O Orçamento Participativo como um instrumento de gestão de políticas públicas

Por Fernando mezadri | 18/09/2010 | Política

Título: O Orçamento Participativo como um instrumento de gestão de políticas públicas

Fernando Mezadri
Licenciado em Filosofia pelo Centro Universitário de Brusque (UNIFEBE). Mestrando em Sociologia Política pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC)
fmezadri@terra.com.br

Resumo: O presente ensaio tem como objetivo, fazer correlações entre a prática das políticas públicas no Brasil através da Gestão pública. Neste contexto, o Orçamento Participativo como experiência de participação democrática vem trazer algumas contribuições, alguns limites e possibilidades para os municípios que o adotam como instrumento de ampliação da democracia e da transparência pública. Sabe-se que o OP, como parte dos novos arranjos institucional de participação civil na esfera governamental, vem fazendo parte dos mecanismos de gestão pública dos municípios, principalmente no que se refere ao orçamento e receitas do município. Nas cidades onde foram aplicados, como o caso de Porto Alegre (RS), demonstraram muita eficiência quanto a governança pública. Este ensaio, após a introdução, discute algumas noções de políticas públicas, na terceira etapa trata da gestão pública e dos espaços de participação. Na quarta etapa, o papel da governança no processo de implementação de políticas públicas analisando o caso do Orçamento Participativo e a última parte, breves considerações finais.

Palavras-Chave: Orçamento Participativo, Gestão Pública, Políticas Públicas, Participação Democrática.


I - INTRODUÇÃO


Nas últimas décadas, viemos acompanhando um aumento e incremento da participação no campo da gestão pública. O avanço progressivo da democracia participativa vem consolidando a atuação dos novos arranjos institucionais de participação da Sociedade Civil na esfera do governo e em seus processos de decisão e deliberação. A participação foi trazendo para si, mais do que um valor em si mesmo, um importante recurso estratégico para a sustentabilidade do governo, bem como para a formulação de políticas públicas, principalmente na área social.
Amplamente aceito pelas agências internacionais de desenvolvimento (Banco Mundial), bem como, pelas distintas correntes teóricas que se dedicam ao estudo da Democracia participativa e da gestão pública, o Orçamento Participativo (OP), experimento que se tornou característico no Brasil nos famosos casos de Porto Alegre (RS) e Belo Horizonte (MG) no início dos anos 90, disseminou em larga escala a noção de bom governo, de administração pública transparente e responsável. Sobre este modelo de bom governo, levanta-se uma agenda de reflexões sobre a efetividade destes mecanismos de participação no âmbito da discussão, mobilização e implementação de políticas públicas a partir dos trabalhos no interior do OP .
A intenção deste ensaio, não é a de avaliar casos concretos de Políticas públicas e experiências do OP; mas sim, de sistematizar informações e teorias sobre esta temática, fazendo uma breve análise crítica a partir de algumas teorias do Estado e seu diálogo com a Sociedade Civil, artigos especializados, conceitos e concepções de políticas públicas, Orçamento Participativo e democracia participativa.


II - A ATUALIDADE DO TEMA DAS POLÍTICAS PÚBLICAS NO BRASIL

O campo das políticas públicas, amplamente discutidos no Brasil; traz em seu bojo uma gama de reflexões sobre o papel que estas desempenham dentro dos governos, principalmente no que se refere ao impulso do desenvolvimento econômico e da promoção da inclusão social de grande parte da população .
Para Mead (1995); Lynn (1980); Peters (1986); Dye (1984) apud Souza (2003), as primeiras definições de políticas públicas em âmbito internacional , concentravam-se sobremaneira no papel dos governos em fazerem ou não determinadas ações; influenciando, alterando ou regulando o comportamento individual e coletivo. Que de uma forma unilateral, deixavam de lado o aspecto conflituoso e as possibilidades de cooperação destes com outras instituições e grupos sociais. Ora, as políticas públicas não passavam de um campo de conhecimento de competência dos governos de colocarem-se em ação, de produzirem resultados ou mudanças no mundo real (Souza, 2003, p.69).
Já no Brasil, estudos sobre políticas públicas foram realizados só recentemente, dando-se ênfase às estruturas ou instituições e também à negociação das políticas setoriais .

