OS IMPACTOS DA LEI GERAL DE PROTEÇÃO DE DADOS SOBRE PESSOAS JURÍDICAS

Por Lívia da Silva Guedelha | 04/01/2021 | Direito

OS IMPACTOS DA LEI GERAL DE PROTEÇÃO DE DADOS SOBRE PESSOAS JURÍDICAS [1]

 

Maria Terra Soares da Silva [2]

Lívia da Silva Guedelha[3]

George Andrey Ferro Castro Filho4

Amanda Costa Thomé Travincas5

 

  1.  

O presente trabalho visa analisar o impacto da Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD), número 13.709, recentemente aprovada em 14 de agosto de 2018, sobre as pessoas jurídicas. Tal lei busca tratar os dados coletados de pessoas naturais, tutelando certos direitos fundamentais, como o direito à liberdade, à privacidade, ao livre desenvolvimento da personalidade, entre outros expressos na referida lei, fazendo, portanto, com que esta seja fundamentada através do intento de promoção e proteção dos direitos fundamentais. Nesse sentido, é notório que há determinado direcionamento exclusivo da tutela promovida pela lei às pessoas naturais, o que consequentemente leva a um pressuposto de que pessoas jurídicas não seriam contempladas pela legislação. Logo, será discutido o fato da LGPD, enquanto meio garantidor da efetivação de direitos fundamentais, promover uma tutela às pessoas jurídicas, objetivando identificar o conteúdo e efeitos da lei em relação ao direito de armazenamento de dados, bem como explorar o campo da titularidade de direitos fundamentais das pessoas jurídicas e, por fim, verificar a incidência da lei em relação a estas. Para o alcance de tais objetivos, será utilizado o método de abordagem hipotético-dedutivo, bem como metodologia de caráter estritamente bibliográfico e exploratório, portanto, basear-se-á em pesquisas acadêmicas através de artigos, livros, monografias, doutrinas, entre outros, que abordem acerca da temática em questão e que possam corroborar da forma mais adequada com este paper.  

 

Palavras-chave: Proteção de dados. Pessoas jurídicas. Direitos fundamentais. Titularidade.

 

1 INTRODUÇÃO

 

O uso de dados pessoais em diversos ramos (identificação, autorização, classificação e outros) concretiza o alto grau de importância dos mesmos para assegurar a autonomia e liberdade nos espaços jurídicos (DONEDA, 2011). Nesse sentido, é imprescindível a proteção de tais dados para efetividade de relações sociais, onde estão não somente inclusas pessoas naturais, mas também pessoas jurídicas, estes que não constituem alvo do dispositivo legal supracitado.  Somado a isso, a motivação dos pesquisadores para abordar esta problemática não está resumida ao âmbito social. Os membros desta pesquisa também tiveram o interesse despertado pelo contexto jurídico, atentando para a possibilidade de incidência da LGPD sobre a pessoa jurídica.

 A LGPD, número 13.709, recentemente aprovada em 14 de agosto de 2018, tem por objetivo tratar os dados coletados de pessoas naturais, a fim de tutelar determinados direitos fundamentais das mesmas, bem como direito à liberdade, à privacidade, ao livre desenvolvimento da personalidade, entre outros que se encontram expressamente na referida lei, fazendo, portanto, com que esta seja fundamentada através do intento de promoção e proteção dos direitos fundamentais. (MULHOLLANDa, 2018, p. 162).  

Em seus artigos 1º e 5º, pode-se notar que, há certo direcionamento exclusivo da tutela promovida pela lei para pessoas naturais, o que consequentemente leva a um pressuposto de que pessoas jurídicas não seriam contempladas pela legislação. Dessa forma, a problemática enfrentada no presente trabalho se constitui em: a LGPD, enquanto meio garantidor da efetivação de direitos fundamentais, promove uma tutela às pessoas jurídicas? Em resposta, entende-se que diante dos princípios constitutivos da LGPD e o seu caráter de tutela de direitos fundamentais, há possibilidade de extensão da lei para além da pessoa natural em caráter subsidiário, contemplando, portanto, a pessoa jurídica. Assim como é possível a admissibilidade pelo reconhecimento de que a partir de dispositivos legais, a pessoa jurídica é titular de direitos fundamentais que correspondem, portanto, à sua natureza, e desse modo, a LGPD, em decorrência do seu objetivo de promoção e tutela de tais direitos, deve estender os seus efeitos à pessoa jurídica de forma imediata.

