O Tratamento da Dependência Química e a Negativa de Cobertura Pelos Planos de Saúde

Por Bruno Lemos Guerra | 21/10/2010 | Direito

Cientificamente, não existem mais dúvidas de que o vício em drogas é uma doença. Os mais renomados especialistas concordam, afirmando que se trata de uma doença crônica do cérebro, e não um simples desvio de caráter ou fraqueza moral, como já se cogitou. Da mesma forma, a Organização Mundial de Saúde (OMS) classificou o vício em drogas como uma disfunção cerebral, como distúrbio neurológico, dando, portanto, caráter patológico a ele.

Fato é que a dependência química é uma doença social descrita pela OMS com números que assustam o mundo. No país, estima-se que 11% da população tenha envolvimento com álcool e outras drogas.

No entanto, antes da entrada em vigor da Lei dos Planos de Saúde (Lei 9.656/98), era comum a negativa de tratamento desta enfermidade sob a alegação de falta de cobertura contratual. Na verdade, poucos planos de saúde cobriam procedimentos psiquiátricos. Em função disso, os pacientes com transtornos mentais, inclusive os dependentes químicos (alcoólatras e viciados em drogas), não tinham acesso ao tratamento básico de saúde mental.

Contudo, após a vigência desta lei, passou a ser obrigatório o atendimento a portadores de transtornos mentais, inclusive nos casos de intoxicação ou abstinência provocadas por alcoolismo, drogas ou outras formas de dependência química. De acordo com a regulamentação da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), a internação, sem limite de tempo, é um direito de quem contrata um plano de saúde, desde que seja uma prescrição médica.

Era de se presumir que, a partir desta lei, os problemas relativos à falta ou negativa de cobertura destes transtornos iriam acabar. Mas, infelizmente, o que se percebe é que, apesar de serem legalmente obrigados a garantir e custear o tratamento adequado aos dependentes químicos, as operadoras de planos de saúde, em sua grande maioria, não disponibilizam aos seus segurados o atendimento especializado necessário para o correto e eficaz tratamento. Na maioria das vezes, o que fazem é indicar instituições psiquiátricas "generalistas", que, em grande parte das vezes, não possuem as condições, conhecimento e estrutura necessária para o correto tratamento desta doença.

Ao disponibilizar a internação e tratamento apenas em clínicas e hospitais psiquiátricos não especializados no cuidado e cura de dependências químicas, os planos de saúde não só dificultam ou impossibilitam a cura desta enfermidade, como, ainda, expõe o paciente ao risco de agravamento da doença através da piora de seu estado psicológico.

Diante deste quadro e percebendo que o tratamento disponibilizado pelos planos de saúde não é suficiente, eficaz, muitas famílias, pressionadas pela falta de conhecimento e urgência no atendimento do ente querido, acabam se desfazendo de grande parte ou todo o seu patrimônio para custear um tratamento em uma clínica especializada, que forneça os meios necessários para cuidar da pessoa e livrá-la deste terrível mal. Este tratamento é extremamente caro, chegando a R$ 10.000,00 por mês em alguns casos, o que leva, inclusive, muitos pacientes a abandonarem o tratamento antes de seu término por falta de condições financeiras.

O que a maior parcela da população desconhece é que essa "manobra" dos planos de saúde é, no nosso entendimento, ilegal, não devendo ser aceita. De acordo com a Lei, é dever do plano de saúde providenciar o adequado e eficiente tratamento à doença coberta, não apenas disponibilizar meios paliativos e ineficazes, pois a obrigação e de efetiva tentativa de cura. Independente do valor financeiro do tratamento, a obrigação das operadoras é com a saúde do paciente, devendo se responsabilizar pelo integral custeio das despesas desse em hospital ou clínica especializada no tratamento de dependentes químicos, de acordo com a prescrição médica, especialista que deve ter total gerência e decisão sobre o tratamento.

Se o plano de saúde oferece em sua rede de conveniados centros de tratamento especializados ou reconhecidamente eficazes na lida com esta enfermidade, devem autorizar e custear a internação do paciente ali pelo período que for necessário, de acordo com a prescrição médica. Já se não tiverem um centro credenciado nessas condições, o segurado pode exigir que autorizem a internação em outro centro indicado pela equipe médica responsável.

O importante, nesses casos, é o consumidor saber que tem o direito de exigir tratamento eficiente e eficaz para aquelas doenças que possuem cobertura em contrato, pois, afinal, trata-se de um contrato que visa a manutenção da saúde, não sendo suficientes ou aceitáveis medidas paliativas.