O Romantismo do Conto 'Destinos' de Miguel Torga

Por Amanda Lima | 29/04/2010 | Literatura

Amanda Graziela C. Lima

1.O AUTOR:

Miguel Torga, pseudônimo de Adolfo Correia da Rocha, escritor português natural, de São Martinho de Anta, Vila Real. Proveniente de uma família humilde teve uma infância rural dura, que lhe deu a conhecer a realidade do campo, feita de árduo trabalho contínuo. Após uma breve passagem pelo seminário de Lamego, emigrou com 13 anos para o Brasil, onde durante cinco anos trabalhou na fazenda de um tio, em Minas Gerais, como capinador, apanhador de café, vaqueiro e caçador de cobras. De regresso a Portugal, em 1925, concluiu o ensino liceu e freqüentou em Coimbra o curso de Medicina, que terminou em 19331, em 1928 aos 21 anos estreou-se publicando poesias.

Escreveu poemas, romances, textos dramáticos, ensaios, diários e contos.Algumas pessoas preferem o "Torga" poeta, outras optam pelo contista. Acredita-se que em todos os estilos ele supera-se e deixa evidente a marca do seu mundo próprio. Ele autodenominou-se "homem de granito", no entanto nas suas obras o que mais percebemos é que ele extremamente solitário e que sua companhia, mas freqüente é o desespero, de maneira contida com o mundo e em conflito constante consigo mesmo. Miguel Torga vivia rodeado de dúvidas que o faziam não saber se deveria seguir em frente.

Seu constante confronto com o mundo e consigo mesmo o faziam desacreditar na paz com tudo que o rodeava- Deus, homens, vida e o mundo. Por ser um poeta solitário, ele via a solidariedade como um sentimento de integração do homem com o universo. A forma que o escritor tem de mostrar seus sentimentos mais íntimos, no caso de Torga, a solidão e a solidariedade é através de suas obras. Assim o escritor chega próximo da realidade pelas mãos da sua obra, vive através dela.

Suas temáticas, no geral, são humanistas e existencialistas. Ele preocupa-se com o ser humano e suas limitações. Quando aborda o sofrimento humano ele fala de mágoas e inquietações que podem conduzir a esperança ou a desespero, com reações em forma de protestos, revoltas ou inconformidade. Suas inquietações permeiam a existência humana, o destino, a morte e a condição terrena.

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1FONTE: http://www.astormentas.com/din/biografia.asp?autor=Miguel+Torga

2.ANÁLISE DO CONTO "DESTINOS"

O conto "Destinos", do livro Novos Contos da Montanha do autor Miguel Torga, cumpre as características fundamentais do conto: agarra o leitor desde o princípio despertando seu interesse até o final, apesar de ser uma história simples e usar o mínimo de elementos.Não há referência, por exemplo, ao nome do filho de Teodósia. O que importa são os sentimentos e sensações envolvidas entre ele e Natália.

Na visão de Vassalo (1984) o conto é: uma história breve, de enredo simples e linear, com forte concentração de ação, tempo e espaço, nesse conto torna-se claro para o leitor essa "marcação" de tempo e espaço, tendo em vista que o amor entre os personagens principais aflora na primavera - estação propicia dos amantes, terreno fértil para florescer o sentimentalismo, pode-se perceber a passagem do tempo no conto através de outras passagens como: "Os meses passavam, as folhas caíam, e outros renovos vinham povoara a terra"... O espaço em que o contexto está inserido também são características fortes do conto, visto que as paisagens humanas nas aldeias, o espaço campestre é uma das características do Miguel Torga. A narrativa desse autor é marcada pelos costumes de personagens inseridos nos ambientes rústicos das aldeias.

O conto é marcado por ações que acontecem sempre do presente para o futuro onde o narrador adquire uma existência textual, quase como quem conta a vida dos personagens secundários e assume a forma de como elas pensam.

Diante desses aspectos, pode-se perceber que os personagens desse conto são carregados de temores e de tensões, eles são fechados em si mesmos. Tanto Natália quanto o filho de Teodósia demonstram esperança e desesperança durante todo o conto, como uma expressão de conflito íntimo, na verdade esse sentimento é característico do contista onde os sonhos são utilizados como situações ideais e irônicas a fim de suprimir a miséria vivida por esse povo.

