O nascimento da clínica Michel Foucault
Por Elizangela Marques Lacerda | 30/04/2012 | PsicologiaULBRA - INSTITUTO LUTERANO DE ENSINO SUPERIOR DE ITUMBIARA
Curso: Psicologia
Período: 7º
Professor Psicanalista: Wellington Luiz Bessa
Disciplina; Psicologia Clínica.
Aluna: Elizângela Marques Lacerda.
30/03/2012.
LIVRO: O NASCIMENTO DA CLÍNICA – MICHEL FOUCAULT
RESENHA
Este livro é composto de prefácio e dez capítulos. No prefácio explica quanto à linguagem, a partir de que momento e qual modificação semântica ou sintática puderam-se reconhecer a transformação da mesma em discurso racional. Fala que segundo Descartes e Melenbranch, ver era perceber, porém, tratava-se de, sem despojar a percepção do seu corpo sensível, torna-la transparente para o exercício do espirito. No final do século XVIII, ver consiste em deixar a experiência em sua maior opacidade corpórea; o solido; o obscuro, a densidade das coisas encerradas em si próprias têm poderes de verdade que não provem da luz, mas da lentidão do olhar que os percorre, contorna e, pouco a pouco, os penetra, conferindo-lhes apenas sua própria clareza. Cabia a esta linguagem das coisas e, sem duvida, apenas a ela, autorizar, a respeito do individuo, um saber que não fosse simplesmente de tipo histórico ou estético. Explica que a experiência clinica foi tomada como um confronto simples, sem conceito, entre um olhar e um rosto, espécie de contato anterior a todo discurso e livre dos embaraços da linguagem, pelo qual dois indivíduos vivos estão em uma situação comum, mas não reciproca. Expõe que a medicina como ciência clínica apareceu sob condições que definem, com sua possibilidade histórica, o domínio de sua experiência e a estrutura de sua racionalidade. Falar sobre o pensamento dos outros, procurar dizer o que eles disseram é, tradicionalmente, fazer uma análise do significado. O aparecimento da clínica como fato histórico, deve ser identificado com o sistema destas reorganizações. Esta nova estrutura se revela, mas certamente não se esgota na mudança que substituiu a pergunta: o que é que você tem? Por onde começava no século XVIII, o dialogo entre o médico e o doente, com uma gramática e seu estilo próprios, por outra que se reconhece no jogo da clínica e o principio de todo discurso: onde lhe dói? A clínica deve sua real importância ao fato de ser uma reorganização em profundidade não só dos conhecimentos médicos, mas da própria possibilidade de um discurso sobre a doença. Ao final do prefácio é explicado que este livro não é escrito por uma medicina contra outra, ou contra a medicina por uma ausência de medicina.
Capítulo I – Espaços e Classes – explica que a doença é percebida em um espaço de projeção sem profundidade e de coincidência sem desenvolvimento. Existe apenas um plano e um instante; e que a principal perturbação é trazida com e pelo próprio doente. A pura essência nosológica, que fixa e esgota, sem deixar resíduo, o seu lugar na ordem das espécies, o doente acrescenta, como perturbações, suas disposições, sua idade, seu modo de vida e de toda uma série de acontecimentos que figuram como acidentes em relação ao núcleo essencial. E que para conhecer a verdade do fato patológico, o médico deve abstrair o doente. E o conhecimento da doença é a bússola do médico; o sucesso da cura depende de um exato conhecimento da doença. No período de invasão o médico deve apenas ficar na expectativa, pois os começos da doença existem para fazer conhecer sua classe. Diz ainda que imbricação dos sintomas, simultaneidade de suas formas extremas: isso não basta para formar uma doença; e que não há um processo de evolução em que a duração traria por si própria novos acontecimentos; o tempo é integrado como constante nosológica e não como variável orgânica. O tempo do corpo não modifica, e muito menos determina o tempo da doença. O que faz o corpo essencial da doença se comunicar com o corpo real do doente não são os pontos de localização, nem os efeitos de duração e sim é a qualidade. A doença e o corpo só se comunicam através do elemento não espacial da qualidade. E que quanto aos médicos, esses devem se limitar a conhecer as forças dos medicamentos e das doenças por meio de suas operações; devem observá-las com cuidado, se aplicar em conhecer suas leis e não se esgotar na