Os Limites Éticos da Propaganda

Por Robson Fernando | 16/11/2008 | Adm

Se você ainda não foi seduzido pela propaganda, é porque só começou a viver na civilização urbano-industrial há pouco tempo. Não há para onde correr, cedo ou tarde alguma jogada de marketing publicitário atrairá você. Pode não ser aquelas multinacionais simultaneamente tradicionais e inovadoras, mas alguma que tenha contratado uma agência publicitária criativa e sagaz, o impacto é fulminante. É muito normal que isso aconteça, mas às vezes a estratégia desmedida de certos anúncios acende o sinal amarelo, ou mesmo o vermelho, da ética e do bom senso. Nessas horas é que temos que dizer “ei, não é por aí não, modere-se!”.

Resolvi tocar nesse assunto depois que recordei de um comercial de rádio anti-vegetariano de uma churrascaria paulista, o qual sugeria aos onívoros que “curassem” os adeptos da alimentação ética levando-os para lá. Algo que na visão de um vegetariano como eu obviamente era nojento, abusivo e preconceituoso. Felizmente essa peça foi tirada pelo ar pelo Conselho Nacional de Regulamentação Publicitária (Conar). Outro caso bem recente de “publicidade do mal” de que me lembrei imediatamente foram o outdoor de uma grife infantil mostrando uma menina posando vestida à Rebelde e com uma notável mensagem erotizada intitulada “Use e se lambuze”. Ao ver meu e do Conar, casos legítimos de propaganda abusiva.

Pensa-se num detalhe: qual é o limite ético de uma propaganda? Numa sociedade dividida em parcelas de pensamento praticamente inconciliáveis, fica horrivelmente difícil dizer onde termina o normal e começa o abuso. Há uma propaganda de carne que ao menos até recentemente foi ao ar na TV, intitulada Coração do Brasil: enquanto para consumidores onívoros é um anúncio sedutor e gostoso, para vegetarianos a serviço dos direitos dos animais aquilo é quase nazista, uma vez que põe a espécie humana num deleite em detrimento das tantas vidas animais previamente ceifadas. Propagandas com amor gay também fazem polêmica perante uma sociedade cuja maioria ainda se deixa levar por valores homofóbicos: para alguns, o comercial com dois homens se beijando na boca é “imoral”, “uma fronta”, “pouca vergonha” e o escambau, ao mesmo tempo em que, para quem se libertou do pensamento preconceituoso ou é homossexual, tal cena não é nem deveria ser vista como diferente da de um casal heterossexual em cena de beijo caliente. A mesma polêmica pode ser detectada em propagandas religiosas proselitistas como os outdoors “Jesus é a única esperança” que vão de encontro ao respeito à diversidade de credos e em muitas outras questões que deixo a seu critério pesquisar.

Quanto àqueles comerciais obviamente desrespeitosos, felizmente o Conar e o Ministério Público estão aí para nos acudirem. São os dois que dizem “não, vocês não podem fazer o que quiserem!”. É verdade que não previnem sempre, como nos casos de comerciais erotizantes e preconceituosos – resoluções do Conar regulamentam (apenas) algumas áreas publicitárias, como a de bebidas alcoólicas, e previnem abusos vindos delas –, mas agem como uma “polícia da propaganda” quando o assunto é advertir ou derrubar quem pensa que pode fazer tudo o que quiser, como os dois primeiros citados. O problema é quando os dois, por motivo pouco compreensível, não tomam o veredito justo, como quando o Conar absolveu o mesmo comercial da churrascaria em 2005. Mas, desencontros com o interesse geral à parte, ainda são aqueles a quem podemos recorrer quando somos ofendidos por algum comercial imbecil.

Fazendo minha parte, convoco você a denunciar todo aquele anúncio que falte com bom senso e respeito e mande ao Conar ou ao Ministério Público de seu estado. Não tolere quando, por exemplo, uma agenciazinha, explícita ou implicitamente, chamar o vegetariano de doente ou um não-apreciador de álcool de idiota. Pensamento publicitário tem limites, e os limites somos nós consumidores.