O Impacto da MP 495 Sobre as Licitações Públicas

Por Eduardo Borges do Nascimento | 05/10/2010 | Política

Considerações Iniciais

Uma das leis mais polêmicas na Administração Pública é a de N° 8.666/93 e suas alterações. Desde de sua entrada em vigor, o administrador vem tentando melhorá-la e aperfeiçoá-la a fim de evitar que as compras e serviços contratados pela Administração, sejam alvos de fraudes e desvios dos recursos públicos. Muitas vezes até envolvendo servidores responsáveis pelo controle dessas licitações.
Isso não é tudo. Outro problema grave que a Administração é obrigada a conviver é o fato de contratar muitas vezes, na boa fé, empresas incapazes de realizar tal serviço ou fornecer o bem licitado, e neste último caso, muitas vezes bens adquiridos de baixa qualidade.
O presente texto visa comentar a Medida Provisória N°495 de 19 de julho de 2010, que altera a lei acima mencionada, bem como, outras leis. São elas: Lei N° 8.958 de 20 de dezembro de 1994 e a Lei N° 10.973 de 2 de dezembro de 2004 e revoga § 1° do art. 2° de Lei N° 11.273 de 06 de fevereiro de 2006.

Alterações da MP

A primeira alteração que chama atenção da MP é em seu Art.1° que altera o art. 3° da Lei 8.666/93 que passa a vigorar com o seguinte texto:

"Art. 3o A licitação destina-se a garantir a observância do princípio constitucional da isonomia, a seleção da proposta mais vantajosa para a administração e a promoção do desenvolvimento nacional, e será processada e julgada em estrita conformidade com os princípios básicos da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da igualdade, da publicidade, da probidade administrativa, da vinculação ao instrumento convocatório, do julgamento objetivo e dos que lhes são correlatos."

Vislumbra-se aqui uma forte intenção do governo em incentivar a industria nacional nas contratações com o poder público em todas as esferas, pois a Lei 8.666 é Nacional, atingindo: a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios.
Isso já havia ocorrido com as Microempresas e as Empresas de Pequeno Porte, com a edição da Lei Complementar N°123 de 2006, em Art.1° Inciso III.

Foi alterado o parágrafo 1° ressalvando os §§ 5° ao 12 do presente artigo e do art.3° da Lei 8.248, de 23 de outubro de 1991. Essas alterações ocorridas nesses parágrafos, são as mais relevantes da Medida Provisória.

No parágrafo 2°, houve uma inversão na ordem dos Incisos, que passa a vigorar na seguinte ordem:

"§ 2º ..........................................................................
I - produzidos no País;
II - produzidos ou prestados por empresas brasileiras; e
III - produzidos ou prestados por empresas que invistam em pesquisa e no desenvolvimento de tecnologia no País."

"§ 5º Nos processos de licitação previstos no caput, poderá ser estabelecida margem de preferência para produtos manufaturados e serviços nacionais que atendam a normas técnicas brasileiras.
§ 6o A margem de preferência por produto, serviço, grupo de produtos ou grupo de serviços, a que refere o § 5o, será definida pelo Poder Executivo Federal, limitada a até vinte e cinco por cento acima do preço dos produtos manufaturados e serviços estrangeiros."
Os Poderes Públicos poderão dar preferência aos produtos ou serviços nacionais até 25% mais caros que os fornecidos ou prestados pelos fornecedores ou prestadores de serviços estrangeiros, desde que atendam as normas técnicas brasileiras.