investigação das causas físicas. A percepção da doença no doente supõe um olhar qualitativo; para aprender a doença é preciso olhar onde há secura, ardor, excitação, onde há umidade, ingurgitamento, debilidade. Percepção sutil das qualidades é percepção das diferenças de um caso de outro, fina percepção das variantes; é preciso toda uma hermenêutica do fato patológico a partir de uma experiência modulada e colorida; medem-se variações, equilíbrios, excessos ou defeitos. O que a medicina chama de historias particulares, na verdade são os efeitos de multiplicação provocados pelas variações qualitativas das qualidades essenciais que caracterizam as doenças. O individuo doente se encontra no ponto em que aparece o resultado dessa multiplicação. Sendo assim, o sujeito é uma totalidade, daí sua posição paradoxal. Quem desejar conhecer a doença deve subtrair o individuo com as suas qualidades singulares. A medicina das espécies empenha-se em uma atenção renovada do individual; atenção essa cada vez mais impaciente e menos capaz de suportar formas gerais de percepção, as apressadas leituras de essência. A percepção médica não deve se dirigir nem às séries, nem aos grupos; deve estruturar-se como um olhar através de uma lupa que, aplicada as diversas partes de um objeto, permite ainda notar outras partes que sem ela não se distinguiria, e empreender o infinito trabalho do conhecimento dos frágeis singulares. Segundo a medicina das espécies, a doença possui, por direito de nascimento, formas e momentos estranhos ao espaço das sociedades. Mas, quanto mais complexo se torna o espaço social em que está situada, mais ela se desnaturaliza. À medida que se ascende na ordem das condições e que a rede social se fecha em torno dos indivíduos, a saúde parece diminuir gradativamente; as doenças se diversificam e se combinam; seu numero já é grande. Em resumo, a boa medicina deverá receber do Estado testemunho de validade e proteção legal; a ele cabe estabelecer a existência de uma verdadeira arte de curar. E a medicina da percepção individual, da assistência familiar, dos cuidados a domicilio só pode encontrar apoio em uma estrutura coletivamente controlada e que recobre a totalidade do espaço social.
Capítulo II – Uma Consciência Política – no referido capítulo diz que com relação à medicina das espécies, as noções de constituição, doença e epidemia tiveram, no século XVIII, destino singular. Cita ainda que nem toda constituição é epidemia, mas a epidemia é uma constituição de tessitura mais compacta, de fenômenos constantes e mais homogêneos. A epidemia é mais do que uma forma particular da doença; é no século XVIII, um modo autônomo, coerente e suficiente de ver a doença; dá-se o nome de doenças epidêmicas a todas aquelas que atacam ao mesmo tempo, e com características imutáveis, grande número de pessoas. Contagiosa ou não, a epidemia tem uma espécie de individualidade histórica. Daí a necessidade de usar com ela um método complexo de observação. E a medicina das epidemias se opõe a uma medicina das classes, como a percepção coletiva de um fenômeno global, mas único e nunca repetido, pode se opor à percepção individual daquilo que uma essência pode constantemente revelar de si mesma e de sua identidade na multiplicidade dos fenômenos. Os tratados do século XVIII, instituições, aforismos, nosologias encerravam o saber médico em um espaço fechado: o quadro formado podia não se completar nos detalhes ou, por ignorância, estar em desordem em alguns pontos; em sua forma geral, era exaustivo e fechado. O capítulo em questão explica também sobre a unidade do olhar médico, explana que não é o circulo do saber em que ele se completa, mas a totalização aberta; e que seu suporte não é a percepção do doente em sua singularidade, mas é uma consciência coletiva de todas as informações que se cruzam, crescendo em uma ramagem complexa e sempre abundante, ampliada finalmente até as dimensões de uma história, de uma geografia, de um Estado. Neste capítulo faz uma analogia entre os padres e os médicos, situando-os em status iguais, um como o padre da alma e o segundo como padre do corpo; referindo-se até no que tange há honorários. Em suma, acredito que este assunto deveria sim haver, como há, informações históricas; porém com menos detalhes e citações.
Capítulo III – O Campo Livre – Neste capítulo são feitos questionamentos como: das estruturas hospitalares; o direito do exercício e o ensino médico. Fala muito da história das escolas de medicina da França ao final dos anos 1.700. O foco do assunto deveria ter sido mais resumido, informativo e atual. E ao final do mesmo, diz que o olhar médico, cujos poderes começam a ser reconhecidos, ainda não recebeu, no saber clínico, suas novas condições de exercício; ele é apenas um segmento da dialética do Iluminismo transportado para o olho do médico.
Capítulo IV – A Velhice da Clínica – no referido capítulo é explanado que desde o século XVIII, a medicina tem tendência a narrar sua própria historia como se o leito dos doentes tivesse sido sempre um lugar de experiência constante e estável, em oposição às teorias e sistemas que teriam estado em permanente mudança e mascarado, sob sua especulação, a pureza da evidencia clinica. O teórico teria sido o clemente de permanente modificação. E é neste elemento teórico que o saber medico marcaria sua frágil relatividade. A clínica, pelo contrário, teria sido o elemento de sua acumulação positiva: é o constante olhar sobre o doente, a atenção milenar, e, no entanto nova a cada instante. No invariante da clínica, a medicina teria ligado à verdade e o tempo. Durante muito tempo, sem dúvida, a experiência médica continuou aberta e soube encontrar, entre o saber e o ver, um equilíbrio que a protegesse do erro. O representante mais ambíguo desse equilíbrio foi Hipócrates que reduziu a medicina a sistema, a observação foi abandonada e a filosofia nela se introduziu. E foi esta ocultação que permitiu a longa história dos sistemas, com a multiplicidade das diferentes seitas opostas e contraditórias. Neste capítulo também fala que para compreender o sentido e a estrutura da experiência clínica é preciso refazer a história das instituições em que se manifestou seu esforço de organização, cuja trajetória é tratada esmiuçadamente. E finda reforçando que no século XVIII a clínica é uma figura muito mais complexa do que um puro e simples conhecimento de casos. Porém, ela não desempenhou papel especifico no movimento do conhecimento cientifico; formou uma estrutura marginal que se articula com o campo hospitalar sem ter a mesma que visa à aprendizagem de uma pratica que resume mais do que analisa e que nos últimos anos do mesmo século, a clínica foi bruscamente reestruturada e que separada do contexto em que se originou, passa o saber a fazer corpo com a totalidade da experiência médica.
Capítulo V – A lição dos Hospitais – neste capítulo é explicado que os médicos improvisados ou os empíricos engalanados são tanto mais temíveis quanto à hospitalização da época dos doentes pobres se tornava cada vez mais difícil. Como por exemplo, em Poitiers, em 1793, foram despedidos os 200 doentes do Hôtel-Dieu para dar lugar aos feridos militares, a quem o Exercito pagava pensão, ou seja, se não tinha dinheiro, não possuía o direito ao hospital e ao tratamento. Fala que devido à demanda de charlatães da medicina, nasciam espontaneamente organismos de proteção de origem popular. E que nesta época, em várias grandes cidades, as administrações, não esperavam as decisões do Poder Legislativo: decidiram estabelecer por si mesmas um controle sobre os que pretendem exercer a medicina; criam comissões, formadas por médicos do Antigo Regime, que deviam julgar os títulos, o saber e a experiência dos recém-formados. Explana que os alunos deveriam ser exercitados nas experiências químicas, nas dissecações anatômicas, nas operações cirúrgicas, nos aparelhos. Deveriam ler pouco e ver e fazer muito, se exercitar nos leitos dos doentes. A clínica se tornaria, portanto, um momento essencial da coerência cientifica, utilidade social e pureza política de uma nova organização médica. O ensino clinico deveria ser assegurado por professores suficientemente remunerados para poderem a ele se dedicar. O publico seria amplamente admitido na nova escola de saúde, era esperado que todos os que praticavam a medicina sem terem formação suficiente, viriam espontaneamente completar sua experiência. Assim, seriam escolhidos em cada distrito alunos que tivessem boa conduta, costumes puros, amor à República e ódio aos tiranos, cultura bem cuidada e acima de tudo, conhecimento de algumas ciências que serviam de preliminar para a arte de curar; daí eles seriam enviados à Escola Central de Medicina para que se tornassem, dentro de três anos, oficiais de saúde. Ainda neste capítulo é dito que a medicina clinica não era uma medicina fechada no primeiro grau do empirismo e que procurava reduzir seus conhecimentos, sua pedagogia, por um ceticismo metódico, à constatação única do visível, e que num primeiro momento, a medicina só se defini como clínica ao se definir como saber múltiplo da natureza e conhecimento do homem em sociedade. Quanto à clínica, ela não tinha o valor de formação que dela se esperava. Deixo ratificado que neste capítulo fala-se de muita informação que poderia ser desconsiderada, como por exemplo: informações sobre artigo de constituição e seus idealizadores; modificações de decretos dizendo o que deveria ou não ser; informações de convenções, cidades, o que era ou não aceito e entrar mais afundo no tópico do assunto a que se destina. A única inovação de fato real foi à criação de uma prova de clínica em que o candidato médico exporia junto ao leito do doente o caráter da espécie de doença e seu tratamento. Em suma, diz que o hospital se encontrava em regime de liberdade econômica, a possibilidade de interessar o rico; a clínica constituía a inversão progressiva da outra parte contratante; ela era por parte do pobre, o interesse pago pela capitalização hospitalar consentida pelo rico, e que era necessário compreender em seu excesso, desde que se tratava de uma indenização que era do tipo do interesse objetivo para a ciência e do interesse vital para o rico. O hospital se tornava rentável para a iniciativa privada a partir do momento em que o sofrimento que nele vinham procurar alivio era transformado em espetáculo. Ajudar acabava por paga e o olhar do médico era de uma parcimônia bastante rigorosa nas trocas contábeis de um mundo liberal.
Capítulo VI – Signos e Casos – Este capítulo se inicia enumerando a extensão do domínio clínico, não como um tirano cruel que reina sobre escravos, mas como um pai terno que vela pelo destino de seus filhos. Explica que a clínica não é a primeira tentativa de ordenar uma ciência pelo exercício e decisões do olhar. Porém antes, faz uma retrospectiva da história natural para conhecer as estruturas, a unidade da criação e, portanto, seu lugar singular na mesma. Acrescenta que a clínica pede ao olhar tanto quanto a história natural. Fala do modelo naturalista, a que a medicina em parte se submetera no século XVIII. Explica sobre a estrutura linguística do signo, e a aleatória, do caso. E que o sintoma é a forma como se apresenta a doença e deixam transparecer a figura invariável, um pouco em recato, visível e invisível da doença. Já o signo anuncia, prognostica o que vai se passar; faz a anamnese do que se passou; diagnostica o que ocorre atualmente. É informado ainda que a formação do método clínico esteja ligado à emergência do olhar do médico no campo dos signos e dos sintomas. Explica que os sintomas constituem uma camada primária indissoluvelmente significante e significada; e que é a intervenção de uma consciência que transforma o sintoma em signo; e o ser da doença é inteiramente enunciável em sua verdade. Este capítulo divaga sobre a história e seus participantes, remonta várias trechos ao século XVII, mas explica a que veio. Fala da complexidade de combinação; do principio da analogia; da percepção das frequências; do cálculo dos graus de certeza. E finalizando, Selle (mencionado no capítulo em questão), dizia que a clínica nada mais era do que o próprio exercício da medicina junto ao leito dos doentes, e que ela se identificava com a medicina prática propriamente dita. Muito mais do que uma retomada ao velho empirismo médico, a clínica é a vida concreta, uma das explicações primeiras da Análise. E questiona o porquê separar a ciência dos médicos daquela dos filósofos? Por que distinguir dois estudos que se confundem por uma origem e um destino comuns? E termina dizendo que a clínica abriu um campo que se tornou visível pela introdução no domínio patológico de estruturas gramaticais e probalísticas.
