ONDE FALTA ÁGUA: NA ESCOLA, NO LIVRO OU NO SEMIÁRIDO NORDESTINO?
Por Marcondes Cunha Bezerra | 28/11/2014 | EducaçãoONDE FALTA ÁGUA: NA ESCOLA, NO LIVRO OU NO SEMIÁRIDO NORDESTINO?
Marcondes Cunha Bezerra
RESUMO
O presente trabalho objetiva identificar o processo de contextualização do ensino, tendo como tema central a Água. As agressões contra a natureza têm gerado mudanças climáticas que afetam não apenas aqueles que vivem no campo, como também quem vive nas cidades. Diante deste cenário surgem novas expectativas voltadas para a conscientização da sociedade e sem dúvida a escola é o melhor lugar para executá-la. Mas por muitos ambientes escolares manter-se ainda na esfera tradicional no desenvolvimento de suas práticas educativas, mostram-se resistentes a inclusão em suas propostas educacionais um maior comprometimento no tocante ao tema Água. Tal fato é percebido pelos conteúdos programáticos que são seguidos à risca pelos educadores e educadoras, os quais preferem conservar os programas expostos no livro didático adotado por eles sem qualquer contextualização. Contextualizar o ensino tem muito haver com proporcionar sentido àquilo que os educandos e educandas aprendem, fazendo com que relacionem o que está sendo ensinado com sua experiência cotidiana. O Semiárido Brasileiro é a região com maior dificuldade na formação educacional de crianças e jovens. Segundo o estudo, essa região concentra metade da população de analfabetos acima de 15 anos e apresenta altos percentuais de evasão escolar. Um dos fatores que leva os alunos a abandonarem os estudos é a falta de interesse na escola, cujo currículo não leva em consideração suas realidades. Ao contrário, muitas unidades de ensino contribuem para a construção da imagem do Semiárido como um lugar de atraso e de falta de oportunidades. A ideia não é rejeitar os conteúdos tradicionais, mas de reconsiderá-los ou requalificá-los. É fazer com que nas escolas do Semiárido Brasileiro não se aprenda só sobre metrô, semáforo, pêssego, morango, mas que também se aprenda sobre a caatinga, cisterna, cacimba, água, cabra, umbu, roça, etc. A pretensão é desenvolver uma educação direcionada para a convivência com o Semiárido num sentido mais amplo e, a partir daí, ter uma melhor convivência com o mundo e com sua complexidade. O conhecimento que a população dessa região tem sobre a água e muito pouco, ou seja, ela desconhece a origem e o sistema de atuação das chuvas; não sabe por que ocorrem as secas; não tem ideia de qual a quantidade de água necessária, por dia, mês e ano, à vida das pessoas e dos animais; não domina as diferentes formas de construir cisternas e/ou perfurar poços; e, finalmente, desconhece a importância da higiene da água. Portanto, a escola, como espaço de inclusão, tem representado cada vez mais uma relevante importância na formação de crianças, jovens e adultos, principalmente nos aspectos intelectual, profissional e político.
Palavras-Chave: Água, Escola, Educação Contextualizada, Semiárido.
ABSTRACT
This study aims to identify the process of contextualization of teaching and the water as the central theme. The aggressions against nature have generated climatic changes that affect not only those who live in the countryside, but also those who live in cities. In this scenario there are new expectations aimed at raising awareness of the society and the school is undoubtedly the best place to run it. But for many school environments still remain within the traditional sphere in the development of their educational practices, appear resistant to include in their proposals a higher educational commitment regarding the water issue. This fact is perceived by syllabuses which are adhered to by educators, who prefer to keep the programs outlined in the textbook adopted by them without any contextualization. Contextualizing teaching has much to do with providing direction to what the students learn and educands, causing relate what is being taught with their everyday experience. The Brazilian semiarid region is more difficult in educational training of children and youth. According to the study, this region has half the population of illiterates over 15 years and has high rates of truancy. One of the factors that lead students to abandon their studies is the lack of interest in school, whose curriculum does not take into consideration their realities. Unlike many teaching units contribute to the construction of Semiarid image as a place of backwardness and lack of opportunities. The idea is not to reject the contents of the traditional disciplines, but reconsider them or reclassify them. It is to make schools the Brazilian Semiarid not only learn about Metro, traffic, peach, strawberry, but also learn about the caatinga, cistern, water hole, water, goat, umbu, rubs, etc.. The intention is to develop a targeted education for coexistence with the semiarid region more broadly and, thereafter, have a better acquaintance with the world and with its complexity. The knowledge that the population of this region has on the water and very little, ie, it ignores the source and actuation system of the rains, do not know why droughts occur, has no idea how much water needed per day, month and year, the lives of people and animals, does not dominate the different ways to build tanks and / or drilling wells, and finally, know the importance of water hygiene. Therefore, the school as a space of inclusion, has played an increasingly important role in the formation of children, youth and adults, particularly in regard to intellectual, professional and political.
Keywords: Water, School, Education Contextualized, Semiarid.
INTRODUÇÃO
Pelo fato da água ser o recurso natural mais abundante que existe no planeta observa-se pouco destaque em relação aos 3% (três por cento) de disponibilidade que ela se encontra para o consumo humano, pois o restante sendo constituído de água salgada, geleiras e águas subterrâneas são de difícil captação e imprópria para o consumo humano e para a produção de alimentos (DECICINO, 1983). Observa-se que a água potável é escassa em diversas regiões do mundo transformando-se numa barreira para o desenvolvimento econômico e o progresso social. Contudo, no Semiárido Brasileiro, o problema é bem mais relacionado à gestão do uso, do que à ausência desse recurso. É preciso que a sociedade aprimore as formas de uso da água de maneira contextualizada, o que ampliará a oferta desse recurso e evitará a degradação ambiental.
