O DIREITO AO PRÓPRIO CORPO E O PRINCÍPIO DA DIGNIDADE HUMANA: LIMITES À DISPOSIÇÃO DO PRÓPRIO CORPO

Por Bruno Henrique de Oliveira Coqueiro | 22/06/2018 | Direito

RESUMO

Discussão sobre os direitos da personalidade no que tange o direito ao próprio corpo e o principio da dignidade da pessoa humana. Analisando a intervenção do estado nas relações privadas e os aspectos da concepção psicológica de cada individuo em relação ao próprio corpo.

Palavras- chave: Dignidade; Integridade física; Disposição sobre o próprio corpo.

1 INTRODUÇÃO

Os direitos da personalidade contemplados no código civil e fundamentados na Constituição Federal, em seu art. 1° inciso III, sob o manto do princípio da dignidade da pessoa humana possuem características bastante peculiares, como o fato de serem: extra- patrimoniais, não sendo dimensionados a avaliações econômicas; intransmissíveis, por serem inerentes a pessoa não se admitindo a transferência; imprescritíveis, onde o exercício do direito não cessa com o transcorrer do tempo e dentre outras características, são indisponíveis não podendo privar-se de tais direitos seu titular. A indisponibilidade dos direitos da personalidade remete a uma reflexão mais profunda acerca da proteção à integridade física.

Salvo por exigência médica, é defeso o ato de disposição do próprio corpo, quando importar diminuição permanente da integridade física, ou contrariar os bons costumes.

Parágrafo único. O ato previsto neste artigo será admitido para fins de transplante, na forma estabelecida em lei especial. (CC, 2002, art. 13)

            O Código Civil de 2002, ao regular os direitos da personalidade de forma genérica, limitou os atos de disposição do próprio corpo que importem em diminuição permanente da integridade física ou contrariem os bons costumes, ressalvando os casos de exigência médica e restringindo a sua disposição de maneira diversa. Sobre esse prisma, o princípio da dignidade da pessoa humana, positivado na Constituição Federal como valor central do ordenamento jurídico brasileiro, torna necessária a relativização da indisponibilidade sobre o corpo.

            A Constituição Federal de 1988 centralizou o sistema jurídico, de modo que os ramos do direito passaram a operar de acordo com as suas normas e princípios, o que mostra uma constitucionalização do direito e a superação da dicotomia entre direito público e privado. Assim o direito civil passou a abranger também o aspecto existencial além da visão meramente patrimonialista. O que pode, facilmente, ser percebido na definição de personalidade jurídica (pessoa civil) que é a aptidão que todo ser humano tem, para ser titular de direitos e deveres. Onde os direitos atingem as esferas patrimoniais (bens) e também extrapatrimoniais (os direitos da personalidade). 

Com isso é necessário analisar como o Estado pode limitar a disposição sobre o corpo sem ignorar outras perspectivas de anseio individual e como essas relações poderão ser abordadas no futuro pela sociedade e pelo direito.

2 A DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA

Introduzido no ordenamento jurídico brasileiro na Constituição Federal de 1988, como também em inúmeros outros ordenamentos pelo mundo após a Declaração Universal dos Direitos Humanos em 1948. O princípio da dignidade da pessoa humana é o fundamento de todos os outros direitos constitucionais.

Em um estado democrático de direito, onde todas as ações são reguladas por leis, sendo estas elaboradas por um poder escolhido pelo povo, ou seja, democraticamente, nada mais natural, que tais normas assegurem a vida, a liberdade, o nome, a imagem, a propriedade, o bem estar individual e coletivo e não menos importante a integridade física. Pois nesta perspectiva, observa Guilherme Calmon Nogueira da Gama:

O bem jurídico integridade física representa a projeção do princípio da dignidade da pessoa humana sobre o corpo do sujeito e no próprio texto constitucional, pode ser verificado regras que vedam a pratica da tortura, o tratamento desumano ou degradante, a aplicação de penas cruéis (Gama, 2006, p.34).

Neste contexto é fundamental lembrar que a integridade física, protegida pelos direitos da personalidade, compreende a psicológica, e que há aspectos, dentro de tal proteção, que remete a subjetividade no que diz respeito à disposição do próprio corpo. Nada mais digno que o ser humano em pleno gozo de suas faculdades mentais e sem ferir o direito alheio, possa ter o domínio do seu próprio corpo em razão das mais variadas crenças e concepções.

Dignamente o homem deve ter a sua liberdade de pensamento e entendimento sobre as questões que lhes são relevantes, e principalmente as de fórum íntimo como as relativas ao seu próprio corpo. Até que ponto, pode ir a imposição do Estado quando disciplina a disposição sobre o corpo, quando indivíduos, respeitando os direitos de terceiros, optam por um “estilo” de vida fora daquilo que convém, a sociedade, ser o normal. O contexto social atual se define de modo heterogêneo, ou seja, não existem fórmulas e nem regras que estabeleçam um determinado padrão.

O transexualismo é uma realidade no mundo e cada vez mais os entendimentos doutrinários enveredam nesse sentido. Pois o individuo é fruto daquilo que acredita ser, onde um homem com “mente de mulher” não deve constituir empecilho, além do biológico, para que se efetive essa decisão de caráter intimo em nome dos bons costumes disciplinados pelo código vigente. O estado por sua vez, não deve lhe negar reconhecimento, uma vez que, tal opção não lhe excluem da condição de seres humanos e merecem todo respeito.

Artigo completo: