OS DESAFIOS DAS EMPRESAS FAMILIARES: GESTÃO DE PESSOAS
Por Arlene do Rocio Mattozo | 06/10/2010 | HistóriaSOCIEDADE PARANAENSE DE ENSINO E INFORMÁTICA ? SPEI
ABC BONN IN COMPANY LTDA.
PÓS-GRADUAÇÃO EM GESTÃO DE PESSOAS E QUALIDADE NO SETOR PÚBLICO
ARLENE DO ROCIO MATTOZO
OS DESAFIOS DAS EMPRESAS FAMILIARES: GESTÃO DE PESSOAS
Artigo apresentado como requisito parcial à obtenção do título de especialista em Gestão de Pessoas e Qualidade no Setor Público.
Orientação: Profª Drª Rosi Terezinha Ferrarini Gevaerd
CURITIBA
2010
OS DESAFIOS DAS EMPRESAS FAMILIARES: GESTÃO DE PESSOAS
Arlene do Rocio Mattozo
Rosi Terezinha Ferrarini Gevaerd
Resumo
Este artigo analisa o preparo das empresas familiares para obter ou manter o sucesso, assim o estudo tem por objetivo avaliar o grau de adoção de diversas práticas associadas ao sucesso da empresa, envolvendo a cultura organizacional, gestão de cargos e salários e fatores emocionais e administrativos em empresas familiares. O processo sucessório na empresa familiar é um assunto bastante complicado, não pode ser tratado apenas sobre os aspectos puramente lógicos, pois envolve pontos efetivos e emocionais relacionados com a própria estrutura familiar, por outro lado, o atual contexto competitivo exige prontidão nas tomadas de decisões, nesse sentido é de suma importância prover a sistematização de uma ferramenta de controle estratégico em uma atmosfera de empresa. A empresa familiar tem a necessidade constante de, a cada dia que passa se profissionalizar mais e mais e seguir padrões empresariais globais, dessa forma, atribuindo melhor o foco do seu modelo gerencial. Através de fontes bibliográficas disponíveis em livros, bibliotecas, artigos em revistas e internet, o estudo possibilitou concluir que a maior contribuição, para uma empresa familiar, é flexível e alusivo às mudanças promovendo o crescimento integrado da empresa, tornando a empresa familiar plenamente competitiva e com perspectivas de crescimento.
Palavras-chave: Empresas familiares. Gestão de pessoas. Gestão de cargos e salários. Cultura organizacional.
THE CHALLENGES OF THE FAMILY BUSINESS: PEOPLE MANAGEMENT
Abstract
This article analyses the preparation of family firms to attain or maintain success, therefore this study aims at assessing the adoption degree of several practices associated to the company?s success, involving organizational culture, management positions and salaries and administrative and emotional factors in family businesses. The succession process in a family business is quite a complicated issue, it cannot be treated exclusively on the logical aspects, because it involves effective and emotional matters related to the family structure itself, on the other hand, the current competitive context requires promptness in decision making, consequently it is of great importance to provide the systematization of a strategic control tool in a business atmosphere. Each passing day, the family firm has a constant need of getting more and more professionalized and follows global business standards, thus, granting a better focus on its management model. Through bibliographical sources available in books, libraries, magazines and Internet articles, this study allowed to conclude that the greatest contribution to a family business is flexible and refers to changes promoting the integrated growth of the company, making it totally competitive and having growth prospects.
Key words: Family business/Family firms. People management. Management positions and salaries. Organizational culture.
INTRODUÇÃO
Empresas progridem ou regridem devido às suas objetividades de foco. Hoje, como alternativa as empresas estão recorrendo a diversas estratégias com o objetivo de estimular os colaboradores a crescer juntamente com a organização.
Na empresa familiar esta premissa está mais evidente por ser um ambiente em que se confundem o papel profissional do gestor, racional e objetivo, e o papel familiar, de pai, filho, que pressupõe uma relação caracterizada pela afetividade.
