O trabalho psicológico na perspectiva grupal entre adolescentes em uma instituição evangélica

Por Janaina dos Santo de Brito | 24/11/2011 | Psicologia

O TRABALHO PSICOLÓGICO NA PERSPECTIVA GRUPAL ENTRE ADOLESCENTES EM UMA INSTITUIÇÃO EVANGÉLICA

 

Janaina dos Santos de BRITO²

Cibelle Marchi de Ângelo

Claudemir GOMES³

 

Faculdade da Fundação Educacional Araçatuba

 

RESUMO: A psicologia comunitária por meio de sua atuação e intervenção tem sido considerada feitora de grandes e importantes contribuições nas instituições sociais. Ela tem sido capaz de promover significativas mudanças pela atuação prática do profissional psi. A partir desta perspectiva, foi elaborado um projeto que tinha como objeto de atuação um grupo de adolescentes, todos filiados a uma instituição religiosa (igreja batista). Considerando que é possível a elaboração de situações de trabalho a partir dos valores contidos nas crenças e nos dogmas religiosos, os estagiários e o grupo de adolescentes, elegeram um temário de discussões que envolviam conceitos, juízos, noções e expressões práticas do cotidiano da vida dos jovens. Este temário serviu de pauta para várias reuniões com desdobramentos em vários conteúdos psicológicos refletidos pelo grupo. Com isso o objetivo do projeto que era fornecer aos jovens um espaço de discussão, reflexão e de escuta, proporcionando com isso oportunidades de aprender novas situações e de tirar dúvidas sobre outros temas, foi amplamente superado com novas dinâmicas e participações. Nesses encontros viu-se o desenvolvimento dos jovens, por meio do exercício de ações reflexivas, com considerável mudança na construção de novos valores culturais, desenvolvimento intelectual e perspectivas de vida.  

                                                                                        

Palavras-chave: Psicologia. Psicologia Comunitária. Adolescência. Comportamento Cristão

                                
1 INTRODUÇÃO

 

           A psicologia comunitária e de instituições sociais a qual se refere este projeto, trata-se de um espaço privilegiado de atuação do psicólogo, este profissional deve ir a campo para buscar o seu objeto de trabalho, ou seja, o seu cliente para, "tratar e intervir nos processos psicológicos que gravitam e afetam a estrutura da personalidade e - portanto - as relações entre os seres humanos". (Bleger, 1984, p.27).

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1   Título da pesquisa realizada no estágio específico profissionalizante em instituições sociais.

2 Nomes das alunas concluintes do curso de psicologia-2011, da Fundação Educacional Araçatuba. Endereço eletrônico:
       janak2_811@hotmail.com e cibelledeangelo@hotmail.com

3   Professor supervisor dos estágios profissionalizantes, orientador do artigo e docente do curso de psicologia da Fac-FEA

            Nesta atitude profissional abrem-se inúmeras oportunidades de sucesso na promoção de saúde da população, sem contar na profunda gratificação para o profissional atuante neste contexto (Bleger, 1984.).

                 A psicologia comunitária por meio de sua atuação e intervenção tem sido considerada feitora de grandes e importantes contribuições nas instituições sociais. Ela tem sido capaz de promover significativas mudanças pela atuação prática do profissional psi. A partir desta perspectiva, foi elaborado um projeto que tinha como objeto de atuação um grupo de adolescentes, todos filiados a uma instituição religiosa (igreja batista).

                 Considerando que é possível a elaboração de situações de trabalho a partir dos valores contidos nas crenças e nos dogmas religiosos, os estagiários e o grupo de adolescentes, elegeram um temário de discussões que envolviam conceitos, juízos, noções e expressões práticas do cotidiano da vida dos jovens. Este temário serviu de pauta para várias reuniões com desdobramentos em vários conteúdos psicológicos refletidos pelo grupo.

     O trabalho tinha o objetivo de proporcionar aos jovens um espaço onde pudessem aprender a tirar suas dúvidas de uma forma dinâmica, já que a adolescência é uma fase de descobrimentos e de busca de identidade, momento em que o jovem deseja expressar suas idéias e seus sentimentos, que por sua vez, estão em plena ascensão principalmente em decorrência das mudanças corporais que muitas vezes gera insegurança e indefinições.  Com isso o objetivo do projeto que era fornecer aos jovens um espaço de discussão, reflexão e de escuta, proporcionando com isso novas oportunidades de aprendizagem e de tirar dúvidas sobre outros temas, foi amplamente superado com novas dinâmicas e participações.

