Ops! gafes de narradores e locutores
Por Laércio Becker | 19/01/2011 | SociedadePor Laércio Becker, de Curitiba-PR
A profissão de narradores de futebol é ingrata. Além de ter que narrar o jogo (haja cordas vocais) e transmitir emoção, não existe um script. Por ser tudo no improviso, é claro que a possibilidade de cometer erros é enorme. Os locutores de estádio também estão sujeitos às derrapagens, já que é tudo ao vivo. Ossos do ofício. Meus sinceros respeitos e homenagens aos narradores e locutores abaixo citados, os minutos dessas gafes não desmerecem em nada as décadas de informação e emoção que eles já nos proporcionaram.
URSS x Portugal
São Januário, sábado, Vasco x Americano. Lá pelas tantas, o locutor do estádio anuncia, em voz cava: “Em Lisboa, no Estádio da Luz, União Soviética 2 x Portugal 0”.
Um burburinho correu pelas sociais, tomadas de portugueses e descendentes. O conselheiro Pacheco interpelou o presidente Antônio Soares Calçada:
- Oh, Calçada, como é que podemos perder hoje um jogo a se realizar amanhã?
Essa frase, por si só, já é uma pérola da lógica e a história podia até terminar por aqui. Mas não. O presidente foi averiguar e, pouco depois, o locutor do estádio anuncia:
- Atenção. O jogo que acabamos de noticiar será realizado amanhã. E está 0 a 0.
Fonte:
MOREYRA, Sandro. Histórias de Sandro Moreyra. Rio de Janeiro: JB, 1985. p. 47.
Madureira x Flamengo
Década de 70, rádio Jovem Pan. Enquanto José Silvério narrava uma partida, Milton Neves estava no plantão, auxiliado por um estagiário, que informa a marcação de gol do Madureira contra o Flamengo, 1x0. Depois vieram novos gols: 2x0, 3x0. Quando chegou no 4x0, Silvério pede que Milton confirme a zebra. Quando descobre que o estagiário estava acompanhando a preliminar, pelo campeonato de aspirantes, Milton Neves anuncia simplesmente o seguinte:
- Todos os gols de Madureira 4x0 Flamengo foram anulados. Ainda está 0x0.
Fonte:
BINDI, Luiz Fernando Bindi. Futebol é uma caixinha de surpresas. São Paulo: Panda, 2007. p. 85.
Mandaguari x Londrina
Década de 50. A Rádio Paiquerê, de Londrina, pretende transmitir a final da zona norte, entre Mandaguari e Londrina. Sem condições técnicas de fazer a transmissão diretamente de Mandaguari, a emissora colocou Willy Gosner para narrar o jogo a partir da transmissão da Rádio Guairacá, de Mandaguari.
0x0 no placar, o Londrina precisava da vitória quando, aos 43 do segundo tempo, conseguiu a marcação de um pênalti a seu favor. Só que, na hora de bater, Lei de Murphy: a Guairacá sai do ar. Às cegas, Willy resolveu narrar: “gol!! Londrina campeão!”
Foi a maior festa entre os torcedores. Só que o jogador errou o pênalti. E Willy teve de fugir da cidade.
Fonte:
CARNEIRO NETO, Antonio Carlos. Efabulativos do futebol. Curitiba: Coração Brasil, 2003. p. 184-5.
Orson Welles
Durante a excursão do São Paulo pela Europa, em 01.04.1949, o locutor Geraldo José de Almeida narrou uma partida em que o tricolor, com direito a Leônidas da Silva, foi impiedosamente derrotado por 7x0. No dia seguinte, a Rádio Record admitiu que foi uma brincadeira de primeiro de abril. Talvez inspirada na famosa transmissão radiofônica de A guerra dos mundos (de H.G. Wells), por Orson Welles, em 1938.
Fonte:
POLI, Gustavo; CARMONA, Lédio. Almanaque do futebol Sportv. Rio de Janeiro: Casa da Palavra, 2009. p. 284.
Brasil x Iugoslávia
Num amistoso noturno entre Brasil e Iugoslávia. Segundo Sandro Moreyra, entra o goleiro gaúcho Alberto – segundo Carneiro Neto, o goleiro Jairo, do Coritiba. Então, um locutor bastante bairrista resolveu chamar a atenção para as qualidades do arqueiro:
- A esse, se derem chance vai longe. Boa envergadura, boa elasticidade, excelente nas bolas altas...