III - GESTÃO PÚBLICA E OS ESPAÇOS DE PARTICIPAÇÃO

O novo status adquirido pela participação no campo da gestão pública, corresponde a um fenômeno muito maior que a própria mudança política, teórica ou ideológica; mas sobretudo, a expansão capitalista. Nesta direção, o declínio do Welfare State desempenhou um papel importantíssimo na agenda da participação de diferentes grupos no processo de decisão e implementação de políticas públicas na área social.
No rastro da falência do Estado de Bem-Estar Social, novas formas de participação popular foram surgindo em busca da democratização e ampliação dos espaços públicos democráticos . E cada vez mais, a participação vem se tornando objeto de análise da literatura sobre Gestão e Administração Pública. Ora, enquanto se observa certo grau de esvaziamento e enfraquecimento nos reclames dos movimentos sociais dado a não polarização rivalizante entre Estado detentor na maldade e Sociedade Civil, pólo da virtude; novas formas de articulação sócio-política passaram a fulgurar no âmbito da gestão pública.
Nesta direção, estão os Conselhos Gestores de Políticas Públicas e o próprio Orçamento Participativo(OP). Inauguraram, por assim dizer, um novo contexto de relacionamento entre Estado (governo municipal) e Sociedade Civil . Contexto esse, pautado em um processo de maior aproximação, maior diálogo e participação dos atores da Sociedade Civil junto aos espaços de decisões até então, próprios do Estado. Neste caso, o orçamento municipal, até então domínio do Governo, passa por um processo de participação direta da comunidade através de planejamentos, proposições, deliberações e fiscalizações.
Inicia um processo novo para os gestores públicos: criar condições técnicas e instituições favoráveis para a participação de diferentes atores da sociedade civil representantes dos mais variados setores sociais legitimando o caráter democratizante de seus governos; sem perder a eficiência técnica-burocrática. As experiências do Orçamento Participativo vão nesta direção .
Debates sobre políticas públicas implicam em responder sobre qual o papel que aos governos desempenham na definição e implementação de políticas públicas no Brasil. Para (Peters)1998, apud (Souza) 2003, visões menos ideologizadas defendem que apesar da existência de limitações e constrangimentos, estes não inibem a capacidade das instituições governamentais de governar a sociedade, apesar de que, mais complexidades surjam no processo .

IV - O PAPEL DA GOVERNAÇA NO PROCESSO DE IMPLEMENTAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS: O CASO DO ORÇAMENTO PARTICIPATIVO

