O dumping e seus efeitos nas relações jurídicas de consumo
Por Luiza Cristina Milagres Pereira | 30/05/2012 | DireitoO Dumping e seus efeitos nas relações jurídicas de consumo
1. INTRODUÇÃO
A prática de crimes econômicos afetam a sociedade como um todo, entretanto, as relações de consumo são as que sofrem diretamente as conseqüências dessas práticas abusivas, pois estas oneram de tal maneira o consumo que o dificultam e as vezes até o inviabilizam.
Diante disso, a estrutura da ordem econômica afeta diretamente para a proteção da sociedade contra esse tipo de pratica, de acordo com João Bosco Leopoldino da Fonseca:
“Pode-se definir ordem econômica como aquele conjunto de princípios estabelecidos pela constituição e que tem como objetivo fixar os parâmetros da atividade econômica, coordenando a atuação dos diversos sujeitos que põem em pratica aquela mesma atividade. Ao conjunto desses princípios costuma-se dar se o nome de constituição econômica, salientando que está ela intrinsecamente ligada à constituição política, formando uma unidade indissociável. (...) enfatiza-se o direito de propriedade individual e sua conseqüência inarredável, o principio da liberdade de iniciativa, como fatores indispensáveis ao progresso, e impulso da atividade econômica. Mas ao mesmo tempo, defendem-se os princípios da função social da propriedade, da liberdade de concorrência, de respeito aos direitos dos consumidores,e dos trabalhadores.” (FONSECA, 2010, pag. 166,167).
2. PROTEÇÃO DO CONSUMIDOR
De acordo com o artigo 170 da Constituição Federal, a proteção do consumidor é um principio da ordem econômica, e como parte hipossuficente da relação de consumo, deve ser protegido pelo Estado, o qual deve criar meios de igualar esta relação, proporcionando ao consumidor o direito de ter acesso aos produtos.
A preocupação do legislador em elevar a proteção do consumidor ao status de garantia fundamental se deu a partir da analise de uma situação social concreta, em que se vislumbrava a posição de inferioridade do consumidor em face do poder econômico do fornecedor, bem como a insuficiência do ordenamento jurídico, que não tutelavam novos interesses identificados como coletivos e difusos.
A partir desse pensamento, foram criados vários instrumentos de defesa dos direitos do consumidor, tais como, o Código de Defesa do Consumidor, a criação dos Procons, Juizados Especiais de Relações de consumo, entre outros.
Entretanto, essas atitudes tem mais efeitos nos casos concretos, ficando de lado as praticas que mais prejudicam o consumidor, as que atingem os consumidores como um todo e afetam os preços dos produtos e diretamente o consumo. Diante disso, outro meio importante de proteger o consumidor é com a regulamentação dos mercados, para impedir que práticas abusivas e ilegais prejudiquem ou onerem excessivamente o consumo.
Insta salientar que o próprio Código de Defesa do consumidor elenca como passiveis de proteção os interesses econômicos do consumidor, portanto, a pluralidade de fornecedores deve ser garantida, como forma de proporcionar ao consumidor seus próprios critérios de consumo e seu direito de escolha.
3. A REGULAMENTAÇÃO DA ORDEM ECONOMICA COMO FORMA DE PROTEÇÃO DO CONSUMIDOR
Infere-se partir desse pensamento, que a proteção do consumidor e a defesa da livre concorrência são parte de um mesmo sistema. Nesta vertente é a opinião da Conselheira Hebe Teixeira Romano:
“As mais corriqueiras atividades comerciais, muito embora regidas pelo direito privado quanto as relações que as partes estabelecem entre si, podem transcender os interesses dos particulares ali regulados para repercutir no mercado, atingindo interesses difusos. É nesse momento que a supremacia do interesse público faz com que a prática comercial comum se torne relevante para a defesa da concorrência e nem mesmo a composição a que eventualmente cheguem as partes poderia afastar a conduta da apreciação do órgão competente. (...) Assim é que diversos setores da economia que estão submetidos a lei ou regulamentação especial de modo a compatibilizar os interesses econômicos e dos consumidores face as estruturas comerciais complexas, traduzindo em certa restrição sob a perspectiva competitiva, inclusive quanto a suas disposições, resultantes da necessidade de assegurar o desenvolvimento econômico e social da atividade.” (ROMANO, ato de concentração nº 08012012242/99[1])
O grande problema é que a maior parte da população brasileira desconhece o sistema econômico bem como as nossas leis de defesa da concorrência e não sabem que alguns atos praticados por certas empresas são crimes e que afetam o poder de compra do consumidor diretamente.
