O Perfil do Missionário Cristão a partir de uma Análise Bíblico - Teológica do Apostolado de Paulo

Por Gustavo Ávila de Araújo | 22/01/2013 | Religião

1          INTRODUÇÃO

            Há um grande número de publicações que discorrem sobre a missiologia a partir de uma perspectiva bíblica e teológica, entretanto, são poucos os livros que apresentam uma possível relação entre as características da vida e teologia do apóstolo Paulo e a missiologia cristã. Daí surgiu o interesse de se fazer um estudo das contribuições paulinas para a formação do perfil do missionário cristão. O pesquisador escolheu o tema “O perfil do missionário cristão a partir de uma análise bíblico-teológica do apostolado de Paulo”, como forma de restringir o assunto, pois, se fosse feita uma abordagem de toda a teologia de Paulo, o trabalho ficaria por demais extenso, não se enquadrando nas exigências de um trabalho monográfico.

            Entende-se que o estudo do ministério apostólico de Paulo exige primeiramente um conhecimento das suas origens, aquilo que recebera de influência enquanto morador de Tarso, tanto as influências recebidas dos pais judeus quanto as da filosofia e cultura locais, além da sua formação farisaica e os efeitos da sua conversão na maneira de entender as Escrituras. Tudo isso, em muito contribuiu para o entendimento que ele tinha do seu ofício apostolar. Será visto que muitas das responsabilidades e aptidões de Paulo devem ser copiadas pelos missionários cristãos, para que a expansão do Evangelho (e consequentemente do Reino de deus) seja feita de forma sadia e eficiente.

            Em seguida serão analisados os possíveis significados da palavra apóstolos nos diversos contextos influenciadores do cristianismo, a saber: no grego clássico, no judaísmo e Septuaginta e no Novo Testamento. O objetivo desta análise é delimitar o emprego do termo, para que se entenda corretamente os fundamentos da função apostolar de Paulo.

            Nos dois primeiros capítulos deste trabalho foram utilizadas como bibliografia básica dois livros que analisam a biografia de Paulo, além de dicionários bíblicos e teológicos, que foram fundamentais para o estudo dos significados da palavra apóstolos. As obras, “Paulo o apóstolo da graça”, de F. F. Bruce, e “Paulo: Biografia Crítica”, de Murphy O’Connor, têm um conteúdo bastante rico e esclarecedor, suficiente para a compreensão da trajetória de vida do apóstolo dos gentios. Já o “Dicionário Crítico de Teologia”, de Jean Yves Lacoste, e “O Novo Dicionário da Bíblia”, de J. D. Douglas, forneceram informações indispensáveis para o entendimento dos fundamentos do ofício apostolar.

            Os capítulos seguintes são usados para demonstrar os objetivos deste trabalho, ou seja, através das principais características do apostolado de Paulo, apresentado por ele em suas cartas e com o apoio da narrativa de Lucas em Atos, será elaborado um perfil de missionário cristão. Para tanto, serão citadas obras de diversos autores, como David Bosch, John Stott, Mauro Pesce, C. S. Lewis, Dietrich Bonhoeffer, George Eldon Ladd, John Piper, Herman Ridderbos, Ronaldo Lidório e Simon Kistemaker. As características apostolares analisadas neste trabalho não esgotam a lista das qualificações de Paulo, mas são norteadoras da aplicação destas no contexto da missão da Igreja, especialmente na vida do missionário.

            O pesquisador entende que, somente com a compreensão das peculiaridades da vida e do ministério daquele que foi o grande missionário da história do cristianismo, seguido pela imitação destas características por parte do missionário, será possível se fazer missões de forma a honrosa ao sacrifício vicário de Jesus Cristo.

2          AS ORIGENS DE PAULO

            Para um entendimento correto da pessoa do apóstolo Paulo é necessário inicialmente um estudo das possíveis influências recebidas por ele em sua vida, já que tais influências colaboraram para a formação da sua forte personalidade e de sua teologia, tão importantes no desempenho do seu apostolado. A avaliação das suas origens passa necessariamente pelo estudo da sua cidade natal e sua cidadania romana, da sua família, da sua educação em Jerusalém e os efeitos da sua conversão a caminho de Damasco.

2.1.        Tarso

            “Sou Judeu, cidadão de Tarso, cidade importante da Cilícia” (At 21: 39). Com esta frase o apóstolo Paulo se identificou ao tribunal militar que o julgou ser um agitador egípcio, por ocasião de sua prisão em Jerusalém.

            A cidade de Tarso era a capital do estado da Cilícia, um território às margens do Mar Mediterrâneo na chamada Ásia Menor, região da atual Turquia. Tornou-se conhecida por ser uma via comercial importante e bastante usada para o transporte de mercadorias do oriente a Roma através do rio Cnido (ou Cidno), mesmo local do romântico e histórico encontro entre Cleópatra, a famosa rainha do Egito, e Marco Antônio, militar romano, em 41 a.C.[1] Sua riqueza estava na planície fértil onde se localizava, região da chamada Cilícia Pedias (Cilícia Plana), em que se cultivava o vinho, o azeite e o trigo.

            Havia também rebanhos de cabras que eram apascentados ao longo das montanhas do Taurus, cuja pelagem era usada na preparação do Cilício, um tecido resistente e muito usado para combater o frio e a umidade. Possivelmente, o Cilício era o material utilizado na fabricação de tendas, atividade da qual Paulo era sabedor.

            Entretanto, a grande característica de Tarso, pelo menos para o propósito deste trabalho, é sua rica atividade cultural, que possibilitava a seus habitantes o acesso à filosofia, às artes, e a todo tipo de aprendizado, estando inclusive, segundo palavras de F. F. Bruce, à frente de “Atenas e Alexandria, cujas escolas eram freqüentadas mais por visitantes do que por seus próprios cidadãos. Tarso, em resumo, é o que poderíamos chamar de cidade universitária”.[2] Dos filósofos de Tarso, quase todos estóicos, destaca-se Atenodoro. Ele exerceu grande influência cultural na cidade, sendo tutor do próprio imperador César Augusto. Mesmo morrendo por volta do ano 7 d.C., “por muito tempo o seu nome permaneceu como herói em Tarso. É quase impossível que o jovem Saulo não tivesse ouvido algo a respeito dele”.[3] Verifica-se, então, que a cidade natal de Paulo é a típica metrópole, poderosa e exuberante, com uma população interessada nas diversas formas do conhecimento, que possibilitavam uma significativa ampliação dos horizontes culturais. Seguramente, Paulo fora alimentado com toda esta diversidade cultural e intelectual, seja na sua infância, ou até mesmo no período pós-conversão em que se retirou para a região da Cilícia.

2.2.        Hebreu, romano e fariseu.

            O que Paulo diz a respeito de si na carta aos Filipenses: “Circuncidado no oitavo dia de vida, pertencente ao povo de Israel, à tribo de Benjamim, verdadeiro hebreu; segundo à Lei, fariseu” (Fp 3:5), mostra aspectos da sua origem familiar e da sua educação que merecem destaque.

            Acredita-se que Paulo seja filho de pais judeus que já moravam em Tarso, oriundos da Diáspora, que lá o geraram entre os anos 3 a 10 d.C.. Sendo assim, provavelmente foi educado com todo o rigor de uma família israelita moradora de uma província romana, ou seja, preocupados em não se deixarem contaminar pela cultura pagã, nem pelas idéias gregas, incentivando o aprendizado da história judaica, da literatura dos profetas e da poesia salmídica, e falando o aramaico em seus relacionamentos familiares, mesmo sabendo se comunicar na língua grega, e quando preciso, o latim.[4]

            Jerome Murphy O’Connor diz que o uso da língua dos ancestrais criava um elo mais profundo com a terra, e eram os “hebreus” – aqueles que falavam o hebraico – que lançavam mão desta designação para se diferenciarem dos “helenistas” – aqueles que falavam o grego.[5] E com ele concorda F. F. Bruce, acrescentando ainda que os hebreus freqüentavam sinagogas em que os cultos eram realizados em hebraico, e usavam o aramaico como língua cotidiana; enquanto que os helenistas utilizavam o grego na sinagoga e no dia-a-dia.[6]

            Juntamente com a educação judaica, uma importante herança recebida de seus pais foi sua cidadania romana. Não se sabe como seus pais a adquiriram; se compraram por grande soma em dinheiro[7], se a receberam gratuitamente de Roma por algum serviço prestado por seus pais à causa romana, ou se alforriados por cidadãos de Roma, seus patrões[8]; mas o que se sabe com certeza é que Paulo a adquiriu ao nascer, de acordo com o relato lucano em Atos 2: 28.

            Sendo um cidadão romano, deveria ter também um nome romano, ou seja, um nome tripartido. O primeiro nome seria o praenomen (nome próprio), o segundo o Nomen Gentile (nome de família ou do patrono da família), e o terceiro seria o cognomen (nome adicional). Paulus provavelmente é seu nome adicional (Ex. Sérgius Pompeius Paulus). Infelizmente não se têm informações sobre o nome completo de Paulo, assim, não é possível saber como seus pais adquiriram a cobiçada cidadania.

            A única alusão ao nome hebraico de Paulo, Saulo, é feita por Lucas na narrativa de Atos, não tendo nenhuma menção feita pelo próprio Paulo em suas cartas. Provavelmente o nome grego Silas seja a melhor tradução para a forma aramaica de Saulo – She’ilã. Sabe-se que o uso de dois nomes era bastante comum naquele ambiente cosmopolita, além disso, o nome Saulo soava mal aos ouvidos gregos, que costumavam empregá-lo como adjetivo designador de pessoas de comportamento efeminado. Desta forma, entende-se que o autor do livro de Atos pode ter feito uma escolha intencional para relacionar o nome semítico ao trabalho de Paulo como fariseu, e o nome grego ao trabalho de Paulo como apóstolos dos gentios. Se não a fez, constata-se uma grande coincidência não intencional, pois seu nome hebraico era bastante comum dentre os da tribo de Benjamim, uma provável homenagem ao mais importante benjamita da história de Israel, o rei Saul.

            Existem divergências quanto à idade em que Pauloiniciou seus estudos em Jerusalém, se na adolescência ou se mais velho. No entanto, o mais importante é o indiscutível – o que se tornou e com quem aprendeu. Paulo disse que era fariseu e que fora instruído aos pés de Gamaliel, mais importante fariseu da sua época (At 22:3; 5: 35-38). Possivelmente se tornara membro do Sinédrio[9], pois em Atos 26: 10 ele diz que dava seu voto a favor da morte dos cristãos presos, e em Gálatas 1: 14 afirmava que excedia outros judeus da sua idade e que era zeloso das tradições de Israel. (Ora,) Um fariseu, zeloso com as tradições de Israel, que se destacava em seu conhecimento da Torá, e que opinava em relação ao futuro dos cristãos só poderia ser um membro do Sinédrio.

            O nome “Fariseus” deriva da palavra hebraica p’erushim, que quer dizer “os separados”. “Dedicavam-se a seguir a Lei de Deus, considerando-se a comunidade do autêntico Israel”.[10] Se Paulo era discípulo de Gamaliel, deveria ser da escola de Hillel, pois este fora sucedido por aquele. No entanto, é bem possível que ele tenha seguido uma escola um pouco mais radical, a de Shammai.[11]

            Como um fariseu da escola mais radical, membro do Sinédrio e perseguidor da Igreja, Paulo aparentemente atravessou todas as etapas aconselháveis para se tornar um judeu exemplar. Diante disso, não seria estranho o fato dele ter sido casado. Entretanto, a afirmação em 1 Coríntios 7: 8: “Digo, porém, aos solteiros e às viúvas, que lhes é bom se permanecerem como eu” mostra ser não-casado. Se viúvo ou divorciado não é possível se precisar, pois logo em seguida ele dá uma série de instruções acerca do divórcio, o que poderia indicar que era entendido no assunto, e vivia separado de sua esposa. Mas qualquer afirmação acerca deste assunto é no mínimo insensata, já que o próprio Paulo não deixou nenhuma informação precisa. O que resta são deduções como a de Rinaldo Fabris: “Ele teria se separado consensualmente da mulher, após sua adesão à fé cristã e, sobretudo, depois de seu compromisso como missionário itinerante”.[12]

            Como um fariseu perseguidor de cristãos, Paulo tinha um certo conhecimento de Jesus:

É inconcebível que ele perseguisse cristãos sem saber nada sobre o fundador do movimento. O fariseu Paulo com certeza estava em posição de descobrir tanto quanto Josefo descobriu. Assim, podemos com segurança supor que Paulo sabia que: 1) Jesus era um mestre a quem se atribuíam maravilhas; 2) fora crucificado sob Pônico Pilatos em resultado de acusações judaicas e 3) seus seguidores o consideravam o Messias. Entretanto, é improvável que ele se contentasse com fatos tão superficiais. Os interesses farisaicos o levariam a aprofundá-los.[13]

            Paulo se preocupava com os ensinamentos de Jesus e seus efeitos no povo judeu. Cria que Jesus relativizara a Lei com questionamentos acerca das tradições judaicas. Entretanto, o ponto de maior interesse para Paulo era a crença sobre a ressurreição de Jesus tão defendida por seus seguidores, pois, para um fariseu era inconcebível que Deus tivesse ressuscitado a Jesus, o falso mestre e falso pretendente a Messias, aquele que iludira tantos judeus e pagãos e questionara a autoridade da Lei. Para Paulo, a morte de Jesus poria fim à esperança dos seus seguidores, sendo assim, não era admissível que uma crença apoiada na sua ressurreição se apresentasse como um obstáculo ao judaísmo autêntico. Incrivelmente, após a experiência vivida na estrada de Damasco, onde vira o Senhor ressurreto e se convertera à fé cristã, a pregação de Paulo se apoiaria na crença da ressurreição de Jesus, agora o verdadeiro Messias (1 Co 15: 14).

