OS SERVIÇOS PÚBLICOS E A SUA RESPONSABILIDADE

Por Felipe Bartolomeu Antero de Oliveira | 21/03/2017 | Direito

AUTOR: Felipe Bartolomeu Antero de Oliveira

COAUTOR: Artur Ribeiro Rocha de Oliveira

COAUTORA: Taphylla Braga de Brito Bacurau

 

 

INTRODUÇÃO

 

Os serviços públicos possuem grande relevância no Direito do Consumidor, tendo em vista que é por meio deste que será possível garantir ao consumidor que os seus direitos constitucionais não estão sendo violados, tendo assim seus direitos assegurados nas relações de consumo com os entes da administração pública.

Por isso o presente artigo visa justamente apresentar os aspectos do direito do consumidor e serviços públicos fundamentais, relacionados aos serviços essenciais na ótica consumerista, onde estes tem que ser prestados de forma ininterrupta para que assim não violem direitos consagrados nas normas jurídicas.

Para que fosse possível chegarmos à obtenção de tais resultados deste trabalho foi realizada uma pesquisa voltada para a categoria teórica, com uma abordagem de forma qualitativa, sendo que esta possui uma natureza bibliográfica, devido sempre tentarmos buscar fazer todo o levantamento das bibliografias existente relacionadas à matéria, bem como nas legislações relacionadas a esta.

Por fim utilizamos na pesquisa o método analítico - descritivo e também o crítico - dedutivo, onde será abordado sobre o conceito de serviços públicos, a equiparação da pessoa jurídica pública a fornecedor, a forma como esses serviços são prestados, logo em seguida passamos para os serviços essenciais contínuos, onde o art.10 da Lei nº 7.783/89, denominada de Lei de Greve, aborda quais são os serviços públicos que são essenciais e urgentes, e o objetivo do trabalho em mostrar a discursão da doutrina no que toca a interrupção desses serviços de caráter essencial, trazendo para resolver essa problemática o entendimento atual do STJ e por fim a questão da responsabilidade do prestador do serviço público.

 

  1. O CONSUMIDOR

 

O conceito de consumidor foi trazido pelo legislador em artigos próprios do Código de Defesa do Consumidor, com isso evitou interpretações que pudessem causar problemas. Começaremos pela análise do art.2 disposto da seguinte forma:

Art. 2° Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final.

Esse conceito trazido pelo artigo acima citado traz uma forma mais concreta do que seria o consumidor, é concreta por estar abordando sobre o consumidor real. Quando o artigo aborda como sendo consumidor a pessoa jurídica, o faz de forma ampla, pois engloba todos os tipos de pessoas jurídicas. Outra importante distinção abordada é em relação aos verbos adquirir ou utilizar, sendo consumidor aquele que adquire e utiliza, bem como aquele que só utiliza, sem o ter adquirido. Importante destacar a parte final do referido artigo quando aborda sobre como destinatário final, assim entendido aquele que realmente se utiliza do produto ou serviço para proveito próprio, sem a finalidade de produção de outros produtos ou serviços.

Conforme veremos a seguir, há outra norma jurídica que também traz um conceito sobre o consumidor, ela veio no art.29 do Código de Defesa do Consumidor e dispõe da seguinte forma:

 

Art. 29. Para os fins deste Capítulo e do seguinte, equiparam-se aos consumidores todas as pessoas determináveis ou não, expostas às práticas nele previstas.

 

Portanto, ele aborda sobre um conceito de forma mais ampla, mais abstrato, equiparando a consumidores também as pessoas determináveis ou não que estão expostas as práticas comerciais.

 

  1. OS SERVIÇOS PÚBLICOS

 

Os serviços públicos em termos administrativos foi definido como sendo aquela atividade administrativa concreta que se traduzem nas prestações que diretamente se representam, que se propõem em utilidades ou comodidades materiais para a população no geral, onde é executada sob um regime jurídico de direito público pela administração pública, ou por particulares delegatários.

Os serviços públicos podem ser delegáveis e indelegáveis. Os primeiros são aqueles em que pode ser prestados pelo Estado de forma centralizada ou então de forma particular por meio das concessões e permissões, tendo como exemplo o caso dos serviços de telefonia. Já em relação à segunda modalidade são aqueles que somente podem ser prestados pelo próprio Estado, bem como pelas pessoas jurídicas de direito público que fazem parte da administração indireta, tendo como exemplo o caso da garantia da defesa nacional.

Com isso, os serviços essenciais contínuos se encaixam na modalidade de serviços públicos delegáveis, isso decorre do fato de que são tratados como serviços de natureza essencial e contínuos aqueles elencados no art.10 da Lei nº 7.783/89, denominada de Lei de Greve. Esses são delegados a determinados entes por meio das concessões e permissões. Como exemplo, podemos citar o caso das telecomunicações.

Convém abordar no presente trabalho o conceito do que seria o serviço público em termos consumerista. O serviço público é assim aquele prestado pela Administração ou por seus delegados, regulados por normas e controles estatais com a finalidade de satisfazerem as necessidades que são essenciais ou também as secundárias da coletividade, bem como as simples conveniências do Estado. Logo em seguida de acordo com a redação trazida pelo caput do art.3 do Código de Defesa do Consumidor, nota-se que a pessoa jurídica pública esta incluída no rol dos fornecedores, como aponta a sua redação a seguir disposta:

 

Art. 3° Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços.

 

Posteriormente, em seu §2º dispõe de forma clara e objetiva a definição do que seria serviço, conforme disposto a redação legal a seguir:

 

  • 2° Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista.

 

Sendo assim a Lei n. 8.078/90, denominada de Código de Defesa do Consumidor, abordou em sua temática os serviços públicos essenciais e sua existência, isso está previsto no art.22 que aborda in verbis:

 

Art.22. Os órgãos públicos, por si ou suas empresas, concessionárias, permissionárias ou sob qualquer outra forma de empreendimento, são obrigados a fornecer serviços adequados, eficientes, seguros e, quanto aos essenciais, contínuos.

 

Portanto o referido artigo acima mostra claramente que os serviços públicos podem ser prestados de duas formas distintas, que nada mais seria do que a de forma direta e a indireta. No que se refere à primeira forma é aquela que é executada diretamente pelo próprio Estado por meio dos seus diversos órgãos que compõem, portanto a sua estrutura administrativa, já com relação à segunda forma são aqueles serviços prestados por entidades diversas, como por exemplo, podemos citar o caso das autarquias, bem como também as empresas públicas e as sociedades de economia mista, entre varias outras que foram criadas a parti do Decreto-lei nº200/67.

Logo em seguida vai ser abordado no presente artigo referido acima como o fornecimento de tais serviços tem a obrigação de serem prestados de forma adequada, eficiente e seguro. Devemos lembrar que quando nos referimos à questão da eficiência este decorre justamente de um princípio de natureza constitucional que vem amplamente estampado em seu art.37 que passa a dispor a seguir:

 

Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:

 

Nestes termos devemos observar que em relação ao serviço não basta apenas que este seja adequado e que se encontre a disposição das pessoas, verifica-se assim, portanto que, acima de tudo ele tem que ser eficiente, ou seja, ele tem que atender a finalidade a qual é destinado. Portanto o sentido dado à palavra eficiência, lato sensu, é de o serviço público é eficiente quando ele suprir a necessidade para ao qual foi criado.

Importante frisar que as outras características, da forma como os serviços devem ser prestados, estão diretamente ligadas a eficiência, onde não é possível que um serviço público seja eficiente sem ser antes de tudo adequado, seguro e quanto aos essenciais contínuos.

 

  1. SERVIÇO ESSENCIAL CONTÍNUO

 

Importante salientar que, no que se refere aos serviços de natureza essencial estes tem que ser contínuo tendo por base que existem inúmeras garantias constitucionais que proíbem que tal evento ocorra, não só isso, mas entre outras coisas que serão apontados a seguir.

Antes, portanto, de passarmos para uma análise das questões atinentes a matéria propriamente dita, iremos fazer uma breve interpretação do sentido da palavra essencial e a posteriori, adentrar no assunto principal que é o que a norma pretende ao abordar que o serviço essencial tem que ser contínuo.

Sendo assim para que possamos entender o sentido da palavra essencial abordado pelo legislador no texto supracitado devemos atentar para dois aspectos, o primeiro em relação ao caráter não essencial de alguns serviços e em segundo o caráter da urgência.

No que toca ao caráter não essencial de alguns serviços estes só podem ser verificados no caso concreto, já ao que se refere ao segundo caráter este sim possui grande importância onde a Lei nº 7.783/89, denominada de Lei de Greve, veio justamente a regular quais os serviços públicos que são essenciais e urgentes, como dispõe o art.10 in verbis:

 

Art. 10. São considerados serviços ou atividades essenciais:

I – tratamento e abastecimento de água; produção ou distribuição de energia elétrica, gás e combustíveis;

II – assistência médica e hospitalar;

III – distribuição e comercialização de medicamentos e alimentos;

IV – funerários;

V – transporte coletivo;

VI – captação e tratamento de esgoto e lixo;

VII – telecomunicações;

VIII – guarda, uso e controle de substâncias radioativas, equipamentos e materiais nucleares;

IX – processamento de dados ligados a serviços essenciais;

X – controle de tráfego aéreo;

XI – compensação bancaria.

 

Sendo assim o CDC trata tal matéria de forma clara e objetiva, não comportando exceções, onde esses serviços supracitados não podem ser interrompidos em nenhuma hipótese devido a sua própria essencialidade, não só isso, mas devido principalmente à garantia advinda do próprio texto constitucional.

