O Instituto da Compensação De Crédito Tributário com Advento da Lei nº 8383 de 1991

Por Steffani Carvalho de Santana | 12/05/2017 | Direito

 Código Civil de 1916 em seu artigo 1.017, vedava a compensação de credito das Fazendas Publicas, salvo em hipótese previstas em leis esparsas e nos regimentos das próprias Fazendas, onde ocorreria compensação caso este credito da Administração Publica fosse oponível ao contribuinte.

Tal dispositivo, atualmente revogado, foi base para a compensação que conhecemos hoje no artigo. 170 do Código Tributário Nacional, disciplinado pelo art. 66 da Lei 8.383/91, que nos mostra ainda mais a origem obrigacional da compensação e do Direito Tributário:

 

“Art. 170. A lei pode, nas condições e sob as garantias que estipular, ou cuja estipulação em cada caso atribuir à autoridade administrativa, autorizar a compensação de créditos tributários com créditos líquidos e certos, vencidos ou vincendos, do sujeito passivo contra a Fazenda pública. (Vide Decreto nº 7.212, de 2010)”.

 

“Parágrafo único. Sendo vincendo o crédito do sujeito passivo, a lei determinará, para os efeitos deste artigo, a apuração do seu montante, não podendo, porém, cominar redução maior que a correspondente ao juro de 1% (um por cento) ao mês pelo tempo a decorrer entre a data da compensação e a do vencimento”.

E ainda:

“Art. 170-A. É vedada a compensação mediante o aproveitamento de tributo, objeto de contestação judicial pelo sujeito passivo, antes do trânsito em julgado da respectiva decisão judicial. (Artigo incluído pela Lei Complementar nº 104, de 2001)”.

 A compensação do artigo 66, da Lei nº 8.383/91, refere-se ao lançamento por homologação, quando diz que “o contribuinte poderá efetuar a compensação”, ou seja, pode ser praticada pelo contribuinte em face de autoridade administrativa.

Também nos termos da Lei nº 8.383/91 a compensação somente pode ocorrer entre tributos da mesma espécie, com créditos e débitos líquidos e certos, e ainda entre tributos federais de espécies diferentes.

Completa o artigo 39, da Lei 9.250/95, que a compensação só pode ser efetuada com imposto, taxa, contribuição da mesma espécie e destinação constitucional. A saber: 

“Art. 39. A compensação de que trata o art. 66 da Lei nº 8.383, de 30 de dezembro de 1991, com a redação dada pelo art. 58 da Lei nº 9.069, de 29 de junho de 1995, somente poderá ser efetuada com o recolhimento de importância correspondente a imposto, taxa, contribuição federal ou receitas patrimoniais de mesma espécie e destinação constitucional, apurado em períodos subsequentes”.

 A conceituação do que são tributos da mesma espécie já foi pacificada pelo STF no RE n.º 148.754-2 de Relatoria do Ministro Carlos Velloso, uma vez afastada a classificação há de se considerar a natureza do tributo, no sentido, se autoriza a compensação de imposto com imposto, taxa com taxa e contribuição com contribuição:

 EMENTA: CONSTITUCIONAL. ART. 55-II DA CARTA ANTERIOR. CONTRIBUIÇÃO PARA O PIS. DECRETOS-LEIS 2.445 E 2.449, DE 1988. INCONSTITUCIONALIDADE. I - CONTRIBUIÇÃO PARA O PIS: SUA ESTRANEIDADE AO DOMÍNIO DOS TRIBUTOS E MESMO AQUELE, MAIS LARGO, DAS FINANÇAS PÚBLICAS. ENTENDIMENTO, PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, DA EC Nº 8/77 (RTJ 120/1190). II - TRATO POR MEIO DE DECRETO-LEI: IMPOSSIBILIDADE ANTE A RESERVA QUALIFICADA DAS MATÉRIAS QUE AUTORIZAVAM A UTILIZAÇÃO DESSE INSTRUMENTO NORMATIVO (ART. 55 DA CONSTITUIÇÃO DE 1969). INCONSTITUCIONALIDADE DOS DECRETOS-LEIS 2.445 E 2.449, DE 1988, QUE PRETENDERAM ALTERAR A SISTEMÁTICA DA CONTRIBUIÇÃO PARA O PIS. 

