OS CRIMES CONTRA A ORDEM ECONÔMICA E A NECESSIDADE DE...

Por renara de mello | 04/12/2016 | Direito

OS CRIMES CONTRA A ORDEM ECONÔMICA E A NECESSIDADE DE PROTEÇÃO A UM NOVO BEM JURÍDICO NO DIREITO PENAL BRASILEIRO[1]

Renara C. B. de Mello[2]

Natália Cardoso Xavier

Maria do Socorro Carvalho[3]

RESUMO

O tema abordado tratará sobre a importância do Direito Penal Econômico para a sociedade e as implicações de condutas que firam a ordem econômica, bem jurídico tutelado pelo Direito Penal e resguardado por lei. Será de grande significância discutir acerca do papel exercido pela lei n° 8.176 de 1991, visto que essa corresponde a uma inovação no âmbito jurídico brasileiro, pois passou a tutelar um bem jurídico antes não visto aos olhos do Direito Penal brasileiro, o que significa  que houveram mudanças significativas na sociedade e portanto necessidade de adequação do Direito a uma nova realidade. Irá mostrar também as incidências dos crimes contra a ordem econômica na coletividade e sua implicação nas relações interpessoais, expondo a repercussão dos crimes dessa natureza. Será discutido aqui os crimes contra a ordem econômica dando enfoque ao homem no exercício de sua atividade econômica, que como dito antes passou a existir previsão penal de situações antes inimagináveis.

INTRODUÇÃO      

Previstos a partir de 1991 pela Lei n°.  8.176, os crimes contra a ordem econômica configuram-se ˗ assim como a maioria dos crimes que recaem sobre a coletividade e seu desenvolvimento econômico ˗ como uma ameaça a base da sociedade, seu sustento e alicerce, daí o motivo para essa categoria de crimes possuir tamanha relevância no âmbito Penal.

Após ocorrências que violavam a ordem econômica, o Direito Penal brasileiro passou a prever e punir determinadas condutas, exercendo a função principal desse ramo do Direito: prevenir a reincidência de condutas que firam ao bem jurídico protegido pelos delitos que insurgem-se contra a ordem econômica de um determinado lugar, que como veremos posteriormente as consequências são trágicas.

Foi exatamente a partir do reconhecimento dessa necessidade explicitada anteriormente de se tutelar condutas que ferissem ou contribuíssem para o mal funcionamento ou degradação da ordem econômica que aprovou-se a lei n°. 8.176 no ano de 1991. Sua validade passou a prever como criminosas condutas que anteriormente não possuíam relevância para o Direito Penal e insurgiu uma nova figura agora analisada como bem jurídico protegido: o homem na vida econômica.

Diversos autores que tratam de Direito Penal Econômico preconizam diversas condutas que foram adotas pelo legislador como delitos contra a ordem econômica. Além da lei nº. 8.176/91, pode-se encontrar diversas jurisprudências no sentido de combater os crimes elencados nessa categoria, como por exemplo o cartel, muito combatido pelo Direito Penal.

Os crimes contra a ordem econômica não possuem previsão antiga, o que determinou com que fossem inseridos no ordenamento jurídico brasileiro relativamente recentemente, com a promulgação da lei de 1991 já explicitada anteriormente. Por ser um assunto recente mas de grande repercussão, principalmente por causar sérios danos ao desempenho econômico social (vez que não atinge o homem em sua individualidade) o Direito Penal entendeu ser necessário punir essas condutas. 

1 NOÇÕES PRELIMINARES ACERCA DO DIREITO PENAL ECONÔMICO E DOS CRIMES CONTRA A ORDEM ECONÔMICA

Antes de atingir o foco desse trabalho, analisando a lei que tutela os crimes contra a ordem econômica e explicando sua contribuição para o Direito Penal e sociedade, relevante se torna tecer algumas considerações aos crimes contra o sistema financeiro nacional, fazendo-se uma análise da problemática sobre as condutas dispostas nesse tipo penal e a criminalidade que lhe é inerente.

Tecendo comentários acerca da criminalidade econômica, que o Direito Penal Econômico preocupa-se em combater, o autor Luís Regis Prado contribui para o embasamento teórico da presente pesquisa ao entender que por motivo da extensão dos danos tanto materiais como morais que a criminalidade econômica provoca, bem como sua capacidade de adaptar-se aos diversos contextos políticos e sociais ela configura-se como uma grave ameaça a organização de qualquer sociedade. Principalmente pela dimensão dos efeitos desses crimes é que o governo e demais aparelhos estatais preocupam-se em combater e intervir nessas condutas buscando mecanismos eficazes de defesa.

A partir da exposição acima, correto se torna afirmar que com o avanço da sociedade e consequente processo de modernização, se tornou muito importante a tipificação de condutas que tragam graves consequências a ordem econômica societária, visto que a proteção da ordem econômica é  imprescindível na sociedade moderna. Pode-se sentir a maior e eficaz proteção quando as normas jurídicas de maior hierarquia estabelecem princípios que possuem relação com a atividade econômica. Desta forma, a professora Iara Sandes atesta a necessidade dessa mudança no Direito Penal:

Atualmente, o direito penal está passando por um período de transformação, decorrente não só da evolução da sociedade, mas,         também, dessa nova dimensão nos vários âmbitos surgidos da criminalidade, que advém da própria evolução da sociedade. A criminalidade se tornou mais moderna, mais sofisticada, mais organizada, equipada, técnica, ou seja, “mais inteligente” [...] Surge aí uma criminalidade        com um novo foco de atenção, qual seja, a criminalidade econômica (SANDES,Iara,2012).