As agressões contra a natureza têm gerado mudanças climáticas que afetam não apenas aqueles que vivem no campo, como também quem vive nas cidades, em todos os continentes. Segundo Sosa (2012, p. 12) a água transformou-se em uma mercadoria que os capitalistas utilizam para obter lucros. Este mesmo autor informa que a Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação – FAO acaba de anunciar que pela primeira vez na história da humanidade chega-se a um bilhão de pessoas que passam fome todos os dias, frutos de uma má utilização dos recursos naturais disponíveis ao homem.
O litro de água potável é ainda mais caro que o de gasolina. Isso nos diz que a vida em nosso planeta corre graves riscos, sobretudo para os seres humanos, caso não sejam tomadas medidas urgentes. Não se trata de paranoia, nem de loucura de ambientalistas. Todos os dias temos provas e comprovações das nefastas consequências deste modelo de consumo. (SOSA, 2012, p. 12)
Com o crescimento da população e consequentemente das atividades humanas ao longo do século XX, observa-se gravemente uma redução à oferta de água doce no mundo. Santos (2007) diz que a captação de água cresceu em ritmo muito maior do que o crescimento da população, com isso multiplica-se os riscos de escassez deste recurso. Segundo essa autora os especialistas consideravam que o crescimento da oferta de água era um problema técnico que poderia ser resolvido com a construção de barragens, reservatórios e etc. Porém no início do século XXI verifica-se que as soluções técnicas para aumentar a oferta do bem estão tornando-se inviáveis, devido a crescente dificuldade de exploração de novas reservas de água doce.
Diante destes fatos apresentados surgem novas expectativas voltadas, agora, para a conscientização da sociedade e sem dúvida a escola é o melhor lugar para executá-la. Mas por muitos ambientes escolares manter-se ainda na esfera tradicional no desenvolvimento de suas práticas educativas, mostram-se resistentes a inclusão em suas propostas educacionais um maior comprometimento no tocante ao tema Água, uma vez que tornam-se raros àqueles estabelecimentos educativos que realmente enfatizam o referido tema nas suas respectivas propostas.
Tal fato é percebido pelos conteúdos programáticos que são seguidos à risca pelos educadores e educadoras os quais preferem conservar os programas expostos no livro didático adotado por eles de forma acrítica sem reflexão e acima de tudo, sem contextualização. Livros estes extremamente inadequados às realidades desses educadores e educadoras que sequer procuram nortear-se, a ponto de não entenderem que o Brasil é um País rico em diversidades culturais, assim sendo cada região apresenta-se de forma diferente até mesmo no tocante a desenvoltura econômica social e educacional. Cada região ilustra diversificadas características de paisagens, relevos, solos, climas, população, costumes e até crenças, notadamente todas estas características irão influenciar diretamente nas vidas dessas pessoas espalhadas por esse território. Portanto torna-se imprescindível um novo paradigma escolar com características contextualizadas.
O eixo em que discutimos sobre a Educação Contextualizada procuramos nos subsidiar em autores como Rocha (2007), Sousa (2008), Nogueira (2012), Lima (2005) Araújo (2001), Morin (2002), Macêdo (2010), dentre outros.
A referida pesquisa foi aplicada na Escola Municipal de Ensino Fundamental “Maria Elói Leite”, localizada na área urbana da Cidade de Logradouro/PB, a qual faz parte do Semiárido Nordestino Brasileiro.
A pesquisa é de caráter exploratório, de natureza qualitativa, e como técnicas de coleta de informação foram realizadas entrevistas com 07 (sete) professores do 6º ao 9º ano, distribuídas nas disciplinas de Artes, Ciências, Geografia, História, Inglês, Matemática e Português. Trabalhou-se ainda com 06 (seis) educandos distribuídos entre o 6º, 7º, 8º e 9º ano do Ensino Fundamental. Estavam na faixa etária entre 13 e 19 anos, os quais foram entrevistados individualmente.
Günther, (2006) enfatiza algumas características da pesquisa qualitativa:
São características da pesquisa qualitativa sua grande flexibilidade e adaptabilidade. Ao invés de utilizar instrumentos e procedimentos padronizados, a pesquisa qualitativa considera cada problema objeto de uma pesquisa específica para a qual são necessários instrumentos e procedimentos específicos.
Nas entrevistas aplicadas aos professores, procurou-se verificar como a questão do tema “Água” é explorada em sua disciplina e de que forma. Já com os estudantes procurou-se identificar se o tema “Água”, uma vez trabalhado pelos professores, surtia alguma importância no seu processo de aprendizagem.
As entrevistas dirigidas aos professores, aos estudantes da escola foram compostas de uma conversa não estruturada (Lakatos e Marconi, 1992), orientado por um roteiro flexível, visando analisar qual tem sido o impacto dos processos educativos no uso da água. Desenvolveram-se um roteiro do tipo reflexivo, no qual o pesquisado não responde, tão somente, às informações procuradas, como também se depara com questões estimulativas, criando oportunidades de refletir acerca de suas condições de tempo, sentimento e movimento.
Para o desenvolvimento da pesquisa, foi realizado o levantamento bibliográfico, com o intuito de auxiliar na construção da fundamentação teórica sobre o tema Água, bem como seu impacto nos processos educativos. Noutro momento ocorreu à análise das entrevistas que foram feitas com os professores e educandos com o objetivo de obter informações relevantes acerca dos impactos educativos no tocante ao tema Água.