Capítulo VII – Ver, Saber – Este capítulo começa dizendo que Hipócrates, um estudioso da época, só se ateve à observação, desprezando todos os sistemas. Somente seguindo seus passos a medicina pode ser aperfeiçoada; porém, os privilégios que a clínica acabara de reconhecer na observação eram muito mais numerosos e de natureza inteiramente diversa dos prestígios que lhe concedia a tradição. Sobre o olhar da observação, é frisado que o mesmo que observa se abstém de intervir: é mudo e sem gesto. E que na temática do clínico, a pureza do olhar está ligada a certo silêncio que permite escutar e que toda teoria se cala ou se esvanece sempre no leito do doente. Assinala ainda, que o olhar clínico tem propriedade d ouvir uma linguagem no momento em que percebe um espetáculo; na clínica o que se manifesta é o que fala. E quanto à oposição entre clínica e experimentação é que o observador lê a natureza, aquele que faz a experiência a interroga. Assim, observação e experiência se opõem sem se excluir e é natural que a primeira conduza à segunda, mas com a condição de que esta só interrogue no vocabulário e no interior da linguagem que lhe foi proposta pelas coisas observadas. E deixa claro que é necessário não confundir a observação com a experiência; esta é o resultado ou o efeito; a outra é o meio ou a causa; a observação conduz naturalmente à experiência. Acrescenta ainda que a observação é a lógica ao nível dos conteúdos perceptivos, e a arte de observar seria uma logica para os sentidos que ensinaria mais particularmente suas operações e seus usos, ou seja, a lógica é a base de observar. E que a observação clínica supõe a organização de dois domínios conjugados: os domínios hospitalar e o pedagógico. Neste capítulo a clínica é definida como lugar de encontro do médico com o doente e o mesmo é determinado por três meios: A alternância dos momentos falados e dos momentos percebidos em uma observação; O esforço para definir uma forma estatutária de correlação entre o olhar e a linguagem e O ideal de uma descrição exaustiva. Acrescenta ainda que a arte de descrever os fatos é a suprema arte em medicina: tudo empalidece diante dela e que a clínica médica poderia ser considerada tanto como ciência, quanto como modo de ensino da medicina. Em resumo, neste capítulo é dito que se dever “saber ver”, observar, embasar as observações nas teorias, mas não interromper as observações para tal. Porém, o referido capítulo possui muitas informações que poderiam ser resumidas, ou seja, poderiam ser eliminados muitos detalhes para que fosse alcançado um entendimento mais imediato.
