O CONTROLE DO MÉRITO DOS ATOS ADMINISTRATIVOS DISCRICIONÁRIOS PELO PODER JUDICIÁRIO

Por Frederico Nepomuceno Léda | 22/06/2016 | Direito

O CONTROLE DO MÉRITO DOS ATOS ADMINISTRATIVOS DISCRICIONÁRIOS PELO PODER JUDICIÁRIO[1]

Frederico Nepomuceno Léda

Rafaela Coelho Rodrigues Lima[2]

Tiago José Mendes Fernandes[3]

Sumário: Introdução; 1 Atos Administrativos; 1.1 Elementos dos atos administrativos; 1.2 Mérito dos atos administrativos; 2 Controle da administração Pública; 2.1 Controle do ato administrativo discricionário pelo Poder Judiciário; 3 Os posicionamentos jurisprudenciais acerca do controle do ato administrativo discricionário pelo TJ-MA; Considerações Finais; Referências

 

RESUMO

O presente trabalho visa conceituar e analisar os o Controle do mérito dos atos administrativos discricionários pelo poder judiciário. E tem como principais objetivos a análise dos méritos dos atos administrativos, o controle judicial desses atos e a análise do posicionamento do Tribunal do Maranhão a respeito do controle do ato administrativo discricionário.

PALAVRAS-CHAVE: Ato administrativo. Discricionariedade. Controle do ato administrativo. Análise do mérito. Posicionamento jurisprudencial.                                         

 

1 INTRODUÇÃO

O Princípio da inafastabilidade da jurisdição força a incidência de um controle judicial no âmbito das decisões discricionárias atinentes ao direito administrativo. Contudo, é válido ressaltar que esse controle deve respeitar os limites previamente delimitados pelo legislador, no intuito de se preservar o mínimo essencial para que a atividade discricionária do Direito Administrativo não sucumba.

Todavia, em sentido diametralmente oposto, há uma teoria que defende a hipótese de o próprio Poder Judiciário decretar a nulidade do ato administrativo, comprovada a incidência de desvio de poder em virtude da autoridade administrativa ser munida do poder discricionário, usando este atributo para atingir um fim diverso daquele fixado por lei. Ainda assim, há um entendimento de grande força na doutrina, de que esses mesmo atos administrativos discricionários sequer poderiam sofrer algum controle do judiciário, sendo esta a discussão central a ser abordada pelos pesquisadores.

A controvérsia em questão foi o que desencadeou o interesse dos pesquisadores ao longo da pesquisa, estes explanarão os diversos posicionamentos jurisprudências acerca da discrionariedade dos atos administrativos, especialmente no que tange a incidência da interferência do judiciário em concursos públicos realizados no Estado do Maranhão.

Por conseguinte, o tema em comento nos remota ao Princípio da Separação dos Poderes. A Constituição Federal, em seu art. 2, prega que os Poderes da União, sendo eles, Executivo, Legislativo e Judiciário, são independentes e harmônicos entre si, possuindo estes, atribuições específicas e peculiares, individualizadas de forma singular pela Constituição Federal. Contudo, não são dotados de exclusividade, esse princípio é fundamental para fundamentar a hipótese de incidência ou não de controle jurídico dos atos administrativos discricionários. (DI PIETRO, 2014)

Noutra senda, a abordagem dos atos administrativos está intimamente ligada a Administração Pública, no âmbito de suas funções junto ao organismo Estatal, e neste intuito, é de suma importância os entendimentos de Maria Silvia Zanella di Pietro (2014), a referida autora afirma que Administração Pública desfruta de poderes que lhe asseguram “posição de supremacia sobre o particular e sem os quais ela não conseguiria atingir os seus fins” (DI PIETRO, 2014, p. 257).

Ainda conforme a administrativista, esta ressalta que dentro do Estado do Direito, há postulados básicos a exemplo do princípio da legalidade, neste caso há de se afirmar que o Direito Administrativo é vinculado, o que implica dizer que os atos administrativos são limitados pela lei, no intuito de impedir os abusos e as arbitrariedades a que as autoridades poderiam ser levadas. (DI PIETRO, 2014).

No ensejo, apesar do caráter vinculado que diz respeito à Administração Pública, a lei deixa uma certa margem de liberdade mediante uma decisão que leva em consideração um caso concreto, de tal modo que a autoridade poderá optar por uma solução mais favorável e sempre de acordo com o que é permitido em lei. Nesses casos, Di Pietro (2014) defende ser o poder da Administração Pública discricionário, tendo em vista que a alternativa escolhida é feita segundo critérios de oportunidade, conveniência, justiça, equidade, próprios da autoridade, porque não definidos pelo legislador.

