazer de seus filhos e até mesmo mata-los. Esse ensejo é mais específico, trata de uma situação atípica, por isso recebe uma legislação especial no Código Penal. Artigo 123 do Código Penal: “ Matar sob a influência do estado Puerperal, o próprio filho, durante ou logo após o parto, Pena- detenção de dois a seis anos.” 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

O anonimato da parturiente: 

 

Art. 4º do Projeto de Lei n° 3220/08:   A mulher que solicitar, durante o pré-natal ou o parto, a preservação do segredo de sua admissão e de sua identidade pelo estabelecimento de saúde, será informada das conseqüências jurídicas de seu pedido e da importância que o conhecimento das próprias origens e história pessoal tem para todos os indivíduos. 

 

Parágrafo único: A partir do momento em que a mulher optar pelo parto anônimo, será oferecido à ela acompanhamento psicossocial.   

 

 

 

Art. 10: A mulher que desejar manter segredo sobre sua identidade, fica isenta qualquer responsabilidade criminal em relação ao filho, 

 

ressalvado o art. 123 do Código Penal Brasileiro 

 

 

 

Conforme o projeto, durante o pré-natal e o parto, a parturiente poderá manter em sigilo sua verdadeira identidade, utilizando um nome falso, não podendo ser punida por isso. Entretanto o hospital terá informações sobre sua verdadeira identidade no prontuário médico, que terá validade de 20 anos, após isso ele será deletado. Entretanto, uma pessoa que nasceu do parto anônimo só terá acesso à essas informações por meio de uma ordem judicial ou em caso de doença genética do filho . 

 

 

 

O registro do menor: 

 

 

 

O projeto de lei do IBDFAM, em seu artigo  9º diz que:  “A criança será registrada pelo Juizado da Infância e Juventude com um registro civil provisório, recebendo um prenome. Não serão preenchidos os campos reservados à filiação.” 

 

Parágrafo único. A mulher que optar pelo segredo de sua identidade pode escolher o nome que gostaria que fosse dado à criança. 

 

 

 

O projeto não deixa esclarecido como ficará a identidade dessa criança. O artigo fala em um nome provisório, que poderá ser mudado pelos pais adotivos. Após ser adotada, a criança passará a ter um registro definitivo. Mas isso demanda tempo, e durante esse tempo a criança cria vínculos afetivos por meio do nome que lhe foi dado, e por isso não podem ser ignorados. Dessa forma, onde fica o direito à personalidade garantido pela Constituição Federal ? 

 

 

 

 

 

Os abrigos: 

 

 

 

A mídia  dar muita  ênfase as formas cruéis de abandono de recém-nascidos, e isso faz fomentar uma conjuntura favorável ao parto anônimo”, e observarmos alguns benefícios que  esse projeto de lei pudesse nos trazer:  

 

 

  1. Evita que gravidez indesejada seja alvo de aborto clandestino pondo em risco a vida da gestante. 

  1. Visa a diminuição do numero de abandonos de recém-nascidos em lugares ermos. 

  1. A parturiente vai poder contar com grande acesso às redes públicas; 

 

  1. ‘’O parto anônimo não visa “legalizar” o abandono, mas equalizar dois interesses contrapostos, ou seja, garantir que uma criança indesejada pela mãe não seja vítima de aborto, abandono ou infanticídio, e que a mãe tenha liberdade para assumir ou não a maternidade e o direito ao anonimato’’ 

 

 

 

 

 

 

 

 

 Precisamos tomar cautela, pois se aprovado esse projeto de lei, uma mãe que por qualquer motivo não quiser seu filho, vai ter toda a facilidade para se desfazer dessa criança. Isso, com certeza, iria aumentar o número de crianças entregues, consequentemente os abrigos iriam ficar superlotados.Então precisamos saber, será que os abrigos do Brasil possuem estrutura para suportar o aumento de numero de crianças abandonadas? 