A pesquisa será de cunho bibliográfico, ou seja, através da consulta em livros, artigos acadêmicos e científicos (tese, monografia, dissertação), legislação e anais de evento. Definido por Severino (2000, p.131) como o comentário sobre conjuntos de informações devidamente selecionadas escritas por estudantes ou especialistas, em livros ou revistas sobre determinada área científica tratada no trabalho.

Este trabalho teve como objetivo geral analisar a LGPD quanto a promoção e proteção de direitos fundamentais no que diz respeito à titularidade de pessoas jurídicas. Os objetivos específicos foram: Identificar o conteúdo e os efeitos da LGPD em relação ao direito de armazenamento de dados; explorar o campo da titularidade de direitos fundamentais da pessoa jurídica; verificar a incidência da referida lei a proteção de dados da pessoa jurídica.

 

2 LEI GERAL DE PROTEÇÃO DE DADOS E PESSOAS JURÍDICAS

 

2.1 A LGPD em relação ao direito de armazenamento de dados.

 

Em um momento histórico anterior ao desenvolvimento da informática, a proteção jurídica do direito à privacidade se apresentava eficiente, hodiernamente dados de diferentes naturezas são armazenados e circulam, comumente sem controle, entre particulares, empresas privadas e Estados. Com base nisso, torna-se indispensável a análise do tema relativo à proteção de dados pessoais, bem como a criação de fronteiras para a proteção dos mesmos diante de uma adequação da realidade digital (RUARO; RODRIGUEZ, 2010). É neste cenário que se promulgou a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais.

Baseada nas discussões acerca da GDPR europeia, a LGPD visa a promoção de maior controle das pessoas sobre seus dados bem como, por meio de normas flexíveis e adequadas para interagir com os atuais modelos de negócios dependentes de tais dados, de um cenário de desenvolvimento econômico e tecnológico. Em linhas gerais, tal dispositivo garante aos titulares (pessoa natural), entre outras coisas, o direito à transparência dos seus dados na medida que estabelece o direito de obter, com facilidade e precisão, informações acerca do seu tratamento e os devidos agentes de tal tratamento, proporcionando o discernimento da maneira com a qual os dados são usados ao requisitar de órgãos públicos e privados, baseados nos segredos comercial e industrial. Em outros termos, o princípio da transparência deve ser intrínseco a todas as relações entre o responsável por tratar tais dados e seus respectivos titulares, assegurando a estes o livre acesso. (MONTEIRO, 2018).

Face a este conteúdo, destaca-se o intuito de tutela aos direitos fundamentais de liberdade, privacidade e desenvolvimento da personalidade da pessoa natural e, por conseguinte, excluindo ou não discorrendo acerca da pessoa jurídica, haja visto que todos os conceitos da lei são direcionados não para esta, mas para aquela enquanto agente no polo passivo. Entretanto, a identidade de uma pessoa jurídica é singular, seus atos de negócios realizados em âmbitos negociais e personalíssimos não são atribuídos ao empresário, porém à empresa, sendo os seus dados, advindos de uma contratação (eletrônica ou não), categorizados como prolongamentos de sua identidade socioeconômica. Assim sendo, negar a proteção a tal ente autossuficiente proporciona distorções e mal-entendidos entre a dimensão social-econômica e a dimensão técnica legislativa. (MAGALHÃES; DIVINO, 2019).

Nesse sentido, deve-se atentar para o tratamento quanto à pessoa jurídica. É notável que há um abandono da mesma pela LGPD, tendo em vista que esta não recebe proteção legal, mas, por outro lado, somente é abordada como responsável pelo tratamento dos dados pessoais de titulares, ou seja, pessoa natural. Sendo assim, à proporção que é negligenciada a proteção aos dados da pessoa jurídica, resulta também, no desmazelo em relação a proteção dos seus direitos fundamentais.

