O Tempo Ruge

Por Osorio de Vasconcellos | 09/03/2009 | Crônicas

Escritos de Osorio de Vasconcellos

Série 2009

Seqüência Luca Matéria

O tempo ruge

Com os 84% de popularidade do presidente Lula, 16%precisam acautelar-se contra a Síndrome de Estocolmo, aquela mesma que leva a vítima de um sequestro a identificar-se com o sequestrador, e a defendê-lo.

Esta é uma observação que Luca Matéria faz, enquanto rememora uma lição de Hegel.

O caso é que LM percebeu na supremacia avassaladora de Lula um parentesco próximo do quadro psicológico dos seqüestros e situações assemelhadas.

Tamanho é o domínio dos 84, que o pelotão dos 16 deixa de ser uma simples minoria, estimada quantitativamente, e passa à situação de "terrível malefício", para usar as palavras do próprio Hegel, que Mestre Luca rememora.

A propósito, disse Hegel: "quando a diferença numérica numa votação é avassaladora, converte-se automaticamente em diferença qualitativa. A idéia derrotada não é uma questão de mais ou menos, mas seria considerada um terrível malefício para a nação que vota."

Percebe-se facilmente o fardo gigantesco que pesa sobre os ombros dos 16. De um lado, a ameaça psicológica da vassalagem, de outro, o alarido das massas, que rechaça como "terrível malefício" a dissidência.

Sob tais pressões, adverte Mestre Luca, ninguém dos 16 pode considerar-se imune aos ataques da Síndrome de Estocolmo.

Por isso, recomenda extremo cuidado quando advier a tentação de elogiar a facção dominante, ou mesmo o medo de manifestar uma crítica justa.

O pelotão dos 16 precisa resistir a isso tudo, e entender que se defronta não com um artefato ideológico, mas com um clamor, uma espécie de petição fisiológica elementar.

O pelotão dos 16 deve, portanto, confiar em Hegel.

Se o fardo de ser um "terrível malefício" estiver pesando além da conta, Hegel oferece o consolo de sua dialética : sempre que a vida entra em conflito consigo mesma, encaminha-se necessariamente a um novo estágio que transcende o conflito.

Neste ponto, eu mesmo faço uma ponderação: tudo bem, ninguém contesta a genialidade de Hegel, nem o determinismo renovador de sua dialética, mas isso leva tempo, e o tempo, sem trocadilhos, o tempo ruge.

Em estonteante arrancada, a popularidade de Lula chegou a 84%. Nesse pique, se a Síndrome de Estocolmo se alastrar, em pouco tempo o poder emanará por aclamação.

Isso significa retrocesso, na medida em que a ovação sempre desemboca em autoritarismo, com todos os seus onerosos desdobramentos. O filme rodaria outra vez. E ninguém merece.

Portanto, olho na próxima pesquisa. Um ponto percentual, um mísero pontinho a favor do "terrível malefício" - digamos 83 a 17 – poderá deter a escalada de Lula a caminho da unanimidade insana, e poupar o Brasil a um vexame histórico sem precedentes.

Caucaia (CE), 28 de fevereiro de 2009.