Consideramos que esta pesquisa trará contribuições relevantes para despertar principalmente nos(nas) educadores(ras) a importância que tem em tornar a aprendizagem dos(as) educandos(as) mais significativa, e até mais próximos de suas realidades.
Alguns Traços do Semiárido Brasileiro
O Semiárido brasileiro ocupa uma parcela considerável da Região Nordeste do Brasil, onde as diversidades ambientais, bem como os fenômenos naturais como a seca provocam sérias limitações no processo econômico e social das populações, principalmente daqueles que compõem o grupo dos pequenos agricultores, os quais desenvolvem a agricultura familiar.
Considerados um dos maiores do Planeta em extensão geográfica e em população, o Semiárido brasileiro (SAB) corresponde a quase 70% do Nordeste, abrangendo os sertões da Bahia, Sergipe, Alagoas, Pernambuco, Paraíba, Rio Grande do Norte, Ceará, Piauí, bem como o norte do Estado de Minas Gerais. Vivem nesta região 26.423.362 habitantes – 15,56% da população brasileira, com uma área territorial de 969.589,4 km². No total o Semiárido concentra 1.133 Municípios. (MINISTÉRIO DA INTEGRAÇÃO NACIONAL, 2005)
O Mapa 1, apresentado a seguir, mostra a localização geográfica da região do Semiárido Brasileiro, o qual se refere este trabalho.
Mapa 1: Mapa da Nova Delimitação Semiárido brasileiro
Fonte: Ministério da Integração Nacional (2005)
Segundo Silva (1998, p. 15) as regiões semiáridas são caracterizadas, de modo geral, pela aridez do clima, pela deficiência hídrica com imprevisibilidade das precipitações pluviométricas, e pela presença de solos pobres em matéria orgânica. O prolongado período de seca anual eleva a temperatura local, caracterizando a aridez sazonal. Conforme essa definição, o grau de aridez de uma região depende da quantidade de água advinda da chuva (precipitação) e da temperatura que influencia a perda de água por meio da evapotranspiração potencial.
Para Furtado (1998, p. 15) as problemáticas da estiagem que assola o Semiárido brasileiro são de causas naturais. O drama de famílias que moram nessas regiões é demasiado conhecido. Já para Galizoni (2004, p. 6) o problema da seca não é apenas um problema climático, mas social e político. São notórias as ações de políticas públicas ainda que paliativas voltadas para as condições básicas de sobrevivência e cidadania para a sustentabilidade de famílias que convivem com o fenômeno da seca.
São explícitas as desigualdades da região do Semiárido. É importante que desenvolva nessas áreas, ações políticas contundentes com a realidade local, preservando os valores culturais, aumento da renda das famílias e tecendo nelas um desenvolvimento de sustentabilidade (Souza, 2010, p. 8).
Educação Contextualizada Como Processo de Formação Sócio Cultural
Em meio aos enormes problemas socioeconômicos nessas áreas do Semiárido destacamos: a pobreza, elevada taxa de mortalidade infantil, analfabetismo, elevada concentração de renda e de terra pertencentes aos latifundiários, sem contar o difícil acesso aos serviços de saúde e saneamento básico. Assim sendo:
Como alternativa as problemáticas sofridas pelas famílias rurais, ainda vê-se o êxodo rural e o consequente inchaço das cidades (médias e grandes) – que não apresentam condições de suporte do fluxo migratório. O reflexo se dá em cadeia: desemprego falta de moradia, degradação ambiental, miséria, marginalidade, violência. Em resumo, a população não alcança o objetivo esperado – a busca de uma melhor condição de vida – e muitas vezes não encontra possibilidades de retorno ao campo. (ROCHA, 2007, p. 10).
O grande nível de pobreza que gera as catastróficas condições de vida do homem é que o expulsa do campo. O problema não é um fenômeno natural e sim de irresponsabilidade política. O Semiárido é uma economia pobre, porque os políticos fazem-na ser desta forma. São pobres os agricultores/trabalhadores (Sousa, 2006, p. 209).
Precisa-se investir mais na região que abrange o Semiárido Nordestino onde residem famílias, são homens, mulheres e crianças que não almejam riquezas e sim meios para viver dignamente. É importante que se crie técnicas sustentáveis permanentes, fazendo com que as famílias residentes nessas áreas semiáridas permaneçam em seu espaço geográfico, conscientizando-se de que podem utilizar-se dos recursos naturais e artificiais disponíveis, já se preocupando com suas futuras gerações para que, assim como eles, não precisem migrar para áreas urbanas.
Neste cenário é indispensável o papel da escola, o melhor lugar para instigar processos de conscientização, cidadania e autonomia pautados numa educação contextualizada das aprendizagens desses atores envolvidos diretamente neste processo de convivência nessa região semiárida. Sobre educação contextualizada Nogueira (2012) diz,
Educação contextualizada é aquela que tem um currículo que trabalha elementos do contexto em que as crianças e suas famílias vivem. Por exemplo, se numa comunidade as famílias não tem acesso à água, ou tem acesso a uma água contaminada, os professores vão buscar discutir em algumas disciplinas, esse contexto. Então a escola, ao invés de trabalhar os conteúdos de forma distante da realidade dos alunos, traz a realidade para dentro da sala de aula.