2.3.        A Conversão de Paulo

            Havia uma corrente de pensamento judaica que admitia que a validade da Lei poderia ser apenas temporária, e que seria substituída por uma nova ordem quando o Messias viesse.[14] Se Paulo fora instruído nesta corrente de pensamento, a única hipótese, segundo ele, de se mudar os costumes antigos passados por Moisés, era através da vinda do Messias. Percebe-se que a questão determinante para “abrir os olhos” de Paulo seria a admissão de que Jesus era este Messias esperado, e foi exatamente isso que aconteceu na experiência a caminho de Damasco.

            Tanto na descrição lucana quanto nas menções paulinas em suas cartas, percebe-se que a experiência de conversão na estrada de Damasco não foi esperada. O encontro com o Senhor Jesus ressurreto sugere uma experiência de “transformação repentina e impressionante de um judeu zeloso e perseguidor da igreja em um seguidor de Jesus”.[15] Isso mostra que Paulo estava convicto em suas crenças e no propósito de exterminar os cristãos da região da Judéia na ocasião da viagem, e que sua experiência não teria sido fruto de uma busca por uma relação mais profunda com Deus, nem por supostas respostas não encontradas. Ele fora surpreendido pelo Senhor, fazendo-o crer naquilo que tão ferozmente combatia, a ressurreição de Jesus.

            Sua conversão não fez com que ele rompesse com tudo o que havia aprendido ao longo de sua vida e simplesmente construísse uma nova teologia a partir de então. Não é possível determinar até que ponto seus pressupostos judaico-helênico-romanos influenciaram seu pensamento, mas “sua insistência de que havia sido escolhido antes de nascer para servir a Deus (Gl 1: 15) deve conter a verdade de que suas experiências de criança e jovem, o estavam preparando para cumprir uma tarefa divinamente ordenada”.[16]

            Certamente, Paulo já possuía um grande conhecimento teológico do rabinismo quando se converteu. Faltava-lhe, no entanto, a experiência fundante em Jesus Cristo a qual lhe propiciou a iluminação do Espírito Santo para desempenhar seu apostolado. A partir daí, todas as suas convicções giraram em torno da afirmação salvadora de que Jesus Cristo é o Messias tão esperado que havia ressuscitado, cumprido toda a Lei e que lhe aparecera no caminho de Damasco, vocacionando-o para o testemunho apostólico.

            Conclui-se, desta forma, que Paulo recebera grande influência helênica e romana em sua infância por causa do contexto em que estava inserido, a cidade de Tarso. Muito provavelmente teve acesso aos grandes escritos da filosofia grega, e conhecia de forma profunda os ensinos dos filósofos estóicos da região. Entretanto, sua educação familiar contribuiu enormemente para a construção do seu futuro, pois o zelo que seus pais tinham pela tradição judaica, além de poupá-lo da sedução do mundo grego, fez com que ele galgasse os degraus necessários para se tornar um fariseu de destaque, indo ainda adolescente para Jerusalém, sendo discípulo do mais importante rabino da época, Gamaliel. Paulo lançou mão de alguns benefícios que possuía, como sua cidadania romana e o grande conhecimento da cultura grega, apenas como ferramentas de auxílio ao seu ministério farisaico, e posteriormente, cristão. As origens de Paulo em muito contribuíram para o desempenho do seu apostolado, pois foram responsáveis pela formação de uma personalidade forte e de uma teologia concisa, servindo como um dos importantes alicerces da fé cristã.

3          OS APÓSTOLOS

3.1.        O Significado no Grego Clássico

            A utilização da palavra grega apostellõ (apostellw), e suas derivações, era bastante ampla na língua grega pagã. Aparece pela primeira vez empregada na linguagem marítima como substantivo (apostollos) para designar um navio de carga, uma frota enviada a uma determinada expedição ou um documento que a legitimava, como um passaporte, por exemplo. Posteriormente passou a designar o comandante de uma expedição naval. Daí retira-se o significado da palavra apostellõ, que  é composta por stellw (colocar, aprontar) e ainda a preposição apo (de, para longe), ou seja, literalmente enviar.[17] Mesmo assim não era muito comum seu emprego para designar “alguém que fora enviado”. Em Heródoto[18], por exemplo, encontra-se apenas duas vezes a palavra apostellõ usada no sentido individual. O mais usado para se falar de uma pessoa era a palavra aggelos (anjo, mensageiro), ou khruz (proclamador, arauto).

            Mais tarde, o termo passou a ser usado para se referir àquela pessoa enviada para uma missão especial, que agia como representante, ou substituto de quem a enviou. Esta utilização possivelmente recebeu influência do Oriente, que tratava seus emissários como mediadores da revelação divina, e fora usado primeiramente nos círculos gnósticos, tanto no singular, para designar um salvador celestial, quanto no plural “para representar certo número de pessoas salvadoras ou ’homens espirituais’”.[19]

3.2.        O Significado no Judaísmo e na Septuaginta

            A Palavra hebraica sãlah,[20] que quer dizer enviar ou esticar, é usada quase que exclusivamente para se referir à autorização recebida por alguém para levar uma mensagem, como em Josué 1:16 “Então responderam a Josué: Tudo que nos ordenaste faremos, e aonde quer que nos enviares iremos”. Poucas vezes a palavra aparece como forma de descrever o envio em si. Percebe-se que ela é usada como verbo na grande maioria das vezes, e a única vez que é usada como substantivo é em 1 Reis 14: 6, “Eu sou enviado a ti com duas novas”. Neste texto, o profeta Aías recebe o comissionamento e o poder para entregar uma mensagem à esposa de Jeroboão.

            No judaísmo rabínico dos tempos de Jesus usava-se do termo aramaico shãllïah[21], indicando uma pessoa que tem plena autoridade em favor de outra, ou seja, uma espécie de procurador. Os judeus responsáveis pela coleta de impostos e pelas inspeções nas sinagogas localizadas nas comunidades de Jerusalém e nas da diáspora, desempenhavam esta função de “procurador”, pois eram comissionados pelo Sinédrio, e dele recebiam delegações, representando sua autoridade perante as sinagogas visitadas. Portanto, de acordo com Jean Yves Lacoste, o substantivo verbal aramaico shãllïah “corresponde exatamente, em sua forma e em seu conteúdo, ao termo cristão apóstolos”.[22]

            Mesmo sendo comissionados, os representantes do Sinédrio não podiam ser chamados de missionários, já que a palavra shãllïah não era empregada àqueles que tentavam converter pagãos em judeus. Suas responsabilidades se limitavam àquela missão particular, de acordo com a orientação e autoridade do Sinédrio.

            Na Septuaginta, as palavras gregas empregadas para traduzir Sãlah são apostellõ (ou exapostellô), e pempô. Ambas têm o mesmo significado literal (enviar), mas enquanto pempô, que aparece apenas cinco vezes na septuaginta, ressalta o mero ato de enviar, apostello estabelece uma estreita relação entre o mandatário e o mandante.

Na filosofia estóica popular, a idéia de autoridade do emissário para representar seu mestre adquire um significado religioso. Um mestre peripatético cínico considerava-se um embaixador e exemplo enviado por Zeus. Daí, apostellõ também ocorre como um termo técnico que significa a autorização divina.[23]

            Diante disso, conclui-se que a palavra apostellõ é empregada na septuaginta para significar a autorização recebida por alguém para cumprir um dever, e não sua mera nomeação formal. A atenção é focada na pessoa que envia e não no enviado; na autoridade do que comissiona e não no serviço do mandatário. Por este motivo é que a preferência pelo emprego do termo na forma verbal predomina no uso corrente da tradução grega do Antigo Testamento, mais do que sua forma substantiva.

            Desta forma, o emprego da palavra apostellõ na septuaginta e sãlah no Antigo Testamento possui a mesma significação. Ambos fazem referência a uma atividade específica, exercida em nome do que comissiona, produzindo, assim, uma ênfase sobre este e não sobre aquele que a executa. E ainda, o termo não possui uma responsabilidade contínua, mas sua função tem duração específica, termina com o cumprimento da missão.

3.3         O Significado no Novo Testamento

            Há mais de 130 ocorrências da palavra apostellõ (e suas variações) no Novo Testamento, a grande maioria delas nos evangelhos e no livro de Atos. Em contraste com a septuaginta, apostellõ é mais freqüentemente usada no Novo Testamento como substantivo. E em comparação com seu uso no grego clássico, esta palavra é empregada num sentido mais abrangente como “mensageiro”, e quando empregada num sentido mais específico, designa um título oficial.[24]

            O conjunto dos escritos lucano restringe a aplicação da palavra apostellõ ao grupo dos Doze, exceto em Lucas 11:49, que descreve um determinado grupo de pessoas, e em Atos 14:14, referindo-se a Barnabé e Paulo. O evangelista Marcos usa uma única vez a palavra para se referir à volta bem sucedida dos doze de uma missão de pregação e curas. Nota-se que eles só recebem este título após o retorno da missão. Mateus já os apresenta como sendo apóstolos antes mesmo do envio (Mateus 10:2), sendo aqueles que tinham estado com Jesus durante todo seu ministério terreno.

Somente em João é que se tem um emprego diferente dos evangelistas sinóticos. No quarto evangelho as palavras pempõ (pempw) e apostellõ são sinonímicas. Enquanto que nos três primeiros evangelhos a palavra é empregada para designar os Doze (exceto em Mateus 10:2), no evangelho de João é usada para designar um mensageiro qualquer, exceto em João 13:16, que mostra Jesus se referindo ao enviado como alguém menor do que aquele que envia.

Apenas uma vez a palavra apostellõ é usada para se referir a Jesus, quando o autor da carta aos Hebreus deixa claro que Cristo é o Enviado de Deus, o Sumo Sacerdote da fé cristã (Hb 3:1).

            Sem dúvida, o número Doze é uma representação simbólica do povo de Israel, como um cumprimento escatológico da missão de Jesus. Em Apocalipse 21:14, por exemplo, João tem uma visão da Cidade Santa e um muro com doze fundamentos onde estão escritos os nomes dos doze apóstolos. Os próprios apóstolos criam neste simbolismo, e isso é visto na necessidade de se escolher o décimo segundo apóstolo, o substituto de Judas (At 1: 15-26). Contudo, sabe-se que o número de apóstolos não se restringia a doze. O próprio Paulo se considera um apóstolo, além de Tiago, irmão de Jesus (Gl 1:19), Barnabé, Andrônico e Júnias (Rm 16:7).

            Levando-se em consideração o fato de os evangelhos terem sido escritos por último em relação aos demais documentos neotestamentários, entende-se que o conceito cristão já estava formado na ocasião de suas produções escritas. A identificação autoritária dos Doze como apóstolos resulta então, de uma harmonização retrospectiva.[25]

            Este conceito cristão de apóstolos entendia que a função primária do grupo era “servirem de testemunhas a Cristo, testemunho este baseado em anos de conhecimento íntimo, experiências preciosas e treinamento intenso”.[26] Deveriam ser aqueles que detinham o melhor e maior conhecimento daquilo que Jesus dissera e a melhor maneira de se viver uma vida digna do Seu nome, e a partir do Pentecostes passaram a ser as grandes autoridades do cristianismo primitivo.