 

2.2 Titularidade de direitos fundamentais das pessoas jurídicas.

 

A princípio, é relevante mencionar o reconhecimento legal da personificação e da atribuição dos direitos de personalidade as pessoas jurídicas. Tal reconhecimento promove, consequentemente, a sua capacidade jurídica, que abarca a contração tanto de deveres quanto do exercício de direitos que sejam compatíveis com sua condição e natureza, além de se reverter como um sujeito de direito legalmente atribuído. (ALBUQUERQUE,2007).

Nesse sentido, apesar de já ter se reconhecido titularidade de forma mais ampla que a capacidade jurídica, resta-se superado tal entendimento. As terminologias destinatário e titular de direitos fundamentais, que significam, respectivamente, a pessoa que o titular pode exigir a proteção e a promoção do seu direito e aquele que detêm direitos que devem ser resguardados e promovidos.  No que pese tal compreensão, é entendido que apesar da pessoa jurídica ser vista, na maioria das vezes, como destinatário de um direito fundamental, remetendo-se a eficácia privada dos direitos fundamentais, não se exclui a possibilidade de figurar de ambas as formas, como destinatário e titular. Por esse motivo, a determinação de titularidade não deve ocorrer de forma anterior para tais direitos, pois se entende necessário uma identificação de acordo com as individualizações, tendo como parâmetro cada norma de direito fundamental, o caso concreto e quem figura na relação jurídica. (SARLET, 2009)

Acerca da titularidade das pessoas jurídicas quanto a direito fundamentais, entende-se que apesar de não conter na Constituição Federal claúsula expressa de garantia da titularidade, tal possibilidade é plenamente viável diante da doutrina e jurisprudência, que defendem essa perspectiva compreendendo as limitações que decorrem da própria condição de pessoa jurídica. Por meio disso, há entendimento firmado quanto a aceitação da tese de que as pessoas jurídicas, em contrapartida com as pessoas naturais, não possuem titularidade de todos os direitos, mas somente daqueles que são compatíveis com a sua natureza e condição, o que envolve diretamente os fins a que se propõe, concluindo-se que diante da ausência de incompatibilidade entre o direito fundamental e a condição e finalidades da pessoa jurídica, há entendimento majoritário do reconhecimento da titularidade, tanto sobre direitos processuais, como em direitos materiais. (SARLET; MARINONI; MITIDIERO, 2017)

Ademais, o reconhecimento de direitos fundamentais a pessoas jurídicas se justifica tanto pela ordem de direitos subjetivos, como objetivos. Para tanto, é necessário que se determine seus direitos e deveres pela compatibilização e conciliação com a sua natureza, que depende, primordialmente, do conceito e âmbito legal do direito fundamental em questão. Isto posto, entende-se que o reconhecimento de titularidade pela jurisprudência e doutrina  mais recorrente em relação a pessoas jurídicas envolve a proteção da intimidade, honra e imagem desta, pela indenização referente a danos morais com respaldo na Constituição Federal, inciso V e X. No que concerne a honra, trata-se da sua perspectiva objetiva, que equivale ao direito de não ter comprometida a sua respeitabilidade perante a coletividade. Em conformidade, compreende-se também que é essencial o exercício de direitos fundamentais por esta, no que tange a sua própria existência. (SCHMITT, 2000).

Em contrapartida ao tema ora versado, o entendimento de que pessoas naturais ou físicas são titulares de direitos fundamentais é unânime, uma vez que tal afirmação possui respaldo no próprio substrato constitucional. Posto isto, é por meio da Nova Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) e seus princípios constitutivos,  que se reconhece a pessoa natural como titular do direito fundamental a proteção de dados pessoais, já que diante de uma Sociedade da Informação os seus dados são corriqueiramente utilizados para uma diversidade de atividades. (DONEDA,2011). Nesse ponto, propõe-se, consequentemente, o questionamento sobre a possibilidade de pessoas jurídicas estarem abarcadas por essa lei.