Nesta perspectiva Lima (2005) diz que a ideia não é rejeitar os conteúdos tradicionais das disciplinas, mas de reconsiderá-los ou requalificá-los. É fazer com que nas escolas do Semiárido brasileiro não se aprenda só sobre metrô, semáforo, pêssego, morango, mas que também se aprenda sobre a caatinga, cisterna, cacimba, água, cabra, umbu, roça, etc. A pretensão é desenvolver uma educação direcionada para a convivência com o Semiárido num sentido mais amplo e, a partir daí, ter uma melhor convivência com o mundo e com sua complexidade. Para este mesmo autor,
O conhecimento que a população dessa região tem sobre a água e muito pouco, ou seja, ela desconhece a origem e o sistema de atuação das chuvas; não sabe por que ocorrem as secas; não tem ideia de qual a quantidade de água necessária, por dia, mês e ano, à vida das pessoas e dos animais; não domina as diferentes formas de construir cisternas e/ou perfurar poços; e, finalmente, desconhece a importância da higiene da água. (LIMA, 2005)
Edgar Morin (2002) defende o conhecimento contextualizado, que fica mais próximo da realidade dos alunos, fazendo-os se adaptarem ao ensinamento de todas as disciplinas, e no caso da língua portuguesa, se houver integração com a história e a filosofia, a gramática que foi transmitida durante o ensino fundamental será melhor absorvida pelos alunos e com isso podemos formar pessoas críticas, conhecedoras do passado, que faz parte da nossa história.
Para Macêdo (2010)
A educação contextualizada nos remete aos processos de interação entre sujeito-sujeito, sujeito e contexto e contexto e escola, num movimento pedagógico triangular e constante. Nessa interação se dá a construção dos conhecimentos individuais - mas não solitário - dos conhecimentos coletivos, a transmissão da memória coletiva, dos valores e das tradições. O processo educativo se dá na família, na comunidade, na escola. A escola trabalha, então, com a diversidade de contextos, de subjetividades, com variados espaços pedagógicos, com conhecimentos e contextos múltiplos, multiculturais.
Ainda seguindo esta perspectiva de contextualização Araújo et al (2001, p. 24) reforça.
[...] os espaços voltados à educação devem atender as necessidades de novos conhecimentos, sem esquecer-se de valorizar os já existentes, levando em consideração a realidade dos envolvidos nesses processos, bem como, o contexto social no qual estes estão inseridos.
Neste contexto, portanto, a escola, como espaço de inclusão, tem representado cada vez mais uma relevante importância na formação de crianças, jovens e adultos, principalmente nos aspectos intelectual, profissional e político.
A escola deve refletir o meio na qual está inserida, levando em consideração as experiências do povo que está a sua volta, a sua cultura, suas tradições. Também deve explorar as possibilidades de extrapolar ou redimensionar os conhecimentos, buscando formar pessoas preocupadas com o desenvolvimento de suas comunidades. (REIS, 2004 apud ARAÚJO, 2001, p. 25)
Segundo Mattos (2004) apud Araújo, et al (2011, p. 25)
O conhecimento só tem sentido quando situado no contexto, ou seja, faz-se necessário situar informações e dados no contexto para que estes adquiram sentido. A ausência da contextualização torna o processo cognitivo insuficiente, pois as condutas se aprendem, e são aprendidas em um ambiente, e todos os ambientes tem capacidade de educar se soubermos percebê-los e nos relacionar com eles significativamente.
Assim sendo, a educação escolar contextualizada, além de representar um direito conquistado e assegurado para os inúmeros grupos de nossa sociedade inclusive de aspectos culturais, representa um dos instrumentos primordiais para o melhor desenvolvimento do país, diminuindo assim as desigualdades sociais, ainda, tão gritantes em nosso meio.
RESULTADOS E DISCUSSÕES
ANÁLISE DA ENTREVISTA DOS EDUCADORES(AS)
Em relação às perguntas direcionadas aos educadores(as), pode-se perceber que existe uma imensa diversidade de ideias, mas no geral, é dada uma aceitável relevância ao tema abordado. Contudo, existe uma forte dependência do livro didático, inexistindo a busca por associar os demais conteúdos às condições de semiaridez do município. No depoimento abaixo:
“Sim. Na medida em que vou seguindo os conteúdos do livro didático, quando chega a parte que aborda o tema Água, procuro trazer cartazes e até vídeos que mostrem o uso correto da água e sua importância para a vida.”
(Professora, Ensino Fundamental)
Observa-se que o educador(a) segue um roteiro de conteúdos, os conteúdos do livro didático e só aborda a questão da Água de forma sequencial, independente do conteúdo aparecer no início ou no final do livro. Assim sendo é eximida aos educandos(as) abordar o tema Água, de modo mais relevante, principalmente no período em que ocorra a falta ou escassez desse recurso, uma vez que no período de estiagem, típica dessa região, cresce a procura.
Em seguida perguntamos se este ano de 2014, a questão da água já tinha sido abordada em sala de aula:
“Pela sequência do livro didático, ainda não foi possível trabalhar esse conteúdo.”
(Educador(a) entrevistado(a)
Fica claro o estágio de dependência do educador(a) e a autoridade exercida simbolicamente pelo livro didático. A realidade vivida localmente é negligenciada no processo educativo, logo a educação escolar é desinteressante, é incapaz de despertar significados que valorizem o dia a dia, está descontextualizada. Quanto a isso Martins (2004, p. 34) avalia o seguinte:
[...] a educação escolar que se dirige aos vários pontos da imensidão do território brasileiro, é uma educação descontextualizada e, por sê-lo, é também colonizadora, ou seja, ela se dirige hegemonicamente de uma determinada realidade – atualmente majoritariamente esta realidade é a do sudeste urbano do Brasil.
