PARTE CDXLVI – “FESTA NO BORDEL (O CASO ‘MARLENE RICA’  -28.11.2003): “O PODER EXPLOSIVO DA MÍDIA E O FATOR MINISTÉRIO PÚBLICO”.

Por Felipe Genovez | 12/06/2018 | História

PROJETO DE UNIFICAÇÃO DOS COMANDOS DAS POLÍCIAS NO ESTADO DE SANTA CATARINA

Data: 03.03.2004, horário 16:00 horas: 

A história do “bordel” da “Marlene Rica”  mais parece um furo da mídia com pitadas de “pornanchanchada” às avessas. O lamentável de tudo foi a repercussão que deram ao fato, justamente, porque o Coronel Caminha, Comandante-Geral da PM estava no interior do estabelecimento e foi chamado para verificar o que estaria acontecendo com a chegada da guarnição policial militar. Mas espera aí, qual a conduta que poderia se esperar do Coronel diante das circunstâncias? Ele estava ali se divertindo, bem provavelmente, no barzinho do estabelecimento, talvez tomando uns drinks, conversando animadamente na companhia de outras autoridades, fora do horário de trabalho (uma noite de sexta-feira), pura distração, então o que teria de mais isso? Ah, sim, a denúncia seria de que o Coronel havia tentado obstruir uma diligência da Justiça que estava no local fazendo uma inspeção de rotina naquele ambiente? Encontraram alguma coisa? Não me caberia fazer a defesa de ninguém porque a própria “Marlene Rica” declarou aos jornais o seu estabelecimento sempre foi muito bem frequentado por autoridades, políticos, empresários, estrangeiros..., sempre funcionou licitamente, então o local não era um “bordel”, isto sim, um local “vip”, refinado, para a elite...

Imagina se uma das autoridades tivesse feito uma despedida de solteiro, se tivesse se dirigido a um estabelecimento desses para um show de “striptease” e se por azar tivesse havido um crime de repercussão no estabelecimento que resultasse em repercussão midiática? E se o Chefe de Polícia estivesse no local e fosse conversar com os policiais, peritos..., isso poderia ser classificado como “obstrução” da Justiça? Quer dizer que se não ocorresse nada de anormal estaria tudo bem? Afigura-se que foi dado um tratamento muito hipócrita para a ocorrência, bem ao gosto de jornalista ávidos por furos de reportagens...

O que percebemos desse fato foi mais uma ditadura da imprensa sempre fora de qualquer tipo de controle, e que após fazer explodir um “factoide” torna obrigatória a sua apuração, uma punição exemplar... e será que o Ministério Público seria o instrumento de execração pública, da punição inquisitorial exemplar? Aliás, o Promotor Grubba chegou a afirmar em tom de brincadeira que só estaria recebendo “pressões” dos jornalistas, de ninguém mais para conduzir sua apuração...

Nesse passo, até as Corregedorias das instituições, por não terem autonomia, parece que também ficavam reféns e obrigadas a dar um encaminhamento político para o assunto, ou seja, achar um “culpado”, dentro de uma percepção de "falso moralismo"...  O Ministério Público poderia ser uns instrumento de “justiça” no presente caso, mas há que se inferir que o Promotor Grubba pode ter ficado numa situação muito difícil, porque para encerrar o caso teria que buscar uma solução a partir de um responsável...

De outro vértice, digamos, e se o Coronel Caminha ao invés de se expor para saber o que estava ocorrendo tivesse ficado oculto no interior do estabelecimento? Provavelmente não teria acontecido absolutamente nada, talvez nem tivesse sido reconhecido pelo Tenente que comandava a guarnição militar.