Os avanços globais criaram a necessidade das empresas focarem o capital humano em suas estratégias de competitividade e desenvolvimento. Em empresas familiares, mais precisamente, as personalidades administrativas costumam transmitir tendências inteiramente pessoais aos salários de seus subordinados, resultando em grupos mais favorecidos pelas benesses de um chefe influente, em detrimento de outros. O estudo tem por objetivo avaliar o grau de adoção de diversas práticas associadas ao sucesso da empresa, envolvendo a cultura organizacional, gestão de cargos e salários e fatores emocionais e administrativos em empresas familiares.
Para acompanhar essas mudanças, as empresas familiares, e consequentemente, o setor de recursos humanos devem permanecer em estado de constante transformação, buscando qualidade de vida e auxiliando também seus colaboradores no desenvolvimento pessoal e profissional.
REVISÃO DA LITERATURA
Para entender cultura em empresas familiares torna-se imprescindível compreender a noção da família no mundo contemporâneo, pois é a partir dos arranjos familiares existentes que pode emergir a noção de organização familiar.
Este tipo de organização mantém uma interação com a família, conforme salienta Machado (2005), para uma empresa se sustentar como familiar no mercado competitivo do século XXI, deve haver uma sinergia e um relacionamento estreito entre a família e a empresa. A empresa precisa ter um desempenho de forma que crie valor para a família e a família precisa criar valor para a empresa. A atuação se torna impossível sem o envolvimento familiar.
Para Souza (2006, p. 42) "montar um negócio em família e manter sua gestão ligada aos laços de parentesco sempre foi, em toda a trajetória do sistema capitalista, uma forte tendência".
O modelo de administrador na gestão empresarial brasileira, conforme Prates (1996, p. 26), pode ser caracterizado como um sistema composto de quatro subsistemas:
O institucional, o pessoal, o dos líderes e o dos liderados. Os institucionais estão relacionados com os traços culturais que encontramos no espaço da "rua", enquanto os traços típicos do espaço da "casa" compõem o subsistema pessoal. O subsistema dos líderes faz um corte, reunindo traços encontrados naqueles que detêm o poder, enquanto o subsistema dos liderados abrange os aspectos culturais mais próximos daqueles subordinados ao poder.
É importante perceber que esse conjunto de traços culturais com maior ou menor intensidade, chega até a formar um único conjunto que tem o outro como subconjunto. O patriarcalismo, a face supridora e afetiva do pai, atendendo ao que dele esperam os membros do clã, e o patrimonialismo, a face hierárquica e absoluta, impondo com a tradicional aceitação sua vontade a seus membros, convivem lado a lado na cultura brasileira (PRATES, 1996).
Segundo Castells (1999, p. 169), a principal transformação que está ocorrendo na família é o fim do patriarcalismo, que "caracteriza-se pela autoridade, imposta institucionalmente, do homem sobre a mulher e filhos no âmbito familiar". Este sistema, segundo o autor, está enraizado na civilização, em razão da sua perpetuação histórica e cultural, determinando também relacionamentos interpessoais que extrapolam os limites da família. Um dos principais fatores, na perspectiva do autor, e que determinou esta mudança, é a inserção das mulheres no mercado de trabalho. A partir da década de 1980, concomitantemente com a globalização, foi generalizada a ampliação das mulheres em postos de trabalho.
Com o crescente declínio da família patriarcal, hoje é possível existir uma empresa familiar constituída por uma família monoparental, na qual trabalham, por exemplo, mãe e filha. Apesar disso, um número considerável de estudos continua sendo desenvolvido, com o enfoque na empresa familiar patriarcal. É importante salientar que esse tipo de estrutura familiar não deixou de existir, mas não corresponde mais integralmente à representação de organização familiar. Nesse sentido, o aumento da complexidade se dá somente pela dificuldade em compreender novos arranjos familiares, mas também porque coexistem diferentes tipos de estruturas familiares dentro de uma mesma cultura (CASTELLS, 1999).
