O Estupro e a Política Palaciana

Por Denis Farias | 29/08/2009 | Direito

Os noticiários têm mostrado dois fatos que causam elevada repulsa e indignação ao cidadão comum. Porém, apesar de ambos serem inegavelmente hediondos, a sociedade como um todo reage de forma diferente no trato de cada um dos deploráveis acontecimentos.

O primeiro foi a manobra palaciana, arquitetada e executada, em grande parte pessoalmente, pelo presidente Lula para salvar José Sarney. Lula foi movido pela pressão de Renan Calheiros e Sarney para que o PT usasse o poder de fogo no Conselho de Ética do Senado no sentido de engavetar as representações contra o presidente do Senado. Se o PT fizesse corpo mole, o PMBD retiraria o apoio à campanha a Ministra Dilma Rousseff, aquela que quer ter o título de mestrado e doutorado só no currículum, sem ter concluído nem um nem outro curso. Sem o apoio do PMDB, Lula teme que seus planos de eleger a sem-sorriso Chefe da Casa Civil desmoronem. A ordem para salvar Sarney chegaria ao Senado pela boca de Berzoini, e ganharia eco na voz do Senador Aloizio Mercadante, o líder sem liderança.

A tarefa não era tão fácil assim de ser executada. O problema para os Senadores do PT não eram manter a boa consciência livrando Sarney, mesmo sabendo que a estripulia legal e moral feita por ele tinham que ser investigada. O maior temor era o desgaste perante a opinião pública, eis que segundo pesquisa do Instituto Datafolha, algo em torno de 70% dos brasileiros quer a cabeça de Sarney na bandeja e bem longe da presidência do Senado. Logo, o reflexo de quem proteger Sarney deve ser visto nas eleições do ano que vem. Portanto, todas as atenções da opinião pública estavam voltadas para o Conselho de Ética. Os mais receosos eram os Senadores Delcídio Amaral e Ideli Salvatti, que apesar da proximidade com Sarney, votar em público para absolvê-lo seria extremante temerário. O único voto pró-Sarney que estava garantido, era o do Senador amazonense João Pedro, devido a sua condição de suplente. Logo, sem eleitorado, não tem o que perder. A falta dos dois votos certamente causaria a degola de Sarney. Mas nada que a astúcia de Lula não resolvesse. E resolveu.

A outra pedra no caminho de Lula era a resistência de Aluizio Mercadante, que já tinha se comprometido perante a opinião pública que não iria participar de manobra para salvar Sarney. E como Líder do PT no Senado, tem posição estratégica. Lula teve que entrar em campo pessoalmente. Para lhe auxiliar chamou seus super-amigos José Dirceu, o acusado de ser o chefe da quadrilha do mensalão. Outro tentáculo de Lula foi o ministro da Justiça Tarso Genro que tinha como dever de casa calar o Senador Paulo Paim. Usou como ferramenta de trabalho a ameaça. Paim só seria candidato à reeleição se não fizesse nenhuma manifestação contra Sarney. A intimidação surtiu efeito. Por outro lado, usando novamente o golpe baixo da ameaça deixaram Alozio Mercadante dócil, sob pena de ficar sem legenda para disputar da eleição paulista de 2010. Daí que, mesmo garantindo que iria renunciar a liderança do partido não o fez, ficando desmoralizado perante todos, o que pode lhe custar seu mandato. Com todos os Senadores do PT devidamente domados por Lula e seu esquadrão do terror, na hora de votar no Conselho de ética, disseram "sim" para Sarney e as 11 representações contra o Presidente do Senado foram arquivadas, para a vergonha geral da República!

Mas esse não foi o único fato asqueroso que tivemos que presenciar.

O outro foi a prisão de um dos médicos mais conhecidos do país, o Roger Abdelmassih, de família de imigrantes libaneses. Cursou medicina na Unicamp. Trabalhou com médico Milton Nakamura, responsável pelo nascimento do primeiro bebê de proveta do Brasil. Roger alcançou o sucesso devido sua meritocracia e aos contatos sociais com famosos. Na elegante lista consta Roberto Carlos, Pelé, Hebe Camargo e Fernando Collor, escudeiro de Lula, dentre outros. Assim, seu consultório ganhou prestígio internacional.

Mas toda essa pompa ruiu em decorrência de mais de 50 acusações de estupros e atentado violento ao pudor, praticado contra suas pacientes na clínica onde atendia em São Paulo. A investigação contra Roger, que começou em maio do ano passado tornou-se pública em janeiro e na semana passada ocupou a grande mídia com a prisão preventiva do acusado. As acusações passaram a ser tipificadas como estupro devido a uma recente mudança na legislação, que classifica os crimes de natureza sexual como estupro e não mais como atentado violento ao pudor. As vitimas relatam fatos que vão de beijos forçados, passando por carícias íntimas e vão até penetração consumada. Os atos mais torpes eram praticados quando as pacientes estavam anestesiadas. A prisão preventiva foi mantida em todas as esferas do Poder Judiciário. Se a sociedade e o Poder Judiciário tratassem as manobras políticas e a corrupção como tratam o crime de estupro, o Conselho de ética do Senado não absolveria José Sarney.

Denis Farias é advogado.

E-mail: denisadvogado@hotmail.com