A questão da educação escolar descontextualizada repercute tragicamente na vida de uma comunidade, em especial, pois ignora profundamente a diversidade cultural existente nas várias regiões do Estado Brasileiro. Diante deste fato, Martins e Lima (2001) se manifestam de forma contundente ao propor que seja desenvolvido um trabalho de descolonização da educação por meio da construção de uma educação contextualizada que favoreça um diálogo permanente entre o conhecimento científico e o saber popular, entre o que se aprende na escola e a possibilidade concreta do desenvolvimento humano sustentável. Os autores continuam:
Uma educação que busque contextualizar o ensino-aprendizagem com a cultura local, considerando as potencialidades e limitações do semiárido, num espaço de promoção do conhecimento, de produção de novos valores e a divulgação de tecnologias apropriadas à realidade semiárida, construindo uma ética de alteridade na relação entre natureza humana e não humana. (MARTINS e LIMA, 2001)
Verifica-se, ainda que a professora segue acirradamente os conteúdos programáticos expostos no livro didático, uma vez que a inflexibilidade quanto aos planos de curso é notável, pois sua elaboração se constitui de forma sequencial a partir do livro didático por ela adotado. Guimarães (2009) cita que:
Por mais bem fundamentado que seja o planejamento escolar, o professor precisa ter consciência de que alguns imprevistos podem surgir ao longo do ano letivo (e esses sinais não devem ser ignorados). É importante que haja uma avaliação constante do processo de ensino, com o educador sempre alerta para diagnosticar obstáculos encontrados e medir o ritmo de avanço das atividades sobre os temas programados.
É indispensável, portanto, que temas relevantes para a vida das pessoas do Semiárido, como Água e Condições Socioeconômicas, sejam também relevantes nas práticas escolares das escolas inseridas nesse ambiente. A contextualização do conhecimento é imprescindível ao aprimoramento intelectual das pessoas do Semiárido, pois propiciará uma melhor relação com o meio ambiente.
O conhecimento que a população da região do semiárido tem sobre a água é muito pouco, ou seja, ela desconhece a origem e o sistema de atuação das chuvas; não sabe por que ocorrem as secas; não tem ideia de qual a quantidade de água necessária, por dia, mês ou ano, à vida das pessoas e dos animais; não domina as diferentes formas de construir cisternas e/ou perfurar poços; e finalmente, desconhece a importância da higiene da água. (LIMA, 2004)
Quanto ao que Lima (2005) cita sobre essas populações não saberem o porquê ocorrem às secas, parte de um preconceito generalizado e incorreto sobre as populações desse ambiente. As mesmas são detentoras de conhecimentos centenários, construídos ao longo de séculos de convivência nessas condições edafoclimáticas. Tais conhecimentos, via de regra são negligenciados pelas políticas públicas e pela escola formal. A escola deveria ser também mediadora do diálogo de saberes. Promover câmbios entre o que está sistematizado pelo conhecimento convencional, como no texto abaixo, com o saber acumulado das pessoas do campo.
Considerado um dos fenômenos naturais determinantes da ocorrência de secas no semiárido brasileiro, o “El Niño” caracteriza-se pela elevação da temperatura das águas no Oceano Pacífico, influenciada por diversos fatores naturais, estando relacionado com anomalias climáticas persistentes em várias áreas do globo terrestre. No Brasil, a ocorrência do El Niños produz impactos no Sul/Sudeste, com as enchentes provocadas pela retenção de frentes frias na região, e no Norte/Nordeste com um déficit de precipitações pluviométricas ocasionando fortes secas. (CÁRITAS, 2002)
No tocante a quantidade de água necessária por pessoa, o qual Lima (2005) se refere, é importante informar o seguinte:
A água para consumo humano ou doméstico se utiliza na alimentação, o asseio pessoal e na limpeza da casa e dos utensílios ou roupas, na lavagem de automóveis e na irrigação de jardins. O consumo médio da água é mais ou menos de 120 litros diários por pessoa. Mas esta quantidade depende das condições de nossa casa, da instituição ou instalações onde trabalhamos e das atividades que se realizam nelas.
Estima-se que a distribuição do consumo médio diário de água, por pessoa, é aproximadamente a seguinte: 36% na descarga do banheiro; 31% em higiene corporal; 14% na lavagem de roupa; 8% na rega de jardins, lavagem de automóveis, limpeza de casa, atividades de diluição e outras; 7% na lavagem de utensílios de cozinha, e 4% para beber e alimentação. (PORTAL SÃO FRANCISCO, 2008)
Portanto torna-se prioridade o educador(a) ter consciência da importância do tema “Água” e passar a tratar com os educandos e educandas, mesmo que não esteja no conteúdo programático ou que ainda não seja o conteúdo de sequência. Neste caso é importante que a escola busque concretizar uma proposta de educação contextualizada, dando mais sentido ao ensino aprendizagem.
Neste sentido faz-se necessário construir novas concepções de currículo, procurando sintonizar o que se ensina na escola com a realidade vivenciada pelos educandos. Um currículo que atente os conhecimentos universais, mas que também levem esses educandos a conhecer sua região, suas precariedades de água, solo, fauna, flora, como também suas potencialidades econômicas e culturais. Ainda, um currículo que busque favorecer a construção coletiva de conhecimentos e saberes sobre o semiárido, local onde a escola está inserida em toda sua dimensão. Neste sentido Souza (2005) diz,
[...] o currículo contextualizado se fundamenta na ideia de que só é possível dar mais sentido ao processo ensino aprendizagem se este for construído considerando a historicidade dos sujeitos sociais, pautando-se, sobretudo, na complexidade de tais processos históricos.