Capítulo VIII – Abram Alguns Cadáveres – Este capítulo começa explanando que durante 150 anos se repetia a mesma explicação: a medicina só pôde ter acesso ao que a fundava cientificamente contornando com lentidão e prudência, um obstáculo maior, aquele que a religião, a moral e obtusos preconceitos opunham à abertura de cadáveres. Fala que só tinham acesso os corajosos que driblavam as proibições da Igreja, estudando às noites em cemitérios e abrindo cadáveres clandestinamente. E que quando a filosofia introduziu sua luz aos povos civilizados, foi permitido lançar um olhar escrutador aos restos inaminados do corpo humano, e aqueles despojos, antes miserável presa dos vermes, tornaram-se a fonte fecunda das mais úteis verdades. Porém, o referido capítulo explica que esta reconstituição é historicamente falsa. Morgani, em meados do século XVIII, não teve dificuldades em fazer autópsias; tampouco Hunter, alguns anos mais tarde; os conflitos narrados por seu biógrafo são anedóticos e não indicam uma oposição de princípio. É interessante frisar que no art. 25 do decreto de Marly que diz: Ordenamos aos magistrados e diretores dos hospitais que forneçam cadáveres aos professores para as demonstrações de anatomia e o ensino das operações cirúrgicas. Portanto, não havia nenhuma escassez de cadáveres no século XVIII, nem sepulturas violadas ou missas negras anatômicas. Há uma ilusão do Antigo Regime da Idade Média, esta ilusão tem um sentido preciso na história da medicina; funciona como justificação retrospectiva; explica que se as velhas crenças tiveram durante tanto tempo tal poder de proibição, foi porque os médicos deviam sentir, no fundo de seu apetite cientifico, a necessidade recalcada de abrir cadáveres. Aí está o erro e a razão silenciosa que o fez ser cometido tão frequentemente e que a partir do dia em que se admitiu que as lesões explicavam os sintomas e que a anatomia patológica fundava a clínica, foi preciso convocar uma história transfigurada, em que a abertura dos cadáveres, ao menos a título de exigência científica, precedia a observação, finalmente positiva, dos doentes; a necessidade de conhecer o morto já devia existir quando aparecia a preocupação de compreender o vivo. Neste capítulo é falado muito sobre Bichat e como seguiu seus estudos em relação às dissecações humanas. É explicado ainda que da mesma maneira que o indivíduo é único, subjetivo, singular; as patologias podem ser as mesmas, porém, atacam de formar diferentes os tecidos humanos. E que uma clínica dos sintomas procura om corpo vivo da doença; a anatomia só lhe oferece o cadáver para ser estudado. E que o acesso do olhar médico ao interior do corpo doente não é a continuação de um movimento de aproximação que teria se desenvolvido, mais ou menos regularmente, a partir do dia em que o olhar, que começava a ser científico, do primeiro médico se dirigiu, de longe, ao corpo do primeiro paciente; é o resultado de uma reformulação ao nível do próprio saber e não ao nível dos conhecimentos acumulados, afinados, aprofundados, ajustados. E finalizando, com Bichat, o olhar médico gira sobre si mesmo e pede à morte contas da vida e da doença; à sua imobilidade definitiva pede contas de seus tempos e seus movimentos e fez mais do que libertar a medicina do medo da morte, ele integrou a morte em um conjunto técnico e conceitual em que ela adquiriu suas características específicas e seu valor fundamental de experiência. De tal modo que o grande corte na história da medicina ocidental data precisamente do momento em que a experiência clínica, tornou-se o olhar anátomo-clínico. Este capítulo, mesmo tendo muitas informações históricas que a meu ver poderia ser desconsiderada, pois remete há assuntos já ditos são de suma importância no que tange às explicações de como se originou as autópsias e os porquês de tais procedimentos, já que diante da abertura de cadáveres os médicos e profissionais em geral da medicina puderam e podem colaborar imensamente com a medicina e possíveis curas para diversas patologias, pois só se conhecendo o interior do corpo humano é que os referidos profissionais podem saber como é o processo desta máquina fantástica que é o ser humano.
Capítulo IX – O Invisível Visível – Este capítulo fala da vista da morte, a doença tem uma terra, uma pátria demarcável; os valores locais definem suas formas. A partir do cadáver se percebe a doença viver. Fala de princípios, tais como: Principio da comunicação tissular; Principio da impermeabilidade tissular; Princípio da penetração em parafuso; Princípio da especificidade do modo de ataques dos tecidos; Principio da alteração da alteração. Em resumo estes princípios se definem as regras do curso patológico e descrevem por antecipação seus possíveis caminhos. Fixam a rede de seu espaço e de seu desenvolvimento, fazendo aparecer em transparência às nervuras da doença. É também explicado neste capítulo que no século XVIII, a doença pertencia tanto à natureza quanto à contra natureza, na medida em que tinha uma essência ordenada, mas que era de sua essência comprometer a vida natural. Vários autores opinam neste capítulo sobre o referido assunto e encerra filosofando que a morte abandonou seu velho céu trágico e tornou-se o núcleo do homem: sua invisível verdade, seu visível segredo.