"§ 7o A margem de preferência de que trata o § 6o será estabelecida com base em estudos que levem em consideração:
I - geração de emprego e renda;
II - efeito na arrecadação de tributos federais, estaduais e municipais; e
III - desenvolvimento e inovação tecnológica realizados no País.
§ 8o Respeitado o limite estabelecido no § 6o, poderá ser estabelecida margem de preferência adicional para os produtos manufaturados e para os serviços nacionais resultantes de desenvolvimento e inovação tecnológica realizados no País.
§ 9o As disposições contidas nos §§ 5o, 6o e 8o deste artigo não se aplicam quando não houver produção suficiente de bens manufaturados ou capacidade de prestação dos serviços no País."
Quando não houver fornecedores, fabricantes ou prestadores de serviços nacionais do objeto licitado, não se aplica a margem de preferência estabelecida nos §§ 5°, 6° e 8°. Assim as empresas estrangeiras poderão concorrer normalmente em igualdade com outras empresas.
"§ 10. A margem de preferência a que se refere o § 6o será estendida aos bens e serviços originários dos Estados Partes do Mercado Comum do Sul - Mercosul, após a ratificação do Protocolo de Contratações Públicas do Mercosul, celebrado em 20 de julho de 2006, e poderá ser estendida, total ou parcialmente, aos bens e serviços originários de outros países, com os quais o Brasil venha assinar acordos sobre compras governamentais."
Outra alteração substancial, a inclusão do MERCOSUL podendo participar no país, podendo gozar dos benefícios da margem de preferência com outras empresas que estejam fora do Mercado Comum do Sul, salvo se o Brasil possuir acordos internacionais sobre compras governamentais.
"§ 11. Os editais de licitação para a contratação de bens, serviços e obras poderão exigir que o contratado promova, em favor da administração pública ou daqueles por ela indicados, medidas de compensação comercial, industrial, tecnológica ou acesso a condições vantajosas de financiamento, cumulativamente ou não, na forma estabelecida pelo Poder Executivo Federal."
"§ 12. Nas contratações destinadas à implantação, manutenção e ao aperfeiçoamento dos sistemas de tecnologia de informação e comunicação, considerados estratégicos em ato do Poder Executivo Federal, a licitação poderá ser restrita a bens e serviços com tecnologia desenvolvida no País e produzidos de acordo com o processo produtivo básico de que trata a Lei no 10.176, de 11 de janeiro de 2001." (NR)

Mais uma vez, o governo tenta priorizar e restringir os bens oriundos de aperfeiçoamento dos sistemas de tecnologia produzidos no país.

Em resumo, encontramos no art. 6° desta Medida Provisória, o seu objetivo, ou seja, o Governo visa a priorizar e da preferência, de acordo com os Incisos XVII,XVIII e XIX, em se tratando de contratação com o Poder Público, o seguinte:

"Art. 6º ...................................................................
.................................................................................
XVII - produtos manufaturados nacionais - produtos manufaturados, produzidos no território nacional de acordo com o processo produtivo básico ou regras de origem estabelecidas pelo Poder Executivo Federal;
XVIII - serviços nacionais - serviços prestados no País, nas condições estabelecidas pelo Poder Executivo Federal;
XIX - sistemas de tecnologia de informação e comunicação estratégicos - bens e serviços de tecnologia da informação e comunicação cuja descontinuidade provoque dano significativo à administração pública e que envolvam pelo menos um dos seguintes requisitos relacionados às informações críticas: disponibilidade, confiabilidade, segurança e confidencialidade." (NR)
No art. 2° da Medida Provisória determina que se aplicará à modalidade pregão, conforme Lei N° 10.520 de 17 de julho de 2002.

Críticas à MP

Acredito que a intenção do governo seja de proteger e incentivar a industria nacional e os prestadores de serviços localizados no país. Salutar a idéia, porém, há o receio de que aconteça a contratação de empresas que acabarão fornecendo produtos de baixa qualidade e serviços inadequados que não atenderão de forma eficiente e econômica, o fim a que se destina.
Uma preocupação dessas alterações, podemos citar como exemplo, um órgão licitando equipamentos de alta tecnologia em medicina avançada. E empresas de ponta no exterior, demonstre o interesse em fornecer tais produtos. Ora, com a carga tributária que temos, nossas empresas não são concorrentes para se equipararem as empresas estrangeiras, no que diz respeito a preços competitivos e fica pior a comparação quando falamos em tecnologia. Além de comprarem produtos com qualidade inferior, correremos o risco de pagar mais caro.
Será que os órgãos de controle interno e externo estão aptos a julgar subjetivamente o que é mais favorável para o Poder Público ? Será que num exemplo como o de cima, a baixa qualidade não vai interferir de maneira substancial no resultado esperado ?
São perguntas que ficam no ar e somente com o tempo poderemos de fato verificar se estávamos certos ou errados.
A vista do exposto, resta o governo preparar bem seus servidores, participantes das comissões permanentes de licitação, para escolher de maneira criteriosa a modalidade e o tipo de licitação a ser empregada, nomear gestores técnicos, responsáveis e com o comprometimento com a coisa pública, valorizar os órgãos de controle, Ministério Público Federal e Estadual, buscando a maior economicidade acompanhado da eficiência e eficácia no Serviço Público.

Eduardo Borges do Nascimento
TFC/CGU-AM/PR