PARTE CCLXXXI – “ACADEPOL X UNIVERSIDADE: EM FOCO A DESCENTRALIZAÇÃO DOS CONCURSOS PARA INGRESSO NA POLÍCIA CIVIL”

Por Felipe Genovez | 09/05/2018 | História

PROJETO DE UNIFICAÇÃO DOS COMANDOS DAS POLÍCIAS NO ESTADO DE SANTA CATARINA

Data: 05.10.2001 – “Notícias das Polícias pelo Estado”:

“Dionísio Cerqueira está sem delegado – Autoridades pedem nomeação e lembram ao governo que situação se mantém há 18 meses – Dionísio Cerqueira – Um documento subscrito por 14 autoridades civis, militares, judiciária e religiosa de Dionísio Cerqueira, no Extremo-oeste de Santa Catarina, e Barracão (PR) foi enviada ontem ao governo do Estado pedindo a imediata nomeação de um delegado de polícia  (...)”  (A Notícia, 5.10.2001). 

“Promessas 1 – O comandante-geral da Polícia Militar, coronel Walmor Backes, e o secretário de Segurança Pública, Antenor Chinato Ribeiro, participaram de reunião da comissão de fiscalização da  Assembleia, presidida pelo deputado Jaime Mantelli (PDT) e requerida pelo deputado João Henrique Blasi (PMDB). Na pauta, novos questionamentos  sobre a segurança pública em Santa Catarina e as ações do governo para combater a violência. Também estiveram presentes os deputados Manoel Mota (PMDB), Lício Mauro da Silveira (PPB) e Ivan Ranzolin (PPB). O aumento da violência nas cidades catarinenses é uma preocupação comum de todos os parlamentares. Ivan Ranzolin falou sobre as quadrilhas que estão agindo no Estado e citou os assaltos na Capital. ‘Antes, quando haviam mais viaturas nas ruas, a incidência era menor’, declarou”’  (A Notícia, Antonio Neves – Alça de Mira, 8.10.2001). 

Data: 09.10.2001, horário: 12:00 horas:

Estava de saída da Delegacia-Geral e encontrei o Delegado Braga de retorno do almoço quase em frente ao prédio.  Braga foi dizendo:

-  “O que tu achas da gente reunir o nosso pessoal, nós temos um grupo, vamos reunir eles, esse negócio de fazer o concurso por meio da universidade não pode vingar, qual o teu parecer?  O Mário é a favor, não podemos contar com ele”. 

Diante da insistência de Braga, dei a minha resposta:

- “Sim, o Estatuto da Polícia Civil é claro, compete a Academia planejar, executar os concursos para ingresso é isso que está na nossa lei estatutária, não pode ser ignorado, é aquilo que tu já dissestes outro dia, vai ser outro dispositivo que vai caducar, o caminho seria o Mário se colocar contra e a Adpesc teria que fazer jogo duro contra também”.

Braga não perdeu o ímpeto e voltou a dizer que não adiantava contar com Mário Martins e que tínhamos que reunir o grupo, e que não precisava para isso de um jantar.  Aproveitei para argumentar:

- “Braga, mais grave que isso é nós entregarmos o nosso sistema de comunicação para a Polícia Militar, isso é brincadeira, o concurso é feito uma vez ou outra, e ser for por uma universidade até tudo bem, é claro que isso também é grave, mas não tem comparação com o que estão fazendo com o nosso serviço de comunicação, passar o nosso sistema para funcionar lá junto como o Copom 190, dá licença, né!”

Braga intercedeu:

- “Mas o pessoal aí encima diz que é o nosso pessoal que vai fazer o serviço de rádio, vai continuar tudo na mão da Polícia Civil, é o que eles dizem lá encima!”

Fiquei perplexo vendo a passividade de Braga ao tratar o assunto com certo desinteresse só porque eles disseram que policiais civis iriam participar do esquema:

- “Sinceramente, eu acho isso muito mais grave, é o nosso sistema de comunicação, são as nossas informações e é dentro da Polícia Militar que vai comandar tudo. Esse negócio de policial civil ir lá colaborar é pura ‘maquiação’, o nome do sistema é ‘Copom”  que significa ‘Centro de Operações da Polícia Militar’ e o número de telefone continua o cento e noventa  e você pergunta para qualquer pessoa aí o que significa isso, todo mundo vai dizer que é o sistema de comunicação da Polícia Militar, sinceramente, esse pessoal está perdido, estão entregando tudo ou então tu acreditas em ‘papai noel’?” 