Reconhecendo as novas potencialidades relacionadas à ampliação do atores sociais envolvidos na gestão da coisa pública, a literatura especializada sugere a prática da Governança, prática esta, que vai ganhando cada vez mais espaço no âmbito das Ciências Políticas e Administrativas. Tais ciências se vêem na necessidade de criação de redes, parcerias e mobilização de saberes em duas direções: (a) para suprir necessidades administrativas e governamentais e (b) favorável à participação social e redistribuição de poder.
O cerco aos governos está se fechando de maneira acelerada. Além da esfera do Mercado, a Sociedade Civil também exerce tensões de força esperando respostas às demandas apresentadas.Quanto às pressões do Mercado, o Governo responde com as privatizações; da parte da Sociedade Civil, respondem com a ampliação nos espaços decisórios . Permitindo ou cedendo às pressões, o Estado, segundo Offe (1984), ainda mantém sua condição de produtor de seletividades. Com certas ressalvas teóricas, o Estado, principalmente na esfera do Governo Federal cria constrangimentos e atua como um seletor de demandas, inclusive em relação à implementação de políticas públicas .
Essas reviravoltas políticas radicais, tão comuns na política brasileira, dizem respeito não apenas à definição de prioridades e técnicas materiais, mas freqüentemente também, às formas de cooperação, participação e regulação dos conflitos entre executivo, legislativo e sociedade civil. Como em outras recentes democracias, no Brasil, onde as estruturas e processos são sujeitos a uma dinâmica peculiar, no que diz respeito à política municipal; estudos de políticas públicas exigem a realização de levantamentos primários sobre as dimensões "polics" e "polity" nos municípios escolhidos, indo dessa maneira além da dimensão material das políticas setoriais .
A prática da governança participativa dialoga diretamente com a crescente necessidade de se aumentar o grau de interação entre os diversos atores sociais. Para Kooiman (2002) apud Fley (2004), os gestores públicos deveriam não apenas se preocupar com a solução de problemas específicos, mas também com o desafio de governar interações . As experiêcias modernas de participação democrática representam importantes modelos de interações entre diferentes segmentos da sociedade que podem contribuir no processo de Governança pública.
O caso do Orçamento Participativo; arranjo político de participação da comunidade sobre parte da receita municipal, delegando e fiscalizando a aplicação dos recursos; vem se mostrando e se qualificando como um importante modelo de democracia participativa e que em alguns casos, modelando-se para ferramentas de governança urbana. Sujeito a mudanças permanentes, os próprios participantes do OP, influenciam de forma decisiva sua transformação e readequação. No balanço crítico acerca do Orçamento Participativo, Avritzer (2003) aponta para tentativas de apropriação da forma OP com o objetivo de transformar uma experiência bem sucedida de participação em uma nova forma de administração de recursos municipais. A experiência de Porto Alegre (RS) sempre se coloca como um caso sui generis para os estudos sobre a participação democrática .
Mesmo que ocorram criticas acerca desta experiência de participação, ao enfatizarem-se casos de contaminação por mecanismos clientelistas de cunho partidários, dirigismo governamental e instrumentalismo eleitoral; o estabelecimento de regras processuais e o princípio da publicidade das informações podem ser considerados cruciais para garantir transparência e um grau significativo de racionalidade discursiva.
Considerando os bons resultados obtidos pelo OP de Porto Alegre, esta experiência democrática, para Avritzer (2003), dada a complexidade dos procedimentos, pode ser considerada como um conjunto de regras, normas, e leis capazes de dar sustentabilidade às práticas participativas . Para Abers(1998) apud Frey(2004), Porto Alegre (RS) pode ser considerado uma experiência exemplar que mostra as possibilidades de uma política ativa de reforma democrática, que, através da disponibilização de um ambiente favorável, contribui para o fortalecimento de grupos locais da Sociedade Civil e, através de uma cooperação direta e estreita com as comunidades locais, em vista do aumento das capacidades organizacionais , sem se render à tentativas de cooptação .


V - CONSIDERAÇÕES FINAIS

Em decorrência da maior visibilidade e transparências das políticas públicas, a autogestão social converte-se no paradigma do novo arranjo institucional que faz da cooperação social a via para a provisão de serviços públicos. As políticas públicas nesta direção caminham sempre para um estágio de policy analysis, princípio este fundamental para a análise das políticas públicas.
Os estudos de políticas públicas enfocam sobremaneira, casos empíricos e seus resultados, como a exemplo do Orçamento Participativo apresentado anteriormente. À medida que cresce o número de estudos específicos realizados nos vários campos da política, aumenta o conhecimento das políticas específicas, bem como o conhecimento teórico referente às inter-relações entre estruturas e processos do sistema administrativo por um lado e os conteúdos da política estatal por outro. No caso do Brasil, dentro de um processo de análise de políticas públicas, é preciso tomar como variáveis o contexto da política municipal no país. Devem-se considerar certas especificidades do cenário político de cada município. No caso do OP, tivemos no Brasil experiências difusas acerca da mesma prática com resultados igualmente controvertidos.
Por fim, espera-se estar conquistado para o Brasil, no âmbito das práticas e experiências de participação democrática na modalidade dos novos arranjos institucionais de participação, as chamadas comunidades epistêmicas, isto é, uma rede de profissionais com "expertise" e competência reconhecida para produção de saberes e posteriormente ajudando os Estados a identificar interesses, enquadrar as questões do debate coletivo, propondo políticas específicas e identificando questões de destaque para negociações .