PARTE CDXXIV – “OS CHEFES DE POLÍCIA E QUESTÃO SALARIAL: MAURÍCIO NORONHA E A ‘CARTA NA MANGA?’”
Por Felipe Genovez | 06/06/2018 | HistóriaPROJETO DE UNIFICAÇÃO DOS COMANDOS DAS POLÍCIAS NO ESTADO DE SANTA CATARINA
Data: 20.11.2003, horário: 09:00 horas:
Estava na “Assistência Jurídica” e o Delegado Tim ligou avisando que precisava conversar comigo. Quando já estava na sua presença, ele relatou que no jantar de ontem na sede da “Deic” o Chefe da Polícia Civil novamente cobrou o projeto de criação das seis Diretorias da Polícia Civil. Segundo Dirceu Silveira a Polícia Militar havia criado esses órgãos por meio da Lei Complementar 248/2003 (criou seis comandos militares). Argumentei que não iria viajar naquela próxima sexta-feira e que poderíamos conversar à tarde. Tim comentou que Dirceu Silveira havia cobrado novamente o trabalho do grupo, queria resultados. Fiquei pensando no nosso “projeto” da “Procuradoria-Geral de Polícia” e pensei: “Será que Dirceu está pensando grande ou está pensando pequeno? Bom, se é para cobrar então vamos cobrar dele o resultado daquele importante projeto, será que ele vai gostar?” Pelo que estava querendo parecia que a sua estratégia era copiar a Polícia Militar, enquanto que o projeto da “Procuradoria-Geral” era algo grandioso e de nossa iniciativa, porém, benéfico para ambas as Polícias e para a sociedade. Mas só o tempo é que iria mostrar a verdade e para onde estariam nos conduzindo...
Tim ainda participou que Dirceu estava indo para um encontro de Chefes de Polícia na cidade de Foz do Iguaçu. Imediatamente relembrei daqueles encontros que o Delegado Evaldo Moreto também participava e que de concreto nunca saiu absolutamente nada, somente cartas de intenções. Khrystian depois me esclareceu que o “doutor Xox.” (nome com que ela carinhosamente tratava o Delegado Peixoto), também iria junto ao encontro dos Chefes de Polícia e que retornariam no próximo sábado.
Horário: 15:00 horas:
Tim me ligou aprontando uma daquelas suas:
- “Doutor Felipe, o pessoal já está querendo ir embora. O senhor já vai subir?”
Imaginando que o pessoal do “grupo” realmente estava me aguardando respondi que já estava subindo. Ao entrar na sala de Tim fui surpreendido com as presenças dos Delegados Maurício Noronha, Arthur Régis e Adriano Luz.
Logo percebi que se tratava de um trote de Tim Omar que me meteu numa saia justa, não esperava encontrar o pessoal da Adpesc na sua sala. Logo que abri a porta e percebi o panorama tentei em vão retroceder. Noronha foi quase que gritando:
- “Êpa, olha ele não quer entrar!”
Percebi que era comigo e tinha tudo haver com minhas opiniões acerca da correspondência que Noronha encaminhou para todos os Delegados enaltecendo o “plano de cargos e salários”. Em segundos refleti que não tinha escapatória. O Delegado Régis estava bem mais afável, político, receptivo e foi logo argumentando:
- “Doutor Genovez o teu pai já votou em mim. Tais aí com a tua célula? Eu acompanhei o voto do teu pai. Ele votou direitinho em mim. Gente boa! Vai votar em mim? Quer que eu pegue a célula?”
Argumentei que havia esquecido minha célula em casa. Régis insistiu que pegaria uma. Argumentei que não e que à tarde traria a minha célula. Régis disse que à tarde viria na “Assistência Jurídica” para pegar a minha célula. Eu concordei. Aquela altura eu já tinha plena capacidade de compreender o que tinha que falar para os visitantes. Nisso Tim me introduziu:
- “O doutor Felipe tem algumas ideias sobre o ‘plano’...”.