 

 Ao visitarmos o único abrigo na cidade de Sobral-CE, Abrigo São Franciscopudemos constatar que não. Primeiramente, o abrigo foi criado pela existência da necessidade de um lugar para acolher crianças abandonadas, mas o mesmo não foi instituído por iniciativa da prefeitura local, e sim de uma comunidade católica, que por meio de seu trabalho social dar assistência à essas crianças. O alojamento, segundo o responsável, Aleandro, recebe da prefeitura o valor de R$18.000,00 (dezoito mil reais) por ano. Equivale a R$ 1.500,00 mil e quinhentos reais) por mês. Segundo Aleandro, só os gastos com funcionários equivale a R$ 7.000,00 sete mil reais), sem falar em água, luz, telefone, transporte, alimentação, produtos de higiene. O abrigo, hoje, acolhe 13 crianças, com  idade entre 0 à 6 anos. O número de famílias que querem adotar é muito grande, porém o processo é muito burocrático e demorado, isso faz com que a saída  dessas crianças do abrigo seja demorada. Talvez seria primordial o governo investir numa necessidade que já existe, do que criarem mais leis, se não há estrutura para efetiva-la. 

 

 

 

 

 

A responsabilidade que cairia sob os hospitais públicos se aprovado o projeto e suas atuais condições: 

 

 

 

O artigo 5° do Projeto de Lei nº 2747/08  “ Os hospitais deverão criar estruturas físicas adequadas que permitam o acesso sigiloso da mãe ao hospital e o acolhimento da criança pelos médicos.” É preciso avaliarmos se os hospitais no Brasil terão condições para acolher essas crianças 

 

  

 

Art. 9º A criança só será levada à adoção após oito semanas da data em que chegou 

 

ao Hospital, período em que a mãe ou parentes biológicos poderão reivindicá-la. 

 

Art. 10º As formalidades e o encaminhamento à adoção serão de responsabilidade dos 

 

médicos e enfermeiros que acolheram a criança abandonada, bem como, do diretor do Hospital. 

 

  

 

A priori, é necessário observarmos que, hospital não é local para acolher uma criança durante oito semanas. A criança ficará sujeita a infecções hospitalares, e á todo tipo de doenças durante esses dois meses. É preciso falarmos, também,  que a situação dos hospitais públicos no Brasil é muito crítica. Há a falta de estrutura física, falta de médico, falta de enfermeiros, falta de medicamentos, falta de material de higiene, e aí precisamos avaliar, será que o governo terá condições de oferecer uma boa estrutura para efetivar essa lei  ( se aprovada) ?  

 

Ao visitarmos o hospital público da cidade de Sobral, pudemos aferir que não. Conversamos com alguns médicos e enfermeiros que além de não concordarem em manter os recém-nascidos nos hospitais durante oito semanas, também não concordaram em serem os responsáveis em encaminhar essa criança para adoção. Isso não faz parte do trabalho exercido por eles.  

 

 

 

Conselho Tutelar e CREAS: 

 

 

 

O Conselho Tutelar e o CREAS (Centro de Referência de Assistência Social) trabalham juntos para tentar impedir o abandono de crianças. Quando um desses órgãos recebem a notícia que  há alguma gestante que pretende entregar seu filho à alguém, ou que há alguma mãe que demostra claros sinais de rejeição, eles vão até essas pessoas, tentam convecê-las a ficarem com seus filhos. Entretanto muitas delas já estão certa do que querem e não voltam atrás, então o Conselho Tutelar ou o CREAS procura os familiares daquela criança, seja avó, tio, ou até mesmo os parentes mais distantes, para lhes entregarem a guarda provisória do menor, afim de que não se perca os vínculos afetivos. Entretanto, precisamos avaliar: Se aprovado o Parto Anônimo, como o Conselho Tutelar ou o CREAS irão procurar pela família da criança, se vai ser mantido o anonimato da mãe? 

 

 Não sendo possível, a criança será encaminhada para adoção. A adoção é um procedimento para ser feito em último caso.   