            Estava implícito, então, que o uso da palavra apostellõ deveria ter três características, pelo menos. O apóstolo deveria: a) ter visto a Jesus ressurreto; b) ter sido chamado (comissionado) por Cristo; c) ter pleno conhecimento da pessoa de Jesus, por ter sido seu discípulo. Isso, num sentido técnico, pois num sentido não-técnico, ou secundário, esta palavra se refere a todos os missionários enviados, dotados de autoridade e poder para a missão.[27]

            Percebe-se que Paulo atendia a apenas duas daquelas qualificações, ambas vivenciadas na estrada de Damasco. Entretanto, o relato lucano de que Paulo fora levado aos apóstolos por Barnabé após sua conversão (Atos 9:27), dá a entender que seu objetivo era obter, em Jerusalém, informações acerca de Jesus, que só ali seria possível obtê-las. Mesmo deixando claro em suas cartas que sua comissão apostólica viera diretamente de Deus e não dos apóstolos, “Pedro era a principal pessoa que podia informar Paulo das coisas que este agora deveria saber: os detalhes do ministério de Jesus e da ‘tradição’ de ensino que derivou dele”.[28] Isso pode ser confirmado pelo texto de 1 Coríntios 15:3, em que ele diz que o evangelho que entregou é o que também recebeu, já que o verbo grego usado para traduzir recebeu é paralambano, cujo significado mais correto é receber por tradição. O mesmo verbo é usado em outras passagens dos escritos de Paulo, até mesmo em Gálatas 1:12, onde ele diz ter recebido o evangelho pela revelação de Jesus Cristo e não por meio de homem algum. Com isso, conclui-se que Paulo, mesmo não tendo sido um discípulo de Jesus, todas as informações passadas a ele pelos apóstolos a respeito das peculiaridades de Cristo foram suficientes para preencher os requisitos necessários para que se tornasse uma autoridade entre os cristãos primitivos.

            Assim, nos diversos contextos histórico-culturais influenciadores do cristianismo, encontra-se a palavra grega apostellõ, e suas variações, sendo usada de diferentes maneiras. No entanto, pode-se dizer que esta palavra tinha um significado especial para os primeiros cristãos. Apostellõ significava a legitimidade necessária para a execução de uma determinada tarefa, exercida por alguém que mantém um relacionamento estreito e profundo com o aquele que o enviou, que por sua vez é alguém com autoridade reconhecida e respeitada. O mandante comissiona o mandatário para que este o represente de forma digna, numa missão que, em geral, tinha um período de tempo pré-definido.

            Conclui-se também, que o termo apostellõ adquire maior valor quando usado como substantivo, referindo-se aos Doze e a Paulo, pois estes receberam um chamado especial de Deus, considerados os fundadores da Igreja de Jesus Cristo. Mas nos escritos do Novo Testamento, pode ser aplicado a todo cristão, pois estes são considerados autênticos embaixadores de Cristo (João 13: 16); e aplicado, também, aos enviados especiais das igrejas, os missionários que recebem um comissionamento para desempenhar uma tarefa específica (2 Co 8: 23).

4             AS DIMENSÕES DO APOSTOLADO DE PAULO

           

            O emprego do termo apostoladoapostolé (apostolhn)[29] - aparece pela primeira vez no Novo Testamento nos escritos paulinos (Gl 2: 8). Designa o cargo que um apóstolo tem por ser recebedor de um comissionamento permanente feito por Jesus Cristo já ressuscitado. O uso desse termo indicava que o cristão estava autorizado pela Igreja de Jerusalém a pregar a Boa Nova[30] a respeito de Jesus.

            Percebe-se que está implícita a autoridade por trás do seu emprego, e a quantidade de apóstolos que recebia a designação do cargo apostolar era restrita a certo número, não podendo ser aplicado a todo cristão (Atos 1: 24-25; 1 Co 12: 29; 15: 6-11). A Didaqué[31], por exemplo, contém ensinamentos relativos à maneira como as comunidades deveriam receber os apóstolos que eram enviados pelas igrejas. “Todo o apóstolo que vem a vós seja recebido como o Senhor”.[32]

Paulo interpreta sua vocação como sendo alguém que fora separado por Deus desde o ventre da sua mãe (Gl 1:15), fazendo uma clara analogia ao chamado vocacional de Profetas do Antigo Testamento.[33] Ele deixa claro que sua conversão foi um plano de Deus para que os pagãos também tivessem acesso à graça divina, vinculando sua missão aos gentios à sua experiência na estrada de Damasco, não existindo nenhum intervalo de tempo entre um e outro.[34] Esclarece também que foi o último apóstolo que viu a Jesus ressuscitado (1 Co 15:8), sendo também o último a receber o apostolado.

            Contrariando este ponto de vista, a Igreja Católica Romana atribui ao ofício Papal a mesma autoridade apostólica dos primeiros apóstolos, afirmando que o Papa é um sucessor de Pedro, considerado o primeiro deles. Da mesma forma, certas denominações evangélicas têm interpretado de forma equivocada o ofício apostólico, demonstrando total falta de conhecimento acerca dos ensinamentos basilares da fé cristã:

Hoje, o desafio provém de certos líderes de igrejas pentecostais e carismáticas que afirmam que Deus está concedendo novamente apóstolos e profetas a sua Igreja, e que os ensinamentos deles complementam as Escrituras. Qualquer evangélico irá concordar que hoje existem ministérios apostólicos (por exemplo, missionários pioneiros, plantadores de igrejas e líderes de igrejas) e ministérios proféticos (voltados, com sabedoria inspirada por Deus, para situações específicas). Mas os evangélicos deveriam também ser capazes de concordar que hoje não existem apóstolos e profetas com autoridade comparável à dos apóstolos e profetas bíblicos, cujos ensinos constituem o fundamento da igreja (Ef 2.20). Se houvesse tais apóstolos e profetas, seus ensinos teriam que ser acrescentados à Escritura e, com isso, o princípio da suficiência desta seria quebrado.[35]

             

4.1.        A Pregação do Evangelho

            Paulo estabelece uma relação direta entre seu apostolado e a pregação da Palavra de Deus. Para ele, o apóstolo deve não só pregar a Palavra, mas também personificá-la. “Toda a sua pessoa e seu modo de vida mostram a marca do Evangelho, que tem a Cristo crucificado como coração e conteúdo”.[36]

            Analisando suas cartas, especialmente a escrita aos Romanos e aos Gálatas, observa-se que Paulo prima pela autoridade e importância do Evangelho. Via seu apostolado subordinado e a serviço dele, e ainda condicionado aos seus princípios essenciais (1 Co 3: 5; 2 Co 4: 1-2).

            Mauro Pesce diz que Paulo pregou o Evangelho de Jesus Cristo em duas etapas ou fases distintas. “A primeira fase iniciava-se com a proclamação e terminava com a fundação de uma igreja e com a partida do apóstolo; a segunda era a orientação de comunidades já fundadas”.[37]

            Existem indícios desta primeira fase nas suas cartas. O uso das expressões: “como já disse” ou “como já dissemos” (Gl 5: 21; 1 Ts 4: 6), ou ainda “vós aprendestes de nós” e “vos demos” (1 Ts 4:1-2) demonstram que Paulo já havia tido um primeiro contato com as igrejas, que seria exatamente na sua fundação e exposição da Boa Nova de Jesus Cristo. Desta forma, entende-se que o primeiro contato de um apóstolo com uma comunidade era para apresentar a grande novidade a respeito de Jesus: Que Ele morrera pelos pecados dos homens e foi sepultado, a morte foi vencida, já que, em seguida, Ele ressuscitou ao terceiro dia para que se cumprissem as Escrituras (1 Co 15: 3-4).

            Os contatos seguintes com as comunidades, a segunda fase da pregação de Paulo, eram utilizados para ensinar, normatizar e orientar os cristãos para um viver digno da Cruz de Jesus, ou seja, tinham como objetivo o desenvolvimento da vida cristã. Se se refere a um crescimento, pressupõem-se diferentes níveis de maturidade. Isso se observa, por exemplo, em Romanos 14, texto em que Paulo adverte aos que comem todo tipo de alimento que não desprezem os que não comem (os fracos), e aqueles que não comem de tudo, não julguem quem o faz. (v. 2 e 3). Em outras cartas de Paulo[38], o termo mais usado para se referir aos iniciantes na fé é nepíois (nhpiois), como crianças, e para se referir aos mais maduros é teleíois (teleiois), ou perfeitos.

            Segundo Pesce, este desenvolvimento da vida cristã tem dupla dimensão. Consiste num crescimento tanto do conhecimento (gnôsis) quanto do amor (agapê). Os perfeitos praticam na sociedade uma sabedoria espiritual que os iniciantes não são ainda capazes. Só que esta sabedoria não se alcança com mero conhecimento intelectual, mas com uma aplicação prática do que se conhece acerca de Deus na esfera ética, especialmente na encarnação do amor. Percebe-se, assim, que o conhecimento é fundamental no cristianismo paulino, desde que subordinado ao amor.[39]

            Fica claro que todo o conhecimento adquirido por Paulo acerca das Escrituras[40] foi de grande utilidade para seu ministério apostólico, e tal conhecimento, por sua vez, deve-se ao grande zelo que seus pais tinham pela tradição judaica, característica comum dos judeus da diáspora. Eles não deixaram que Paulo se contaminasse com o sedutor mundo helênico, e o fizeram trilhar os retos caminhos da Torá. Sua mente estava, desde criança, sendo influenciada pelos conceitos e pela estrutura de pensamento acerca de Deus apresentada pelas Escrituras. Talvez seja este o motivo que respalda a afirmação de que Paulo fora escolhido por Deus antes mesmo do seu nascimento. Após sua conversão, Paulo colocou Cristo e seu ministério terreno como referencial interpretativo das Escrituras, e o resultado disso pode ser visto nos ensinamentos, normas e orientações contidas nas suas cartas.

            Quando se afirma que o conhecimento está subordinado ao amor, quer-se dizer que o resultado prático do conhecimento a respeito de Deus, através de Jesus Cristo, deve necessariamente reproduzir o próprio Cristo em cada um dos seus seguidores e, em especial, na comunidade, e esta reprodução é também percebida no amor mútuo entre os membros desta comunidade.

A palavra empregada por Paulo para amor é ágape (agaph), que pode ser entendida como a entrega de uma pessoa em favor de outras, assistindo-as em todas as suas necessidades físicas, psíquicas e espirituais. Biblicamente falando, o amor é uma questão de vontade e a decisão de amar não se fundamenta na simpatia ou antipatia, mas no que se quer para a pessoa amada.[41]

Este amor não pode ser considerado resultado de uma mera emoção, mesmo possuindo elementos emotivos em sua formação. O agapê não está centrado no homem, mas em Deus, logo, tem mais valor a obediência a Deus à satisfação humana.

Assim sendo, em último recurso temos que abandonar ou desqualificar os que estão mais próximos de nós e nos são mais queridos quando eles interferem em nossa obediência a Deus. Não devemos agir de acordo com a piedade que sentimos, é preciso fechar os olhos às lágrimas e os ouvidos às suplicas.[42]

            Em obediência a Cristo, Paulo pregava seu Evangelho não só com palavras, mas também com suas atitudes. Ele afirmou que tinha as marcas de Jesus em seu corpo (Gl 6:17), que havia abdicado de todos os seus privilégios para ser como Cristo (Fp 3: 7), e que não apenas sua pregação, mas toda sua vida estava fundamentada no Evangelho (Fp 1: 20-21). Portanto, como apóstolo, deveria viver conforme sua pregação, pois tanto suas palavras, como suas ações deveriam apontar para Cristo – sua vida, sua cruz e sua ressurreição.

Conclui-se, assim, que Paulo considerava a pregação do Evangelho como sendo o anúncio da grande novidade acerca da vida, morte e ressurreição de Jesus,

bem como os ensinos e as orientações sobre a vida cristã e sobre o próprio Deus. Tudo que aprendeu enquanto judeu serviu como ferramenta a serviço do cristianismo, pois cria que seu apostolado fazia parte de uma escolha soberana de Deus, feita antes mesmo do nascimento em berço judaico. Como forma de amor e gratidão a Deus, e como conseqüência do conhecimento adquirido, percebe que a personalização do Evangelho, em seu apostolado, seria condição essencial para a eficácia da pregação, tendo em vista sua função apostolar de representar o próprio Cristo aos povos que ainda não o conheciam. Sua maneira de agir e de se relacionar deveria ser a manifestação viva do Evangelho pregado.

