Para Vandré o canto do povo não é em vão
Por Edson Terto da Silva | 01/02/2010 | ArtePara Vandré o canto do povo não é em vão
Edson Silva
Um ouvinte distraído, em 1966, talvez nem percebeu que o ritmo alegre, carnavalesco da marcha-rancho “Porta Estandarte”, de Vandré, trazia uma mensagem de conotação revolucionária. Afinal, somente a sutileza corajosa de Vandré para fazer o povo cantar a esperança numa época em que o direito de liberdade estava cerceado no Brasil. O poeta ainda proclamava que as dores e tristezas findariam um dia, que seria comemorado na avenida, sendo anunciado com um estandarte nas mãos, uma inteligente alusão ao suposto e permitido Carnaval.
Aquele que se permite conhecer o breve trabalho profissional de Vandré na Música Popular Brasileira (MPB) terá rico acervo de textos corajosos para uma época em que ousar, desafiar resultava em tortura, banimento, desaparecimento, exílio ou morte. Vandré, e façamos justiça a outros nomes igualmente corajosos, tais como Sérgio Ricardo, Chico Buarque e Edu Lobo, fez de sua arte musical uma válvula de escape para, de certa forma, tentar dar voz ao povo, que era mais censurado no que deveria ser direito básico, ou seja expressar sua opinião.
Nos tempos atuais, alguns tipos de censura ainda vigoram, principalmente aquelas relacionadas aos ditos altos cleros da política. Na música, embora muitas nada transmitam ou comuniquem, agora pode se dizer o que quiser, até os mais descabidos palavrões, sem a odiosa censura prévia, mas temos que destacar artistas que fizeram sua arte, sem precisar de palavrões, em épocas em que dar voz ao povo era crime contra a soberania nacional. Lembro-me mais ou menos de uma frase do Vandré em que ele dizia que se as canções dele, que falavam só de seu amor pela pátria e pelo o povo brasileiro foram motivos para arbitrariedades e torturas, ele humildemente pedia perdão aos amantes e ao amor. Segue a letra singela do “Porta Estandarte”.
“Olha que a vida tão linda se perde em tristezas assim/Desce o teu rancho cantando essa tua esperança sem fim/Deixa que a tua certeza se faça do povo a canção/Pra que teu povo cantando teu canto ele não seja em vão/Eu vou levando a minha vida enfim/ Cantando e canto sim/E não cantava se não fosse assim/ Levando pra quem me ouvir/ Certezas e esperanças pra trocar/ Por dores e tristezas que bem sei/ Um dia ainda vão findar/Um dia que vem vindo/ E que eu vivo pra cantar/Na avenida girando, estandarte na mão pra anunciar”
Edson Silva, 48 anos, é jornalista da assessoria de imprensa da Prefeitura de Sumaré.