                 Nesses encontros viu-se o desenvolvimento dos jovens, por meio do exercício de ações reflexivas, com considerável mudança na construção de novos valores culturais, desenvolvimento intelectual e perspectivas de vida. 

A adolescência é um período inicial da vida, caracterizado principalmente pela intensidade das emoções. Seu inicio marca o surgimento das contestações e questionamentos. Os valores dos adultos já não são passivamente aceitos. Os jovens precisam desse momento para começar a se conhecer, a estabelecer seus próprios valores e ver o mundo sob uma nova ótica – a sua própria.

 

[...] Nesse processo de construção de identidade, o adolescente mergulha no questionamento de si mesmo enquanto pessoa com características singulares, confrontando-se com a família, o grupo, a cultura e a sociedade a que pertence, para descobrir-se universo único e, ao mesmo tempo, parte significante de um todo composto de história de outros indivíduos que o precedem. (SERRÃO, BALEIRO.1999, p.65).

 

Por isso, nesta fase do desenvolvimento dos jovens faz-se necessário um apoio de base reflexiva a essas novas responsabilidades e cobranças de postura que lhes são atribuídos, nesse sentido o trabalho de grupo é fundamental para que os adolescentes, apesar de suas singularidades, possam reconhecer e enxergar no outro, um pouco da sua beleza, sinceridade, fraqueza, dúvida e dificuldade, e assim possam encontrar meios facilitadores para que esse processo conflituoso que é a adolescência seja o menos desconfortável possível, gerando com isso melhores acessos à vida.

No desenvolvimeneto deste projeto foram desenvolvidos trabalhos de reflexões temáticas direcionados ao grupo de adolescentes envolvendo questões tais como: namôro, sexualidade e DST’s condizentes com as dúvidas gerais dessa faixa etária.

Tendo em vista outros assuntos como: conscientização em relação à importância do processo educacional com perspectivas de futuro, motivação, preparação para os desafios da juventude, a fé cristã e o conceito de mundo, os limites da relação social e grupal seja na família, na escola, na comunidade ou no trabalho.

 Com o objetivo de possibilitar a descoberta das possibilidades existentes em cada adolescente de modo que fossem elaboradas as habilidades, capacitando-os às novas maneiras compreensivas de pensar o futuro, fornecendo subsídios para o enfrentamento das novas situações e das responsabilidades que estão por vir, bem como, elaborar processos de conscientização sobre o uso e as conseqüências das drogas para que eles fossem capazes de prevenirem-se, o projeto dedicou cuidadosamente  o melhor planejamento das dinâmicas e das discussões, mediando as indicações temáticas oferecidas pelos jovens bem como dinamizando os encontros e os atendimentos pessoais para que eles pudessem sentir coragem para tomarem as atitudes necessárias de aceitarem a necessidade de crescerem como pessoas.

 

No Brasil a trajetória do saber-fazer da psicologia em relação à comunidade iniciou-se em meados dos anos 60 e sofreu transformações teóricas, epistemológicas e metodológicas importantes neste espaço de tempo relativamente curto, o que resultou na diversidade que hoje pode ser encontrada com respeito ao desenvolvimento dos trabalhos dos/as psicólogos/as nas comunidades  (NEVES; BERNARDES.1998, p.241).

 

 

 

 Este novo ramo da psicologia, cujo profissional atua na comunidade é caracterizado por desenvolver projetos que se direcionam a sujeitos sociais em condições ambientais específicas, atento às suas respectivas constituições psíquicas. Seus olhares estão abertos para a melhoria das relações entre os sujeitos e a natureza. É nesta configuração que está todo o esforço para a mobilização das comunidades numa continua procura de melhores formas de se viver, e mesmo que a Psicologia Comunitária tenha diferentes correntes psicológicas, ela tem este objetivo em comum. (FRANCO, 1988).

           

            Sobre esse assunto Guirado (2004, p.25) discute algumas idéias de Bleger:

 

 

Sua proposta é de fazer a Psicologia sair dos consultórios e dos limites terapêuticos para abarcar a realidade cotidiana; e se esse trajeto deve ser científico, a função social do psicólogo será sempre traçada como uma intervenção investigadora. Nela, levanta hipóteses e atinge conclusões parciais retomadas por novas hipóteses que, por sua vez, permitem a relatividade de outras afirmações, e assim se vai indefinidamente. O conhecimento descontinuo e inacabado é um desafio constante. (Psicologia Institucional, 2004, 133p.)