4.2.        A Comunidade e o Apóstolo

            A primeira fase da pregação de Paulo era feita especialmente nas sinagogas judaicas (At 9: 22; 13: 5 e 42; 18: 4; 19: 8), e o resultado, muitas vezes, era a conversão seguida do batismo dos ouvintes, e a inauguração de uma nova comunidade cristã (1 Co 9:1; 15:1). Para Paulo, o apóstolo era alguém que tinha como tarefa “reunir a comunidade de salvação, formada de judeus e de pagãos, para fazer dela o lugar de existência do Evangelho na história”.[43]

A palavra grega utilizada por Paulo para se referir a essa comunidade cristã é ekklésia(Ekklhsia), encontrada mais de 60 vezes em suas cartas. Segundo Ladd, a palavra ekklésia designa um encontro de cristãos para a adoração, a reunião de crentes numa casa particular, ou a totalidade de crentes que vivem em um determinado lugar. Nunca se refere ao prédio onde os cristãos se reúnem, mas à assembléia dos santos reunida para adorar e prestar culto, sejam locais, ou regionais. Ladd afirma também que, em Paulo, está implícita na palavra ekklésia a declaração de que a igreja é a continuação direta do povo de Deus do Antigo Testamento. Para ele, a igreja local não é parte da igreja, mas a igreja em sua expressão local, ou seja, o poder total de Cristo está disponível a cada comunidade local.[44]

            Conclui-se, até aqui, que Paulo considerava a igreja como sendo cada congregação local (Rm 16: 5), assim como a totalidade dos crentes de um determinado lugar (Rm 16: 1), e também todos os que foram redimidos, formando a igreja de Deus (Gl 1: 13). “No pensamento de Paulo, deve-se interpretar a ‘justiça de Deus’ (cf. Rm 3: 21-31) como um dom concedido à comunidade, não ao indivíduo, pois o crente individual não existe em isolamento”.[45]

            A maioria das cartas de Paulo era dirigida às comunidades locais e aos crentes de uma cidade ou região específica, e continham orientações que visavam ao aprimoramento da vida cristã. Não havia um modelo de organização formal que unia os membros das comunidades. Era a autoridade e a doutrina apostólica que serviam como ponto de união dos crentes, e é por isso que os falsos mestres e seus ensinamentos foram tão combatidos por Paulo. Tais ensinamentos eram, para ele, um grande perigo para a vida da igreja, já que provocavam sua divisão (1 Co 1:10; Gl 1:6-7).

            Paulo lançava mão de sua autoridade apostólica para regular a comunidade com o Evangelho de Jesus Cristo.

Paulo, como apóstolo, reivindicava sua autoridade, especialmente no ensino, que insistia que fosse reconhecida por todas as igrejas. Contudo, essa autoridade era de persuasão moral e espiritual, não formal e legal. (...) Embora Paulo pronunciasse um anátema contra os falsos mestres (Gl 1: 8), não tomou nenhuma iniciativa formal ou legal contra eles.[46]

            Esta autoridade, exercida pelo convencimento e não pela imposição, é claramente vista na narrativa que Lucas faz das ações de Paulo em Atos 17: 2-3: “Segundo o seu costume, Paulo foi à sinagoga e por três sábados discutiu com eles com base nas Escrituras, explicando e provando que o Cristo deveria sofrer e ressuscitar dentre os mortos”. Em algumas traduções, as palavras explicando e provando podem ser substituídas por expondo e demonstrando, respectivamente, que são mais fiéis ao original grego - dianoigwn, que significa abrir, expor e interpretar; e paratiqemenos, que significa demonstrar, apontar. Em seguida, o texto diz que alguns judeus e gregos foram persuadidos (epeisqhsan), e passaram a seguir Paulo e Silas em sua missão (At 17: 4).

            Paulo não abdica da sua autoridade perante a comunidade, pois sabia que esta era o resultado do seu trabalho apostolar (1 Co 9: 2), e que, nela, seus direitos como apóstolo de Jesus eram salvaguardados e garantidos (1 Co 9). Mesmo assim, ele não exigia obediência a si, mas às Escrituras. Isto é visto ao contrastar as palavras entolh - lei, decreto (1 Co 14: 37) e epitaghn - comando, ordem (1 Co 7: 6)[47], para se referir ao mandamento de Deus e aos seus conselhos apostólicos, respectivamente.

            É comum nas cartas paulinas, especialmente em 1 Tessalonicenses, o uso de termos como pai, filhos e irmãos. Eles fazem alusão a um certo tipo de afetividade que deve existir entre os membros de uma comunidade, como se tivessem algum grau de parentesco. Fica claro, então, que a igreja deve ser o grupo de convívio mais importante e prazeroso para seus membros, como se fosse uma família. Essa comunhão familiar, entretanto, deve romper os limites territoriais das comunidades locais e se estender a toda a igreja universal (Rm 12: 13). A responsabilidade é de todos para com todos.

            Paulo insere a idéia de comunhão (koinwnia = relacionamento íntimo) pelo  evento do batismo, pois nele todos se tornam filhos de Deus, logo, irmãos em Cristo (Gl 3: 26; Rm 6: 3-11). O batismo acarreta, conscientemente, uma mudança nas relações sociais e na autocompreensão, pois a fé em Cristo torna a comunhão possível. A comunhão não une somente judeus e gregos, mas pessoas de diferentes classes sociais. Paulo insistia que as barreiras precisavam ser transpostas (1 Co 10 – 11), e que a comunidade é posta em risco quando grupos de cristãos dividem-se por causa de raça, etnia, sexo ou posição social.[48]

            Os ensinamentos e exortações acerca da Ceia do Senhor (1 Co 10 e 11) era a maneira de Paulo falar da responsabilidade na comunhão (koinwnia) da igreja. O pão cortado em pedaços mostra a unidade dos membros individuais, demonstrando que deve haver a unidade na igreja, já que todos são um em Cristo; e o cálice demonstra que todos estão unidos por causa do sacrifício reconciliatório de Jesus, tornando possível a comunhão entre Deus e seu povo. “Nesse sentido, portanto, a Ceia é a base e o critério para a unidade da Igreja como o novo povo de Deus”.[49]

            Dietrich Bonhoeffer diz que a comunhão é uma realidade espiritual e não psíquica, já que se fundamenta unicamente em Jesus Cristo. Afirma que o fundamento de toda a realidade espiritual é a Palavra de Deus revelada em Jesus – a verdade, enquanto que o fundamento de toda realidade psíquica são os estímulos e os anseios da alma humana – os desejos. Acrescenta ainda que na comunhão espiritual, vive o radiante amor do serviço fraternal, o Agapê, em que o amor ao

próximo é uma expressão do amor a Cristo; na comunhão anímica prevalece o amor obscuro e impulsivo, o Eros, em que o amor ao próximo é uma expressão do amor a si mesmo. Este amor anímico é que provoca o sectarismo na igreja.[50]

            Percebe-se, assim, que a relação que Paulo faz entre seu apostolado e a comunidade centraliza-se na comunhão entre seus membros. Como já foi visto, o conhecimento que se adquire a respeito de Deus deve produzir resultados práticos na comunidade, ou seja, o amor mútuo entre seus membros. Paulo fazia questão de impor sua autoridade através da persuasão pela argumentação[51] acerca das Escrituras, pois sabia que o verdadeiro amor, que manteria a unidade da igreja, só pode ser vivido se antes houver uma compreensão total da pessoa de Jesus Cristo e da dimensão prática da sua vida, morte e ressurreição.

4.3.        A Adaptabilidade do Apóstolo

            A melhor descrição da maneira como o apóstolo Paulo entendia e vivia a relação entre seu apostolado e a missão de pregar o Evangelho é vista na passagem de 1 Co 9: 19-22:

“Porque, embora seja livre de todos, fiz-me escravo de todos, para ganhar o maior número possível de pessoas. Tornei-me judeu para os judeus, a fim de ganhar os judeus. Para os que estão debaixo da Lei, tornei-me como se estivesse sujeito à Lei (embora eu mesmo não esteja debaixo da Lei), a fim de ganhar os que estão debaixo da Lei. Para os que estão sem lei, tornei-me como sem lei (embora não esteja livre da lei de Deus, e sim sob a lei de Cristo), a fim de ganhar os que não têm a Lei. Para com os fracos tornei-me fraco, para ganhar os fracos. Tornei-me tudo para com todos, para de alguma forma salvar alguns”.

           

            O uso da palavra ganhar demonstra que a compreensão da pregação não era imposta ou exigida, mas conquistada.

Ele precisa ‘ganhar’ seus ouvintes no sentido mais específico da palavra. Para isso precisa primeiro compreender seu modo de ser, adaptar-se a esse jeito e captar o que nele for positivo. Isso não é mera maleabilidade e habilidade, muito menos uma encenação para aliciar incautos. Paulo visava seriamente ganhar pessoas; por isso demonstrou séria empatia com eles.[52]

            A perícope mostra a adaptabilidade a que o apóstolo submetia-se para que o Evangelho fosse pregado e os ouvintes fossem salvos. Nela, Paulo menciona pelo menos quatro grupos diferentes de pessoas: a) os judeus; b) os cristãos de consciência fraca; c) os que estão sem a lei; d) os fracos.

            Nos versículos anteriores (1-18), Paulo argumenta com os coríntios sobre o fato dele ser uma pessoa livre de todos os homens, pois mesmo tendo direito ao sustento financeiro da igreja, ele optava por se manter pelo seu ofício de fabricante de tendas. Ele estava, desta maneira, livre de qualquer impedimento para a sua pregação. Contudo, mesmo estando livre de controles humanos, Paulo optou por uma vida de serviço aos coríntios. Vê-se aqui o cumprimento das palavras de Jesus, que afirmou que os maiores são os que servem e não os que são servidos (Mt 20: 25-27). Paulo demonstra que a verdadeira liberdade é vivida quando se é servo de Jesus Cristo, e conseqüentemente, do povo de Deus (Gl 5: 13).

            Nesta estratégia de evangelização de Paulo, ele se refere inicialmente à adaptação que faz de sua pregação e, conseqüentemente, da sua vida, ao modo de crer e de viver dos judeus. Sendo um hebreu de hebreus, sabia de todas as peculiaridades deste povo e, ao afirmar que se tornou um judeu para um judeu, estava implícita sua nova cidadania, a cristã.

            Um exemplo claro da adaptabilidade de Paulo e de seus discípulos aos costumes judeus em prol da exposição do Evangelho é narrado em Atos 16. Timóteo precisou circuncidar-se, pois todos os judeus da região de Listra sabiam que o jovem era filho de pai grego (vv. 2-3). Se Timóteo não se circuncidasse provavelmente não teria acesso à sinagoga e não teria a oportunidade de argumentar com os judeus acerca das Escrituras. Circuncidar-se já em idade adulta, com toda a dor e constrangimento que tal atitude poderia causar, era, para Paulo e Timóteo, um preço justo pelo privilégio de pregar a Palavra de Deus. Timóteo tornou-se um judeu para ganhar os judeus. “O que era desnecessário para ser aceito por Deus era recomendável para ser aceito por alguns seres humanos”.[53] Da mesma maneira, Paulo aceitou a proposta de Tiago e participou, com ele, de alguns ritos judaicos de purificação (Atos 21: 17-26).

            O cumprimento da Lei não era um problema para Paulo, desde que não tivesse o mesmo significado que tinha para o judeu. Em outras palavras, por causa de Cristo, a visão que Paulo tinha da Lei de Deus foi transformada. Guardar a Lei deixou de ser pré-requisito para a salvação e passou a ser resposta de gratidão a Jesus.[54]

            Quando Paulo menciona os que estão debaixo da Lei, ele não está se referindo somente aos judeus, mas também aos cristãos de consciência fraca, aqueles que carregavam o fardo de cumpridores da lei civil e/ou cerimonial de Israel, mesmo sendo já cristãos (Gl 5: 1), não conseguindo viver a liberdade da nova vida em Cristo. A Lei se torna um peso, pois não é a lei de Cristo, mas a Lei Mosaica que impõe condições para a salvação.

            Mas o que vem a ser esta lei de Cristo a que Paulo se refere? Em Gálatas 6: 2 ele diz que esta lei de Cristo é cumprida ao se carregar os fardos uns dos outros. É por isso que também afirma que está sob ela e, conseqüentemente, não está livre da Lei de Deus. Ele está se referindo à lei moral de Deus. Existe, na verdade um fardo a ser carregado, mas não é o fardo da Lei de Moisés, e sim o fardo uns dos outros, em imitação a Cristo, por amor a Ele e demonstrado na forma de se relacionar com o próximo.

Portanto a Lei de Cristo é carregar pesos. Carregar é sofrer. O irmão é um fardo para o cristão, justamente para o cristão. Para o pagão, o outro nem chega a se tornar um fardo. Ele evita qualquer encargo por causa dele, porém o cristão tem que carregar o fardo do irmão.[55]

            Sendo assim, Paulo sabia que não estava livre da Lei de Deus, mas submisso a ela por causa da lei de Cristo. Desta forma, quando se encontrava com os gentios (os sem a lei) Paulo deixava de observar as leis judaicas, a fim de que eles ordenassem suas vidas de acordo com a lei de Cristo, a lei da liberdade. Somente na liberdade da lei era possível ganhar os sem lei.