Segundo o mesmo autor, na concepção tradicional, a família é constituída de um grupo de pais e filhos, ou, em um sentido mais abrangente, incluindo também parentes próximos. Esse conceito corresponde à noção de família nuclear ou família extensiva, mas a compreensão de família alterou-se, principalmente, na década de 90. Desta forma, o conceito de família está inserido em um sistema ideológico mais amplo, ao mesmo tempo em que desenvolve e reproduz um sistema de valores próprios.
Outro fator refere-se às transformações tecnológicas, proporcionando controles sobre a reprodução humana. Para o autor, está o movimento feminista, com impacto na esfera do trabalho e na eliminação de qualquer forma de opressão ou desigualdade de poder. Além desses fatores, o autor menciona a difusão de uma nova identidade da mulher, decorrente da emancipação feminina.
Salienta Castells (1999), que o adiamento da formação dos casais, derivado da dificuldade de compatibilizar casamento, trabalho e vida, bem como a formação de relacionamentos sem casamento legalizado, contribuíram para enfraquecer a autoridade patriarcal e institucional.
Para ele, "essas tendências indicam o fim da família como a que conhecemos até agora: não apenas a família nuclear, mas a baseada no domínio patriarcal, que tem predominado há milênios." (CASTELLS, 1999, p. 174).
Essas alterações nas estruturas familiares revelam que o que está em jogo "não é o desaparecimento da família, mas sua profunda diversificação e a mudança do seu sistema de poder." (CASTELLS, 1999, p. 177).
De acordo com Machado (2005, p. 319), percebe-se que a noção de família envolve atualmente uma complexidade, na medida em que diferentes formas coexistem na mesma cultura, representando uma composição diferenciada da família nuclear tradicional e patriarcal, tanto pelos seus integrantes e pela redifinição de poder. Sendo assim, de modo sucinto, pode-se observar que a dinâmica familiar adquire novos contornos, principalmente no que se refere a alguns aspectos:
? Distribuição do poder: estudiosos apontam como um dos principais aspectos de transformação familiar a nova distribuição de poder, resultante da queda da estrutura patriarcal.
? Distância ente gerações: outro aspecto diferenciado nos arranjos familiares atuais é representado pelo aumento da distância de idade entre gerações, gerado pelo fato de os indivíduos terem filhos com idade mais avançada do que gerações anteriores. Apesar disso, o convívio entre gerações se apresenta modificado, principalmente com a intensificação da convivência entre avós e netos, muitas vezes maior do que entre pais e filhos.
? Tamanho da família: uma das transformações na família contemporânea é o tamanho das famílias, reduzido em função do número de filhos. Fatores como o ingresso de mulheres no mercado de trabalho, a redução de níveis de renda ou até mesmo o predomínio do individualismo podem ter contribuído para a redução do tamanho da família.
Do ponto de vista de Ricca (2010) as empresas possuídas e administradas por famílias constituem uma forma organizacional peculiar, cujo caráter especial tem consequências positivas e negativas. Elas extraem uma força especial da história, da identidade e da linguagem comuns às famílias. Quando dirigentes chave são parentes, suas tradições, seus valores e suas prioridades brotam de uma fonte comum. As comunicações, verbais ou não, podem ser grandemente aceleradas nas famílias. Cônjuges e irmãos têm maior probabilidade de entender as preferências explícitas e as forças e fraquezas ocultas uns dos outros. Mais importante, o empenho, até mesmo a ponto do auto-sacrifício, pode ser solicitado em nome do bem estar geral da família. Entretanto, esta mesma intimidade também pode trabalhar contra o profissionalismo do comportamento empresarial.
A partir dessa síntese de transformações da família, buscou-se compreender as suas implicações na cultura das organizações, no caso específico, de empresas familiares.