 

 

 

2  DESENVOLVIMENTO DO CONTEÚDO    

 

O presente projeto foi realizado nas dependências de uma instituição religiosa, que conta com uma abrangente abertura a desenvolver e receber projetos sociais. Foi fundada no dia 05 de Março de 1950, com aproximadamente 30 membros. Hoje sua membresia tem aproximadamente 280 pessoas de participação efetiva. Dentre esses membros existem 30 adolescentes,  que formam o grupo de trabalho deste projeto. 

A metodologia utilizada para o desenvolvimento do trabalho baseou-se teoricamente na abordagem Sócio Histórica, por trabalhar com uma visão crítica considerando os fatores culturais e sociais, no qual os adolescentes estão inseridos, determinantes da construção histórica e da produção da vida. Dessa forma não reduz e nem ao menos responsabiliza o individuo isoladamente pelas suas condutas a determinados contextos, já que durante seu desenvolvimento o sujeito se relaciona com outros em uma troca mútua de experiências.

 

 

A inserção da psicologia comunitária no campo da psicologia social, por um lado, afirma o pressuposto de que o ser humano é construído sócio-historicamente e, ao mesmo tempo, constrói as concepções a respeito de si mesmo, dos outros e do contexto social” (NEVES; BERNARDES, 1998, p.241).

 

A partir desta perspectiva teórica decidiu-se empregar diferentes recursos para a realização da intervenção, utilizando formas dinâmicas e criativas para que o ambiente de trabalho com o grupo fosse descontraído, onde todos pudessem participar sem receios e resistências.

 As dinâmicas foram realizadas em uma comunidade religiosa, com um grupo de adolescentes, e para isso a turma pretendeu-se utilizar a exibição de Filmes, pois a linguagem audiovisual, educa, estimula a criatividade e é um excelente dispositivo de construção de conhecimentos, para promover identificação e reflexão em rodas de discussão.

Foram trabalhados diferentes assuntos por meio da aplicação de Dinâmicas com o objetivo de dispor o aprendizado de forma participativa e integral, trabalhando sua socialização dentro do convívio grupal e também como um meio facilitador do processo de formação da identidade. Os círculos de debates, projeto para o futuro, e questões polêmicas que emergiram durante o trabalho foram situações que demandaram a atenção do projeto.

Foi realizado um encontro semanal, com duração de 3 horas, durante os meses de agosto, setembro, outubro e novembro.

No primeiro encontro foi desenvolvida uma atividade, na qual foi discutido o quanto e como cada um julga o outro através das aparências. Com o objetivo de desmistificar e desmascarar o primeiro impacto da aparência, geradora de preconceitos.

No segundo encontro foi realizada uma atividade sobre a importância das escolhas e as suas conseqüências. Nessa situação foram apresentados ao grupo seis casos que abordavam assuntos comuns do cotidiano, esses casos evidenciavam as causas e as conseqüências das escolhas. Na dinâmica proposta foram divididos os jovens presentes em dois grupos: de um lado a acusação e do outro lado o grupo da defesa. O objetivo dessa ação foi o de apontar o quanto o futuro é determinado pelas escolhas, salientando as responsabilidades.

Os assuntos abordados foram: gravidez na adolescência, carreira e profissão, família, honestidade, corrupção, compromisso social, D.S.T e estudos.

Em um dos encontros, foi apresentado um filme religioso, que  contava a  vida  de  uma adolescente.  O objetivo dessa apresentação era o de provocar processos de identificação.

Posteriormente, com base no filme apresentado, foi realizado um debate com o grupo de adolescentes que viu o filme, e os assuntos abordados nessa ocasião foram:

  • Tudo vale a pena por um sonho?
  • Para se atingir um objetivo é preciso: conhecer, analizar, estabelecer estratégias de ação, ter apoio, estar preparado para enfrentar dificuldade.
  • Como assumir as responsabilidades de nossos atos?
  • Qual a importância da família?
  • Assumir um erro e voltar atrás é o suficiente para apagar as feridas do passado?
  • Qual a atitude que os filhos esperam dos pais?
  • O que os pais esperam dos filhos?
  • Temos que corresponder sempre ao que esperam de nós?
  • Discriminação sofrida pela orientação religiosa.
  • Cobrança de comportamento, ter sempre que ser o exemplo, por causa da religião.
  • Valores morais.