“Nunca trabalhei o tema “Água”, só o citei numa turma de maneira informal. É que nos meses de Março, Abril e Maio ainda não tinha caído uma gota de chuva sequer aqui na região, assim aproveitei e comentei que a água está cada vez mais difícil de ser encontrada e se não chover logo pode haver racionamento.”
(Educador(a) entrevistado(a)
Observa-se mais uma vez que os conteúdos programáticos inclusos nos livros didáticos adotados pelos professores são seguidos rigorosamente. Se nos conteúdos planejados no início do ano letivo vierem a abordar tais temas, estes jamais poderão ser modificados ou desviados. Mesmo que estes conteúdos apresentem-se distantes da realidade dos educandos(as). Por mais que o livro didático seja uma ferramenta importante no processo educativo, os livros utilizados nas escolas dessa região, não despertam muito interesse nos educandos. Eles apresentam realidades muito distantes da realidade desses discentes, o que compromete diretamente no aprendizado e na construção do pensamento crítico. Neste sentido, uma das tentativas para melhorar esta realidade, possibilitando assim, um melhoramento nos processos metodológicos educativos, conforme já citado neste mesmo trabalho, está presente na Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB), nº 9.394/96 que prevê, em seu artigo 28, a adaptação dos conteúdos curriculares às peculiaridades da área rural e demais regiões, além da utilização de metodologias de ensino que procurem atender as verdadeiras necessidades dos educandos. Neste sentido atentemo-nos no que diz Araújo et al (2011, p. 24.)
Os espaços voltados à educação devem atender as necessidades de novos conhecimentos [...] levando em consideração a realidade dos envolvidos nesses processos, bem como, o contexto social no qual estes estão inseridos.
A adaptação do conteúdo curricular às peculiaridades da área rural e das demais regiões, além da utilização de metodologias de ensino que busquem atender as reais necessidades dos educandos, está presente na Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) nº 9.394, que desde 1996 prevê, em seu artigo 28, conforme mencionado anteriormente.
Esta proposta de ensino busca trabalhar os conteúdos em sala de aula tendo como foco os elementos sociais, culturais e ambientais característicos do meio no qual os educandos(as) estão inseridos. Assim sendo é indispensável o professor trabalhar o tema “Água”, uma vez que o foco ambiental faz parte dos elementos expostos na referida Lei, sem contar que em Logradouro, cidade a qual a escola pesquisada se encontra, faz parte da região do semiárido nordestino, que tem como traço principal as frequentes secas que tanto podem ser caracterizadas pela ausência, escassez, alta viabilidade espacial e temporal das chuvas, não sendo rara a sucessão de anos seguidos de seca. Esta região pertence ainda à área considerada como “O Polígono das Secas”.
O Polígono das Secas é um território reconhecido pela legislação como sujeito a períodos críticos de prolongadas estiagens. Recentemente as Áreas Susceptíveis à Desertificação–SAD, passaram a ser denominadas por força de convenções internacionais (Convenção de Nairobi), de Semiárido Brasileiro. Compreende os estados do Piauí, Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba, Pernambuco, Alagoas, Sergipe, Bahia e extremo norte de Minas Gerais e do Espírito Santo. O Polígono das Secas compreende uma divisão regional efetuada em termos político-administrativos dentro da zona semiárida, apresentando diferentes zonas geográficas com distintos índices de aridez, indo desde áreas com características estritamente de seca, com paisagem típica de semideserto a áreas com balanço hídrico positivo. (MIN/SUDENE)
“Não. Nessa disciplina nunca trabalhei o tema Água, até porque este tema não está inserido na grade de conteúdos de minha disciplina, nem a escola, neste ano, realizou qualquer projeto que envolveu esse tema.”
(Educador(a) entrevistado(a)
Percebe-se, mais uma vez, o fiel compromisso que o professor demonstra em seguir o livro didático, os quais todos os conteúdos programáticos são extraídos sem qualquer preocupação de desvio.
Neste quinto momento procuramos entrevistar outro professor de outra disciplina cuja pergunta foi-lhe dirigida igualmente aos demais já entrevistados.
A questão da água é explorada em sua disciplina? De que forma?
“Não, não é explorada. Este tema acredito que seja explorado nas disciplinas de Ciências e Geografia.”
(Professor, Ensino Fundamental)
Pode-se notar pelo relato do professor que o entendimento sobre a questão da “Água” na escola deve ser discutido, apenas, nas áreas de Geografia e Ciências, não tendo assim uma visão de interdisciplinaridade com as outras áreas.
Analisemos os Parâmetros Curriculares Nacionais, elaborados no ano de 1997, a fim de fornecer suporte metodológico aos professores que lecionam desde o ensino infantil ao fundamental, os quais procuram ser usados para a construção, elaboração, reelaboração ou adaptações curriculares pelas secretarias de educação do Brasil, as quais, individualmente, buscam construir seus currículos de acordo com os PCNs e suas realidades locais.
Os Parâmetros Curriculares Nacionais foram elaborados procurando, de um lado, respeitar diversidades regionais, culturais, políticas existentes no país e, de outro, considerar a necessidade de construir referências nacionais comuns ao processo educativo em todas as regiões brasileiras. Com isso, pretende-se criar condições, nas escolas, que permitam aos nossos jovens ter acesso ao conjunto de conhecimentos socialmente elaborados e reconhecidos como necessários ao exercício da cidadania. (PCN, 1998).