 

Os Agentes da saúde da Família, são profissionais que também ajudam no trabalho de identificar mães que não querem seus filhos ou mesmo se recusam a fazer o pré-natal ou a ter qualquer tipo de cuidado que uma gestante deve ter. Quando identificam alguma situação avisam ao Conselho Tutelar ou CRESAS, que tomam suas providências.  

 

O projeto de lei, visa facilitar á entrega da criança à adoção, para evitar o abandono de incapaz. Entretanto, conforme pesquisas realizadas, podemos constatar que não há nenhuma burocracia para se desfazer da criança na forma legal prevista na lei. Quando uma parturiente  quer entregar seu filho à alguém, é preciso apenas, que ela assine um termo abrindo mão de sua responsabilidade. Quando o conselho tutelar junto ao CREAS, tomam conhecimento disso, lhe dão um atendimento psicológico para que não haja arrependimento. Conhecendo a realidade de perto constatamos que há muitos casos de mulheres que antes de parir já tem prometido dar seu filho para determinada família, muitas vezes nem chegando as vistas dos conselheiros, de forma que isso não é de mal grado como falou o conselheiro, sabemos que há sim uma grande burocracia para se efetivar uma adoção, e como uma forma de burlar a lei é feita a adoção a brasileira, assim depois de receber a criança as famílias adotivas procuram o conselho, defensoria para formalizar a adoção evitando assim que a criança passe pelo abrigo.  

 

 

 

O parto anônimo frente a Constitucionalidade: 

 

O Parto Anônimo foi alvo de muitas criticas e dividiu opiniões. Um dos pontos polêmicos do projeto de lei é que a facilitação para adoção viola  a primeira parte  do artigo 19 do ECA ( Estatuto da Criança e do Adolescente), que diz: “ Toda criança ou adolescente tem direito a ser criado e educado no seio da sua família, e excepcionalmente em família substituta”. A preservação do anonimato da mãe, tira da criança o direito de saber sobre sua origem genética. Direitos que são garantidos pela Constituição Federal, em seu artigo 5°, inciso XXXIII: “ Todos tem direito de receber, dos órgãos Públicos, informações de seu interesse particular”. 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Conclusão 

 

 

 

O parto em anonimato não é a solução para o abandono de recém-nascidos, pois este fator está diretamente ligado à implementação de políticas públicas. Já existem leis que garantem a vida do recém-nascido, a adoção, a assistência à parturiente que deseja entregar o filho, a punição para quem abandona. O que deve-se fazer é criar mecanismos para efetiva-las. Não basta criarmos mais leis. 

 

O Estatuto da Criança e do Adolescente foi criado para a proteção integral da criança e do adolescente. Num país como o Brasil, o ECA foi uma grande conquista, por meio dele é garantido todos os direitos da criança e do adolescente. Então, como podemos aprovar uma lei que ignora boa parte desses direitos? Como podemos aprovar uma lei que ignora toda a luta e trabalho feito pelo ECA? A aprovação do Parto Anônimo seria um retrocesso. Voltaríamos a viver numa sociedade onde crianças e adolescentes não têm seus direitos garantidos.  

 

 

 

 REFERÊNCIAS: 

 

 

 

ALBUQUERQUE, Fabíola Santos.O instituto do parto anônimo no direito brasileiro: 

 

avanços ou retrocessos. In: Em destaque - Parto em anonimato: uma janela para a vida. 

 

 

 

OLIVEIRA, Daniel Bogado Bastos. XIII Encontro de história Anpuh Rio. Em destaque: Parto Anônimo. 

 

ALMEIDA, Marília. Parto Anônimo: entenda o projeto que permite abandonar o recém-nascido. 

 

 

 

Estatuto da Criança e do Adolescente. 

 

Constituição Federal. 

 

Projeto de Lei 3220/08 do Instituto Brasileiro de Direito de Família. 

 

Projeto de Lei n°  2747/08  do Deputado Eduardo Valverde