PARTE CCLXXXI – “MAURÍCIO ESKUDLARK: A TENTATIVA DE REVERTER MAIS UMA INJUSTIÇA? (O CASO: ‘COMISSÁRIO BRASIL’)”

Por Felipe Genovez | 10/05/2018 | História

PROJETO DE UNIFICAÇÃO DOS COMANDOS DAS POLÍCIAS NO ESTADO DE SANTA CATARINA

Data: 16.10.2001, horário: 15:25 horas:

Estava na “Assistência Jurídica” e solicitei para “Jô Guedes” avisar o Delegado Maurício Eskudlark  (Diretor de Polícia do Interior) que já estava a sua disposição ( tinha me procurado uma hora antes).

Logo em seguida Maurício chegou na “Assistência Jurídica”  acompanhado do “Comissário Brasil” (Roberto Carvalho Fernandes). Imaginei do que se tratava, pois já havia recebido o processo disciplinar de Brasil na última quarta-feira e fiquei duas noites com aquilo na cabeça, fiquei me remoendo por dentro face a bárbara injustiça que acreditava estar sendo cometida contra o referido policial.  Em síntese: Durante os anos de 1997 a início de 1999 (durante o governo Paulo Afonso/Lúcia Stefanovich), Brasil (formado em Direito)  foi designado para responder pelo cargo de Delegado Municipal (hoje comarca) de Camboriú. Lá chegando, em razão da falta de efetivo, ele  “manteve” a atribuição de servidores públicos municipais,  que há anos estavam à disposição daquela  repartição policial, de continuarem a exercer algumas funções policiais civis. O processo disciplinar registrava o excelente trabalho desenvolvido pelo acusado (relatórios, documentos, depoimentos de testemunhas, fotografias e etc.). O relatório final da comissão constituída pelos Delegados Paulo Matte (Presidente), Hilton Vieira e Ruben Garcez concluíram por recomendar a demissão simples do acusado porque reconheceram que realmente ele permitiu/atribuiu funções policiais civis a um servidor municipal que estava à disposição da Delegacia de Polícia (fiquei pensando nos policiais militares e cidadãos que eram convocados há anos para exercerem funções policiais civis de responsáveis por Delegacias Municipais e Distritais, dos servidores municipais e estaduais colocados à disposição da Polícia Civil para exercerem funções policiais civis..., inclusive, dos policiais civis que exerciam de forma anômala funções carcerárias que nada tinham haver com o rol de suas atribuições... (pensei comigo: “êta comissão!). Maurício logo que sentou na minha frente me perguntou:

- “Conhece o Comissário Brasil, doutor?” 

Respondi:

- “Claro que sim, lembro muito bem dele, nas reuniões da ‘Fecapoc’ lá em São Miguel ele sentava no fundo da sala, bem no canto esquerdo...”. 

Maurício pareceu surpreso e ficou me observando.  Antes que ele dissesse o porquê da sua presença, procurei poupá-lo e fui direto ao assunto:

- “Recebi o processo na semana passada e já mandei para cima,  acho que foi ontem, quando foi mesmo ‘Jô’?” 

“Jô Guedes” respondeu rapidamente:”

- Foi hoje de manhã!” 

Pedi que “Jô Guedes”  apanhasse a informação que subscrevi naqueles autos, permitindo que Brasil lesse o seu conteúdo. Enquanto ele se entretinha lendo o que havia sido informado procurei conversar com Maurício para dizer:

- “Pois é, a coisa tá na mão do Lipinski, pelo que vi tá aí mais uma tremenda injustiça que estão cometendo. Lipinski tem condições de obstar isso, basta um simples despacho, agora não é o que eu tenho visto, ele manda tudo para o Gabinete do Chinato e lá é outro mundo, eles não têm compromissos conosco, estão lá de passagem, julgam de outra forma, não têm o conhecimento dos fatos como nós temos”.

Enquanto isso o Comissário Brasil dava a impressão que “comia” a informação jurídica, sendo visível sua ansiedade.   Maurício foi avisado que o pessoal do programa “Cesar Souza” estava no seu gabinete, razão porque logo em seguida ele deixou a “Assistência Jurídica”, sendo que ao se levantar arrematou:

- “Doutor eu quero convidar para aquele cafezinho, quero convidar o amigo para me ajudar naquele negócio, lembra?”.

 Apenas sorri dizendo que entendia e que se estivesse nos meus limites.  Na verdade Maurício já estava em campanha e deveria estar querendo que eu me engajasse na sua campanha eleitoral. Em seguida o policial Brasil solicitou solenemente permissão para ficar comigo mais um pouco e começou a narrar sua triste história, de um policial que chorava por dentro, mas que o cotidiano parecia que matado todas as suas lágrimas, o seu encanto de outrora pela profissão policial:

- “Doutor eu estou sendo penalizado por trabalhar, tenho tudo provado, como encontrei a Delegacia de Camboriú e como deixei,  tive que tomar algumas medidas, não havia provas de policiais envolvidos em  ‘golpes do chute’, isso eu não posso provar, mas tive que combater esses crimes quando chequei lá, posso dizer que havia policiais que usavam drogas, fumavam maconha e isso eu tive que coibir, só que os policias acabaram sendo removidos de lá,  tudo isso gerou um clima de vingança contra mim. No início do ano de 1999, logo no início do governo Amin, eu continuava respondendo pela Delegacia Municipal e num determinado dia fui chamado à Delegacia. Estavam lá os Delegados Lipinski (Corregedor-Geral) e  Paulo Matte, tinham revirado todas as minhas gavetas, documentos, olhado livro de inquéritos e depois que fizeram isso Lipinski me disse: ‘... eu vim aqui com ordem de te suspender da função, até de te colocar na cadeia em razão das denúncias que fizeram contra ti!’. Doutor,  o doutor Lipinski disse que olhou tudo e viu que meu trabalho estava todo em ordem,  meus autos de prisão em flagrante estavam todos homologados e que não iria fazer nada, que era para eu continuar os serviços, ele disse para mim ficar tranqüilo. O doutor Paulo Freyslenben me telefonou dizendo que estava preocupado, que o senhor ligou para ele dizendo que a comissão pediu a minha demissão, eu tinha conversado com o doutor Edson Konell Cabral, meu advogado, e ele tinha me garantido que estava tudo certo, que o pessoal estava consciente de que não iria dar em nada, e que se desse alguma coisa não haveria unanimidade dos membros da comissão. O doutor Paulo Matte pediu que eu procurasse o senhor. O senhor vê, doutor, eu fui para Camboriú e com minha esposa construímos  nossa casa financiada pela Caixa, comprei um carro e não sei se cresceu os olhos de alguém, não sei de quem possa ter partido isso contra mim.  Minha esposa chegou a perguntar se não havia algum fato que tivesse escondido dela, o senhor não imagina o que eu tenho passado e quando achava que estava tudo se resolvendo recebi essa notícia, estou respondendo outro processo disciplinar,  quiseram me incriminar dizendo que eu estava envolvido com quadrilha de “golpes de chute” e não existe prova nenhuma contra mim, já quis pedir exoneração e eles não me deixam sair, fiz concurso no Paraná para Delegado de Polícia e acertei setenta e cinco por cento das provas, já sei que passei lá, não aguento mais entrar na Delegacia, será que não cabe tutela antecipada contra o Estado, quero me desligar, não quero mais ficar”.

Depois que o policial Brasil fez sua narrativa quase que desesperada procurei dar alguns conselhos, não sei se bons ou maus:

- “Eu acho que tu não deves querer demonstrar que queres largar tudo e ‘fugir’ neste momento, acho que deves enfrentar, provar a tua inocência, assim como eu confio em ti, tive coragem de dar um parecer contra a comissão a quem eu respeito, acho que existem outras pessoas que poderão confiar na tua inocência, que tudo isso é uma grande armação, uma grande injustiça, só não entendo por que o Corregedor Paulo Matte e os Delegados Hilton Vieira e  Rubem Garcez não enxergaram isso, acho que tu deves procurar o Lipinski, deves ir sozinho, sabes que aqui existem facções, não vai com o doutor Maurício, vai sozinho e tenta falar com ele. É ele quem pode resolver isso, basta um despacho dizendo que concorda com o parecer e mandar arquivar, agora se ele mandar lá para cima tudo fica incerto, a comissão dizendo uma coisa e eu dizendo outra, e tu sabes que o trabalho da comissão é bastante decisivo porque são três delegados e eles que estiveram à frente das investigações, dos trabalhos. Essa é uma opção que tu tens, ir lá em cima e tentar falar com o Lipinski, assim tu já terás uma noção de como a coisa está, se vai terminar por aqui ou se vai prosseguir.  Deves deixar a emoção de lado, esse negócio de querer pedir exoneração soa mal para ti, estais numa prova de fogo e eu já passei por isso na direção da Penitenciária, sei como é que é, quando combatia a entrada de drogas, o desvio de material por servidores e prepararam a cama para mim com uma rebelião, acabou a imprensa entrando no jogo do sensacionalismo barato e os meus superiores não me defenderam, muito pelo contrário. Tens que ver racionalmente quais as saídas possíveis, tudo menos pela emoção”.

A essa altura, a minha dor de cabeça já havia voltado e só queria ir embora, não podia aceitar tamanha injustiça, a agonia de alguém que não quis se corromper e não se acomodou, que quis combater o mal, mas que em razão disso o que o destino lhe reservou?  Só uma comissão externa, de pessoas isentas, poderia rever o seu caso e dimensionar aquilo que parecia ser mais uma grande injustiça que estava sendo urdida pelos bastidores. “Serviria para fins de estatística ou para ‘esteriotipar os fodões’ da Polícia?” (pensei). Depois que o policial Brasil saiu “Jô Guedes” somente deixou escapulir uma frase lapidar que resumia tudo:

- “Meu Deus, estou morrendo de pena desse rapaz, que injustiça!”

Fiquei contente de ouvir aquele comentário porque ela também leu o processo disciplinar e não me deixou sozinho. Mas o que esperar de uma comissão disciplinar que estavam reunidos “Paulo Matte, Hilton Vieira e Rubem Garcez?” Três cabeças que juntas mais pareciam cavaleiros de filmes apocalípticos e messiânicos, inseridos num cenário (leia-se: gestão) nebuloso, de areias movediças por vários lados..., possivelmente, querendo ficar bem aos olhos das cúpulas ou, também, permanecer próximo do poder, das benesses, de serem lembrados ou chamados para as horas de fartura (viagens correcionais, diárias, cargos...), cheios de discursos moralizadores, limpeza institucional, expurgos...?  

Mais tarde “Jô Guedes” voltou do quarto andar (havia solicitado para que ela fosse substituir a Informação no processo disciplinar do policial Brasil porque ao rever o parecer encontrei alguns erros elementares e não poderia deixar que o documento ficasse daquele jeito...). Logo foi me avisando que o policial Brasil estava sozinho  aguardando para falar com o Delegado-Geral. Brinquei com “Jô Guedes” dizendo:

- “Não chamasse ele num canto para advertir que tomasse cuidado com o p. porque ele é t.?”

“Jô Guedes” respondeu prontamente:

- “E precisava, todo mundo sabe disso!”.

(...)