Assim sendo em linhas gerais os Parâmetros Curriculares Nacionais se apresentam com algumas características, dentre as quais destacamos abaixo:
- ampliar a visão de conteúdo para além dos conceitos, inserindo procedimentos, atitudes e valores como conhecimentos tão relevantes quanto os conceitos tradicionalmente abordados;
- evidenciar a necessidade de tratar de temas sociais urgentes — chamados Temas Transversais — no âmbito das diferentes áreas curriculares e no convívio escolar;
De acordo com todas essas importâncias oferecidas pelos PCNs, observa-se que tanto a Secretaria de Educação, a Escola, bem como o educador o qual relatou seu pensamento acima, no tocante a pergunta a qual foi dirigida ao mesmo, mostram-se omissos as questões educacionais propostas pelo MEC–Ministério da Educação e Cultura, uma vez que não estão sendo observadas os contextos dos educandos(as), suas necessidades educacionais e sociais. Em uma única questão abordada percebeu-se que simplesmente o tema “Água” o qual entendemos ser indispensável sua abordagem, devido à localização geográfica a qual se encontra a escola pesquisada, não está inserido nas aulas semanais ou bimestrais, até o momento desta pesquisa, nas várias disciplinas existentes na estrutura curricular da escola, uma vez que outros professores aqui mesmo neste trabalho claramente declararam a inexistência de projetos voltados para tal tema.
Meio ao distanciamento de educadores(as) quanto ao tema Água, nos chamou a atenção a seguinte resposta:
“Não, mas poderia ser trabalhada em todas as disciplinas, mas isto não ocorre.”
(Educador(a) entrevistado(a)
Através desta resposta observa-se que o professor entende que o tema “Água” deve ser abordado de maneira interdisciplinar, todavia a interdisciplinaridade, proposta a partir dos Parâmetros Curriculares Nacionais – PCNs, se fundamentam na crítica de uma concepção de conhecimento que toma a realidade como um conjunto de dados estáveis, questiona a segmentação entre os diferentes campos de conhecimento, produzida por uma abordagem que não leva em conta a inter-relação e a influência entre eles — questiona a visão compartimentada (disciplinar) da realidade sobre a qual a escola, tal como é conhecida, historicamente se constituiu. (PCNs, P. 29, 30). Assim sendo, essa natureza interdisciplinar é recomendável, uma vez que grandes estudiosos do assunto definem a questão do tema “Água” seguida de vários aspectos que podem ser explorados a partir deste tema gerador.
Foi justamente na exploração de diferentes linguagens que um educador(a) foi subversivo, buscando em recursos diferentes possibilidades de ampliar o diálogo em sala e permitir maior significado ao tema:
“Sim. A temática água é explorada em minha disciplina como tema transversal. Neste ano foi trabalhada a questão da “Água na Escola”, utilizando-se músicas e vídeos, além de imagens da própria natureza e de obras de artes que abordam a temática.”.
(Educador(a) entrevistado(a)
Verifica-se que existe um destaque no que se refere à educação ambiental, a qual o tema “Água” consolida-se pela sua transversalidade. Cavalheiro (2008), diz que:
A Educação Ambiental, como tema transversal, possibilita a opção por diferentes situações desejadas, balizadas por valores como responsabilidade, cooperação, solidariedade e respeito pela vida, integrando os conteúdos disciplinares e os temas transversais. Coloca-se dentro de uma concepção de construção interdisciplinar do conhecimento, visa à consolidação da cidadania a partir de conteúdos vinculados ao cotidiano e aos interesses da maioria da população.
Observa-se firmemente que a proposta dos novos Parâmetros Curriculares Nacionais – PCNs, juntamente com a nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação as quais dão suporte jurídico ao educador(a) de interdisciplinarmente explorar conteúdos ou assuntos que busquem estimular os educandos(as) no seu processo de aprendizagem significativa, e que não estão explícitos diretamente nos conteúdos didáticos, aparecem concretizados na proposta metodológica educativa do referido professor.
ANÁLISE DA ENTREVISTA DOS EDUCANDOS
Todos os educandos(as) traziam consigo a lembrança da temática Água a partir das disciplinas de Ciência e Geografia, mas foram os trabalhos desenvolvidos na disciplina de Artes que mais chamaram a atenção para problemática da escassez de água. Nos depoimentos abaixo é possível observar que mesmo com a relevância do tema ser trabalhado em sala, existe ainda um distanciamento do contexto local.
“Os professores nos ensinam que não devemos desperdiçar a água. Porque hoje tem, mas amanhã pode faltar. Depois desse dia eu passei a ter mais cuidado com a água. Em casa mesmo quando eu ia tomar banho passava todo o tempo com o chuveiro ligado. Agora eu desligo e só ligo no momento certo.”
“O professor de artes de geografia e de ciências. O de Artes fez um trabalho com agente. Assistimos a um vídeo com a música “Terra, Planeta Água”. Depois ele nos mostrou a importância de nós não desperdiçarmos a água.”
“O professor de Artes deu uma aula bem interessante nos mostrando à importância de nós não desperdiçarmos a água. Assistimos a um vídeo com a música “Terra, Planeta Água”, aprendemos cantar a música. Daí aprendi que devemos economizar água e que um dia ela pode acabar. Por isso devemos preservar e economizar o máximo. O professor de ciências também trabalhou a questão da água. Aprendi que a água é importante para diversas coisas do nosso dia-a-dia e sem a água não existiria vida na terra.”
