O Instituto da União Estável na Carta Magna e a Lei da Convivência
Por Carla Michelle Carneiro | 15/03/2009 | DireitoO instituto da união estável na Carta Magna e a Lei da Convivência.
Carla Michelle Carneiro – Bacharelanda em Direito pela Universidade Estadual de Feira de Santana.
A Constituição Federal, promulgada em 1988, traz à lume as denominações família e entidade familiar. A princípio designadas por vocábulos diferentes, estas instituições acabam por ter respeitada a essência material/substancial que lhes assemelha: a conjunção dos indivíduos em prol da convivência e dos interesses em comum. Neste sentido, uma e outra instituição recebem tratamento isonômico quanto à sua natureza, pois uma mesma é a finalidade para a qual existem.
Em seu art. 226, caput, a família é instituição basilar para a sociedade, constitui, portanto, a célula mater responsável por capacitar o indivíduo para a convivência com os demais, mediante a sua inserção e integração sociocultural.É caracterizada pelos elos da afetividade, numa situação de permanência e continuidade.
A família, no âmbito constitucional, é "polissêmica". Para o seu reconhecimento são desnecessárias a formalização da união por meio do casamento, a existência de prole e a consangüinidade dos filhos. Mesmo a união de pessoas do mesmo sexo, cujos objetivos estejam o de partilharem vida e interesses em comum, são tratadas constitucional e substancialmente como família, embora não de modo expresso pela norma. (BULOS, 2002, p. 1282, 1283)
Os parágrafos terceiro e quarto da Magna Carta trazem o reconhecimento dessa diversidade gregária quanto às uniões estáveis entre homens e mulheres e quanto ao agrupamento formado por pai ou mãe e a prole, respectivamente. Entretanto, é omissa quanto ao caráter das uniões homoafetivas, deixando a encargo dos doutrinadores a posição a respeito, se familiar ou não.
Estes parágrafos são regulamentados pela Lei n. 9278, de 10 de maio de 1996, denominada Lei da Convivência, cujo artigo primeiro infere serem os conviventes da reconhecida entidade familiar em questão, o homem e a mulher. Isto acaba por apartar, para as uniões de pessoas do mesmo sexo, o caráter familial. Grosseiramente, pois, a informalidade e, inda mais, a marginalidade da existência das uniões homoafetivas só explica-se por uma cegueira proposital do legislador em ocultar da ordem jurídica a realidade da livre agregação dos indivíduos.
Esta indiferença proveniente de um moralismo despropositado só se explica pelo fato de estarem ameaçados, deputados e senadores, de perder o apoio de suas bases religiosas. É oportuno observar que o fato da elegibilidade política concorre para o desenvolvimento de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, na defesa do Estado que é LAICO, embora fundado sob a proteção divina. Em contrapartida, a Instrução Normativa n. 57, de 10 de outubro de 2001, por força de decisão judicial, reconhece o instituto da união estável entre homossexuais para efeitos de concessão de benefícios previdenciários, comprovadas a convivência pública e estável e a dependência econômica.
Equiparam-se, pois, os direitos e deveres recíprocos entre os conviventes (art. 2o e incisos), àqueles referidos no art. 1566 do Código Civil de 2002 (art. 231, CC/1916) para os cônjuges. Quanto à fidelidade recíproca, entende-se ser de fundamental importância para a convivência harmoniosa e legítima entre homem e mulher sob proteção jurídica, haja vista que a sociedade brasileira assim o exige para efeitos de moralidade e estabilidade. Todavia, é pesaroso lembrar que o legislador tenha se imiscuído de expressar este inciso na Lei de Convivência.
Quanto ao patrimônio, os bens havidos durante a união são considerados de esforço comum, salvo estipulação contratual diversa acordada entre os conviventes (art. 5o). Podem requerer a qualquer tempo:
1. A conversão da situação de convivência pública e estável para a de casamento no Ofício de Registro Civil onde estão domiciliados (art. 8o);
2. A dissolução da união na competência do Juízo da Vara de Família (art. 9o) com possibilidade de assistência material a título de alimentos para o convivente sem condições econômicas de manter-se (art. 7o).
Cabe ressaltar para efeitos de justificativa de dissolução de união estável, e conseqüente apuração de culpa de qualquer dos conviventes, pode-se valer dos justos motivos elencados nos incisos do art. 1573 do CC/02 para a separação judicial, inclusive no que tange à infidelidade cuja essência da conduta ofensiva equivale ao adultério em substância. Dissolvida por motivo de falecimento de um dos conviventes, o sobrevivente possui direito real de habitação no imóvel da residência familiar (§ único do art. 7o).
A Lei n. 8971, dos direitos dos conviventes à alimentos e à sucessão.
Com relação à prestação material dos alimentos, o art. 1o da Lei em questão, datada de 29 de dezembro de 1994, remete à Lei n. 5478, de 25 de julho de 1968, republicada em 8 de abril de 1974. Infere este direito de assistência material a título de alimentos à mulher que comprove união com homem solteiro, separado judicialmente, divorciado ou viúvo, ou ao homem que comprove união com mulher sob as mesmas condições, dês que comprovada a necessidade da subsistência e não haja constituído nova união. Estão revogadas as referidas leis por força do Decreto n. 2428, de 17 de dezembro de 1997, o qual promulga a Convenção Interamericana sobre Obrigação Alimentar.
No que pertine à norma sucessória do art. 2o e incisos, caso não constitua nova união, o companheiro sobrevivente participará do patrimônio do de cujus: em um quarto, se houver deixado filhos o falecido; em metade, se não houver filhos; no todo, se não houver descendentes ou ascendentes em questão. Quanto aos bens havidos mediante esforço comum durante o curso da união, o sobrevivente possui direito à metade deles, conforme dispõe o art. 3o.