O SINTOMA INFALÍVEL DA SALVAÇÃO
Por João Valente | 19/08/2009 | ReligiãoO SINTOMA INFALÍVEL DA SALVAÇÃO
(O lugar privilegiado dos obedientes a tudo no Reino de Deus)
A salvação da alma é o tema mais antigo e mais debatido das religiões, sobretudo das monoteístas (Judaísmo, Islamismo e Cristianismo) e que crêem na Queda do Homem como um fato irretorquível na História da Humanidade. Este artigo explorará um outro tema que as três aceitam em uníssono, e que é "dogma de fé" plenamente aceito por seus respectivos seguidores. Refiro-me à questão da existência de algum sinal de salvação externamente visível no fiel praticante dessas religiões, sobretudo do Cristianismo, que é o ramo majoritário no Ocidente.
Uma pergunta súbita se apresenta de saída: "Alguém pode alcançar a salvação nesta vida?"... Sim, pode; mas isto é também uma questão de fé nesta possibilidade, pois os outros ramos tomam por base a crença de que "nesta vida ninguém nunca alcança a salvação, e portanto esta nunca se completará num ser humano, exceto no Além, e a razão é porque ninguém a merece". Dentro do próprio Cristianismo as duas idéias são igualmente aceitas, e ambas com argumentações bíblico- eclesiais na sua fundamentação. Entretanto e a rigor, a discussão da possibilidade da salvação não é o tema deste artigo. O nosso assunto é se haveria algum ou alguns sinais visíveis da salvação (ou pelo menos do momento inicial do processo) e qual seria o mais infalível deles.
Novamente a resposta é SIM. Porquanto existe de fato sinais de salvação que podem ser detectados em sua feliz testemunha. Todavia aqui vamos nos ater tão somente ao mais forte e mais decisivo desses sinais, pois ele carrega a condição sine qua non da santidade imprescindível exigida dos cristãos, o que significa "sem a qual a salvação nem chega a ser pensável".
Refiro-me à virtude da obediência. Virtude que pressupõe um tal "espírito de obediência", que até tem mais valor salvífico do que o ato em si. Com efeito, às vezes há atos de obediência que são praticados com tanta má vontade que o Supremo Juiz nem sequer os levaria em consideração. Isto significa que a obediência perfeita pressupõe não apenas um longo caminho de maturação até a docilidade plena da alma, como também que outras virtudes paralelas teriam que entrar e se firmar como auxiliadoras no processo de "humildecimento" do ego humano. Este processo, com efeito, já incia com uma obediência, pois a fé inicial em Cristo não deixa de ser a 1a atitude dócil da alma, em obediência às instruções do Evangelho.
É evidente que a humildade em si (ou as virtudes das quais é formada, como a mansidão, a sapiência, o desapego, o altruísmo, a confiança, a lealdade, a paciência, etc.) traduz um excelente sintoma de salvação, ou até perfeito na busca da santidade, e dispensaria a apresentação de sinais exteriores. A própria Bíblia valoriza muito mais um coração puro do que um ato de pureza, e Jesus chegou a condenar muito mais a intenção impura do desejo sexual do que o ato em si. Tudo isso é sabido. Todavia, porém, foi o próprio Salvador quem declarou "pelos frutos conhecereis a árvore", indicando com isso que a virtude interior jamais se firmará (jamais criará o bom hábito) se externamente não houver a prática dos bons atos dela decorrentes.
Então qual é o ato exterior que não apenas ilustra a humildade, mas que é também o melhor auxiliar na sua formação mais profunda? É a obediência. E por que a obediência tem toda essa qualidade? Vejamos.
Ser humilde é ter o ego anulado. I.é., ser uma alma livre que entregou sua liberdade àquEle que a comprou com seu sangue, renunciando à sua vontade pela vontade de Deus. Ser humilde é reconhecer tranqüilamente a total dependência do Amor de Deus para ter nascido e para manter-se vivo, sem qualquer mérito pessoal. E esta virtude angelical é despertada e consolidada pelo espírito de obediência, único capaz de produzir atos voluntários de obediência aprazível. Esta obediência de gozo indizível dos anjos pode chegar ao coração humano, porém não sem um vasto repertório de experiências marcantes de obediência individual, no cumprimento da mais dura frase de Jesus para exercitar a humildade humana (a saber: "Se alguém quer vir após mim, a si mesmo se negue, tome a sua cruz e siga-me").