4. O DUMPING
Entre essas praticas encontra-se o dumping, que é caracterizado por ser uma prática que consiste na comercialização de produtos a preços abaixo do custo de produção. O que se justifica basicamente para eliminar a concorrência e conquistar uma fatia maior de mercado. É um tipo de concorrência desleal. O que se busca com essa pratica é tirar os concorrentes do mercado, conseqüentemente monopolizar esse mercado para que assim, essa empresa possa praticar preços acima do mercado e obter mais lucros. Como se pode observar, o que é punido é o fato de vender produtos abaixo do custo injustificadamente, uma vez que a empresa pode vender abaixo do preço se for por uma causa justificada, como por exemplo, otimização dos processos de produção. Infere-se então que, se uma empresa vende seu produto abaixo do preço de custo sem uma justificativa plausível, está prejudicando seus concorrentes e isso caracteriza o dumping. Entretanto, segundo Barral, há dois tipos de dumping, sendo que, se este não causa danos a industria, seria considerado não condenável, vejamos::
“... seria a ocorrência de dumping sem que redundasse em efeitos negativos para a industria estabelecida no território de um pais. Para ser classificado como condenável , ao contrario, o dumping deve implicar dano a industria domestica e o nexo causal entre o dano e a pratica de dumping.” (BARRAL, 2002, pag. 395)
Desta forma, o que se pode punir são os efeitos do dumping e não a prática de dumping em si.
O que pode aumentar o incentivo à pratica de dumping é a sensação inicial que este gera no consumidor. No primeiro momento o consumidor se sente satisfeito com as condições economicamente favoráveis em que se deu o consumo, quando os preços estão baixos. Contudo, o reflexo futuro será extremamente danoso, pois o fornecedor que tenha feito uso do poder econômico para manipular o mercado naquele momento inicial, ao dominar de forma relevante essa mesma parcela voltará a fazer uso de outras práticas comerciais abusivas, só que agora em desfavor do próprio consumidor e não mais dos concorrentes.
5. CONCLUSÃO
Enfim, a pratica de dumping é extremamente prejudicial ao mercado, pois não possibilita que este se desenvolva naturalmente, não deixando com que se implemente a livre concorrência; e ao consumidor, pois os grandes empresários se aproveitam da situação de desconhecimento do cidadão brasileiro sobre a economia e as práticas de mercado para cometer atos ilícitos que prejudicam a industria como um todo, uma vez que impede que novas empresas se firmem no mercado, e para manipular os preços dos produtos, de forma a praticar preços acima do mercado, lesando desta forma, a sociedade como um todo. Enfatiza João Bosco Leopoldino da Fonseca:
“As relações de consumo estão em estrita analogia com as relações concorrenciais no mercado. Uma defesa competente dos direitos do consumidor levará as empresas a se comportarem adequadamente no mercado preservando a liberdade que deve reinar de forma equitativa para todas. Por outro lado, uma liberdade de concorrência assegurada de forma adequada terá como conseqüência inarredável a defesa dos interesses dos consumidores” (FONSECA, 2010, pag. 189).
Com isso, infere-se que não basta regular as relações do consumidor na esfera individual, mas sim, a regulamentação das praticas de mercado, a punição efetiva dos agentes que praticam crimes econômicos e a conscientização da sociedade sobre essas praticas abusivas é de suma importância para se efetivar a proteção ao consumidor.
REFERÊNCIAS
BARRAL, Welber, O Brasil e o protecionismo. São Paulo, Editora Aduaneiras, 2002.
CADE, Concelho Administrativo de defesa Econômica, ato de concentração nº 08012012242/99, requerentes: Ford Brasil Ltda, Distribuidora Olsen de Veículos Ltda e Companhia Metropolitana de automóveis.
FONSECA, João Bosco Leopoldino. Lei de Proteção da concorrência, comentários à legislação antitruste: Rio de Janeiro, Editora Forense, 3ª edição.
[1] CADE, ato de concentração nº 08012012242/99, requerentes: Ford Brasil Ltda, Distribuidora Olsen de Veículos Ltda e Companhia Metropolitana de automóveis.