O Terço Da Carol
Por jose roberto cabral | 27/08/2008 | CrônicasO TERÇO DA CAROL
Divã do zé
O TERÇO DA CAROL
Admito
que comprei uma certa revista masculina desse mês com o único
intuito de ver a atriz global Carol Castro pelada. Acho a Carol linda
e super-sexy, mas o que me fez mesmo comprar a revista foi a
polêmica criada pela Igreja Católica, que se
manifestou a respeito de uma foto em que a atriz aparece com um
terço nas mãos. Querem tirar a revista das bancas.
Ainda bem que já comprei a minha. Um representante da Igreja
disse: "Isso é um desrespeito, um erotismo
vulgar." Faltou "Queimem a herege!" Bem,
eu não achei vulgar nem me senti desrespeitado. Aliás,
eu nem havia percebido o tal do terço. Ninguém
percebeu. Mas graças ao padre espião, agora todo mundo
sabe. Caso essa polêmica toda não tivesse sido
suscitada, a singela (e bonita) foto teria passado batida.
Outro
aspecto que me chamou a atenção: trata-se de uma
revista masculina, para maiores, e de apelo erótico de
conhecimento até das criancinhas, que sabem que não
devem espiar a revista de mulher pelada do papai. Tanto que a revista
é vendida lacrada. Portanto, somente devem olhar as pessoas
interessadas no "tema". E cá entre nós,
supõe-se que nesse público não estão os
padres, que em princípio não deveriam estar
interessados em peitos, xanas ou bundas - com terços ou sem.
Diante da polêmica, resolvi consultar meus leitores para formar
uma opinião.
Uma jornalista amiga minha, católica,
me disse que na opinião dela houve sim um desrespeito, apesar
de atenuado por se tratar de uma expressão artística
(realmente, a Carol é uma obra de arte! ) pois certas coisas
têm significados especiais para certos grupos de pessoas. Por
exemplo: o terço e a cruz para os católicos; o som do
OM ou AUM com o número 3 para o hinduísmo; o
manto laranja para o budismo; a imagem do Castiçal do
Templo (o Menorá) para o judaísmo, e por aí
vai. OK. Só vejo um pequeno problema: com a
multiplicidade de religiões, crenças e seitas que
proliferam por aí, como saber o que é sagrado para
quem? E se a pobre Carol tivesse tirado uma foto pelada
ordenhando uma vaca, por exemplo? Para quem não sabe, a
vaca é sagrada para os hindus. Toda a edição da
revista (com a pobre Carolzinha junto, provavelmente) teria ido parar
no fundo do nojento porém sagrado Rio Ganges. Mas de qualquer
forma é de bom tom respeitar os amuletos, os talismãs
e os objetos sagrados das pessoas. Faz sentido.
Já para um
amigo meu, ministro evangélico, essa polêmica tem apenas
natureza humana, e portanto religiosa - o que é muito
diferente do projeto espiritual fundado na Bíblia, essa sim a
palavra de Deus para os que crêem. Uma das manifestações
mais recorrentes da ira de Deus no Velho Testamento diz respeito
exatamente à idolatria, ou seja, a construção de
imagens, o uso de amuletos etc. Deus deve ser adorado em espírito
e verdade, numa abstração de tudo aquilo que pertença
ao campo material. Figuras, instrumentos e símbolos não
teriam caráter santo ou espiritual, mas apenas idolátrico.
Nessa perspectiva, o terço usado pela Carol não seria
nada mais que um adorno,e pronto. Sem maiores traumas. Faz sentido
também.
Mas... se é assim, então por que a
Igreja Católica (talvez na falta de coisas mais importantes
para fazer) se manifestou? Meu amigo evangélico me explicou
também. Em primeiro lugar, a doutrina católica
pressupõe santidade em imagens e instrumentos. Isto decorre da
institucionalização do cristianismo pelo Estado Romano
como religião oficial. A transição do paganismo
politeísta para o cristianismo monoteísta seria mais
suave pela preservação de algumas características
próprias do politeísmo, como a idolatria. Em segundo
lugar, exatamente por sua "origem estatal" a Igreja de Roma
habituou-se a dar pitaco na vida de todo mundo, inclusive aos não
pertencentes ao seu rebanho. Isto é culturalmente reforçado
pela figura do Papa, que é visto não só
como chefe da congregação católica apenas, mas
como representante do Senhor Jesus na Terra. As autoridades
eclesiásticas agem como porta-vozes de Cristo, numa particular
interpretação do que ele gostaria de dizer. Ora,
a Bíblia sustenta e registra à exaustão que
quando Deus quer falar, não precisa de porta-vozes, e nem liga
a mínima para imagens ou amuletos, portanto nada disso teria a
menor importância porque o terço não passaria de
um objeto de idolatria.
Bem, depois de tudo esclarecido, ainda me
ficou uma dúvida dogmática, que aqui deixo para
enriquecer esse vital, importantíssimo e
fundamental debate, que pode mudar os destinos da humanidade:
qual exatamente é o problema em uma mulher usar o terço
só porque não está totalmente vestida? E se a
Carol é daquelas que só andam de calcinha em casa (fico
arrepiado só de pensar...) dorme nua e gosta de rezar com um
terço antes de dormir? Como faz? Se veste, reza e depois tira
a roupa de novo para deitar? Desde quando Deus se ofende
ao ver a Carol como Ele a fez? Quem se incomoda com a nudez é
o homem branco - pervertido e pecador como é.
Os índios, por exemplo, não se incomodam. Muito menos
Deus.
Procurada pela imprensa, Carol deixou claro que não
pretendeu ofender ninguém ao posar para a foto, contou o
objetivo do ensaio (baseado em Dona Flor, de Jorge Amado) e pediu
desculpas se ofendeu alguém. Não precisava tanta
explicação, Carolzinha... Para mim e para qualquer
pessoa de bom-senso, você não deve desculpa nenhuma.
Não ficamos nem um pouco ofendidos. Aliás, pelo
contrário: talvez você tenha ajudado a arrebanhar muitos
novos adeptos para a Igreja católica, que anda perdendo fiéis
em escala exponencial. Parabéns pelo lindo ensaio e... a
propósito: que tal ir rezar um terço lá em casa?
Fonte : Tribuna do Brasil Data : 22 de agosto de 2008