O Paladino dos Direitos Humanos

Por Diamantino Lourenço Rodrigues de Bártolo | 09/01/2015 | Filosofia

Silvestre Pinheiro Ferreira (1769-1846), de uma forma indireta foi, ao seu tempo, um paladino dos Direitos Humanos, reconhecido por imensos investigadores, não só portugueses e brasileiros, mas também de outras nacionalidades., nomeadamente: sul-americanas e europeias. A intervenção, sempre moderada, em assuntos de Estado, para os quais lhe era solicitado parecer, fazem de Pinheiro Ferreira um exemplo a seguir, quando se fala de Direitos Humanos e se pretende implementá-los no espaço lusófono.

Nesta postura, uma vez mais é dada uma lição de democracia e liberdade, como por exemplo, quando foi necessário ouvir os brasileiros acerca de umas instruções a emitir por D. João VI, a propósito da partida da Corte para Lisboa, ficando o Príncipe Real no Brasil com a regência deste imenso território: «No intuito de inspirar confiança a esses eleitores quando a sinceridade das régias intenções propôs Silvestre Pinheiro em Conselho que se ouvisse o voto da Assembleia Eleitoral acerca das instruções com que deveria ficar o Príncipe regente. Deixemos falar o sábio publicista: … » (PINHEIRO, 1980:381).

E se é certo que Pinheiro Ferreira, em Portugal e noutros territórios sob domínio colonial nacional, nem sempre foi compreendido por determinados setores da vida política, também é verdade que, no Brasil, a maioria das pessoas, com quem convivia, o estimavam e admiravam, com exceção de alguns elementos da Corte, precisamente, porque participou, com a sua moderação e conhecimentos, para que um dos mais sagrados direitos humanos se exercesse: a Independência do Brasil, sem sobressaltos, num clima de tranquilidade e com justiça, porque Silvestre Pinheiro Ferreira: «Muito se preocupa com o princípio do justo, para ele a única base moral para os indivíduos e as nações.» (CERNEV, 1986:19).

Na sua preocupação de manutenção da tranquilidade pública, aquando dos motins de 7 de Março de 1821 e revelando, uma vez mais, a sua frontalidade e lealdade ao soberano, não hesitou em propor ao rei a detenção do próprio Príncipe Real.

Entendia que este estaria vulnerável às tentativas feitas junto dele para se declarar, de imediato, a Independência do Brasil, em condições que muito poderiam prejudicar a segurança e sossego do povo: «Nem devia ser estranho ao que se preparava o herdeiro da Coroa, pois que Silvestre Pinheiro Ferreira aconselhou ao rei sua detenção na Fortaleza de Santa Cruz como o melhor meio de acabar com o desassossego público.» (LIMA, s.d:55).

A atitude de Pinheiro Ferreira valer-lhe-ia, mais tarde, alguns comentários depreciativos, por parte de D. Pedro, futuro Imperador do Brasil. Todavia, também é verdade que, uma vez mais, a sua frontalidade, coerência e preocupação para com o bem-estar e tranquilidade da população não o coibiram de manifestar a sua opinião, sabendo que esta desagradaria ao futuro monarca do Brasil, muito embora este também acabasse por, tacitamente, concordar com tal opinião, porque não exerceu contra o nosso autor quaisquer represálias.

Pelo contrário, aceitaria Pinheiro Ferreira como Ministro quando lhe foi entregar a lista com os nomes dos futuros governantes, proposta pelo povo e que ele, D. Pedro, levaria a seu pai D. João VI, para aprovação: «Surpreendido, também ele, D. Pedro, receberia do Tribuno do Povo, a lista desejada, e retomaria a galope o caminho de S. Cristóvão onde se designariam ministros, realmente, (...) e para os Estrangeiros e a Guerra, Silvestre Pinheiro Ferreira, que vinha de outros ministérios, esse Silvestre Pinheiro, doutor de Coimbra, filósofo liberal, que desde 1814 vinha aconselhando o Rei a se constitucionalizar – e pele primeira vez designando-se para cargos equivalentes dois brasileiros: o futuro marquês de Inhambupe para Indentende-Geral da Polícia, e o futuro Visconde de Cairu, Inspector-Geral dos Estabelecimentos Literários.» (GERSON, 1971:38).

Sabe-se que um dos direitos invocados por Pinheiro Ferreira era a Liberdade e, ele próprio, na medida do possível, e com a coragem que hoje se lhe reconhece, a exerceu, inúmeras vezes, em absoluta lealdade para com D. João VI e também para com o povo brasileiro, denunciando conspirações, movimentos e manobras que poderiam prejudicar o acesso à independência dos brasileiros.