Observa-se pelos relatos dos educandos que existiu um trabalho de conscientização no tocante ao tema “Água” e que, a partir dessa conscientização ele pôde agir com mais respeito e sensatez na utilização deste recurso. Contudo faz-se necessário que esses educadores explorem a questão da água com mais profundidade, buscando abordar o clima, bem como o relevo da região, a compreensão do fenômeno da seca, a qual segundo Furtado (1998, p. 15) esse fenômeno nessa região é demasiado conhecido e que,
[...] a pobreza dessa região não é, em consequência desse fenômeno natural e sim do subdesenvolvimento e da exploração da região pelas próprias elites nordestinas e por grupos diferentes de outras regiões do país [...] a pobreza resulta muito mais da forma de exploração da terra e das relações de produção, do que do impacto da seca; o problema é muito mais social que natural. (ANDRADE, apud FURTADO, 1998, p. 8).
Ainda, os educadores e educadoras devem explorar novas maneiras para lidar com essas realidades buscando meios de transformá-las. Neste sentido é importante desenvolver uma educação que possa direcionar o ensino-aprendizagem dos educandos para a convivência com sua região num sentido mais amplo e mais significativo e, a partir daí, obter uma melhor convivência com o mundo, e para fazer isso é importante contextualizar a aprendizagem, e para que isso ocorra Martins e Lima (2001) propõem o seguinte:
É importante que seja desenvolvido um trabalho de descolonização da educação por meio da construção de uma educação contextualizada que favoreça um diálogo permanente entre o conhecimento científico e o saber popular, entre o que se aprende na escola e a possibilidade concreta de desenvolvimento humano sustentável. Uma educação que busque contextualizar o ensino-aprendizagem com a cultura local, considerando as potencialidades e limitações de cada região, num espaço de promoção do conhecimento, de produção de novos valores e a divulgação de novas tecnologias apropriadas à realidade vivenciada [...]
Percebe-se segundo os relatos abaixo dos educandos e educandas do 7º, 8º e 9º ano que a questão da “Água” é tratada, em sua maioria, naquelas disciplinas que o tema já vem explicitado nos livros didáticos adotados pelos Educadores. Como exemplo nas disciplinas de Geografia e Ciências. Por outro lado observou-se que existe certo esforço por parte da disciplina de Artes, por exemplo, de buscar transversalmente trabalhar o tema.
“Sim. Depois da aula que tive de Artes passei a economizar água em casa e até orientar minha família para economizar também, porque água é vida, sem água não existia a vida.”
Depois da aula de Artes e também da aula de geografia vi que devemos economizar água porque ela é um recurso finito. E que existe pouca água boa para consumo no mundo. E nossa região sofre muito quando não chove como foi nesse ano. Eu que moro no sítio Beira Rio sei como é o sofrimento, nosso sofrimento e das pessoas no ano que não chove.
No entanto observou-se uma acomodação ou até uma deficiência dos professores e professoras nas disciplinas de Português, Matemática, Inglês e História em incluir interdisciplinarmente nos seus conteúdos a questão da água, uma vez que este tema merece destaque devido sua influência direta na vida dessas pessoas, as quais sofrem todos os anos com a falta desse recurso que nessa região é cada vez mais escasso. Porém é importante destacarmos que o tema Água não pode estar centrado apenas nos usos que fazemos dela, como simplesmente foi referida pela disciplina de artes, conforme o relato dos educandos. Bacci e Pataca (2008) diz que,
A água é um bem que pertence a um sistema maior, integrado, que é um ciclo dinâmico sujeito às interferências humanas. Compreender a origem da água, o ciclo hidrológico, a dinâmica fluvial e o fenômeno das cheias, os aquíferos, bem como os riscos geológicos associados aos processos naturais (assoreamento, enchentes) é essencial para que possamos entender a dinâmica da hidrosfera e suas relações com as demais esferas terrestres.
Neste sentido, acreditamos intensamente que a Água seja um tema de aproximação dos conhecimentos para outras aprendizagens, e que interdisciplinarmente as outras disciplinas possam usar como tema gerador, a fim de propiciar fortes subsídios pela busca da aprendizagem significativa aos educandos e educandas residentes nesta região semiárida. A Água neste contexto em que estes se encontram e, que além da mídia propagar desde os primórdios dessa região, que ela (á água) seja a causa de grandes problemas, sociais, econômicos e culturais, desse semiárido, acaba emblematicamente estereotipando todos esses sujeitos.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Os resultados obtidos neste trabalho permitiram observar que a escola estudada utiliza práticas que trazem em sua essência traços fortes de uma educação conservadora, a qual não estabelece discussão significativa sobre a realidade local concernente ao tema Água, que possa vir a ajudar os educandos e educandas, bem como a comunidade de modo geral a construírem uma visão crítica sobre o assunto. A Água não aparece enquanto assunto abordado de maneira interdisciplinar, não está contextualizada nos conteúdos para vida dos estudantes.
Esse distanciamento que existe entre a realidade dos(das) educandos(das) e o que é trabalhado pelos(las) educadores(ras) compromete profundamente os processos de aprendizagem. É preciso que haja mudança de atitude a começar pelos educadores e educadoras, mediadores da aprendizagem, os quais procurem trilhar caminhos objetivando a construção da aprendizagem significativa, contextualizada, para melhor intervir no processo de transformação da vida dessas pessoas.
Propõe-se, portanto, que seja incluída nas escolas localizadas no Semiárido Brasileiro uma proposta de ensino contextualizado, os quais busquem priorizar as potencialidades locais de cada região. Os(as) educandos(as) necessitam de um aprendizado que lhes traga à reflexão as suas realidades, a fim de proporcionar-lhes debates acerca do mundo os quais estão inseridos, e para isso deve-se partir do local para o global e não do global para o local como ocorre atualmente.
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