Capítulo X – A Crise das Febres – Este capítulo trata do último processo pelo qual a percepção anátomo-clínica encontra a forma de seu equilíbrio. Aqui é mostrado um histórico aos anos de 1.800 em que a teoria das febres essenciais e a crítica de Broussais ocupavam um espaço considerável na pesquisa médica. Laennec admite nesta época a divisão das doenças em duas grandes classes: as que são acompanhadas de uma lesão evidente em um ou vários órgãos, as chamadas doenças orgânicas e aquelas que não deixam em parte alguma do corpo uma alteração constante, são as chamadas doenças nervosas. As neuroses e febres essenciais eram consideradas por todos no final do século XVIII e início do XIX, doenças sem lesão orgânica. E que neste período entendia-se por febre uma reação finalizada do organismo que se defende contra um ataque ou uma substancia patógenos, ou seja, seria um signo não da doenças, mas da resistência à doença, em suma, seria um movimento de excreção com intenção purificadora. Posteriormente, porém no mesmo período fala de um número considerável de febres descobertas na época. Com observações, estudos e persistência, foi declarado que a doença nada mais era do que um movimento complexo dos tecidos em reação a uma causa irritante. Neste interim é dito que aí estava a essência do patológico, pois não mais existia nem doenças essenciais nem essências das doenças. É explicado ainda que a febre nada mais seja do que uma aceleração do fluxo do sangue, com aumento da calorificação e uma lesão das funções principais. Acrescenta que seria preciso buscar na fisiologia os traços característicos das doenças e elucidar por análise órgãos sofredores e a medicina comporta os mesmos em três momentos: Determinar qual é o órgão que sofre; Explicar como um órgão se tornou sofredor; Indicar o que é preciso fazer para que deixe de sofrer. Este capítulo termina dizendo que a revolução médica que em 1816 Broussais lançara seus fundamentos, é considerado pelo autor, incontestavelmente, a mais notável que a medicina sofreu nos tempos modernos.
Conclusão – Ao decorrer da leitura, eu me perguntava como poderia expressar-me sobre a mesma, não ousava expor aqui meus pensamentos, mas ao final dos capítulos me surpreendi com o primeiro paragrafo da conclusão que elucida de forma clara e objetiva tudo que se passa, neste momento, em minha subjetividade quanto ao livro em questão, diz: “O livro que se acaba de ler, é entre outros, o ensaio de um método no domínio tão confuso, tão pouco e tão mal estruturado da história das ideias”. Confuso, esta sim é a palavra que procurava para descrever a leitura do livro O Nascimento da Clínica de MICHEL FOUCAULT, palavra esta que define minha visão dos assuntos trazidos à tona. Porém, não posso deixar de mensurar que acredito eu, na minha humilde opinião, que consegui abstrair e entender os assuntos tratados, mas não e claro que não, com total domínio e propriedade; mas pude rever algumas informações que acreditava serem verdadeiras, como no capítulo VIII, que fala sobre as dissecações dos cadáveres. Para mim, foi surpreendente, saber que o acesso aos mesmos não eram assim tão difíceis e nebulosos, pelo menos, foi o que entendi do assunto. Entendi também, que em relação à medicina, a observação, sofreu e sofre, como tudo neste mundo, uma inegável evolução. Claro, ninguém nasce sabendo de tudo nunca, portanto, há a necessidade de experienciar situações, observar, analisar, questionar e talvez, chegar a uma conclusão que abasteça de forma coerente e sem rótulos questões que não param de aparecer e nos confrontar desde o início dos tempos e que sempre teremos desafios a serem vencidos. Finalizando, foi boa a leitura, me permitiu pensar sobre como surgiu à clínica, a observação, o pessoal, afinal não somos fabricados em série, todos nós temos uma subjetividade, singularidade e isso nos torna únicos. Farei a leitura deste livro em outras oportunidades, afinal tenho muito a aprender ainda, quem sabe depois de outras leituras deste, terei outra opinião, até mais esclarecedora, afinal é melhor mudar de opinião do que não ter opinião nenhuma para mudar.