A construção da pessoa jurídica diante do ordenamento democrático de direito, que tem como parâmetro uma economia informacional, em que o funcionamento em rede é importante para a ascensão da autonomia da empresa em uma base e estrutura econômica dinâmica, pois a visão do uso da internet como fonte de produtividade e competitividade adentra no campo empresarial como forma de empreendimento. É nesse contexto, que envolve o campo econômico e tecnológico, que há o surgimento dos dados pessoais, compreendendo que estes são prolongamentos e sujeições do direito a privacidade. Cabe destacar, pois, que o sigilo industrial não se iguala aos direitos de personalidade, por terem objetos distintos e pelo fato da privacidade está ligada a atos praticados exclusivamente pelo ente jurídico no seu âmbito privado. Nesse sentido, a utilização de dados particulares de identificação para qualquer tipo de atividade pela pessoa jurídica é própria desta, já que a personalidade é autônoma e independente. ( MAGALHÃES; DIVINO, 2019)

Outrossim, há perspectiva que considera pessoas jurídicas como detentoras de direitos fundamentais com a finalidade máxima da proteção e promoção de direitos da pessoa natural, o que compreende o sentido que é empregado ao efeito extensivo dessa titularidade. Assim como a tutela da pessoa jurídica visa, como decorrência, na maioria dos casos, de um objetivo a ser conquistado quanto ao resguardo de direitos das pessoas físicas. (SARLET; MARINONI; MITIDIERO,2017). Em razão disso, cabe salientar o caráter ou relação subsidiária que se estabelece na nova lei, na medida em que se assegura e garante direitos fundamentais das pessoas naturais quanto a utilização dos seus dados, em relação a efeitos equivalentes quanto a pessoas jurídicas, entendendo que é por meio da tutelas de tal direito destas que se alcança de forma relevante a real e efetiva proteção de dados dos indivíduos que estão compreendidos no manejo de dados.

 

2.3 A incidência da LGPD em relação a pessoa jurídica.

 

Diversos, mas também limitáveis diante da necessidade do controle de constitucionalidade, são os direitos fundamentais atribuídos às pessoas jurídicas, assim, entende-se que estas podem ser titulares de tais direitos, desde que haja uma compatibilidade entre a natureza e os fins da pessoa jurídica no que diz respeito ao direito fundamental em questão. (SARLET, 2009). Nesse sentido, a personalidade se configura enquanto capacidade de ser titular de direitos, bem como de obrigações jurídicas. (CUPIS, 2008). Portanto, as pessoas jurídicas devem receber a tutela da LGPD, enquanto titulares dos direitos da personalidade, visto que esse direito fundamental visa ser protegido pela referida lei.

Outrossim, a Constituição Federal prevê em seu artigo 5º, inciso X, a inviolabilidade da intimidade, da vida privada, da honra e da imagem das pessoas, onde é assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral que decorre de sua violação, entretanto, não houve indicação a respeito da pessoa a que se refere, possibilitando uma margem interpretativa para compreender a pessoa enquanto natural, bem como jurídica. Isto, pois, se a interpretação possuir caráter restritivo a pessoa natural, resultar-se-ia na inviabilização da construção autônoma dos direitos que se estendem ao ente jurídico. (MAGALHÃES; DIVINO, 2019).

Assim, entende-se que a LGPD protege situações que concernem exclusivamente a operações de armazenamento e tratamento de dados, sendo norteada por vários princípios, a fim de garantir a proteção dos dados da pessoa natural. (MULHOLLAND, 2018). Entretanto, é evidente a necessidade de extensão da LGPD para que possa incidir de forma direta sob as pessoas jurídicas, uma vez que estas armazenam dados de pessoas naturais e possuem dados próprios passíveis de armazenamento, que por sua vez, são coletados e tratados de forma indiscriminada, não havendo uma lei capaz de regulamentar e, de fato, promover e proteger os direitos fundamentais decorrentes desse contexto, onde se reconhece não apenas os direitos da personalidade, mas o direito à privacidade das pessoas jurídicas, bem como o direito à imagem e todos os prolongamentos e sujeições deles derivados, capazes de se constituírem enquanto objetos da coleta e tratamento desses dados que implicam na relação contratual. (MAGALHÃES; DIVINO, 2019). Ademais, tal entendimento é ratificado pela súmula 227 do Superior tribunal de Justiça que prevê o dano moral sofrido pela pessoa jurídica, além da entrada em vigor do artigo 52 do Código Civil, enunciando que é aplicável às pessoas jurídicas, no que couber, a proteção dos direitos da personalidade. Logo, pela LGPD ter enquanto objetivo em sua redação, a proteção de direitos da personalidade, deve estender-se as pessoas jurídicas.