É conhecida a sua atitude perante os planos portugueses no sentido de vencer a insubmissão das províncias coligadas, a partir da adesão da Baía à causa das Cortes Portuguesas de Lisboa. Nesse sentido, ele anteviu o que mais tarde viria a suceder: «A defecção da Baía causou um susto, mas provocou a reacção brasileira, pois o partido brasileiro, como viu Silvestre Pinheiro, estava certo de que o resultado da Revolução seria a favor dos brasileiros e não dos portugueses.» (RODRIGUES, 1975c:18).

Neste dealbar do terceiro milénio, o mundo, na globalidade da sua composição, funcionará de forma diferente e natural, se a intervenção humana contribuir para a harmonia, para a tolerância, para a solidariedade. Através do estudo que ficou para trás, fácil de comprovar é o facto de, ao longo da história do pensamento humano, sempre terem existido pessoas que se preocuparam com princípios, valores e ações.

Na mesma linha do autor luso-brasileiro, compreensivelmente, por metodologias e teorias diferentes, analisar-se-á, oportunamente, que preocupações, desenvolvimentos, teses e sistemas vêm sendo uma constante, não só no domínio das ciências sociais e humanas, como também no âmbito de outras áreas e contextos do conhecimento, sendo possível refletir, em todas elas e/ou a partir delas, na importância do respeito pelos Direitos Humanos, no mundo contemporâneo.

Hoje, reconhece-se a influência de Pinheiro Ferreira, no momento crucial da História do Brasil, num período em que ainda se encontrava ligado à História de Portugal. É indiscutível o seu amor pelo povo brasileiro, pelo qual continua a ser recordado, como o grande impulsionador dos direitos deste povo irmão de Portugal, conforme se pode verificar, aquando da sua escolha para uma missão considerada difícil, relativamente à preparação das Cortes de Lisboa sobre o regresso de D. João VI a Portugal, em 1821.

Com efeito, tendo tido o cuidado de se inteirar da situação em Lisboa, nomeou Frei Francisco de S. Luiz para colher as informações desejadas, porque tinha sido incumbido, por D. João VI, para esta delicada tarefa: «Para esta missão diplomática de vanguarda, fora escolhido Sylvestre Pinheiro Ferreira, experimentado em cargos ministeriais, homem de valor real, cuja biographia se deveria divulgar, pela provisão política de que deu provas e pela cordialidade de seus sentimentos para com o Brasil.» (CALOGERAS, 1928:179-180).

Atualmente, (2015), pode-se afirmar que Silvestre Pinheiro, no campo dos Direitos Humanos, e no que respeita à liberdade dos povos escolherem o seu destino, foi um grande incondicional e persistente amigo do Brasil.

Tem-se conhecimento de um episódio, muito íntimo, entre ele e D. João VI, após a votação que se realizou, sobre se a Corte, instalada no Rio de Janeiro, deveria ou não voltar a Portugal, principalmente o monarca, em que Pinheiro Ferreira foi o único a votar contra o regresso: «No Conselho de Estado, a respeito da partida de el-rei, fôra Silvestre Pinheiro o único a votar contra, de que resultou dirigir-se no fim el-rei para o mesmo conselheiro, dizendo-lhe: “Que remédio Silvestre Pinheiro! Fomos Vencidos”. Honra muito a este publicista a lealdade do seu voto...» (VARNHAGEN, 1916:74).

Bibliografia

 

CALOGERAS, João Pandiá, (1928). “A Política Exterior do Império: II-O Primeiro Reinado”, in Revista do IHGB. Tomo especial. Parte 2ª. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, pp. 179-199

CERNEV, Jorge, (1986) “Silvestre Pinheiro Ferreira: Um Teórico Liberal da Monarquia Representativa”, in Convivium, Vol. 29, (1), São Paulo: Convívio, Jan./Fev. pp. 19-33

GERSON, Brasil, (1971). A Revolução Brasileira de D. Pedro I, São Paulo: s. Editor.

LIMA, Oliveira, (s.d.). O Movimento da Independência – O Império Brasileiro (1821-1889), 2a Ed. São Paulo: Melhoramentos, pp. 15,44,52,55-60,64-71,119,245.

PINHEIRO, (Cónego) Fernandes, (1980). Estudos Históricos. Acrescidos de Estudos Avulsos, Brasileiros Ilustres, 2a Ed., Rio de Janeiro: Livraria Editora Cátedra, pp.380-384.

RODRIGUES, José Honório, (1975c) Independência: Revolução e Contra Revolução: As Forças Armadas, Rio de Janeiro: Livraria Francisco Alves Editora, Vol. 3.

VARNHAGEN, Francisco Adolfo de, (1916). História de Independência do Brasil, São Paulo: s. Editora.

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