            Um exemplo da defesa que Paulo faz da lei de Cristo e da liberdade cristã é visto em Gálatas 2: 3-5, Paulo se recusa a circuncidar Tito. Os falsos irmãos a que Paulo se refere são os cristãos judaizantes que impunham a circuncisão como pré-requisito para a salvação (At 15: 1). Se Paulo cedesse à reivindicação dos judaizantes, estaria indo contra a Verdade do Evangelho que tanto defendeu.

            Quando diz que se torna fraco para com os fracos, Paulo pode estar se referindo tanto aos de consciência fraca, que precisavam constantemente dos seus conselhos para se fortalecer (1 Co 8: 9-13; Rm 14:1; 15:1), quanto aos fracos economicamente, já que, no início da carta, ele diz que poucos eram poderosos e de nobre nascimento, e Deus escolheu os fracos – pobres – para envergonhar os fortes – ricos (1 Co 1 : 26-28).

            Os fracos de consciência, aqueles que muitas vezes se tornavam um peso para a igreja e para o desenvolvimento desta, já eram cristãos, portanto, não haveria necessidade de serem ganhos para Cristo. “Como fracos na consciência eles requerem ajuda daqueles que são fortes”.[56] Mas que tipo de ajuda os fracos de consciência precisavam? De acordo com Paulo, essas pessoas precisavam ser salvas (ganhas) pela palavra da Cruz, ou seja, todos que não vivem de acordo com a lei de Cristo são pessoas perdidas, necessitadas de salvação. E era isso que Paulo, como um maduro na fé (teleiois), fazia. Ele se tornava um fraco para fortalecer os fracos em benefício da igreja, já que apenas uma igreja madura é capaz de apresentar o amor de Deus em Jesus Cristo.

            A infância de Paulo, sua educação e algumas características de sua vida, como a cidadania romana, por exemplo, indicam que ele fazia parte de uma família rica, poderosa e influente em Tarso. Ele mesmo afirma que já viveu na fartura (Fp 4: 12). Mesmo assim, Paulo fazia questão de se identificar com os menos favorecidos. Em sua carta a Filemom, por exemplo, ele intercede a favor de Onésimo, escravo de Filemom, com quem estivera enquanto estava preso em Roma (vv. 8-13). Estimula uma mudança na relação senhor/escravo, fazendo um trocadilho com as palavras: Onésimo significa útil, e sua condição de escravo não deveria fazer dele uma pessoa inútil (v. 11), mas um irmão em Cristo (v. 16).

            Além disso, o trabalho de fabricante de tendas não era muito bem visto pela elite social greco-romana, pois, para ela, o trabalho numa oficina era feito por escravos e não por homens livres. Entretanto, para o pobre e para o escravo, era motivo de alegria e orgulho ter em seu meio um cidadão romano de família rica, que fazia questão de ser como um deles.

            Assim, o apóstolo, segundo Paulo, deve ser um modelo para todos que desejam ganhar pessoas para Cristo, pois é alguém que não exige nada, mas serve em tudo. Que vai até o lugar onde o outro se encontra, na sua cultura, no seu ambiente de vida e “não os interpreta intelectualmente a partir de uma altura superior, mas ele ‘se faz’ tudo para eles”.[57] Ao tornar-se tudo para com todos (dentro dos limites da lei de Cristo), Paulo deseja usar de todos os meios possíveis para pregar a Palavra de Deus, pois seu real objetivo era o de levar o Evangelho ao maior número possível de pessoas, para de alguma forma salvar alguns. “Ele trabalha como se todas as pessoas devessem ser salvas, mas ele sabe que só algumas responderão ao evangelho”.[58]

4.4.        O Sofrimento do Apóstolo

            “Mostrarei a ele o quanto deve sofrer pelo meu nome” (At 9: 16). Com esta frase, Jesus revela a Ananias o que Paulo viria saber mais tarde: que o sofrimento era parte integrante do seu chamado apostólico.

            A razão da relação de Paulo com os sofrimentos impostos por Cristo ao seu comissionamento pode ser atribuída tanto ao nível de sua experiência com a graça de Deus revelada na cruz, quanto com sua esperança na ressurreição (Rm 5: 8; 1 Co 15: 30-32; Fp 3: 10-11). Ele sabia que se participasse dos sofrimentos de Cristo seria também participante da sua ressurreição, e que o significado da vida cristã em muito consistia na escolha destes sacrifícios na era atual para poder desfrutar da alegre comunhão com Jesus na era futura (Fp 3: 7-11).

Paulo não considerava seu relacionamento com Cristo a chave para tirar o máximo de conforto e prazer nesta vida. Não, o relacionamento de Paulo com Cristo era um chamado para escolher o sofrimento. (...) Era um sofrimento que teria sido totalmente estúpido e de dar dó, se não há ressurreição que conduza à presença alegre e Cristo.[59]

           

            Estava evidente, para Paulo, que a participação nos sofrimentos de Cristo não era exclusividade dos apóstolos (At 14: 22; Fp 1: 29; 1 Ts 3:3; 2 Tm 3:12), mas promessa feita por Jesus a todos que resolvessem ser seus discípulos, ou seja, a todos os cristãos (Lc 9: 23-24). Com isso, Paulo, apóstolo de Jesus Cristo e responsável por representá-Lo através da pregação e personificação do Evangelho, deveria ter uma motivação maior para aceitar e buscar o sofrimento, que a mera responsabilidade obediente de um simples cristão. Não que esta fosse uma responsabilidade desprezível, ou insignificante, mas a natureza do seu apostolado deveria impeli-lo à busca de uma motivação mais altruísta.

            Neste sentido é que F. F. Bruce afirma que Paulo suportava seus ferimentos e tribulações com mais disposição, por acreditar que, por seus sofrimentos, outros cristãos seriam poupados. Da mesma forma que Jesus ofereceu-se como sacrifício a favor de muitos, Paulo também seria o responsável pela vida de muitos, em troca da morte diária de seu corpo (1 Co 15: 31; 2 Co 4: 12).[60]

            Paulo afirma que a marca maior do seu ministério apostólico não era sua retórica superior, nem os sinais e prodígios que acompanhavam seu trabalho, mas o prazer no seu sofrimento – por amor a Cristo – em prol do Evangelho. Este sofrimento evidencia a força divina que atua na fraqueza humana (2 Co 11: 5-6, 23-27; 12: 9-12). Paulo diz que foi dado a ele um espinho na carne (2 Co 12: 7) para impedir que se exaltasse por causa das revelações que recebera de Jesus, e que esta provável mazela, ao invés de ser um empecilho ao seu ministério, funcionava como um grande aliado deste, pois o mantinha em constante dependência da capacitação divina, pela graça de Jesus Cristo. A graça não priva o apóstolo (nem ninguém) das tribulações, mas é suficiente para suprir todas as necessidades dos cristãos, e conduzi-lo num viver e num agir digno da cruz de Cristo. Portanto, no sofrimento, e pelo sofrimento, a graça de Deus encontra manifestação abundante.

            Na carta aos Colossenses, Paulo afirma que se alegra nos sofrimentos pelos cristãos de Colossos, preenchendo o que resta das aflições de Cristo (Cl 1: 24). Logicamente, ele não quer dizer que as aflições de Jesus foram pequenas e insuficientes para o plano de salvação de Deus (Rm 5: 9,19; Fp 2: 8), mas que sua importância não era conhecida nem mesmo compreendida adequadamente por todos os povos e nações. Logo, o trabalho de Paulo era apresentar a esses povos e nações, através da sua vida em imitação a Jesus, o valor eterno dos sofrimentos de Cristo. “O sofrimento é o melhor contexto no qual podemos ter certeza do amor de Deus”.[61]

            É por isso que Paulo afirma trazer no corpo as marcas de Cristo (Gl 6: 17). Ele resolve completar as aflições de Jesus, sofrendo por aqueles que tenta ganhar. Nos sofrimentos de Paulo vê-se os sofrimentos de Cristo, nas suas feridas as pessoas viam as feridas de Cristo. Esta atitude mostra que ele entendeu o valor do verdadeiro amor de que Jesus tanto falara aos seus discípulos: “Ninguém tem maior amor do que aquele que dá a sua vida pelos seus amigos” (João 15: 13). A compreensão prática desta afirmação só é garantida àqueles que se submetem alegremente às tribulações que conduzem à transformação do caráter e

conseqüentemente à maturidade cristã (Rm 5: 3-5).

            Conclui-se, desta forma, que, para Paulo, o sofrimento não é algo que se deve suportar passivamente, “mas também expressa, e talvez prioritariamente, o engajamento ativo da igreja no mundo por amor à redenção deste mundo. O sofrimento representa, pois, um modo de envolvimento missionário”.[62]A missão de Paulo consistia exatamente em tornar conhecido o amor de Deus que se revelou em Jesus, mostrando a tantos quantos conseguisse, a importância e o valor da cruz de Cristo. A morte operava cotidianamente em seu corpo, para que a vida se manifestasse eternamente em favor dos que se tornaram cristãos por causa do seu ministério. As marcas que trazia em seu corpo mostravam como ele se desgastava pessoalmente por amor à comunidade (2 Co 12: 15), e isso era motivo de grande alegria, pois, agindo assim, percebia a graciosa manifestação do poder de Deus, que agia em sua fraqueza. Sendo assim, a maior marca do apostolado de Paulo era a experiência sofredora em identificação com Cristo, pois desta forma ele demonstrava o pleno entendimento que tinha do verdadeiro amor de Deus em Jesus, vivido por este na radicalidade da cruz do calvário. “Como o evangelho é o evangelho do crucificado, o ministério do evangelho envolve viver uma theologia crucis e não uma theologia gloriae”.[63]

5             O MISSIONÁRIO E O APOSTOLADO DE PAULO

Em pouco mais de dez anos, Paulo plantou a igreja em quatro províncias do império: Galácia, Macedônia, Acaia e Ásia. Antes de 47 não havia igrejas nestas províncias; no ano 57 Paulo podia dizer que seu trabalho estava feito, e planejar investidas longas no extremo oeste, sem ficar preocupado com que as igrejas que tinha fundado, pereceriam em sua ausência, por falta de orientação e apoio.[64]

            Tendo em vista que grande parte da expansão do Evangelho se deu através do trabalho apostolar de Paulo, que foi uma resposta obediente a um comissionamento feito por Cristo, pode-se dizer que ele é o modelo de missionário cristão a ser estudado e copiado.

            É bem verdade que Paulo era um apóstolo separado por Deus com uma missão especial e com autoridade comparável somente à dos Doze, afinal de contas, são eles os pilares da fé cristã sobre os quais a Igreja formou-se. Fica claro, pois, que qualquer modelo missiológico criado, a partir de uma análise do apostolado de Paulo, não deve almejar a mesma importância e autoridade do apóstolo, fazendo do missionário cristão uma pessoa diferenciada como Paulo o foi. “O apostolado (Rm 1: 5; 1 Co 9: 2; Gl 2: 8) é distinguido de todos os outros dons e ministérios, pois não pertence à capacidade contínua e repetida da Igreja”.[65]

            Entretanto, o próprio Paulo recomendou a seus ouvintes e leitores que tomassem sua vida como exemplo a ser seguido, assim como ele fazia em relação a Jesus Cristo (1 Co 4: 16; 11:1; Gl 4: 12; 1 Ts 1: 6; Fp 3: 17). Desta forma, o missionário não deve almejar o cargo que Paulo ocupava, mas o serviço que ele desempenhava. Não deve ser alguém que lança novos fundamentos para o desenvolvimento da Igreja (ou de uma igreja), como Paulo o fez, mas deve ser um dos responsáveis por fazer cumprir a doutrina que os primeiros apóstolos construíram a partir do comissionamento especial de Jesus, e sob a qual a Igreja se constituiu.

“Missão” quer dizer atividade divina que emerge da própria natureza de Deus. Ora, o Deus vivo da Bíblia é um Deus que “envia”; eis, aí, portanto, o significado da palavra. Ele enviou os seus profetas a Israel, e enviou o seu Filho ao mundo. Este, por sua vez, enviou os apóstolos, os setenta e a igreja.[66]

             Esta conceituação de missões feita por John Stott é bastante relevante para o propósito deste trabalho, posto que não há interesse de se definir missões ou missiologia, tampouco propor modelos missiológicos para a igreja brasileira. Deseja-se apenas apresentar as características fundamentais de um missionário cristão, a partir da função apostolar de Paulo, e as peculiaridades de sua vida que influenciaram seu ministério.

