O Fantasma

Por Maria da Penha Jorge Carvalho Monteiro | 05/08/2010 | Contos


O FANTASMA

No bairro onde moro há um cemitério e, por causa dele, muitas histórias de fantasma são inventadas. A última que inventaram foi incrível.
Dizem que tudo começou numa noite muito escura e chuvosa, havia um vento frio, a rua estava deserta, ninguém se atreveu a sair de casa naquela noite, exceto Marina que dizia não ter medo de fantasmas. "Essas coisas não existem, não tenho medo dos mortos, os vivos é que são perigosos". Dizia ela, sempre que o assunto era fantasmas.
Decidida a comprar um vinho para acompanhá-la na solidão do seu quarto, Marina foi, sem medo, à rua. Comprou seu vinho, olhou algumas vitrines e, como já estava ficando tarde, resolveu ir para casa. Depois de caminhar duas quadras, começou a chover, para chegar a casa mais rápido, decidiu que passar em frente ao cemitério seria a melhor coisa a fazer. Então, caminhou sentindo a garoa molhar suavemente seus cabelos, aos poucos, foi sentindo seu casaco mais pesado, pois, àquela altura, chovia forte. Caminhou depressa pisando com força nas poças que haviam se formado anteriormente, naquele dia havia chovido muito.
Passou em frente ao cemitério, para surpresa sua, sentiu um leve arrepio ao perceber um vulto saindo da necrópole, caminhou ainda mais rápido quando percebeu que estava sendo seguida, pensou logo em assalto e, literalmente, correu. Entrou em casa ofegante, trancou a porta com a tranca de segurança, pôs uma cadeira atrás da mesma, só por precaução, e foi tomar um gostoso banho enquanto o vinho gelava.
Preparou a banheira com uma água bem quentinha e ficou lá relaxando, para recuperar-se do susto. Naquela noite, estava sentindo-se diferente, não sabia ao certo o que estava acontecendo, mas sentia uma sensação totalmente desconhecida, seu corpo parecia pulsar e seu coração parecia querer saltar para fora do seu corpo. Todo o tempo em que esteve morando sozinha nunca sentira medo, mas naquela noite o inaceitável medo a acompanhava. Saiu da banheira tremendo, não sabia ao certo se, de medo ou de frio. Vestiu-se depressa, pois tinha a estranha sensação de estar sendo observada. Foi até a cozinha, preparou o jantar e arrumou a mesa como de costume, mas, desta vez, parecia esperar por alguém. Jantou e tomou seu vinho demoradamente.
Arrumou a cozinha, pois gostava de deixar tudo em ordem antes de ir dormir, e foi para o quarto assistir TV. Ficou ali, sem prestar muita atenção ao que passava no vídeo, sentia um torpor, uma preguiça estranha. "Achou que tivesse tomado vinho demais." Acabou pegando no sono. Naquela noite, o sono de Marina não foi tranqüilo, teve um pesadelo assustador, parecia tão real que ela podia sentir as sensações como se estivesse acordada. Sentiu um abraço forte envolvendo seu corpo, sua boca entre aberta pôde receber um beijo voluptuoso, podia sentir em seu corpo a firmeza das mãos macias a acariciar-lhe, entregou-se total e liberalmente às carícias do amante onírico. Este, suavemente a despiu, com beijos ávidos a deixou totalmente embriagada pelo desejo, amaram-se ardentemente até chegar ao clímax da paixão.
Na manhã seguinte ao acordar, Marina empalideceu ao perceber sua camisola jogada no chão, ainda sentia sua boca latejando devido aos fortes beijos do sonho. "Sonho? Ou será que alguém entrou aqui?" Levantou-se, vestiu-se depressa e foi verificar a porta; estava trancada. Olhou as janelas, também estavam fechadas. Seu coração disparou, engoliu em seco, assustada. Caminhou até ao banheiro, olhou-se no espelho e disse a si mesma: "Marina, foi só um pesadelo".
Naquele dia não conseguiu trabalhar direito, estava abatida, taciturna. Não era a Marina de sempre, aquela Marina corajosa, alegre. No fim do dia foi para casa sentindo-se muito cansada. Cumpriu todos os rituais de todas as noites e foi dormir, não tomou vinho, queria estar lúcida se sonhasse novamente. Logo adormeceu. Dormiu um bom tempo sem ter nenhum pesadelo, mas pela madrugada começou a sonhar com um homem muito bonito que vinha para ela sorrindo, sua pele macia, ao roçar em seu corpo causava-lhe arrepios, eram arrepios de prazer. Desta vez ele estava mais carinhoso, seus beijos eram mais suaves, demorados, calmos e apaixonantes. Suas mãos iam deslizando pelo corpo seminu da indefesa amada. Trocaram carícias apaixonadas e amaram-se novamente.
Ao acordar, Marina constatou que seus sonhos não eram apenas sonhos. Então, lembrou-se do vulto que a seguira desde o cemitério. "Tolice! Fantasmas não existem!" Disse, descartando aquela idéia absurda. "Mas, se não era fantasma, o que era aquilo?" Trabalhou o dia todo intrigada, não entendia aquela situação e, o que era pior, estava começando a gostar daqueles sonhos.
Passou-se uma semana, um mês, os sonhos continuavam. Ela, então, resolveu procurar um psicólogo, as terapias não resolveram, os sonhos pareciam cada vez mais reais. Agora, saía do trabalho e corria para casa, ansiosa, esperava a noite chegar para receber seu amante que já era, também, amado. E sonhava...
Atualmente, Marina já não tem mais certeza se existe ou não fantasmas. Mas corre à casa todas as noites para esperar seu amante invisível.