Destarte, a teoria da eficácia privada dos direitos fundamentais, a priori, faz distinção entre eficácia vertical e horizontal. Esta, diz respeito as relações entre particulares; aquela está associada a vinculação do Estado aos direitos fundamentais diante das relações com particulares. (FELIX, 2005). Nesse sentido, uma vez considerando a vinculação entre privados, podendo se tratar de pessoas físicas ou jurídicas, aos direitos fundamentais, entende-se que numa relação entre os mesmos, ambos são titulares de tais direitos, independentemente de um deles exercer o papel de destinatário em face do outro. (SARLET, 2000). Logo, pelo fato da existência de titularidade de direitos fundamentais da pessoa jurídica, esta, ao ser destinatário diante do armazenamento de dados da pessoa natural enquanto titular, em nada inviabiliza o seu papel também, de titular, uma vez que subsiste a proteção de dados da própria pessoa jurídica para que sejam cumpridos os princípios da LGPD, bem como a não ocorrência de violação aos direitos fundamentais protegidos pela referida lei.

Diante disso, a composição da sociedade da informação está relacionada ao desenvolvimento social e econômico dentro de um determinado contexto social, baseando-se na utilização crescente de técnicas de transmissão, armazenamento e tratamento de dados, além de informações a baixo custo, que são, portanto, acompanhadas por inovações organizacionais, legais e sociais. Logo, seu funcionamento decorre do aumento e da maior possibilidade de acesso aos meios de comunicação no século XX em diante, principalmente no que diz respeito as redes digitais e, nesse sentido, tais desenvolvimentos têm fomentado inovações produtivas, técnicas, organizacionais e comunicacionais. (LEGEY; ALBAGLI, 2000). Isso posto, compreende-se que dentro de tal cenário informacional contemporâneo, armazenamento e tratamento de dados se tornam objetos suscetíveis a violação e desproteção, uma vez constatada a maior facilidade de transmissão e técnicas através de meios comunicacionais para tal.

Há, nesse aspecto, uma transformação dos mercados diante do modelo de empresa em rede, associada a ideia de produtividade, bem como de inovações, fazendo que que visualizem a coleta e tratamento de dados enquanto um modelo remuneratório rentável. (MAGALHÃES; DIVINO 2018). Portanto, faz-se necessário que, com o surgimento da LGPD, a fim de tutelar direitos fundamentais de titulares dos mesmos, diante de tal sociedade da informação, deve contemplar as pessoas jurídicas, uma vez que esta, possui seus dados e informações próprias, além de coletar, armazenar e tratar os dados de terceiros (pessoa natural), fazendo com que seja imprescindível a tutela da lei.

 

3 CONSIDERAÇÕES FINAIS

 

O intuito desta pesquisa foi analisar a Lei Geral de Proteção de Dados em relação à promoção e proteção de direitos fundamentais diante da titularidade de pessoas jurídicas. Com base nisso, foi realizada uma identificação do conteúdo da LGPD no que concerne aos efeitos sobre o direito de armazenamento de dados, bem como uma exploração do campo de titularidade de direitos fundamentais da pessoa jurídica e a sua proteção de dados. Deste modo, foi alcançado o objetivo da pesquisa na medida que, com a exploração de cada ponto determinado, as duas hipóteses foram devidamente confirmadas: frente aos princípios constitutivos da LGPD e o caráter de tutela de direitos fundamentais, assim como a titularidade de tais direitos pela pessoa jurídica, concluiu-se que esta deve sofrer a incidência do dispositivo legal em questão não somente de forma subsidiária, mas também de forma imediata.