5.1.     A Personificação do Evangelho

            O chamado e o trabalho do missionário estão totalmente subordinados ao Evangelho, da mesma maneira que o apostolado de Paulo o estava. Por isso, não existe chamado missionário que não se origine da compreensão da revelação de Jesus Cristo através da leitura e do aprendizado bíblico. Não existe chamado missionário que não seja consciente do papel a ser desempenhado dentro do corpo de Cristo, que coloca a vontade divina descoberta na Palavra de Deus no centro das decisões. O missionário que se utiliza do ministério para alcançar benefícios próprios e exclusivistas é alguém que coloca o Evangelho, e o próprio Cristo, na periferia dos seus desejos.

            Paulo fundamentou seu chamado na revelação direta que recebera de Jesus ressuscitado e fora aceito como apóstolo pela Igreja de Jerusalém por ocasião do concílio local (At 15; Cl 2: 6-10). Toda sua vida fora transformada e adaptada em função deste comissionamento. Sendo assim, o chamado e o trabalho missionário, além de ser produto de conhecimento bíblico, devem ser validados pela igreja que o envia, que, por sua vez, deve se preocupar com a doutrinação fundamentada exclusivamente na revelação bíblica. O missionário torna-se uma extensão da igreja local no campo a ser evangelizado, levando consigo os valores e princípios essenciais da fé cristã.

            Esta doutrinação é feita também pelo missionário, que é responsável pela orientação e pelo ensino da comunidade que emerge do seu ministério. A idéia de que o trabalho missionário resume-se apenas à apresentação do plano divino de salvação por meio de Jesus Cristo, sua vida, morte e ressurreição, não encontra respaldo bíblico, especialmente nas cartas paulinas. Esta proclamação da salvação em Cristo recebe o nome de evangelismo. Paulo, como já foi dito (item 4.1), pregou o Evangelho em duas fases distintas. Pode-se dizer que a evangelização faz parte da primeira fase. “A palavra ‘missão’ tem sido usada em sentido mais amplo e mais geral, a ponto de incluir a evangelização, sem contudo com ela identificar-se”.[67]

            Esta equivalência equivocada entre missão e evangelização é a responsável pela ida precoce de missionários ao campo, por se considerarem bons evangelistas, mas esquecendo-se de que o ofício missionário exige maior responsabilidade para com a Igreja. “Ele designou alguns para apóstolos, outros para profetas, outros para evangelistas, e outros para pastores e mestres” (Ef 4:11). É interessante notar que dos cinco dons do Espírito descritos no texto acima, quatro deles são exigidos na

aplicação do modelo apóstolo-paulino de missão. Excetuando-se o dom apostólico, o missionário cristão deve ser alguém agraciado com os dons de evangelização, pastoreio, ensino e profecia, pois todos estes se relacionam diretamente com o conhecimento da vontade de Deus e sua aplicação no desenvolvimento da comunidade, conhecimento este alcançado através do estudo da Bíblia.[68]

            O missionário, sendo alguém maduro na fé cristã (teleiois), é visto como um exemplo a ser seguido, pois, se o resultado do conhecimento bíblico é a transformação de vida, tendo Cristo como referência, e o amor a Ele como motivação, sua pregação só terá eficácia se os ouvintes virem no pregador o próprio Cristo anunciado. A personificação do Evangelho é, pois, condição sine qua non para o trabalho missionário.

             A conseqüência imediata da personificação do evangelho pelo missionário é o conhecimento por parte da comunidade do que vem a ser o amor de Deus, pois este é visto através da pessoa de Jesus Cristo, sua vida, morte e ressurreição, anunciado por palavras e exemplificado com a vida do pregador. Este exemplo da encarnação do amor passa a ser o modelo a ser seguido pelos que se decidiram a viver uma nova vida em Cristo Jesus.

            Tonho Oliveira diz que os novos cristãos do norte da África não sabem como se relacionar em família de forma cristã, então, “eles dependem do exemplo do missionário para aprender a remodelar esses relacionamentos de acordo com a nova fé”.[69] Nota-se que o missionário não pode se tornar o paradigma de comportamento a ser copiado, se antes não fizer de Cristo o seu modelo de vida.

            Oliveira segue dizendo que, geralmente, alguns missionários chegam ao campo com um bom suporte financeiro, decidem morar em casas boas de bairros ricos, os filhos estudam nas melhores escolas, têm acesso aos melhores hospitais e freqüentemente viajam ao exterior em suas férias. Este pacote de benefícios muitas vezes é usado pelo missionário como incentivo aos novos convertidos, que por sua vez se convertem interessados apenas nestas benéscias. O cristão local e o missionário vivem de maneiras tão diferente, que a interação entre ambos torna-se praticamente impossível.[70]

            Um exemplo do modelo Paulino de personificação do Evangelho pode ser visto na vida do casal Andrew e Sally Furnival, missionários ingleses residentes em Itabirito, Minas Gerais. Andrew formou-se em Engenharia pela qualificada e respeitada Universidade de Oxford, na Inglaterra, título que lhe proporcionaria uma carreira de sucesso profissional em qualquer parte do mundo. Entretanto, eles preferiram dedicar-se ao trabalho missionário no Brasil, cuidando de crianças carentes. Vivem de forma simples em uma fazenda que recebe o nome de Rainbow Farm, adotaram cinco crianças como filhos, e estão prestes a dar início a um projeto cujo objetivo é receber algumas das crianças que a Justiça Brasileira designa para a adoção. O objetivo do projeto é abrigar estas crianças e cuidar delas como filhos, até que sejam adotadas por alguma família.[71]

            Paulo abdicou de todos os seus privilégios por amor a Cristo (Fp 3: 7-8), preferindo dar mais honra ao próximo do que a si mesmo, adotando um comportamento humilde através do relacionamento com pessoas de posição inferior (Rm 12: 10, 16). Ele se entregava integralmente em favor de outros, para que estes entendessem o significado do amor de Deus através do Evangelho personificado em sua vida. Andrew e Sally, da mesma forma, abdicaram de todos os privilégios que teriam como cidadãos de um país de primeiro mundo, para que as crianças da fazenda Rainbow Farm conhecessem o amor de Deus através de suas vidas.

            “Assim como a Palavra tornou-se homem, assim também deve o amor converter-se em boas obras, se queremos que os homens o compreendam”.[72]

           

5.2.        A Comunidade e o Missionário

           

            “A Igreja só existe quando está aí para os outros”.

Dietrich Bonhoeffer

           

            Como já foi dito (item 4.2), o modelo de organização das primeiras comunidades cristãs não era formal, mas a autoridade e a doutrina apostólica é que unia os membros destas igrejas, sejam elas locais ou regionais. Ainda hoje, é a doutrina apostólica biblicamente ensinada a responsável por trazer a unidade intra e inter comunidades. O missionário cristão, como mestre, pastor, evangelista e profeta que é, torna-se um dos responsáveis por assegurar que a autoridade e a fidelidade à Palavra de Deus sejam preservadas na comunidade. Deve, pois, assim como Paulo, combater os falsos mestres e seus ensinamentos, para que a unidade da Igreja não seja comprometida, bem como seu desenvolvimento.

            A maneira de fazer prevalecer esta autoridade bíblica é através do convencimento. Este convencimento, por sua vez, é feito através da exposição e da discussão das verdades contidas na Bíblia, abrindo espaço para a reflexão e para possíveis questionamentos. Quando estas exposições e discussões são bem feitas, tornam-se também as responsáveis pela desmoralização dos ensinamentos

 errôneos que aparecem nas comunidades. Em Atos 17: 10-12, Por exemplo, Lucas

relata o momento em que Paulo levou a mensagem do Evangelho até Beréia, dizendo que os bereanos a receberam com grande interesse, mas examinavam as Escrituras todos os dias para conferir se tudo que era pregado condizia com o que estava escrito. Esta é a atitude típica de pessoas que realmente se interessam em conhecer a verdade. O versículo 12 diz que muitos judeus, muitos gregos e muitas mulheres importantes creram no que fora pregado. A atitude dos bereanos leva a crer que eles haviam sido convencidos pela discussão e demonstração do que era dito, e não pela imposição de um pensamento.

            Uma comunidade organizada, doutrinariamente fiel à Palavra de Deus, vive uma comunhão (koinwnia) madura entre seus membros. Esta comunhão é entendida como sendo uma maneira íntima de se relacionarem, eliminando possíveis diferenças relativas à raça, sexo ou posição social. Uma comunidade que pratica este tipo de comunhão entende o significado do batismo e da Ceia do Senhor, não considerando-os meros rituais litúrgicos, mas celebrações do verdadeiro amor que os salvou e que os une, o amor de Cristo (agaph).

            Ajith Fernando diz que ninguém pode vir à fé cristã e viver nela sozinho. A comunidade não pode viver uma eclesiologia individualista:

Talvez tenhamos reagido demais à compreensão católica romana de salvação. O slogan católico extra ecclesiam, nulla salus, que significa “fora da igreja, não há salvação”, mostra como eles vêem o papel da igreja na salvação. Eles dão valor salvífico aos meios da graça, tais como os sacramentos do batismo e da eucaristia, e assim vêem a salvação como sendo mediada pela igreja. A reforma protestante redescobriu a verdade gloriosa da salvação individual. Mas podemos ter ido ao outro extremo e abandonado o fato de que o contexto no qual esta salvação acontece é a igreja.[73]

            Quem doutrina a igreja acerca destas questões é o missionário, pois sua presença entre os novos cristãos, vivendo uma vida de entrega ao próximo e de obediência a Deus pela fé na Sua Palavra, é o exemplo vivo da encarnação do amor de Deus. O papel da comunidade é espelhar-se no exemplo do missionário e dedicar-se ao serviço fraternal de uns pelos outros, dando mais honra ao próximo do que a si próprios (Rm 12: 10).

            C. S. Lewis parece ter entendido muito bem que a comunhão cristã cria compromissos em amor, que estão relacionados a todas as áreas da vida do homem, inclusive a financeira:

Não penso, porém, que se possam estabelecer regras sobre quanto devemos dar. Receio que a única regra realmente segura seja dar mais do que podemos. Noutras palavras, se os nossos gastos pessoais com comodidades, bens supérfluos, diversões, etc. estão no mesmo nível do daqueles que têm receitas similares às nossas, provavelmente estamos dando muito pouco. Se as nossas esmolas não nos levam a privar-nos de alguma coisa nem nos atrapalham em nada, eu diria que são modestas demais; tem de haver na nossa vida coisas que gostaríamos de fazer e não podemos porque o dinheiro que gastamos em dar esmolas não o permite. Convém ter presente aqui que falo de “esmolas” no sentido habitual. Casos particulares de apertos econômicos entre parentes, amigos, vizinhos, ou empregados que Deus, por assim dizer, nos põe diante dos olhos, podem exigir muito mais, talvez até que comprometamos seriamente ou mesmo ponhamos em risco a nossa estabilidade financeira.[74]

            Conclui-se, então, que a ação do missionário na comunidade envolve não só a evangelização, mas também a doutrinação, que tem como objetivo manter a unidade da Igreja. Uma doutrinação que não pode ser imposta, mas aprendida pela discussão acerca das verdades bíblicas. A unidade da Igreja é fundamentada na comunhão dos seus membros, que vivem entre si numa relação de entrega mútua, comprometidos em amor uns com os outros, como materialização da doutrinação recebida. “No Cristianismo, a salvação é pessoal, a peregrinação espiritual é comunitária, e nada, absolutamente nada é individual”.[75]

5.3.        A Adaptabilidade do Missionário

            No capítulo anterior (item 4.3) foi visto que o apóstolo Paulo era capaz de adaptar seu modo de vida a diversos contextos e a grupos de pessoas diferentes, a fim de fazer com que o Evangelho fosse pregado. Viu-se também que esta adaptabilidade demonstrava a humildade de Paulo e sua disposição em servir ao próximo, como forma de ser servo de Jesus Cristo.

            Não é todo missionário que possui a capacidade de adaptar seu modo de vida a contextos diferentes, assim como não eram todos os apóstolos que o fizeram. Deve-se levar em conta as facilidades que Paulo tinha pelo fato de falar mais de um idioma, por possuir a cidadania romana, e ainda por conhecer muito bem a filosofia grega e a religião judaica. Sendo assim, vê-se a necessidade de se preparar adequadamente o missionário antes de enviá-lo ao campo. Além do preparo teológico, exige-se também o preparo básico, que é o aprendizado daquelas disciplinas que auxiliam na compreensão e pregação do Evangelho. Este aprendizado pode ser feito formalmente, através de escolas e cursos especializados, ou informalmente, através dos relacionamentos e leituras.