Caminha feriu decoro, diz comando - Investigação da PM conclui que o coronel cometeu transgressão disciplinar de seu estatuto - O coronel Paulo Conceição Caminha sofreu ontem sua segunda derrota no chamado caso do bordel. Denunciado na segunda-feira pelo Ministério Público, por três crimes, depois de ter sido acusado de impedir fiscalização de força-tarefa que apurava denúncia de exploração sexual infanto-juvenil no bordel da Marlene Rica, ontem foi a vez da própria Polícia Militar acusar seu ex-comandante-geral. Sindicância administrativa concluída pelo coronel Anilson Nelson da Silva, atual comandante-geral da PM, e corroborada pelo secretário da Segurança Pública, João Henrique Blasi, imputa ao coronel Caminha a transgressão disciplinar do Estatuto dos Policiais Militares. O ex-comandante não foi acusado de nenhum crime militar, o que poderia resultar, em tese, até mesmo na sua demissão, a bem do serviço público. O coronel Anilson Nelson da Silva, porém, concluiu, depois de ouvir o depoimento de cinco policiais militares e do próprio Caminha, que o então comandante-geral feriu ‘o decoro que a classe (PMs) impõe’, por ‘frequentar ambiente incompatível com seu nível social e o decoro da classe’. Audiência na Justiça será marcada hoje. O ambiente em questão é o prostíbulo da Marlene Rica, no qual Caminha confirma que estava ‘a convite de amigos’, cujos nomes negou-se a revelar em depoimento ao promotor César Augusto Grubba, de Joinville. A sindicância da PM poupou Caminha do crime de abuso de autoridade e de improbidade administrativa, delitos pelos quais foi denunciado por Grubba. O promotor de Justiça afirmou que hoje deve ser definido o dia da audiência em que será proposta ao ex-comandante a chamada transação penal - substituir a deflagração de uma ação penal por pena restritiva de direito, como realizar trabalho comunitário ou pagar cestas básicas. Caminha pode aceitar ou recusar a proposta do MP. Ontem, o DC não conseguiu contato com o coronel. Seu defensor, o criminalista Cláudio Gastão da Rosa Filho, adiantou que vai se pronunciar apenas depois de ter acesso ao relatório da sindicância. Gastão Filho não adiantou se Caminha vai ou não aceitar o acordo com o MP de Joinville. O coronel negou que tenha obstruído a força-tarefa e alegou que estava no bordel como pessoa comum”(DC, 3.3.2004).

A ilha dos “Guarás” nada teria de mais, seria apenas uma sede social para festa de confraternizações do Corpo de Bombeiros. Obviamente que poderiam haver convidados, como no caso do Chefe de Polícia, e o que isso teria de mais? Obviamente que no embalo do “Caso Marlene Rica” tivessem pretendido distorcer os fatos, dar outra conotação, mas totalmente improcedente:

“CERVEJADA - As explicações da Secretaria da Segurança Pública quanto à utilização da Ilha dos Guarás em festa de confraternização do Corpo de Bombeiros, com presença ostensiva de propaganda de uma cervejaria, convenceram a maioria. Mas há quem ainda faça pertinentes restrições. A principal é em relação ao uso do site da Policia Militar como instrumento, indireto, no caso, de marketing de empresa privada, atitude que se choca com elogiados programas antidrogas da própria corporação militar, incluindo campanhas educativas de esclarecimento e combate ao consumo de bebidas alcoólicas” (A Notícia, Raul Sartori, 3.3.2004).

Enfim, Marcucci deu o ar da sua graça... Sinceramente, achei que estava no exterior...:

“Polícia investiga boate - Joinville - O bordel da ‘Marlene-rica’, cenário do escândalo da Segurança Pública, será finalmente investigado pela polícia. O delegado regional de polícia de Joinville, Marco Aurélio Marcucci, determinará a abertura de um inquérito para apurar a situação do local. O procedimento ficará a cargo da 3ª Delegacia de Polícia, que fica na área da casa, na zona Norte. O delegado afirmou ter indeferido recentemente o pedido de um novo alvará de funcionamento da boate, que usa como fachada a licença de bar e whiskeria” (A Notícia, 3.3.2004).

Dirceu deve estar de saída, muda o Secretário, mudam alguns diretores, gerentes e começa tudo de novo:

Segurança no Norte - O Comando de Policiamento do Norte (CPN) será instalado, e inaugurada nova sede pelo governador Luiz Henrique no dia 8 de março, com novas perspectivas para a região Norte, com nova planificação da atuação da Polícia Militar. Dentro disso, estão previstas pelo CPN a criação e ativação da central de emergência 190, principal ligação entre a comunidade e a Polícia Militar; a criação do 15º Batalhão de Polícia em São Francisco do Sul e as instalações das companhias de Barra Velha e Itapoá, bem como o 2º Batalhão de Operações Especiais” (A Notícia, Antonio Neves – Alça de Mira, 6.3.2004).