Braga pareceu emudecido e argumentou:

 - “É, se fosse aquele projeto da criação da ‘Procuradoria-Geral da Polícia’, da ‘unificação dos comandos’, aí funcionaria bem...”. 

Concordei, afirmando que aí sim, porque teríamos um comando único e a determinação partiria desse comando unificado, poderia valer também para a Academia de Polícia e outros órgãos e serviços. Acabamos nos despedindo e fui ao encontro do meu carro ainda perplexo com a passividade de Braga, da sua aceitação, justamente ele que era um dos Delegados mais vibrantes na defesa de nossos interesses institucionais. E pensei que seria esse o início do governo também pretender acabar com o Estatuto da Polícia Civil, e talvez com isso o pessoal iria dizer: “ah, mas eles colocaram alguns dispositivos que falam da Polícia Civil, não esqueceram de nós...?”

Horário: 15:30 horas:

Estava na “Assistência Jurídica”  e chegaram juntos os Delegados Braga e Mauro Dutra. Inicialmente, achei que era alguma articulação para que reuníssemos o nosso pessoal do grupo...  Eu particularmente era contra, no fundo essa ideia de tentar mudar o concurso para a universidade era assunto indigesto, não tinha certeza de quais interesses estariam por traz disso, só era contra o concurso ser feito pela universidade não só pelo desprestígio à Polícia Civil, especialmente, aos Delegados, mas, principalmente, porque ficava aquela impressão de “queima de arquivo” depois de tantas denúncias de fraudes no concurso de 1998 que entrou para a história. Então o melhor seria fazer uma limpeza, uma ruptura... e assim todos esqueceriam bem rápido o passado. Mas considerando os tantos problemas verificados também outros concursos, no íntimo preferia que fosse feito mesmo por uma universidade, mas não naquele momento e não para Delegados (preferia o mesmo sistema que era empregado para magistrados, Promotores de Justiça e Procuradores de Estado).  Braga argumentou:

- “Sobre o concurso eu já sei que tu concordas comigo, tem que ser feito pela Academia...”.

Mauro pediu ajuda para encontrar uma legislação dos anos de  noventa e sete ou noventa e oito.  Braga foi para o lado da “Jô Guedes” já que tinha pedido que ela redigisse um despacho... Aproveitei para reprisar na presença de Mauro Dutra todos os meus argumentos expendidos no final daquela manhã para Braga. Depois, lançei uma pergunta:

- “Vocês viram a exposição de motivos assinada pelo Backes? Viram o que ele disse sobre o sistema de rádio do Copom, que diferença, heim? Um secretário de segurança escreve uma coisa e o Comandante-Geral da Polícia Militar escreve outra, indo muito mais além, defendendo os interesses da sua corporação, só para ficar num exemplo, enquanto o Chinato pedia autorização para realizar concurso público apenas para os cargos em vacância o Backes pedia muito mais, pedia a implantação de novos cargos,  trezentos e sessenta. Ele usou aquele termo, como é mesmo, bem sutil, “incremento”, não, “inclusão, acho que...”. 

Braga adicionou:

- “Esse termo aí também é utilizado pelo Exército!”.

Mauro Dutra reforçou que a exposição de motivos do Coronel Backes estava bem mais consistente.  Braga – em tom de ironia - comentou que Mauro Dutra estava presidindo a comissão encarregada  de estabelecer as mesmas bases territoriais de atuação das Polícias Civil e Militar.  Aproveitei para argumentar que quanto a isso não havia nenhum problema, que era até salutar se estabelecer alguma simetria, desde que não houvesse  vinculações e que o fundamento de nossa atuação deveria ser o Poder Judiciário e o Ministério Público, isso até que um projeto de unificação dos comandos das polícias fosse aprovado no Estado de Santa Catarina. 

Depois disso os Delegados Braga e Mauro Dutra se foram. Fiquei impressionado com a tranquilidade de Mauro Dutra (irmão de Promotor de Justiça) que parecia impermeável ao que se passava a sua volta, dava a impressão que era um autista, sem se deixar abalar por nada. O que estava ocorrendo com ele no meio de todo esse furacão deixava a impressão que ele estava cumprindo um “mandamento superior” e só nos restava acatar, nos amoldarmos, deixar as coisas acontecerem naturalmente...  Diferentemente,  Braga dava visíveis sinais de indignação.  Mauro Dutra parecia denotar total falta de abalo, apatia, desconexão...  e achei que isso se devia mais a sua maneira de ser e estar, mas isso era bem preocupante.