O Quase Inquebrantável Vínculo dos Países Árabes com a Rússia: A Queda de Assad

Por Leôncio de Aguiar Vasconcellos Filho | 23/01/2025 | História

A atual situação geopolítica do planeta, com todas as suas nuances, não deve ser creditada tão somente às atitudes dos agora e diretamente envolvidos, mas à bipolaridade ideológica que marcou o século XX. Lembrem-se que o historiador britânico Eric Hobsbawm nos informou que o século passado iniciou-se com o advento da Primeira Guerra Mundial e terminou com a Queda da URSS.

Com a Primeira Guerra Mundial, o Império Russo surge como contrapeso às potências europeias da ocasião, apesar de ter assinado o antecipado acordo de Brest-Litovsk, de paz em separado com o Império Alemão. Afinal, cerca de quatro milhões de seus cidadãos haviam perecido nos campos de batalha europeus. Isso foi essencial à existência de suficientes forças internas a derrubar a Monarquia e o Czar Nicolau II, com sua família foi assassinado pelos bolcheviques quando das revoluções de 1917.

Dali, Lênin e Stálin perceberam que a nação, devido ao seu potencial, não deveria se contentar, tão só, a ser um imenso território dominado pela agricultura. Quando Stálin assumiu completamente a liderança do Partido, iniciou-se o genocídio por ele perpetrado contra seu próprio povo, e que iria culminar, durante e logo após a Segunda Guerra Mundial, no estabelecimento de uma potência industrial (embora tenha ocorrido mediante trabalho escravo imposto ao povo da URSS) e num Estado exportador de revoluções. Tal ideologia foi imposta pelos soviéticos a muitos dos países da Europa Oriental, pois eram territórios que os nazistas usaram como passagem para a URSS, formando um escudo militar protetor. Era iniciada a Guerra Fria, em que a URSS agiria ativamente a conquistar o máximo de territórios por meios de apoios, eleitorais ou armamentistas, a movimentos guerrilheiros ou governos per si sustentados.

Só que, simultaneamente à emergência da URSS, outro país também adquiriu o rótulo de superpotência: os EUA, que serviriam como agentes reativos a apoiar, também de modo eleitoral ou armamentista, forças guerrilheiras ou governos de caráter antissoviético, dentro de fronteiras alheias. EUA e URSS nunca lutaram diretamente, mas, como se diz, “por procuração” na Coreia, no Vietnã, no Afeganistão, na América Latina, na África e em quaisquer de seus rincões cujas necessidades materiais das classes sociais se faziam em conflito. Percebendo não ser admissível tantas violações de soberania, por parte das superpotências, nos assuntos internos de outros países, em meados da década de 1950 o líder iugoslavo Josip Broz Tito, comandante de seus compatriotas Partisans e construtor de um socialismo autogestionário independente da intromissão soviética, fundou, ao lado do egípcio Gamal Abdel Nasser e do indiano Jawaharlal Nehru, o Movimento dos Países Não Alinhados.

A própria denominação do grupo já diz que seus membros seriam livres a escolherem a ideologia que lhes aprouvesse, sem um juízo impositivo por qualquer das superpotências. E poderia ser uma ideologia variante dos sistemas então existentes, bem como uma completamente nova, ainda que os apoios militares que recebessem viessem, preferencialmente, de um dos polos dominantes. Era o chamado “Terceiro Mundo”, em contraposição ao Primeiro e ao Segundo Mundos, representados, respectivamente, pelos liderados pelos EUA e pela URSS. 

Foi isso o que ocorreu na maior parte dos países árabes: uma ideologia variante do socialismo, dirigida pelo transnacional Partido Baath, que, além de replicar princípios marxistas, também pregava a luta pela realização do sonho de as nações árabes, que falam a mesma língua e seguem a mesma religião (embora dividida em xiismo, sunismo e wahabismo), se fundirem em um único país, o que foi iniciado pelo Egito e pela Síria, que no final da década de 1950 e início da de 1960 constituíram um único país, dominado pelo Baath e chamado República Árabe Unida. País esse cujo lapso de existência durou pouco, tendo os constituintes optado por receber, anterior e individualmente, em razão do conflito árabe-israelense e da Guerra do Canal de Suez (em que o Egito lutou contra Israel, a França e o Reino Unido), apoio militar da URSS e agora da Rússia, ao qual estes e outros países árabes do Terceiro Mundo estão, ainda, vinculados. Vejam, por exemplo, que durante a Guerra do Golfo o Iraque, além de invocar a “Grande Nação Árabe”, usava constantemente mísseis soviéticos Scud para ataques e contra-ataques.

Por isso, na recente revolução acontecida na Síria, em que Bashad Al-Assad foi derrubado por rebeldes apoiados pelo Ocidente, o ditador sírio recebeu asilo imediato na Rússia, que ainda coopta os árabes para um conjunto militarismo, embora o Baath fosse e seja, apenas e como dito, um comando variante do socialismo na sua pura essência. Parceria com a qual somente, hoje, a Rússia continua lucrando, apesar de Assad ter corretamente caído.