Acabei sendo incisivo e direto:
- “Eu não entendo, li a carta e fiquei procurando na lei onde é que consta um dispositivo assegurando isonomia dos Delegados com os Procuradores. Não existe nada. Então fiquei me perguntando: ‘como é que o Noronha colocou na carta aos Delegados que a partir de agora nós iríamos ter isonomia com os Procuradores?’ Me mostra na lei, Noronha?”
O presidente da Adpesc procurou disfarçar a situação constrangedora porque passava, pois os demais ficaram em silêncio, então reiterei:
- “Pelo o que eu sei os Delegados ficaram foi no prejuízo, pois vão ter que carregar nas costas todos os policiais civis, os Oficiais da PM, os policiais militares e, ainda, o Sistema Prisional. Todo vez que forem reivindicar salários ou qualquer outra vantagem vão ter que pleitear para todo esse universo de servidores. Brincadeira. E vem gente dizer que o ‘plano’ é ótimo, excelente. Sinceramente, eu acho que nós temos que dizer para o governador e para o Secretário que os Delegados estão fazendo um sacrifício enorme para viabilizar esse ‘plano’. Essa é a verdade. Nós não estamos levando nada, absolutamente nada. Você já fez uma comparação, Noronha, para ver o que os Oficiais da PM estão levando e o que os Delegados irão levar?”
Noronha, parecendo perdido no meio daquela saraivada de provocações, mas com presença de espírito e sem perder a noção do tempo e lugar, refutou:
- “Mas eu tenho uma ‘carta na manga’. Eu tenho. Vocês não imaginam. É só esperar. Tu vais ver. Eu respeito o teu conhecimento jurídico, mas tu não sabes. Tem um negócio que agora eu não posso contar prá vocês”.
Pego de surpresa com a história da “carta na manga”, ponderei:
“Bom, se for relativo a dinheiro é complicado acreditar porque daqui para frente tudo que os Delegados reivindicarem vão ter que levar um monte de gente nas costas. Agora, só se for sobre a questão da aposentadoria aos trinta anos, é isso? Se bem que isso não beneficia só os Delegados, beneficia todos os policiais. Bom, se for a aposentadoria já é alguma coisa, já é um início...”.
Noronha não quis abrir o jogo e eu fiquei imaginando: “será que é conversa tipo ‘cala a boca’? É provável que vamos ter que esperar para saber se existe realmente alguma coisa. Será que dá para acreditar? Não sei, sinceramente, não sei!” Noronha continuou a fazer uso da palavra:
- “O importante foi que nós conseguimos a isonomia. Nós corríamos o risco de perder lá em Brasília o nosso recurso, pelo menos garantimos e isso foi muito importante. Não imaginas”.
Novamente contraditei:
“Ah não Noronha, o governo de qualquer maneira para viabilizar um plano de cargos e salários para todos os policiais civis, militares e agentes prisionais precisava de um parâmetro. E a jogada foi usar os Delegados. Nada mais que isso. Eu não tenho dúvida que nós fomos usados. Por isso que eu digo que nós fomos para o sacrifício para viabilizar um plano. A pressão em cima do governo foi tanta que ele não poderia retroceder”.
Noronha insistiu:
- “E, mais se os Delegados não concordassem, não seria aprovado nada”.
Argumentei:
- “Espera aí, claro que foi importante a convalidação. Mas isso era algo muito natural. Agora eu pergunto: ‘Por que não negociaram com o governo retirar o recurso lá em Brasília? Por quê? Bastava constar da nova lei que o governo concordava com a isonomia com Procuradores do Estado e que ele desistia do recurso. O governo não fez nada disso. A legislação aprovada não possui um único dispositivo nesse sentido”.
Noronha intercedeu:
- “Tu sabes quanto que um Procurador de Estado está recebendo todo mês? Quatro mil reais e... , é só isso. Um Delegado vai terminar com seis mil”.