Data: 08.03.2004, horário: 16:00 horas

Braga fez uma incursão na “Assistência Jurídica”. Eu estava me preparando para dar uma saída, pois uma dor de cabeça estava latejando e eu mal conseguia ficar de pé. Já tinha chegado de manhã cedo e saí ao meio-dia. À tarde cheguei atrasado (pouco antes das quinze horas) e não estava mais aguentando Garcez que perguntava seguidamente  a mesma coisa (a mesma lei, portarias, decretos...) enquanto fazia um comentários daqueles:

- “Essas pastas estão todas desatualizadas. Olha, Felipe, eu vou conversar com o Valério lá em cima. Vou pedir alguém para me ajudar aqui. Não vou ficar sozinho...”.

Interrompi:

- “Mas Garcez a Suzana retorna a semana que vem...”.

Com a chegada das minhas férias, licença-prêmio que acreditava poderia, enfim, gozá-las depois de três décadas de serviços prestados à instituição... Garcez dava a impressão que estava entrando em parafuso ao saber que eu pretendia me afastar do serviço. Durante os últimos meses procurei passar poucos serviços para ele, especialmente para ver se ele dava conta dos pareceres do mês de dezembro (2003) que estavam atrasados. Bom, só na sexta-feira havia entrado um mandado de segurança, mais outros dois pedidos de manifestação. Também, naquela manhã deu entrada mais um pedido de informação, mas as impressoras não estavam funcionando (não sei se foi porque Garcez tirou tantas cópias, ou se foi natural...). 

Também, havia os pedidos de consulta “on line”, atendimento às pessoas, os anteprojetos de leis, decretos, resoluções, portarias... Realmente Garcez parecia que estava numa situação difícil com a minha saída. Mas, Braga estava ali na minha frente enquanto Garcez tinha saído para tentar resolver outro problema (levar um parecer na Diretoria de Polícia do Interior). Braga comentou:

- “Eu estava ali conversando com o Maurício Eskudlark e ele me disse que o Dirceu não sai. Ele falou que o Dirceu não sai de jeito algum, só se ele quiser...”.

Argumentei:

- “Ainda bem, porque quem é que iria assumir no lugar dele?”

No íntimo sabia que Braga preferia que Mauro Dutra assumisse, porém, ficou muito difícil depois que assumiu o “Deap”.  Braga comentou:

“Eu conversei com o Ilson Silva e ele disse que o Feijó não assume de jeito algum. Ele é muito ligado ao Pinho Moreira. Disse que conversa abertamente com o Pinho Moreira, a amizade deles vem lá de Criciúma”.

Interrompi:

- “É, o Dirceu é muito forte com o Luiz Henrique”.   Depois, acabamos conversando sobre Garcez que provavelmente iria me substituir quando saísse de férias. A seguir confidenciei que estava de saída porque não aguentava mais uma dor de cabeça, especialmente com Garcez por perto, com aquele seu estilo tenso, estressado... Braga lembrou que Garcez trabalhou uma época em Chapecó e o pessoal comentava que ele deixou muita gente fora de órbita com seu estilo, seu modo tenso de ser e, ainda, fez uma revelação:

- “Ele tinha uns ataques de perseguição...”. 

Mas concordamos que ele era uma ótima pessoa, um ótimo caráter, grandes virtudes e comentei:

- “Braga, vamos indo que eu nem quero encontrar o Garcez neste momento, vamos...”. 

Acabamos nos amarrando na “Assistência Jurídica” até que Garcez retornou e deu um leve cutucão nas costas de Braga que estava de costas junto à porta. Depois, Garcez deixou transparecer um sorriso de quem fez uma arte ao surpreender alguém.  Garcez pareceu surpreso com a minha saída e fez um pedido, como se eu não fosse mais voltar:

- “Felipe, tu já vais mesmo? Eu posso te telefonar se precisar de alguma coisa?”

Respondi, quase que já com um pé para fora da sala:

- “Mas claro Garcez, se tu não contares comigo com quem vais contar?” 

Garcez deu a impressão que respirou um pouco mais aliviado. Já descendo às escadas recordei o que tinha dito para ele no início da tarde: “Garcez, não te estressa. Vai devagar. Tu és uma pessoa muito competente. Poucas pessoas têm o teu conhecimento, a tua capacidade. Acredita mais no teu potencial!”

O que eu disse para ele era real, tudo o que eu tinha dito. De resto, meus pensamentos ficaram na conversa com o aceso e irrequieto Delegado Braga.  Fiquei satisfeito por saber que Dirceu Silveira não iria deixar a Chefia de Polícia. Lembrei também que havia comentado com Garcez que apesar de tudo Dirceu até aquele momento não havia perseguido ninguém e isso já contava muito e fazia toda a diferença.