Apesar de muitos acreditarem que família e empresa, quando reunidas tendem a reduzir reciprocamente a sua eficiência, a história das empresas familiares bem sucedidas mostra que isso não precisa acontecer necessariamente. Não é a família em si que atrapalha a empresa, ou vice-versa, mas a ignorância dos problemas desse relacionamento e a falta de um código de relações (Bornholdt, 2005).
Governar uma empresa familiar é saber lidar com toda a complexidade das relações afetivas e financeiras existentes na organização, com as inúmeras diferenças de interesse entre familiares e demais pessoas envolvidas no processo de gestão empresarial e, principalmente, com os inevitáveis conflitos que, não sendo bem administrados, podem levar à destruição de uma instituição (Bornholdt, 2005, p. 83).
Conforme Ricca (2001, p. 7), muitos são os motivos que preocupam os administradores de uma empresa familiar. Nesse sentido, dentre esses, problemas familiares particulares que abatem sobre os membros das famílias tem levado muitas empresas ao fracasso, uma consequência das desvantagens desse tipo de organização. Os problemas são os mais diversos e o nível de complexidade varia de acordo com o porte da empresa e as características da estrutura familiar. "A maior preocupação das empresas familiares é a sua sobrevivência. A maioria delas enfrenta problemas existenciais ou estratégicos, isto é, dificuldades relacionadas à inadequação, tanto na utilização, quanto na escolha dos recursos disponíveis para o alcance das vantagens de mercado".
Em relação ao indivíduo e seu papel, Chiavenato (1993, p. 71), define papel como "o conjunto de atividades solicitadas a um indivíduo que ocupa uma determinada posição em uma organização". Ao estabelecer os papéis individuais a organização pressupõe que o alcance de metas esteja atrelado a um conjunto de expectativas de desempenho. O desempenho desses papéis é viabilizado à medida que a organização oferece condições básicas ao desenvolvimento de papéis e que o indivíduo esteja capacitado e comprometido com os papéis que lhe foram atribuídos pela organização.
Na identificação dos fatores determinantes de um bom desempenho de papéis, a organização deverá conhecer a diversidade de razões, interesses, ações e motivos que regem as expectativas e constroem o cotidiano dos indivíduos no desempenho de seus trabalhos.
Nesse sentido, a organização é uma estrutura de papéis, consistindo em aglomerados de atividades de indivíduos, ou mesmo de grupos que se superpõem, cada qual formado de pessoas que têm expectativas quanto a um determinado papel individual.
Os requisitos básicos no desempenho de papéis poderão ser trabalhados em conjunto pela organização e pelos indivíduos, em virtude do conhecimento do processo técnico e da execução das tarefas exigidas, ou podem ser considerados com base na leitura da descrição dos cargos da organização. Dentro do enfoque dos sistemas orgânicos, as organizações estimulam o resgate da conscientização social dos participantes, ao lado de sua vivência particular, do seu passado pessoal e da sua autoconscientização, quando permite que eles definam seus papéis individuais e os papéis que imaginam que a organização possui em relação ao ambiente que se inscreve (Chiavenato, 1999).
Para conseguir uma boa integração entre os familiares e sua equipe de trabalho, o gestor necessita desenvolver e exercer, em grau elevado, a sua habilidade humana e competência interpessoal.
Segundo Botelho (2004, p. 21), "quanto maior a sua habilidade humana em utilizar métodos em grupo, tanto maiores serão a produtividade e as satisfações encontradas no emprego pelo subordinado".
Um dos princípios básicos para se trabalhar em grupo indica que os indivíduos que não podem identificar-se com os interesses de qualquer grupo de trabalho encontraram-se isolados e muitos, por fim, deixarão a organização e irão procurar outros lugares.
Nesse ponto, é de suma importância o papel do gestor, adverte Moscovici (1999), pois este deverá propiciar condições ao grupo de dar aos seus membros apoio pessoal e uma sensação de valor pessoal.