 

Discussões foram promovidas, com o objetivo de se rever a importância de quebrar limites como uma forma de conquistar algo novo, ou fazer novas descobertas que pudessem contribuir para um fim coletivo ou individual. Tais  como: avanços tecnológicos e científicos, superação da condição atual, quebra de limites e responsabilidade, reflexão sobre o quanto é importante ter maturidade para se quebrar paradigmas e propor algo novo.

De forma lúdica discutiu-se a importância dos limites nas relações de direito e de deveres, bem como a importância das regras que garantem a manutenção do principio da convivência e das práticas sociais. Para isso, utilizou-se um jogo chamado “bandeirinha”, onde a atuação do juiz é fundamental para garantir que o jogo ocorra de forma justa, além de demonstrar ludicamente a invasão do outro no seu espaço e o que se deve fazer para garantir esse espaço sem a devida violência.

Foi desenvolvida uma atividade que proporcionasse aos adolescentes a reflexão sobre o passado de cada um, os planos para o futuro, com o objetivo de promovê-los ao enfrentamento de seus próprios limites, lidando com  a administração de suas expectativas e frustrações, refletindo sobre a repercussão de suas ações, escolhas, atitudes vividas ou sonhadas  e as  conseqüências futuras.  

Neste encontro foi utilizado uma dinâmica onde os jovens se colocavam em uma posição confortável e ao som de uma música calma eram convidados a projetarem-se em uma história contada. Neste sentido os adolescentes foram capazes de identificar seus medos e expectativas para o futuro, compreendendo quais eram os seus limites e se estavam preparados para enfrentar as adversidades ao longo da vida. Finalizando foi dada como proposta a construção da linha da vida, onde eles ilustravam os momentos marcantes de suas vidas até a presente data, bem como suas expectativas futuras, apontando inclusive, o que poderiam encontrar de indesejável.

Ao ouvir os relatos pode-se observar a fantasia relacionada ao desejo idealizado, quais são as barreiras, o que faziam para avançar e ultrapassar  os obstáculos.

Para finalizar o projeto foi sugerida uma dinâmica que firmasse o compromisso e o vínculo grupal.

Na devolutiva aos adolescentes que participaram do projeto,  foi esclarecidos os objetivos propostos e os resultados alcançados. Apontou-se a importância da discussão dos temas com os adolescentes e o papel do psicólogo na comunidade e instituições sociais .

 

3   CONSIDERAÇÕES FINAIS

 

O projeto realizado cumpriu os objetivos propostos e dessa forma foi capaz de proporcionar transformações nas relações dos adolescentes participantes de uma comunidade evangélica. A importância do processo educacional evidenciado no  trabalho com as perspectivas de futuro, de motivação, de preparação para os desafios da juventude e da fase adulta, bem como os limites a serem respeitados dentro de cada relação social e grupal, por si só revelam a contribuição que a psicologia comunitária pode realizar convivendo com tantos jovens. A motivação que os coordenadores dos grupos tiveram na implantação da proposta evidenciou o quanto foi possível estimular descobertas de potencialidades existentes em cada adolescente, de modo que com, isso fossem evidenciadas as habilidades, o novo saber fazer, sugerindo assim novas maneiras compreensivas possíveis de se pensar o futuro, para o enfrentamento das novas situações e responsabilidades que estão por vir.

 

 

REFERÊNCIAS UTILIZADAS

 

 

 

BLEGER, J. Psico-Higiene e Psicologia Institucional. Porto Alegre: Artes Médicas, 1984.

 

__________. Temas de Psicologia .(4ª ed.) São Paulo: Martins Fontes, 1989.

 

FRANCO, V. A Natureza das Técnicas de Intervenção em Comunidades. Psicologia e Sociedade. São Paulo: ABRAPSO, 1988.

 

GUIRADO, Marlene. Psicologia Institucional. 2° edição. São Paulo: EPU, 2004.

 

NEVES, Sissi; BERNARDES, Nara. Psicologia social e comunidade. In: STREY, Marlene. (Org). Psicologia social contemporânea. Petropolis: Vozes, 1998. 241-255p.

 

SERRÃO, Margarida; BALEEIRO, Maria. Aprendendo a ser e a conviver. São Paulo: FDT, 1999.