O que na verdade somos
Por Richely Fernanda de Oliveira Gomes | 06/09/2016 | EducaçãoRichely F. O. Gomes
Somos seres humanos marcados por nossas histórias de dores, lutas, alegrias, superações. Somos seres complexos e intensos. Essa é uma das características que nossa espécie carrega. E assim sendo como conviver socialmente com aquilo que nos confronta, nos comove e nos move a um alvo desconhecido? Como alcançar excelência no processo de mediação da comunicação sem deixar nossa própria marca, humana de ser?
A importância do processo comunicativo na sociedade revela-se especialmente como nos interagimos com o outro através da língua, que é característica própria do ser humano. Com ela nós comunicamos o que sentimos, nossas sensações e reações diante determinados acontecimentos. Diz-se que ética são os princípios morais que orientam a conduta humana. Dessa forma, como não atropelar o professor em sala de aula quando este demora em responder uma pergunta de um aluno surdo, ou de transmitir uma pergunta do aluno surdo desnecessária ao professor, quando o intérprete detém a resposta? Ou ainda, como dizer a uma pessoa cega que a calça que ela veste está com o fecho aberto ou a camisa do lado avesso? Partilho aqui uma perspectiva de que a ética reside no fato de se compreender o outro em suas raízes, consiste da ciência de um ser com origem filogenética e ontogenética. Maturana já afirmava:
A célula inicial que funda um organismo constitui sua estrutura inicial, dinâmica, aquela que irá mudando como resultado de seus próprios processos internos, num curso modulado por suas interações num meio, segundo uma dinâmica histórica na qual a única coisa que os agentes externos fazem é desencadear mudanças estruturais determinadas nessa estrutura. (MATURANA, Humberto. 2002, p.28)
Nascemos com uma estrutura biológica, que de acordo com as interações, com o desenvolvimento da língua e da linguagem vai se modificando. Provocamos mudanças no outro, assim como o outro também provoca mudanças em nós. A realidade vai sendo vista, construída e reformulada conforme as várias lentes interpretativas, passando por nossas emoções e razões.
Não há como mediar comunicação através da língua e da linguagem que está associada às mais diversas habilidades cognitivas sem ser afetado. O que há é uma consciência desse processo que determina uma escolha que afeta terceiros; surdos, cegos e outros e que primeiramente passa por nós, profissionais da comunicação. Maturana destaca que o futuro de um organismo nunca está determinado em sua origem. Não estamos prontos por assim dizer, estamos em processo constante de construção. E isso é o que nos mantém unidos uns aos outros, essa semelhança e capacidade específica a nós, humanos.
“É o fruto dessa nossa rica experiência humana partilhada, o que nos identifica como atores, participantes e parceiros, nessa existência histórica. É a forma por meio da qual nos ligamos uns aos outros, expressando nosso entendimento de um mundo que é uma construção nossa e, como linguagem, pode ser compreendido e comunicado” (DEBORTOLI, 2002).
Assumir a função ética e social do trabalho de comunicação assistiva é assumir o quanto somos seres em desenvolvimento, dependentes de uma linguagem que nos é comum, estabelecida por nós mesmos; seres que formulam, reformulam, tropeçam, caem e se levantam novamente para reconstruir.