Para se chegar à compreensão tranqüila e igualmente necessária das experiências de plena obediência individual, devemos perguntar em todas as ocasiões e situações: "Você quer ser um bom profissional? Você quer ser um bom filho? Você quer ser um bom empregado? Você quer ser um bom soldado? Você quer ser um bom músico? Você quer ser um bom cidadão? Você quer ser uma boa esposa? Etc.", tudo isso exige uma só resposta: "Seja obediente". Vá em frente e experimente: "Seja obediente"...
Com efeito, a coisa funciona assim: Você quer ser um bom profissional? Obedeça aos seus chefes; você quer ser um bom filho? Obedeça aos seus pais; você quer ser um bom empregado? Obedeça ao seu patrão; você quer ser um bom soldado? Obedeça à hierarquia militar; você quer ser um bom músico? Obedeça ao maestro; você quer ser um bom cidadão? Obedeça às leis; [Esta vai doer]: você quer ser uma boa esposa? Obedeça ao seu marido; você quer ser um bom católico? Obedeça ao papa; você quer ser uma boa pessoa, obedeça a Deus. É assim. Faça a experiência, se informando bem com os que obedecem ou com os que um dia obedeceram, e pergunte qual foi o resultado (se foi mais positivo ou negativo).
Assim também funciona em relação a Deus. Na verdade, nada mais engana a auto-imagem de uma pessoa do que viver seguindo apenas os ditames de sua própria vontade, que se acomoda no prazer narcisista e se convence facilmente de que está indo bem, como se sua aprovação pessoal dos prazeres que aprecia fosse a aprovação de Deus, e não a sua própria e auto-enganosa presunção. Igualmente, nada é mais eficaz na demonstração de intimidade e aprovação de Deus do que a alma humana ceder de tal modo à docilidade que esteja sempre pronta a obedecer, e assuma uma sobre-vida sob a direção da obediência, sem rebeldias e sem desânimos. Não há teste melhor. Conversão significa justamente isso: uma mudança tão profunda e radical que o indivíduo deixa de fazer o que quer para fazer o que Deus quer; isto é, ele se abandona para servir a Deus, por ver que a orientação da Onisciência é a única capaz de levá-lo à felicidade plena, e não à alegria ilusória dos infra-prazeres do mundo.
Mas a era moderna "matou" Deus! Extinguiu as fontes do sobrenatural e criou um mundo onde todos só fazem aquilo que desejam, e entram em depressão se assim não for, de um modo que raras vezes se abre uma brecha para realizar qualquer coisa desejada por outrem, mesmo que a vontade individual possa levar a um delito ou a risco de morte. "E mesmo que a vontade alheia seja a de Deus". Então, para evitar o tremendo vexame da consciência de contrariar o Todo-poderoso, a vontade humana inventou uma suposta "impossibilidade" de se identificar a vontade de Deus, deixando esta a mercê da interpretação humana (mesmo leiga, ou no máximo clerical), com o clero sendo posteriormente manipulado para satisfazer os velhos desejos.
Tudo isto assim perfaz a noção convencional e socialmente bem-vinda de que "Deus nos criou livres para exercitarmos todas as hipóteses da liberdade total, pois como Deus é o Amor e o Bem, é evidente que para Ele a única coisa que importa é ver seus filhos felizes". Ledo engano. E com ele nasceu o patético "deus-marionete das vontades humanas", ou o "deus-obediente-ao homem", que colocou de vez a Onipotência no seu devido lugar, i.e, no silêncio da nulidade!... E Deus, que é o modelo maior da obediência (Ele nunca desobedeceu, nem a SI mesmo), aceitou calado o lugar desprezível da distância afetiva, pagando pra ver aonde vai dar a loucura humana de tentar viver por conta própria.
Portanto, o significado mais eloqüente do "silêncio de Deus" vem, depois de uma pungente pergunta: "Meus filhos querem viver seguindo apenas a diminuta abrangência de sua consciência? Querem?... Então assim viverão. Eu permitirei. Mas depois não poderão se queixar de que o Planeta está tremendo e a Natureza está morrendo, pois foi exatamente por extinção e morte que pediram".
Prof. João Valente de Miranda.