 Por isso, foram inseridos vários princípios de natureza constitucional, como o da dignidade da pessoa humana que esta inserida no art.1º, III, o princípio da garantia à segurança e à vida, abordado no caput do art.5º, o princípio de ter uma vida sadia e de qualidade dada em razão de um meio ambiente ecologicamente equilibrado como prevê o caput do art. 225 e por fim o direito necessário à saúde do caput do art.6º.

Com isso verificamos que a Lei n. 8.987 em seu art.6º, §3º, I possui constitucionalidade duvidosa ao prevê uma hipótese da interrupção desses serviços. Entretanto o entendimento e no sentido que essa interrupção e de natureza irregular e pode gerar uma indenização por um dano sofrido na sua interrupção.

Há, no entanto apenas uma possibilidade referida no artigo acima supracitado que é justamente quando ocorrer de o consumidor inadimplente, tem condições de pagar mais mesmo assim não o faz, onde pode haver assim o corte no fornecimento do serviço mediante autorização judicial.

Mister se faz apresentar diante das divergências doutrinarias sobre essa temática de fundamental relevância para o nosso direito o posicionamento já pacificado da jurisprudência do STJ com relação aos serviços de natureza essenciais.

Assim segundo o AgRg no AREsp 177397 / RJ, AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL 2012/0099017-9 em que foi relator o Ministro HERMAN BENJAMIN, julgado no dia 18/09/2012 aborda em parte de sua ementa dessa forma “ 5. A jurisprudência do STJ se firmou no sentido da impossibilidade de suspensão do fornecimento de serviços essenciais, como a água, para cobrança de débitos pretéritos”.Com esse julgado não há mais como questionar sobre o fornecimento dos serviços essenciais de maneira ininterrupta, mesmo no caso de inadimplemento do consumidor, salvo no caso já citado no presente trabalho. 4. RESPONSABILIDADE DO PRESTADOR DO SERVIÇO PÚBLICO Quando abordamos sobre a questão da responsabilidade, temos que focar que existem duas modalidades, a objetiva e a subjetiva, onde a culpa vai ser o fundamento da responsabilidade.Portanto, a responsabilidade objetiva é aquela em que a própria lei determina em quais casos haverá a obrigação de reparar o dano, mesmo que não tenha ocorrido com culpa. Isso decorre do fato de ser analisado apenas e tão somente se houve o dano e o nexo de causalidade. Já em relação a responsabilidade subjetiva é aquela que fundamenta-se na culpa do agente, onde só haverá a responsabilidade em reparar o dano se provar o nexo causal entre o dano e a culpabilidade do agente, abordando a culpa como um dos pressupostos da responsabilidade civil. Com isso importante salientar a regra trazida pelo art.186 do Código Civil disposto da seguinte maneira: 

Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.

 A responsabilidade do prestador do serviço público tem natureza objetiva, pois primeiramente, esta surge de uma norma disposta na Constituição Federal em seu art.37, §6º que dispõe o seguinte: §6º. As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável no caso de dolo e culpa. Devido a essa norma foi que o legislador inseriu também na legislação consumerista o parágrafo único do art.22, como uma forma de garantir que não haja nenhum tipo de prequestionamento em relação à responsabilidade destes, dispõe assim o seguinte: Parágrafo único. Nos casos de descumprimento, total ou parcial, das obrigações referidas neste artigo, serão as pessoas jurídicas compelidas a cumpri-las e a reparar os danos causados, na forma prevista neste Código. Com isso, como já dito anteriormente, a responsabilidade é objetiva e o prestador de serviço público vai estar submetido às mesmas normas que o prestador do serviço privado.

Com toda essa problemática que foi abordada até o presente momento, podemos conclui que os serviços públicos essenciais são de grande importância para o direito por estar relacionada a garantias constitucionais dos cidadãos, onde o próprio STJ por meio dos seus julgados já firmou seu posicionamento no sentido de que tais serviços não podem ser interrompidos nem mesmo se houver o inadimplemento pelo usuário das tarifas, salvo na hipótese de tal inadimplemento ocorrer pelo fato de o usuário podendo pagar não o faz.

Sendo assim, importante ressaltar que os prestadores dos serviços essências possuem responsabilidade objetiva, bem como respondem da mesma forma que os prestadores de serviços privados, ou seja, respondem pelos defeitos e vícios nos serviços elencados no Código de Defesa do Consumidor.

 

REFERÊNCIAS

 

BITTAR, Eduardo C. B, Metodologia da Pesquisa Jurídica. 9ª edição. São Paulo: Editora Saraiva, 2011.

NUNES, Rizzato, Curso de Direito do Consumidor. 7ª edição. São Paulo: Editora Saraiva, 2012.

NUNES, Rizzato, Comentários ao Código de Defesa do Consumidor. 4ª edição. São Paulo: Editora Saraiva, 2009.

FILHO, Sergio Cavalieri, Programa de Direito do Consumidor. Volume único.

São Paulo: Editora Atlas S.A. 2008.

GONÇALVES, Carlos Roberto, Direito Civil Brasileiro. 6ª edição. São Paulo: Editora Saraiva, 2011.