A empresa familiar precisa definir com objetividade, o seu papel, como os parentes estão contribuindo para o sucesso do empreendimento, o que implica num programa sistemático de avaliação dos diretores e gerentes. A empresa familiar precisa também identificar as suas forças e fraquezas, para construir sobre as primeiras e neutralizar as últimas.
Lodi (1999) faz referência ao trabalho de Donneley, o qual baseou suas reflexões num estudo de 15 empresas familiares bem sucedidas. Sua tese é que a presença de membros da família numa empresa familiar não é pior por si só um indício de má administração.
Donneley (apud LODI, 1999, p. 7) apresenta algumas fraquezas evidentes em empresas familiares quando comparada com as subsidiárias de multinacionais e com as estatais, ressalta que:
? Conflitos de interesse entre família e empresa, que se refletem na descapitalização, na falta de disciplina, na utilização ineficiente dos administradores não-familiares e no excesso de personalização dos problemas administrativos.
? Uso indevido dos recursos da empresa por membros da família, transformando a companhia num erário dos familiares. O famoso complexo da "galinha dos ovos de ouro".
? Falta de sistemas de planejamento financeiro e de apuração de custos e de outros procedimentos de contabilidade e de orçamento, que tornam o lucro um resultado totalmente fortuito e não planejado.
? Resistência à modernização do marketing, ficando a comercialização sujeita a alguns vendedores antigos e "de confiança" ou há falta de uma boa política de produtos e de mercados.
? Emprego e promoção de parentes por favoritismo e não por competência anteriormente comprovada.
Portanto toda estratégia deve ser antes de tudo ofensiva, isto é, conforme Martins et al. (1999), deve se basear nas forças da organização. Por isso, o elenco de fraquezas exposto acima não deve preceder o exame dos pontos fortes da empresa familiar. O autor aponta que, em inúmeros seminários foram consultados dirigentes de empresas sobre que tópicos poderiam ser considerados como forças das empresas familiares e obteve invariavelmente as seguintes respostas:
A lealdade dos empregados é mais acentuada na empresa familiar, após algum tempo, pois os colaboradores se identificam com as pessoas concretas que aí estão o tempo todo, e não com dirigentes eleitos por mandatos de assembléias, ou por imposição de poderes públicos.
O nome da família pode ter grande reputação no estado, na região ou no país inteiro, funcionando como uma cobertura econômica e política.
A continuidade da administração. A sucessão de familiares competentes na direção do negócio dá origem a um grande respeito pela firma.
A união entre acionistas e os dirigentes, fazendo com que os acionistas sustentem a empresa mesmo quando há perdas, e também facilitando a comunicação entre diretoria executiva, o conselho de administração e a assembléia dos acionistas.
O sistema de decisão mais rápido, pois, termina ali, no escritório central, três ou no máximo quatro níveis acima do nível de execução.
As gerações familiares em sucessão permitindo um traço de união entre o passado e o futuro, entre os valores do fundador e as vocações e visões pessoais dos dirigentes atuais.
Novamente Lodi (1999, p. 5), referenciando Donelley, argumenta que a empresa familiar é aquela que se identifica com uma família há pelo menos duas gerações e quando resulta numa influência recíproca. Portanto, a empresa de fundador sem herdeiros não é uma empresa familiar, por mais que sofra as injunções de uma personalidade. Uma empresa onde a família põe o dinheiro apenas como investidor, também não é uma empresa familiar.
A empresa familiar é aquela em que a consideração da sucessão da diretoria está ligada ao fator hereditário e onde os valores institucionais da firma identificam-se com um sobrenome ou com a figura de um fundador.
Para Bornholdt (2005), o conceito da empresa familiar nasce geralmente com a segunda geração de dirigentes, ou porque o fundador pretende abrir caminho para eles entre os seus antigos colaboradores, ou porque os futuros sucessores precisam criar uma ideologia que justifique a sua ascensão ao poder.