            Ronaldo Lidório conta uma história da qual participou, em que uma aldeia africana, cujos membros auto-intitulam-se bisalyiins, realizava uma cerimônia de um funeral. No meio da cerimônia, um homem alto levantou-se, matou quatro galinhas, um porco e dois cabritos, recolheu o sangue desses animais em pequenas cabaças e, com a ajuda de um pano, passou este sangue nos umbrais das portas de cada palhoça da aldeia. Quando este homem foi interrogado por Lidório sobre quem o ensinara tal ritual, o africano respondeu que seus ancestrais tiveram de aprender a fazer isto todo mês, para evitar os Nyunin. Lidório identificou nesta prática religiosa uma certa semelhança com a Páscoa judaica narrada na Bíblia (Ex 12). O evangelho foi pregado naquela aldeia e ali nasceu uma igreja.[76]

            Não foram narrados por Lidório os detalhes do seu trabalho junto aos bisalyiins. Contudo, pode-se imaginar que, estando ele naquela cerimônia de funeral, possivelmente se assentou junto ao povo ao redor da fogueira, comeu com eles e até dormiu em uma das palhoças feitas de barro. Lidório conheceu as características daquela religião, comparou-a com a verdade das Escrituras e pregou a Cristo. Ele fez-se de bisalyiin, até o limite em que a lei de Cristo permitia, para ganhar os bysaliins.

            Um tipo de preparo fundamental para o trabalho missionário é o estudo de uma ou mais línguas além da materna. Paulo falava o aramaico, o grego, o hebraico e possivelmente o latim. Da mesma forma que a comunicação não era um problema para Paulo expor o Evangelho, não deve ser também um empecilho ao trabalho missionário.

            Além disso, o apóstolo Paulo teve acesso aos escritos dos grandes pensadores de sua época e foi influenciado por toda a diversidade cultural e intelectual que um típico morador de Tarso poderia ter. Isso lhe possibilitava dialogar com diferentes tipos de pessoas de diferentes lugares. Da mesma maneira, o missionário cristão deve ser alguém culto, com conhecimentos satisfatórios sobre arte, filosofia e política, por exemplo, que o capacitam a se relacionar com todo tipo de pessoas. Entende-se, então, que o preparo do missionário, nas palavras de Bárbara Burns, exige, dentre outras coisas: investimento, acompanhamento, fidelidade, convicção, esforço e, principalmente, tempo.[77]

            Percebe-se que o preparo missionário não se faz da noite para o dia, exige o trabalho de alguns anos de muito esforço e dedicação, não apenas na área da teologia, mas também das disciplinas acessórias que auxiliarão a pregação e personificação do Evangelho.

            Paulo não via limites para sua pregação. Sejam judeus, gregos, os fracos na fé, os sem Lei, ou os menos favorecidos economicamente, todos careciam da salvação que só a cruz de Cristo pode dar. Todos tinham de estar sujeitos à lei de Cristo – carregar os fardos uns dos outros (Gl 6: 2) – por amor a Ele.

            Em análise ao texto de Ap 5: 1-14, Ronaldo Lidório observa que o Cordeiro (Jesus) é digno de receber “poder, riqueza, sabedoria, força, honra, glória e louvor” (v. 12), quatro destes adjetivos serão entregues pela Igreja: a riqueza (Ploton), a sabedoria (Sofian), a força (Isxun) e o louvor (Eulogian). A riqueza refere-se a todo o dinheiro que os cristãos possuem, que deve ser utilizado para servir a Jesus. A sabedoria indica que a utilização da capacidade mental humana tem como finalidade maior o serviço ao Reino. A força demonstra que todo esforço físico e toda a capacidade trabalhista devem estar a serviço do cordeiro. Finalmente, o louvor, que não é a música, mas palavras proferidas, que devem ser ditas com a finalidade do crescimento do Reino de Deus.[78]

            O estudo de Lidório demonstra que muitos missionários podem se sentir tentados a utilizarem os idiomas que falam, ou os conhecimentos filosóficos, culturais e políticos que possuem, ou a eloqüência no falar e no comunicar, ou até mesmo os ganhos financeiros que recebem, para se autopromoverem. Entretanto, a finalidade de todas as suas ações e investimentos deve ser o serviço ao próximo.

            Conclui-se, assim, que o missionário cristão deve ser alguém que escolhe viver uma vida de serviço ao Reino de Deus, pelo serviço ao próximo. Deve ser alguém que se prepara de tal forma para o desempenho do ministério, tornando-se uma pessoa culta e sábia, mas que utiliza esta sua capacidade como ferramenta a serviço do Reino, sujeitando-se ao estilo de vida daquele a quem ele deseja ganhar para Cristo. A adaptabilidade do missionário está diretamente ligada à sua capacidade de se fazer humilde em favor do próximo.

5.4.        A Maturidade do Missionário

            “Os sofrimentos do apóstolo são os mesmos que todo obreiro na seara do Senhor [missionário] tem de enfrentar para estender as fronteiras do Reino”.

Russel P. Shedd

            No capítulo anterior (item 4.4) foi dito que o sofrimento de Paulo tinha um algo a mais em relação ao sofrimento pelo qual todo cristão, verdadeiro discípulo de Jesus, tem de passar; sofrimento que o missionário cristão deve enfrentar com a mesma coragem e dignidade. Sua motivação era baseada no altruísmo (1 Co 15: 31; 2 Co 4: 12). Paulo estava disposto a morrer diariamente para que a Igreja desenvolvesse a si mesma e o Reino crescesse. Da mesma forma, o missionário cristão tem de estar disposto a preencher o que resta das aflições de Cristo (Cl 1: 24), por amor a Ele e pelo interesse do Reino.

            Esta disponibilidade para o sofrimento deve ser aceita pelo missionário, como conseqüência direta da maturidade cristã. Se a tribulação produz perseverança e a perseverança um caráter aprovado, ou seja, o caráter de Jesus, entende-se que somente pela via do sofrimento é que se é identificado com Cristo. Muitos buscam apenas os benefícios da ressurreição, esquecendo-se de que estes só serão possíveis se antes houver um entendimento e um desejo alegre pela vida e morte (cruz) de Jesus. Paulo sabia que os sofrimentos atuais não podem ser comparados com a glória futura (Rm 8: 18; 2 Co 4: 17), por isso sua esperança estava na ressurreição (1 Co 15: 19). “O sofrimento é o único caminho para a glória. Com Cristo foi assim; e assim será com os cristãos”.[79]

            A alegria no sofrimento do missionário não é uma atitude asceta ou masoquista, mas a garantia de que ele possui maturidade suficiente para ser o representante de Cristo onde quer que o Evangelho seja pregado. Esta representação substitui a responsabilidade de todo cristão de anunciar o Evangelho a todos os povos, já que o missionário torna-se um autêntico representante da comunidade, desempenhando a função que lhe foi dada no Corpo de Cristo. Esta substituição também é vista como uma maneira de poupar outros cristãos dos sofrimentos e da morte (1 Co 15: 31; 2 Co 4: 12). É por isso que “as igrejas locais espalhadas pelo território nacional devem entender a necessidade de suprir candidatos e recursos necessários para vencer a guerra histórica de conquistar o ‘homem forte’ e apoderar-se dos seus bens (Mt 12.29; Mc 3.27)”.[80]

            A experiência do sofrimento ensina o missionário a entender, na prática, a dependência da graça de Deus revelada na cruz de Cristo, assim como Paulo o fez. Na fraqueza do sofrimento missionário repousa o poder de Cristo, que é experimentado pela dependência da graça de Deus.

            Mas até onde deve ir a disponibilidade do missionário em sofrer pelo Reino? A resposta é proporcional à grandiosidade do amor demonstrado na cruz. Um amor que é resultado prático do conhecimento adquirido a respeito de Jesus na Palavra

de Deus. Um amor que disponibiliza a própria vida em favor do próximo (João 15: 13). Em outras palavras, o missionário deve estar disposto a sofrer até a morte, para que o Evangelho de Cristo seja conhecido e aceito.

           

Russel Shedd afirmou:

Seria necessário imitar o apóstolo e os perseguidos cristãos do passado que consideraram morrer por Cristo um privilégio. Jim Elliot, colega de turma no Wheaton College, e martirizado pelos aucas selvagens em 1956, disse: “Não é tolo quem larga o que não pode segurar para pegar firme no que não pode perder!”.[81]

            O apóstolo Paulo disse que, para ele, “o viver é Cristo e o morrer é lucro” (Fp 1: 21) desde que Cristo estivesse sendo pregado e Seu nome engrandecido (vv. 18-20). É impressionante que Paulo, mesmo tendo passado por tanto sofrimento em nome de Cristo em favor da Igreja (2 Co 11: 24-29; Cl 1: 24), e trazendo em seu corpo as marcas deste sofrimento (2 Co 12: 15), ele ainda diz que espera não ser envergonhado diante de Deus.

            Conclui-se, assim, com um exemplo claro do significado de “preencher o que resta dos sofrimentos de Cristo em favor da Igreja” que é visto em uma história narrada por Michael Card sobre um jovem guerreio masai chamado Joseph:

Um dia, Joseph, que estava caminhando em uma daquelas estradas africanas quentes e sujas, encontrou alguém que compartilhou com ele o evangelho de Jesus Cristo. Naquele momento e local ele aceitou Jesus como seu Senhor e Salvador. O poder do Espírito começou a transformar sua vida; ele sentiu-se tomado por tamanho entusiasmo e alegria que a primeira coisa que desejou foi retornar à sua própria aldeia e compartilhar as boas-novas de Deus com os membros de sua tribo local.

Joseph começou a ir de porta em porta, falando a todos que encontrava sobre a Cruz de Jesus e a salvação oferecida, esperando ver suas faces se iluminarem da mesma forma que acontecera com ele. Para sua surpresa, os aldeões não deram importância e tornaram-se violentos. Os homens da aldeia agarraram-no e o mantiveram no chão enquanto as mulheres batiam nele com fios de arame farpado. Ele foi arrastado para fora da aldeia e deixado para morrer sozinho no mato.

(...) Após ensaiar a primeira mensagem que tinha ouvido, decidiu voltar e compartilhar sua fé mais uma vez.

(...) Novamente foi agarrado pelos homens da aldeia e imobilizado, enquanto as mulheres batiam nele, reabrindo os ferimentos que haviam começado a cicatrizar. Uma vez mais eles o arrastaram inconsciente para fora da aldeia e deixaram-no para morrer.

Sair vivo da primeira surra foi algo realmente extraordinário. Sobreviver à segunda foi um milagre. Novamente, dias após, Joseph acordou no deserto, todo machucado, cheio de cicatrizes e determinado a voltar à aldeia.

(...) Ele retornou à pequena aldeia e, desta vez, foi agredido antes que tivesse a oportunidade de abrir a boca. Enquanto era fustigado pela terceira e, provavelmente, última vez, ele novamente falou a eles sobre Jesus Cristo, o Senhor. Antes de desmaiar, a última coisa que viu foi que as mulheres que estavam batendo nele começaram a chorar.

Desta vez ele acordou em sua própria cama. Aqueles que o tinham espancado severamente estavam agora tentando salvar sua vida e assistindo-o para que recuperasse sua saúde. A aldeia inteira tinha se rendido a Cristo.[82]

6             CONCLUSÃO

            As origens de Paulo – a zelosa educação recebida de seus pais, as influências helênica e romana que lhe ampliaram os horizontes políticos e culturais e ainda o conhecimento das Escrituras adquirido aos pés do mais importante rabino de sua época – são, indubitavelmente, os grandes responsáveis pelo desempenho do seu apostolado, já que em muito contribuíram para a formação de uma teologia cristã suficientemente forte, servindo como um importante fundamento da Igreja.

            Grande parte dos livros do Novo Testamento são da autoria de Paulo, isso mostra que ele era alguém que gostava das palavras. Entretanto, mais do que escrever, Paulo agiu. Ele entendeu o comissionamento que recebera de Jesus e, a partir dele, dedicou integralmente sua vida em prol da expansão do Evangelho recebido. Paulo se tornou um exemplo de apóstolo, missionário e cristão.

            Os diferentes significados da palavra apóstolos, empregados nas mais diversas línguas, culturas e tempos, não ofuscam o valor maior da sua aplicação, a saber, o serviço a Cristo no Reino de Deus. Paulo serviu ao próximo como forma de demonstrar seu amor a Jesus. Ele entendeu que a pregação da Palavra de Deus está condicionada á personificação desta; que sua função apostolar exige que ele exerça a autoridade na comunidade pelo convencimento, em que as verdades bíblicas são apresentadas e discutidas e não impostas; que a comunidade deve ser o reflexo do seu apostolado, imitando-o no sacrifício em favor do próximo, como forma de expressar o amor a Deus; e que este amor a Deus é plenamente experimentado na decisão diária de completar as aflições de Cristo na Igreja.