A Constituição Federal de 1988, lei maior e legitimadora de princípios, estabelece mandamentos para a legislação ordinária sobre matéria econômica. O artigo 173 da Carta Constitucional ocupa-se em direcionar a atividade econômica, estabelecendo que sua exploração direta se dará através da iniciativa privada, bem como expressamente delimita que a lei tolherá o abuso do poder econômico que objetive à dominação dos mercados, à eliminação da concorrência e ao aumento arbitrário dos lucros, conforme o parágrafo 4°, responsabilizando tanto os dirigentes da pessoa jurídica quanto esta, por condutas que lesem a ordem econômica e comprometam seu normal desenvolvimento.

Discutindo acerca da criminalização do ilícito econômico, a  professora Cinthia Menescal constitui suas contribuições:

"É certo que, no fenômeno da delinquência econômica, lidam-se com interesses jurídicos supraindividuais, ou difusos, entre os quais encontramos a ordem econômica, com a substituição da vítima individual pela coletiva, ou, ainda, pela sociedade, pelo mercado, imprescindíveis para o funcionamento do próprio sistema, o que dá a dimensão de sua importância e gravidade, justificando a atenção do Estado, da sociedade e, em última instância, do legislador." (MENESCAL, Cinthia. 2013)

Segundo o autor Luiz Regis Prado, o Direito Penal Econômico visa a proteção da atividade econômica presente e desenvolvida na economia de livre mercado e o bem jurídico tutelado em um dos crimes que violam a ordem econômica (Crime de Cartel) é a livre concorrência e a livre iniciativa, como fundamento básico da ordem econômica, cuja criminalização encontra previsão constitucional no artigo 170 (incisos III, IV e V) e 173, parágrafo 4°, da CF. (PRADO, Luiz Regis. 2004)

Exemplificando os crimes contra a ordem econômica, tem-se o Crime de Formação de Cartel. Luiz Regis Prado define o empresário ou quem exerce atividade econômica ou empresarial como sujeito ativo desse delito, sendo o sujeito passivo os empresários que estão na concorrência e que tiveram seu direito a livre concorrência restringido ou violado, sendo impedidos de competir no mercado com as mesmas condições, atingindo assim os consumidores pela redução de oferta e variedade de produtos e preços. (PRADO, Luiz Regis. 2004)

Em contrapartida ao entendimento do conceituado autor Luiz Regis Prado, outra parte da doutrina nacional e a doutrina estrangeira, entendem que são protegidos dois bens jurídicos fundamentais: o patrimônio individual e a ordem econômica.  Os delitos contra o sistema financeiro são um capítulo do Direito Penal Econômico, definido como parte do Direito Penal que se reservará a realizar a indispensável proteção dos bens jurídicos protegidos por esses crimes, qual sejam o patrimônio individual e a ordem econômica.

Após exemplificar os crimes contra a ordem econômica, visto que não se configura como um crime de grande popularidade, é de fundamental importância ressaltar que qualquer dano contra a ordem econômica representa um grande dano para a sociedade, dano esse geralmente irreparável, em que seus efeitos nem podem ser medidos de tão graves e prejudiciais que são.

Após essas constatações, pode-se afirmar que é preciso cada vez mais instrumentos que afastem condutas que possam resultar o dano, com natureza inerente a todo o Direito Penal: a prevenção. O legislador precisa estar atento para as diversas mudanças e manifestações da sociedade para um contínuo aprimoramento e atualização do Direito Penal brasileiro, contribuindo, portanto, para a redução de condutas criminosas que provoquem danos inexoráveis e abrangentes. 

2  A LEI N° 8.176/91 COMO INOVAÇÃO DO ORDENAMENTO JURÍDICO: UM NOVO BEM JURÍDICO A SER TUTELADO

No Brasil, à época do Direito Penal Clássico, os bens jurídicos protegidos por este, resumiam-se somente à tutela dos interesses mais relevantes ao homem, ou seja, a tutela dos bens jurídicos individuais, como por exemplo, vida, liberdade, igualde, etc. Deste modo, o Direito Penal Econômico ainda não era visado nesta época, vez que não havia espaço para seu desenvolvimento, quando a função do Estado era tão somente a proteção ao bem jurídico individual, não sendo possível a intervenção estatal na vida econômica e, consequentemente, limitava os bens jurídicos supra-individuais, e comprometia a tutela jurídico-penal dos ilícitos praticados por empresas. 

Com a evolução da sociedade, fez-se necessário a inserção de crimes que tutelem bem jurídicos antes não muito apreciados pelo Direito Penal, como é o caso do homem na vida econômica, mas, desta vez, de caráter coletivo, ou seja, a ordem econômica, cuja, não se restringia mais somente a uma concepção patrimonial individual, cedendo assim, espaço a uma concepção econômica supra-individual.

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