Srour (2002, p. 174), define a cultura nas organizações familiares como
um conjunto de padrões que permitem as adaptações dos agentes sociais à natureza e à sociedade a qual pertencem, e faculta o controle sobre o meio ambiente. Dirige-se a toda atividade humana cognitiva, afetiva, motora, sensorial, uma vez que todo comportamento humano é simbólico.
A cultura é aprendida, transmitida e partilhada. Não decorre de uma herança biológica ou genética, porém resulta de uma aprendizagem socialmente condicionada. É disso que se trata quando falamos de socialização ou de endoculturação: os agentes sociais adquirem os códigos coletivos e os internalizam, tornam-se produtos do meio sociocultural em que crescem, conformam-se aos padrões culturais e, com isso, submetem-se a um processo de integração ou de adaptação social. De modo insensível, tudo aquilo que lhes foi inculcado é reconhecido como natural e normal. A partir daí, quaisquer outras maneiras de ser lhes parecem estranhas e até inaceitáveis. Eis por que indivíduos provenientes de diferentes sociedades, ou oriundos de diferentes meios sociais, são facilmente identificáveis pelas suas formas peculiares de agir, sentir e pensar (MARTINS et al., 1999).
Toda coletividade tende a considerar o próprio modo de vida como o mais sensato e o mais correto. Isso leva ao etnocentrismo, à leitura ensimesmada que se faz do mundo, à ótica exclusiva de uma cultura, à qualificação de todas as demais coletividades como bárbaras ? inferiores, atrasadas e inumanas. Ora, a diversidade dos costumes ensina o relativismo cultural e exige humildade intelectual. Por exemplo, inúmeros são os padrões culturais que horrorizam os brasileiros de hoje e, de forma simétrica, o que os brasileiros fazem espanta muitos outros povos (BORNHOLDT, 2005).
Nas organizações, a cultura impregna todas as práticas e constitui um conjunto preciso de representações mentais, um complexo muito definido de saberes. Forma um sistema corrente de significações e funciona como um cimento que procura unir todos os membros em torno dos mesmos objetivos e dos mesmos modos de agir. Sem referências próprias, as organizações ficariam à mercê das convicções individuais de seus membros diante de situações novas e certamente sofreriam prejuízos dados à disparidade de procedimentos e orientações.
A cultura organizacional exprime então a identidade da organização. É construída ao longo do tempo e serve de chave para distinguir diferentes coletividades. Aliás, as culturas organizacionais gritam de tão diversas que são quando ocorrem fusões, aquisições ou incorporações de empresas, sob o fogo cruzado da multiplicidade das maneiras de ser. Reagem também, quando, sob o aguilhão da concorrência, irrompe a necessidade inadiável de inovar a tecnologia, de alterar a forma de agir, de adotar nova postura moral, de mudar o processo produtivo. Nesta hora, um choque cultural acontece, e seu refluxo desorienta os agentes, podendo paralisar o dia-a-dia das atividades. Explodem então agudas resistências, feito fraturas expostas, pondo a nu os padrões culturais que os anos cristalizaram (SROUR, 2002).
Segundo Muller e Carlin (2002, p. 17), em entrevista para a Revista FAE Business
Só conseguimos entender a empresa familiar, se distinguirmos cultura familiar ? que compreende valores, comportamentos, gostos e hábitos ? de acomodação, que faz com que determinadas empresas não estejam preparadas para fazer frente às exigências da atualidade, que as obrigam aterem uma organização mais racional, um comando hierárquico definido, liderança, flexibilidade, racionalização dos custos e redefinição dos custos e redefinição do perfil societário, entre outras exigências. As empresas sejam elas familiares ou não, requerem administração profissional para atender a essas demandas e não permitir a acomodação organizadora.