            O exemplo do apostolado de Paulo deve se tornar um paradigma para o missionário cristão. A entrega de vida em obediência a um comissionamento, bem como o desprendimento em relação aos valores seculares, precisam ser imitados e ensinados. O missionário deve ser um cristão que se dispõe a evangelizar e a doutrinar a comunidade que surge do seu trabalho. Deve-se destacar a diferença entre a evangelização e a missão. A missão é bem mais abrangente e exige mais responsabilidades que a evangelização. Esta responsabilidade exige, por sua vez, um maior envolvimento com a comunidade. E este envolvimento pressupõe relacionamento íntimo (koinwnia) com os membros desta comunidade. Um relacionamento resultante do amor a Deus despertado pelo conhecimento da pessoa de Jesus Cristo, conhecimento este adquirido através do ensino e personificação do Evangelho.

            Paulo era um homem culto. O missionário deve, também, ser uma pessoa culta e preparada. Este preparo auxilia a pregação da Palavra de Deus, pois contribui para a tarefa de adaptar-se àqueles a quem o Evangelho será apresentado e ensinado. Este Evangelho apresentado e ensinado deve conduzir a comunidade ao entendimento de que nada na vida cristã é individual, centrada em si, mas tudo deve ser feito de forma a sujeitar-se voluntariamente ao outro, pelo bem da Igreja e por amor a Cristo.

            Finalmente, o missionário cristão deve estar disposto a sofrer, até a morte se for preciso, para que o amor de Deus seja perfeitamente compreendido e desejado. Rubem Alves disse: “Ostra feliz não faz pérola”.[83] O sofrimento é a prova da maturidade cristã do missionário, pois produz uma jóia de valor incalculável. Sua atitude diante do sofrimento e da morte evidenciam o poder e o amor de Deus. Poder que se manifesta na fraqueza do cristão, e amor que se revela na identificação com a cruz do calvário.

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[1] Cf. SHAKESPEARE, William. Antônio & Cleópatra. São Paulo: L&PM, 2005. p.47.

[2] BRUCE, F. F. Paulo O Apóstolo da Graça: sua vida, cartas e teologia. 2.ed.São Paulo: Shedd Publicações, 2003. p.29.

[3] PACKER, J. I.;TENNEY, Merril C.; WHITE, William Jr. O Mundo do Novo Testamento. São Paulo: Vida, 1996. p.162.

[4] Cf. POLLOCK, John. O Apóstolo. São Paulo: Vida. 1989. p. 12.

[5] Cf. MURPHY-O’CONNOR, Jerome. Paulo: biografia crítica. São Paulo: Loyola, 2000. p.51.

[6] Cf. BRUCE, 2003, p.38.

[7] João Crisóstomo, um dos grandes Padres da Igreja Oriental, afirma que eram necessários aproximadamente 500 dracmas em propriedades para ser admitido na lista de cidadãos romanos.

[8] Em Atos 6: 9 aparece a expressão “Sinagoga dos Libertos”, que poderia ser uma sinagoga de judeus escravos que foram libertos por cidadãos romanos, e possuíram a cidadania durante o período que serviam a seus senhores.

[9] Sinédrio é o nome dado ao tribunal judeu. Também chamado de concílio

[10] Cf. LOHSE, Eduard. Contexto e Ambiente do Novo Testamento. São Paulo: Paulinas, 2000. p.73.

[11] De acordo com F. F. Bruce, a escola de Shammai era mais radical no cumprimento da Lei, e a escola de Hillel era considerada mais branda. Paulo não adotaria a mesma postura de Gamaliel, da escola de Hillel, na ocasião da prisão dos apóstolos narrada em Atos 5: 34-39, pois “ele repudiou a idéia de que uma política de contemporização era a mais adequada em relação aos discípulos de Jesus” (Cf. BRUCE, 2003, p.45.)

[12] FABRIS, Rinaldo. Paulo: apóstolo dos gentios. São Paulo: Paulinas, 2001. p.78.

[13] MURPHY-O’CONNOR, 2000, p.89.

[14] Cf. BRUCE, 2003, p.66.

[15] Cf. CARSON, D.A.; MOO, Douglas J.; MORRIS, Leon. Introdução ao Novo Testamento. São Paulo: Vida Nova, 1997. p.246.

[16] LADD, George Eldon. Teologia do Novo Testamento. São Paulo: Hagnos, 2003. p.509.

[17] Cf. GINGRICH, Wilber F; DANKER, Frederick W. Léxico do Novo Testamento Grego/Português. São Paulo: Vida Nova, 1984. p.31.

[18] Heródoto Halicarnasso (484 –425 a.C.) foi um historiador grego que relacionou a filosofia à história.

[19] BROWN, Colin; COENEN, Lothar. Dicionário Internacional de Teologia do Novo Testamento. 2.ed. São Paulo: Vida Nova, 2000. p.155.

[20] Cf. BROWN, 2000.

[21] Cf. DOUGLAS, J. D. O Novo Dicionário da Bíblia. 2.ed. São Paulo: Vida Nova, 1995.

[22] LACOSTE, Jean Yves. Dicionário Crítico de Teologia. São Paulo: Paulinas: Edições Loyola, 2004. p.176.

[23] BROWN, 2000, p.154.

[24] Em geral, no Novo Testamento, o uso da palavra apostellõ na forma substantiva indica que o enviado recebe um título formal pela função desempenhada.

[25] Cf. LACOSTE, 2004, p.176.

[26] DOUGLAS, 1995, p.96.

[27] Cf. CHAMPLIN, Russel Norman. O Novo Testamento Interpretado: versículo por versículo. São Paulo: Candeia, 2000. v.3. p.288.

[28] BRUCE, 2003, p.80.

[29] LACOSTE, 2004, p.176.

[30] A melhor tradução para a palavra euaggelion  (evangelho) é “Boa Nova” ou “Boa Notícia”.

[31] A Didaqué (Didach) era considerada uma espécie de manual de religião da comunidade cristã do primeiro século, uma doutrina apostólica.

[32] ZILLES, 2003, p.30.

[33] Isaías 49:1 e Jeremias 1:5.

[34] Murphy O´Connor cita dois teólogos, J. B. Bercovitz e F. Watson, que afirmam que o chamado apostólico de Paulo veio após sua experiência de conversão a caminho de Damasco. O´Connor refuta esta idéia citando Rm 1:1, textoem que Paulo vincula seu chamamento à sua apostolicidade.

[35] STOTT, John. A Verdade do Evangelho: um apelo à unidade. São Paulo: Encontro: ABU, 1999. p.65.

[36] LACOSTE, 2004, p. 177.

[37] PESCE, Mauro. As Duas Fases da Pregação de Paulo. São Paulo: Loyola, 1996. p. 14.

[38] 1 Co 2:6; 3:1-4; 14:20; Fp 3:15

[39] Cf. PESCE, 1996, p.34.

[40] Entende-se por Escrituras o conjunto de livros do Antigo Testamento – Torá, Profetas, Salmos e Escritos de Sabedoria.

[41] Cf. BRAKEMEIER, Gottfried. Por Que Ser Cristão?: dez boas razões para crerem Jesus Cristo, crer na ressurreição, viver em comunidade, ler a bíblia, amar o próximo. São Leopoldo, RS: Sinodal, 2004. p.91.

[42] LEWIS, C. S. Os Quatro Amores. São Paulo: Mundo Cristão, 1986.p. 97. (grifo do autor deste trabalho)

[43] LACOSTE, 2004, p. 177 e 178.

[44] Cf. LADD, 2003, p.721.

[45] BOSCH, David J. Missão Transformadora: mudanças de paradigmas na teologia da missão. São Leopoldo, RS: Sinodal, 2002. p. 208.

[46] LADD, 2003, p.716.

[47] GINGRICH, 1984.

[48] Cf. BOSCH, 2002, p. 210.

[49] RIDDERBOS, Herman. A Teologia do Apóstolo Paulo: a obra definitiva sobre o pensamento do apóstolo aos gentios. São Paulo: Cultura Cristã, 2004. p. 473.

[50] Cf. BONHOEFFER, Dietrich. Vida em Comunhão. 5.ed. São Leopoldo, RS: Sinodal, 1997. p. 20-25.

[51] Não há o interesse de expor, tampouco discutir, a metodologia usada na argumentação de Paulo, nem discorrer sobre a utilização de sua retórica. A abordagem foi feita somente a título de informação.

[52] BOOR, Werner de. Carta aos Coríntios. Curitiba, PR: Editora Evangélica Esperança, 2004. p. 149.

[53] STOTT, John R. W. A Mensagem de Atos. São Paulo: ABU Editora, 1994. p. 285.

[54] Cf. KISTEMAKER, Simon. 1 Coríntios. São Paulo: Cultura Cristã, 2004. p. 430.

[55] BONHOEFFER, 1997, p.78.

[56] KISTEMAKER, 2004, p.431.

[57] BOOR, 2004, p. 151.

[58] KISTEMAKER, 2004, p.433.

[59] PIPER, John. Teologia da Alegria: a plenitude da satisfaçãoem Deus. São Paulo: Shedd Publicações, 2001. p. 221.

[60] Cf. BRUCE, 2003, p. 133.

[61] STOTT, John R. W. A Mensagem de Romanos. São Paulo: ABU, 2000. p. 164

[62] BOSCH, 2002, p.222.

[63] DUNN, James D. G. A Teologia do Apóstolo Paulo. São Paulo: Paulus, 2003. p.654. A Teologia do Novo Testamento entende a theologia gloriae como sendo o estudo dos benefícios recebidos pelos cristãos por causa da ressurreição de Jesus, e entende a theologia crucis o estudo dos sacrifícios e tribulações enfrentadas pelos cristãos em identificação com o sacrifício de Cristo.

[64] ALLEN apud BRUCE, 2003, p.15.

[65] RIDDERBOS, 2004, p.504.

[66] GRAHAM, Billy et al. A Missão da Igreja no Mundo de Hoje: principais palestras do congresso internacional de evangelização mundial realizado em Lausanne, Suíça. São Paulo: ABU, 1982. p. 35.

[67] GRAHAM, 1982. p. 35.

[68] Esta afirmação é baseada em estudos feitos em RIDDERBOS, 2004, p. 504-510 e sua relação com o item 4.1 e 4.2 deste trabalho.

[69] OLIVEIRA, Tonho. Uma Cruz a ser Carregada, um preço a ser pago. Disponível em: <www.teologiabrasileira.com.br>. Acessado em: 27 out. 2005.

[70] Cf. OLIVEIRA, 2005.

[71] As informações sobre o trabalho realizado na Fazenda Rainbow Farm podem ser obtidas no site: www.batistamineira.org.br.

[72] GRAHAM, 1982. p. 151.

[73] FERNANDO, Ajith. Fundamentando Nossa Reflexão nas Escrituras: trinitarianismo bíblico e missão. In: TAYLOR, William D. (Org.).Missiologia Global Para o Século XXI: a consulta de Foz do Iguaçu. Londrina: Descoberta, 2001. p. 347

[74] LEWIS, C. S. Mero Cristianismo. São Paulo: Quadrante, 1997. p. 92.

[75] KIVITZ, Ed René. Uma Síntese Teológica da Missão Integral. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE EVANGELIZAÇÃO, 2, 2003. Belo Horizonte. Missão Integral. Viçosa, MG: Ultimato, 2004. p. 64.

[76] Cf. LIDÓRIO, Ronaldo. Missões: o desafio continua. Belo Horizonte: Betânia, 2003. p. 15-16.

[77] Cf. BURNS, Bárbara Helen. O Preparo Missionário. In. CONGRESSO NORDESTINO DE MISSÕES, 1, 2002. Caruaru, PE. Anunciai Entre as Nações a Sua Glória. Curitiba, PR: Esperança, 2004. p. 285.

[78] LIDÓRIO, Ronaldo. A Tríplice Missão. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE EVANGELIZAÇÃO, 2, 2003. Belo Horizonte. Missão Integral. Viçosa, MG: Ultimato, 2004. p. 71

[79] STOTT, 2000, p. 163.

[80] SHEDD, Russel P. Sofrimento na Missão. In. CONGRESSO NORDESTINO DE MISSÕES, 1, 2002. Caruaru, PE. Anunciai Entre as Nações a Sua Glória. Curitiba, PR: Esperança, 2004. p. 64.

[81] SHEDD, 2004, p. 64.

[82] CARD apud PIPER, 2001, p. 102-103.

[83] ALVES, Rubem. Mansamente Pastam as Ovelhas. Campinas: Papirus, 2002. p. 65.