(RE 148754, Relator(a):  Min. CARLOS VELLOSO, Relator(a) p/ Acórdão:  Min. FRANCISCO REZEK, Tribunal Pleno, julgado em 24/06/1993, DJ 04-03-1994 PP-03290 EMENT VOL-01735-02 PP-00175 RTJ VOL-00150-03 PP-00888) 

No âmbito administrativo da Secretaria da Receita Federal (SRF), existe a possibilidade de utilizar qualquer crédito sujeito à restituição que seja administrada por este órgão para quitar dívidas perante o mesmo, ainda que não sejam da mesma espécie. É o que prevê a regra nos artigo 74 da Lei nº 9.430/96

 “Art. 74. O sujeito passivo que apurar crédito, inclusive os judiciais com trânsito em julgado, relativo a tributo ou contribuição administrado pela Secretaria da Receita Federal, passível de restituição ou de ressarcimento, poderá utilizá-lo na compensação de débitos próprios relativos a quaisquer tributos e contribuições administrados por aquele Órgão”. 

E também o Decreto 2287/86 em seu artigo 7º, § 1º:

 “Art. 7o A Receita Federal do Brasil, antes de proceder à restituição ou ao ressarcimento de tributos, deverá verificar se o contribuinte é devedor à Fazenda Nacional”.

 “§ 1o Existindo débito em nome do contribuinte, o valor da restituição ou ressarcimento será compensado, total ou parcialmente, com o valor do débito.”

  •  Características

 A relação jurídica tributária possui também cunho obrigacional constituída em sua essência, pelos mesmos elementos que compõe qualquer obrigação, ou seja, elementos subjetivos (o credor/sujeito ativo e o devedor/sujeito passivo), objetivos (obrigação/prestação) e de um vínculo jurídico (o liame, o nexo com força jurídica).

Como abordado anteriormente, a compensação de credito tributário é um instituto de origem romana, de direito privado e inicialmente regulado pelo Código Civil de 2002 em seus artigos 368 a 380, sendo o artigo 374 responsável por versar acerca da compensação de dividas fiscais e parafiscais.

Posteriormente, a regulação pelo Código Civil da matéria de compensação no que concerne às dívidas fiscais e parafiscais, foi revogada pela Medida Provisória 75 de 24 de outubro de 2002, transformada na atual Lei nº 10.677, de 22 de maio de 2003.

O instituto da compensação pressupõe duas relações jurídicas distintas onde, o credor de uma é devedor de outra e vice-versa. No campo das possibilidades teóricas da extinção do crédito tributário, o elemento integrativo da relação jurídica obrigacional, atingido pela compensação, é o direito subjetivo do credor e seu dever jurídico correlato.

  •  Legitimidade

 A obrigação tributária é resultante da concretização, no plano fático, do paradigma legal previsto abstratamente na hipótese de incidência tributária. Pode ser analisada a partir de quatro elementos formadores: (i) sujeito ativo; (ii) sujeito passivo; (iii)objeto e (iv) a causa.

Em consonância com o artigo 119 do Código Tributário Nacional, há dois tipos de sujeito ativo: o sujeito ativo direito: entidades tributantes que detem o poder de legislar em matéria tributaria (União, Estados, Municípios e Distrito Federal); bem como o sujeito ativo indireto: entidades parafiscais (CRM, CRC, CRO etc.) que detêm o poder arrecadatório e fiscalizatório.

O sujeito passivo ocupa o polo devedor da relação intersubjetiva da relação tributária. Existem dois tipos de sujeitos passivos: sujeito passivo direito: é o contribuinte, que possui relação pessoal e direta com o fato gerador (artigo 121, parágrafo único do CTN); e o sujeito passivo indireto: é o responsável, na condição de terceiro, escolhido pela lei para o pagamento do tributo, sem que tenha relação com o fato gerador (artigo 121, parágrafo único, II do CTN).

O objeto da obrigação tributária é a prestação, de cunho pecuniário ou não, a que se submete o sujeito passivo diante da realização do fato gerador. O objeto poderá materializar-se na chamada obrigação principal, se for pecuniária, indicadora de uma obrigação de dar.

A obrigação principal está prevista no §1º do artigo 113 do CTN. Por outro lado, o objeto poderá se atrelar a intitulada obrigação acessória, se for instrumental (não pecuniária), indicadora de “obrigação de fazer ou de não fazer”. Ela está prevista no §2º do artigo 113 do CTN.

Por fim, a causa é o vinculo jurídico que motiva o elo jurídico-obrigacional entre os sujeitos ativo e passivo. A causa pode residir na lei tributária (artigo 114 do CTN) ou na legislação tributária (artigo 115 do CTN).