O contexto da promulgação da Lei Geral de Proteção de Dados é primeiramente fundamental para entender a necessidade não unicamente da sua existência, mas igualmente da sua abrangência sobre pessoas jurídicas. O cenário de desenvolvimento social e econômico de uma sociedade baseado no gradativo crescimento de técnicas de transmissão de dados, bem como seu tratamento e armazenamento constitui a denominada sociedade de informação. Deste modo, face ao desenvolvimento tecnológico a partir do século XX, com foco para a facilidade de acesso aos meios de comunicação, principalmente no âmbito de redes digitais, além dos mercados de empresas de rede que identificam um modelo remuneratório rentável na execução de coleta e tratamento de dados, verifica-se a vulnerabilidade dos mesmos e estabelecendo a fragilidade de sua proteção. Portanto, os dados de pessoa jurídica não estão fora dessa vulnerabilidade, porém ao contrário, estão sujeitos à violação.  

Há o entendimento de que a pessoa jurídica é titular de direitos fundamentais quando da ausência de incompatibilidade da condição e finalidades da primeira em relação aos segundos. Ainda que não seja presente a disposição da garantia de titularidade desses direitos na Constituição Federal vigente, a doutrina majoritária é favorável ao reconhecimento de tal titularidade pela pessoa jurídica, uma vez tendo sido compatível com a sua natureza e condição, assegurando direitos processuais e materiais. Somado a isso, quando se trata da proteção da pessoa natural por meio da pessoa jurídica, é plenamente aceitável o raciocínio de que quando a LGPD visa proteger a pessoa física, poderá, por consequência, de forma subsidiária, proteger a pessoa jurídica.

Dessa maneira, ainda é válido reforçar a titularidade da pessoa jurídica pela teoria da eficácia privada dos direitos fundamentais. Compreende-se que na relação entre privados, em outras palavras, a relação horizontal, diante de direitos fundamentais, pessoa jurídica e pessoa física são igualmente titulares, ainda que um deles possa eventualmente assumir a posição de destinatário do outro. Ou seja, a pessoa jurídica, titular de direitos fundamentais, sendo destinatário do armazenamento de dados da pessoa natural, também pode assumir o polo passivo da lei em questão, contribuindo, por efeito, para a concretização dos seus objetivos de proteção aos dados armazenados.

No que diz respeito à forma imediata de incidência da LGPD sobre pessoas jurídicas, é possível aduzir favoravelmente à luz da Constituição Federal. Quando a Carta Magna dispõe acerca da inviolabilidade da intimidade, da vida privada, da honra e imagem das pessoas, postulando o direito à indenização por danos materiais ou morais, no seu artigo 5º, inciso X, não é estabelecido qual tipo de pessoa, possibilitando assim a extensão de tal efeito para pessoas naturais e jurídicas. Diante disto, adicionado ao entendimento do STJ que dispõe o estabelecimento de dano moral sofrido pela pessoa jurídica, assim como a proteção dos direitos de personalidade da pessoa jurídica pelo conteúdo do artigo 52 do Código Civil, compreende-se a possibilidade de extensão direta dos efeitos da LGPD sobre pessoas jurídicas, bem como a necessidade, tendo em vista que as mesmas são portadoras de dados de pessoas físicas e de dados passíveis de armazenamento.

Entende-se, portanto, que a Lei Geral de Proteção de Dados pode e deve se estender à pessoa jurídica de forma direta e também subsidiária, protegendo, por conseguinte, a pessoa natural. Diante da relevância deste tema, a utilização de artigos científicos e acadêmicos, bem como livros, doutrinas e legislações foi de extrema importância, facilitando a conclusão alcançada nesta pesquisa.

 

 

REFERÊNCIAS

 

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[1] Paper apresentado à disciplina Direitos Fundamentais da Unidade de Ensino Superior Dom Bosco – UNDB.

[2] Aluna do 4º período do curso de Direito da UNDB.

3 Aluna do 4º período do curso de Direito da UNDB.

4 Aluno do 4º período do curso de Direito da UNDB.

[3] Professora, orientadora.

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