Repliquei:
- “Mas eles têm outras vantagens que não aparecem. É só perguntar para o pai do Adriano aqui, o Ézio, quanto ele ganha. Eles têm auxílio combustível, a ‘GAF’... Pergunta aqui para o Adriano que ele conversa com o pai dele?”
Adriano intercedeu:
- “Eles têm o auxílio combustível, usam o caso particular...”.
Continuei:
- ‘Pois é, e tem mais, eles não têm dedicação exclusiva. Os Delegados têm. Então? Isso é que tem que ser discutido, argumentado... Noronha, tu sabes quanto é que está ganhando um Desembargador? Está ganhando mais de dezenove mil reais. Sabes quanto está ganhando um Procurador de Justiça? Está ganhando cerca de dezessete mil. Enquanto isso os Delegados...”.
Noronha novamente intercedeu:
- “Mas tu precisas ver o trabalho que nós tivemos para aprovar isso. O Adriano trabalhou direto lá, procurando acertar uma vírgula...”.
Argumentei:
- “Pois é, o Adriano, vírgula, coitado, vírgula. Vou repetir: ‘o Adriano, vírgula, coitado, vírgula’. Meu Deus, imagina o Adriano com toda a responsabilidade de defender a nossa instituição, acompanhar os nossos projetos lá na Assembleia? Sabe como é que o Ministério Público age nessas ocasiões, Noronha? Sabe? O Procurador-Geral pega o presidente da Associação e começa a percorrer todos os gabinetes de Deputados, vai para o Palácio... O presidente do Tribunal de Justiça faz a mesma coisa, o Comandante-Geral da PM também trabalha nos bastidores, em várias frentes... Nós da Polícia Civil fizemos o que...?”.
Adriano meio que se espremeu contra a parede da sala e Noronha ameaçou abrir a porta para se retirar... Régis, na diagonal, me observava atentamente em silêncio... e Tim fazia o mesmo, só que andando de um lado para outro, ora sentando ora levantando, finalmente, pediu que Noronha voltasse. A conversa continuou mais um pouco e eu batendo nas mesmas teclas e Noronha pedindo que nós aguardássemos pois teria novidades... No final, sugeri que Noronha repensasse as homenagens que pretendia fazer no encontro dos Delegados que seria realizado na cidade de Joinville, reiterando que os Oficiais da PM foram os mais beneficiados com o novo “plano”, sem, no entanto, terem se desgastado, feito muita força, contratado advogados..., tampouco, prestaram algum agradecimento ao governo...
Será que Dirceu vai na mesma trilha de Lipinski...:
“PC enfrenta falta de pessoal - Além de enfrentar todas as dificuldades inerentes ao combater a criminalidade, a Polícia Civil enfrenta há anos um problema crônico: a carência de pessoal. A Divisão de Repressão a Entorpecentes (DRE), por exemplo, conta em seu quadro com um delegado e quatro investigadores para atuar na repressão ao tráfico em todo o Estado. A Divisão de Homicídios também sofre com a falta de pessoal: possui um delegado e três policiais para esclarecer dezenas de assassinatos de todas as regiões de Santa Catarina. O delegado-chefe da Polícia Civil reconhece o problema, mas acrescenta que, apesar das dificuldades e limitações, os policiais realizam um excelente trabalho. Silveira Júnior afirmou que, para atender de forma satisfatória todas as regiões do Estado, a Polícia Civil deveria contar com, pelo menos, 5 mil agentes. Atualmente, há cerca de 3 mil policiais civis na ativa, o que faz os agentes elegerem prioridades no combate ao crime. A operação que resultou na detenção de 11 acusados de fazer parte da quadrilha de Neném contou com a participação de 50 policiais, a maior parte vinda do interior, divididos em cinco equipes. Os agentes atuaram em várias comunidades do Centro de Florianópolis. Não houve reação dos suspeitos nem feridos” (DC, 28.11.2003).