Brincou com a Lei de Murphy: foi justamente aí que veio uma bola alta chutada pelo ponta-esquerda e o goleiro, “excelente nas bolas altas”, engole um frango lamentável. Com a língua queimada e certamente constrangido, o narrador tenta responsabilizar os refletores e pergunta no ar: “foi o refletor?” E o comentarista, que não era bairrista, responde na lata:
- Não, foi o ponta-esquerda.
Fontes:
CARNEIRO NETO, op. cit., p. 209.
MOREYRA, op. cit., p. 56-7.
O inconfundível quem?
Na RTP, no início de um jogo do Sporting de Lisboa, o narrador português Gabriel Alves fez a seguinte descrição: “aí vem Paneira, com seu estilo inconfundível”. Maldade ou não, em seguida a câmera dá um zoom no jogador e o narrador, constrangido, corrige: “... mas não, é Veloso!”.
Pelo visto, o estilo de Paneira não era tão inconfundível assim.
Fonte:
BINDI, op. cit., p. 85.
Interatividade
Essa pérola foi de um narrador português: “... e o árbitro foi agora atingido por um objeto estranho, provavelmente atirado por um telespectador”. Haja interatividade!
Fonte:
EMEDÊ. Loucuras do futebol. 3ª imp. São Paulo: Panda, 2005. p. 74.
Doval
Durante uma partida, na década de 70, para consternação dos torcedores presentes, o locutor do Maracanã anunciou a morte do argentino Doval, ídolo de tricolores e rubro-negros. O pequeno detalhe é que ele estava no estádio – e vivo, é claro. Então, o locutor corrigiu-se, com a seguinte pérola:
- O jogador Doval, que havia morrido, não morreu e está assistindo ao jogo.
Fonte:
BINDI, op. cit., p. 83.
Internacional x Atlético Paranaense
Beira Rio, 1970, pela Taça de Prata, final 4x1 para o colorado. Rosildo Portela, da Rádio Guairacá, recebe diretores atleticanos na cabine e, de costas para o jogo, anuncia aos ouvintes a visita ilustre. Foi quando Paulo Branco, que respondia pelo plantão da rádio, avisa:
- Atenção, Portela; gol.
- Gol onde, meu caro Paulo Branco
- Aí em Porto Alegre, Dorval para o Atlético.
Como estava distraído com os visitantes e não havia torcida rubro-negra no estádio para se ouvir a comemoração, Rosildo nem percebeu o gol. Mas não perdeu a pose e narrou atrasado mesmo.
Fonte:
EMEDÊ, op. cit., p. 58.
Seleto x União Bandeirante
Quando o radialista que fazia o plantão esportivo pediu demissão, a Rádio Clube Paranaense contratou um locutor novato de bela voz, mas que não entendia de futebol.
Sua estréia ocorreu numa rodada em que a rádio transmitiria um Atletiba enquanto, em Paranaguá, jogariam o Seleto contra o União Bandeirante. Havia uma grande expectativa, criada pelo próprio narrador do jogo, que anunciava a todo momento a iminente entrada do novo plantonista.
Foi quando se ouviu o vozeirão chamando: “Airton!” E o narrador, enchendo a bola do novato:
- É a estréia do novo plantão da Rádio Clube, Carlos Marassi, a revelação que veio de longe, munido desta voz potente que irá muito mais longe ainda pelas ondas da Rádio Clube. Informe, Marassi!
Deve ter sido a emoção:
- Em Seleto: Paranaguá 1, União 0.
Fonte:
BUCHMANN, Ernani. O ponta perna de pau. Curitiba: ed. do autor, 2005. p. 25-6.
Bulgária x Suécia
Copa do Mundo de 1974, Galvão Bueno narrava partidas a partir de um monitor (“off-tube”). Informado de que narraria Bulgária x Suécia, anunciou as escalações e informou aos telespectadores que o time de branco era a Bulgária e o de amarelo, a Suécia. Já depois de algum tempo de bola rolando, a TV alemã dá um close no placar: Alemanha Oriental 0x0 Austrália, com as mesmas cores. Haja coincidência... Depois de um silêncio constrangedor, Galvão continuou a narração com os nomes todos devidamente corrigidos, como se nada tivesse acontecido.
Fontes:
DUARTE, Marcelo (org.). Enciclopédia do futebol brasileiro. São Paulo: Areté, 2001. v. 2, p. 505.
EMEDÊ, op. cit., p. 72.