A cultura e o propósito das empresas não podem ser desvinculadas da profissionalização e dos aspectos técnicos inerentes à gestão organizacional. A cultura empresarial necessariamente deve compreender missão, crença e valores com interesses na atividade, motivados pela razão, ocasionando com isto a determinação do propósito das empresas. Qualquer organização que queira diferenciar-se e manter-se no mercado deve ter suas metas definidas. Tais metas podem ser, a manutenção ou o aumento de patrimônio, a lucratividade, produtos de alta qualidade, participação no mercado, tecnologia, ou o destaque na sociedade. Muitas vezes, no entanto, a empresa familiar tem em seu gestor a figura do chefe de família, e não se preocupa com a profissionalização ou com as necessidades de manutenção da atividade empresarial. As empresas, no entanto, sofrerão sérias consequências de continuidade caso seu empreendedor não vincule o profissionalismo à cultura organizacional (BORNHOLDT, 2005).
O peso das variáveis emotivas da família influencia nas decisões da organização. Lodi (1999, p. 14) avalia que: "Os conflitos de interesse entre família e empresa, que se refletem na descapitalização, na falta de disciplina, na utilização ineficiente dos administradores", evidenciam assim fraquezas da empresa familiar às demais empresas no mercado.
Um dos elementos essenciais que compõem o processo produtivo, também na empresa familiar, é o pagamento de salários.
A remuneração do trabalho é abordada por Chiavenato (2002, p. 27). Segundo o autor a atividade organizacional em geral e a atividade empresarial são vistas como recursos transformados em resultados, através de um processo de combinação de capital, tecnologia, matérias-primas, mão-de-obra e outros, a fim de obter um determinado resultado. Estes recursos têm seu custo e seu benefício, ou seja, é necessário um investimento para se obter um determinado retorno.
O salário é o centro das relações de troca entre as pessoas e as organizações, despendendo tempo e esforço e recebendo por estes o valor equivalente em dinheiro, com responsabilidades recíprocas entre empregado e empregador. Segundo Paschoal, (1998, p. 5) "para uma grande parte dos trabalhadores, o salário significa a própria subsistência e para muitas organizações a folha de pagamento representa o item mais importante de seus custos".
Ainda segundo Paschoal (1998, p. 4) a forma tradicional das organizações ordenarem e agruparem as tarefas atribuídas às pessoas que a compõem em um conjunto mais ou menos formal constitui um fato organizacional ao qual se convencionou chamar de "cargo".
Portanto, o salário se origina basicamente do valor do cargo e, dentro dele, as eventuais variações tem origem, de um lado, nas qualificações e, de outro na performance dos seus ocupantes, de acordo com a política salarial da organização.
As exigências de competências e as responsabilidades atribuídas aos cargos de diretores e gerentes são proporcionais ao tamanho da organização, medido principalmente pelo seu faturamento anual.
Isso é difícil de ser percebido pelos dirigentes de empresas familiares em rápido crescimento. Na realidade, o que deu certo no início da empresa, não necessariamente funcionará quando a empresa atingir um estágio mais avançado de desenvolvimento e volume de negócios.
No caso das empresas familiares, os próprios donos são seus diretores e gerentes, enquanto a empresa é pequena. Geralmente, são pessoas corajosas, determinadas e trabalhadoras que conseguem fazer o empreendimento crescer e, às vezes, atingir um faturamento anual na casa dos bilhões de reais, num tempo relativamente curto.
O primeiro sinal de alerta ocorre quando os donos não percebem que suas competências como gestores, em relação ao tamanho da empresa, já não são suficientes para manter o crescimento saudável do empreendimento. Se na família dos proprietários não há ninguém com a competência para os cargos estratégicos, é melhor trazer reforços de fora.
Com relação ao planejamento e organização, Lutkus (2007, p. 28), diz que "muitos empresários familiares evitam discutir certos assuntos com sua família, receosos de que possam gerar algum conflito ou desconforto". Essa atitude, normalmente, adia e piora eventuais problemas. Emprego e remuneração, escolha de sucessores, dividendos e reinvestimento e uso de bens da família são alguns dos assuntos importantes, mas, em muitos casos, evitados, por esta razão, segundo o autor, a vantagem de um membro externo traz maior isenção para as discussões e decisões sobre assuntos relacionados à família, como escolha de sucessores, promoção de parentes, distribuição de lucros, entre outros. A preocupação do processo sucessório passa a ser fator determinante para o progresso da organização.