A única testemunha do encontro "amoroso" entre os personagens é a natureza em volta deles - "No Junho, as cerdeiras punham por toda a veiga uma nota viva, fresca e sorridente" (TORGA, 1996, p. 38). Essa é uma das características de Torga o uso da natureza como um personagem. A partir deste encontro fica subentendido entre eles um namoro que nunca foi formalizado, pois nenhum dos dois chega a declarar-se, Natalia mesmo sendo uma moça típica das aldeias portuguesas, tinha algumas atitudes de mulher faceira, capaz de deixar seu amado tímido diante de suas ações e questionamentos, como fica claro nesse trecho retirado do conto: "[...] Era bonita como só ela. Delgada, maneirinha, branca, e de olhos esverdeados, fazia um homem mudar de cor." (TORGA, 1996, p.38)

Foi após o casual e, mas romântico encontro, que os sentimentos afloram entre os personagens mudando o interior de ambos, no entanto não fizeram com que tomassem uma atitude para viver esse "suposto" amor, - seus olhares falam o que eles não têm coragem, seguem angustiados envolvidos numa onda de renúncia e desejo,apesar de amarem-se são incapazes de se libertar das amarras que os prende a um mundo irreal e celebrar um amor que simboliza a condenação à realidade. O contista constrói em instantes uma história de amor para logo depois destruí-la.

Torga não idealiza o homem, ele sabe que fazem parte dele a violência e a crueldade, não só dele, mas dos animais e da natureza. Nas suas histórias podemos notar a grande harmonia que existe entre esses elementos, no entanto existe um desencontro entre seus ciclos, os da natureza ocorrem de uma forma e os da alma humana de outra.

O retorno que o faz ao local onde ocorreu o encontro deles após os desencontro é como uma busca pela cura dos males que o afligem. A natureza utilizada com o poder de cura. É o que nos sugere a última parte do conto. Em apenas algumas páginas presenciamos o nascimento de um amor, acompanhamos o seu "desenvolvimento", e presenciamos o seu término. Tudo isso ocorre de maneira concentrada, ambientado por uma tensão crescente. As personagens envolvidas são poucas e apresentadas esquematicamente, o espaço é reduzido, o tempo passa rapidamente, o interessante são os momentos significativos.

A história de amor entre Natália e o narrador nunca vivida intensamente termina após o pedido de namoro de João Neca a Natália, essa aceita o pedido mesmo amando outro homem, pois não poderia ficar esperando mais que esse pedido viesse do seu amado, como fica explicito nesse trecho:

"Lá conhecer os pontos de honra de um homem, conhecia-os ele. A coragem é que não chegava à altura do entendimento.

Infelizmente, a vida não podia parar naquela lírica indecisão. Os meses passavam, as folhas caíam, e outros renovos vinham povoar a terra". (TORGA, 1996, p. 40)

O amor retratado no conto termina no ultimo trecho:

"Os sinos tocavam festivamente, ia por toda a aldeia um alvoroço de noivado, e só naquela casa a tristeza se aninhava sombria e desamparada a um canto.

- Também eu gostava dela...

Era outra vez Junho, as searas aloiravam já, e nas cerdeiras, polpudas, rijas, as cerejas tomavam uma cor avermelhada e levemente escarninha. (TORGA, 1996, p. 41)

Nesse trecho deixa claro o fim do "relacionamento" dos personagens principais marcado pela tristeza de Teodósia e a covardia do filho em aceitar a perda do seu grande amor. Mas o conto verdadeiramente não acaba porque as sugestões que o narrador dá exigem novas leituras. Miguel Torga deixa sempre em seus contos uma inquietação, não nos dá certeza de nada.

REFERENCIAS:

TORGA, Miguel. Biografia. Disponível em: <http://www.astormentas.com/din/biografia.asp?autor=Miguel+Torga> Acesso em: 24 de mar. de 2009.

________, Destinos. In: Novos Contos da Montanha, 12ª ed. 1996. Disponível em: <http://www.esnips.com/doc/d4ae6326-2f6e-4ed5-8580-35f0638f8fd5/Miguel-Torga---Novos-contos-da-montanha-(pdf)(rev)> Acesso em: 22 de mar. de 2009.

VASSALO, Ligia. A Narrativa ontem e hoje. Introdução. Rio de Janeiro, 1984, p. 9 – 35.