O direito de ser ressarcido do contribuinte (agente passivo) ocorre quando existe na relação tributária pagamento indevido ou a maior. Podemos relembrar que a obrigação tributária nasce com a ocorrência do fato gerador, responsável pelo lançamento do credito tributário:

“O fato gerador do tributo é a ocorrência, em si, que traz a tona a exigência do respectivo ônus para o contribuinte. A lei descreve situações que, ao ocorrerem na vida real, fazem com que se fixe o momento do nascimento da obrigação tributária”[1].

Portanto, compensar é uma faculdade do contribuinte, que possui base na legislação vigente, devendo apenas preencher alguns requisitos para que isso ocorra. Não está atrelada à vontade da administração pública, mas da lei em si.

Ou seja, apenas aquele que deu causa ao fato gerador de pagamento indevido pode pedir o ressarcimento, isto se dá pelo fato de ninguém poder pleitear direito alheio em nome próprio, salvo quando autorizado pelo ordenamento jurídico, conforme artigo 18 do Código Civil.

A discussão, porém, gira em torno da possibilidade da compensação tributária ocorrer com créditos de terceiros obtidos por meio de cessão, onde, na maioria dos casos, a relação ocorre entre pessoas jurídicas. Vez que no ordenamento tributário inexiste lei que trate o assunto e nossos Tribunais não possuem uniformização.

  • Condições para exercer a compensação de créditos tributários

O lançamento é um procedimento administrativo onde o credito é constituído a partir da data do fato gerador e declara a preexistência da obrigação tributária. Segundo o Código Tributário Nacional:

“Art. 144. O lançamento reporta-se à data da ocorrência do fato gerador da obrigação e rege-se pela lei então vigente, ainda que posteriormente modificada ou revogada”. 

O Código Tributário Nacional ainda dispõe a respeito das modalidades de lançamento, acolhendo três espécies, que são: (i) lançamento por declaração, (ii) lançamento de ofício ou direto e (iii) lançamento por homologação.

O lançamento por declaração tem previsão no artigo 147 do CTN e consiste em uma ação conjunta entre o Fisco e o contribuinte, de modo que este presta todas as informações necessárias para que a administração publica proceda o lançamento. Exemplos de impostos que seguem essa modalidade de lançamento são: o II, IE e o ITBI.

O lançamento de ofício, previsto no artigo 149 do CTN, refere-se a hipóteses onde a autoridade administrativa competente sem qualquer tipo de auxilio por parte do contribuinte, devendo-se observar que o rol de hipóteses de lançamento de oficio apresentado pelo artigo.

Por fim, o lançamento por homologação, previsto no artigo 150 do CTN, ocorre quando o próprio contribuinte identifica o fato gerador, quantifica quanto deve recolher, declara e paga, cumprindo a obrigação acessória antes da autoridade administrativa identificar sua existência.

Com advento do art. 66 da Lei 8.383/91 que autorizou a compensação de valores recolhidos indevidamente a titulo de tributos, contribuições federais e receitas patrimoniais, o tema passou a ser de grande interesse do contribuinte.

Portanto, para que seja realizado o pedido de compensação o contribuinte deverá observar os seguintes pontos:

Compensar tributos da mesma espécie, ou seja, aqueles que apresentam a mesma destinação constitucional;

  • Deve ser titular de um credito relativo ao pagamento indevido ou a maior;
  • Tal crédito pode ser compensado com valores devidos a titulo de tributos, contribuições, inclusive previdenciárias ou receitas patrimoniais;
  • É possível a compensação de créditos judiciais com transito em julgado;
  • É possível também a compensação de multa moratória indevidamente aplicada contra o contribuinte. 

Consolidado pela jurisprudência e pela Súmula 523 do STJ[2] que o cálculo para restituição deve abranger a taxa SELIC, desde a data do seu pagamento indevido, incluindo até a data do recebimento do valor reclamado:

STJ - Súmula 523 A taxa de juros de mora incidente na repetição de indébito de tributos estaduais deve corresponder à utilizada para cobrança do tributo pago em atraso, sendo legítima a incidência da taxa Selic, em ambas as hipóteses, quando prevista na legislação local, vedada sua cumulação com quaisquer outros índices.

Assim, procedendo o contribuinte com a compensação em sua conta, a fiscalização não sofrerá qualquer empeço, devendo verificar a exatidão dos cálculos efetuados pelo contribuinte e o cumprimento das demais condições estabelecidas na lei.

 

[1] Disponível em: < http://www.portaltributario.com.br/tributario/fato_gerador.htm>. Acesso em 21/04/2016

[2] (Súmula 523, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 22/04/2015, DJe 27/04/2015)