Argumenta Weil (1999, p. 39), "sem uma visão de longo prazo, e muitas vezes sem ao menos ter tido tempo físico de aprender as complexas e implacáveis leis dos negócios, os familiares acabam adotando estratégias que comprometem o futuro da empresa".
Por sua vez, Lodi (1999, p. 7), afirma que: "O fundador cria uma empresa a partir de um sonho pessoal e chega ao fim da sua vida com dificuldade de partilhar os seus valores com a segunda geração".
Os sonhos da segunda geração precisa ser produto de trabalho de todas as pessoas envolvidas. Para isso, é preciso que quem assuma o comando da família encarne os traços e os valores que a segunda geração descobre da primeira.
A segunda geração vai apresentar ao longo dos anos e, principalmente, no seu processo de crescimento, uma série de questões pertinentes à cultura e valores da geração anterior, que poderão influenciá-la mais do que as complexas atividades de gestão. Segundo o mesmo autor, vale lembrar que uma das peculiaridades da sociedade familiar no Brasil é que a grande maioria dos fundadores é imigrante ou filhos de imigrantes, o que influencia diretamente na busca da solidificação e duração do negócio familiar.
Com relação às estratégias, para o progresso da organização, Gersick et al., (1997), percebe que, descobrem-se interesses comuns que unem os sistemas, tais como a busca por resultados e crescimento, anseio comum do sistema familiar e empresarial, o desejo de equilíbrio financeiro e poder e o interesse no retorno de investimentos, comum ao sistema empresarial.
Uma empresa familiar, de porte médio, com mais de 40 anos que deu certo é o Frigorífico Cardeal, com uma equipe invejável. A união profissional dos filhos, continuadores do trabalho de Lauro Matavelli, seu fundador, imigrante italiano, prosseguiu harmonicamente com colaboradores administrativos, gerenciais e trabalhadores da produção. O Frigorífico mantém firme o objetivo de assegurar o nível de qualidade dos seus produtos. "Com isso", afirma Roberto Matavelli, atual líder da empresa, "pretendemos ampliar nossa participação no mercado, mantendo sua imagem de empresa séria voltada para a qualidade e a tradição, mas, contudo, integrada com as tendências do mercado" (MATAVELLI, 1997, p. 43).
CONCLUSÃO
Percebe-se que não há grande diferença entre empresa não-familiar de empresas familiares, no que diz respeito ao trabalho funcional, pesquisa, marketing ou contabilidade, por exemplo. Mas no aspecto da administração, a empresa familiar requer regras próprias que precisam ser observadas. Instituir e conduzir um negócio de forma competitiva e estratégica no atual mercado corporativo não é uma tarefa muito fácil. Desafios e dificuldades são comuns a qualquer companhia, seja ela administrada por parentes ou não. No entanto, as empresas familiares apresentam maior complexidade na gestão organizacional. Uma das razões para esse fato são os conflitos vivenciados por essas corporações que podem acontecer, por exemplo, devido à cultura familiar, ou seja, às relações emocionais entre os membros da família no ambiente de trabalho podem impactar o relacionamento profissional dos mesmos. Outro motivo preocupante é a falta de conhecimento nessas organizações, uma vez que a ausência de capacitação profissional dos integrantes pode interferir e prejudicar a condução dos negócios, podendo levar à destruição de uma instituição.
E, para gerenciar as mudanças de cargos e salários em empresas familiares, é necessário considerar alguns conceitos imprescindíveis, tais como a cultura da empresa familiar e seus impactos na gestão, compreendendo valores, comportamentos, gostos e hábitos. A cultura organizacional baseia-se no fundador, a estrutura é extremamente enxuta, a visão do proprietário tem como ponto forte a confiança e a lealdade dos seus colaboradores.
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