 

1 OS ATOS ADMINISTRATIVOS

A Carta Magna estabelece os três poderes existentes no Estado Democrático Brasileiro, são eles: o Executivo, o Legislativo e Judiciário, sendo estes independentes e harmônicos entre si. (Art., X, Constituição Federal). Essa divisão dos poderes é matéria fundamental na análise dos atos administrativos, e de “forma ampla pode-se dizer que todo ato praticado no exercício da atividade administrativa é ato da Administração, enquanto que os atos administrativos são aqueles específicos praticados de forma restrita no exercício da função administrativa”. (DI PIETRO, 2011, p.192)

A existência da Administração Pública pressupõe a existência de um ato administrativo, para entender-se essa afirmação se faz necessário tratar-se do conceito dos Atos Administrativo, instituto ainda não pacificado na doutrina. Carvalho Filho (2012) considera em sua obra três importantes quesitos para a caracterização do ato administrativo, enumera a necessidade da vontade emanar do agente que representa a Administração Pública, ou que faz jus as prerrogativas emanadas por esta. Posteriormente, ressalta que o conteúdo deve-se voltar a satisfação e produção de efeitos jurídicos com finalidade público e por fim defende que todos os atos administrativos devem ser regidos pelo direito público.

Partindo do pressuposto de que o Estado possui três funções bem delineadas, a administrativa no entendimento de Maria Silvina Zanella Di Pietro, caracteriza-se por “prover de maneira imediata e concerta às exigências individuais ou coletivas para a satisfação dos interesses públicos pré-estabelecidos em lei” (2011, p. 195). A função administrativa é exercida precipuamente pelo poder Executivo, mas os outros poderes também a exercem de forma peculiar, além do que uma importante característica dos atos administrativos é que estes são conhecidos por produzirem efeitos concretos.

1.1 ELEMENTOS DOS ATOS ADMINISTRATIVOS

Sobre o sub tópico em questão, também paira uma série de divergências doutrinárias, inicialmente com o termo elementos, já que alguns pretendem assim chamá-los de requisitos. Cratella Junior (apud, DI PIETRO, 2011, p. 204) refere-se aos elementos, como a anatomia do ato administrativo, assim como Humberto Fragolla, que seria “o conjunto dos cinco elementos básicos constitutivos da manifestação de vontade da Administração Pública, ou seja, o agente, o objeto, a forma, o motivo e o fim”.

Quanto a diferenciação adotada por alguns doutrinadores no que diz respeito aos elementos ou requisitos, o referido autor os considera como sinônimos, assim como os pesquisadores defendem ser esta a posição mais acertada, tendo em vista o dispositivo de lei, positivado no art. 2, da lei nº 4.717/65.  O dispositivo em questão ao tratar dos atos nulos enumera cinco elementos: competência, forma, objeto, motivo e finalidade.

A competência está ligada diretamente com o sujeito, devendo este estar no atributo das funções ou em posição que assim o permita fazer, a competência faz menção a capacidade apregoada também no Código Civil de 2002. A competência aqui tratada emana da lei, e no direito brasileiro apenas os entes com personalidade jurídica são titulares de deveres e obrigações, portanto, quem tem capacidade para a prática de atos administrativos são as pessoas públicas políticas (União, Estados e Munícipios).

Os entes em comento no parágrafo anterior distribuem as funções entre seus órgãos administrativos, que subdividem-se entre os seus representantes, os seus agentes que são pessoa físicas.

Nos dizeres de Dirley da Cunha Júnior (2004, p. 97 APUD, CARVALHO, 2006, p.13) “para a expedição do ato administrativo é necessário um agente público competente. Isto é, não basta a presença da Administração Pública, precisando haver também um agente público que detenha competência jurídica para tanto”. Já a autora Maria Sylvia Zanella Di Pietro sustenta que “sujeito é aquele a quem a lei atribui competência para a prática de um ato” (2011 p. 205).

 Passando ao estudo do objeto, Maria Sylvia Zanella Di Pietro, prega “que é o efeito jurídico imediato que o ato produz” (2011, p.208), esta é uma característica intrínseca ao ato administrativo, a produção imediata de efeitos, “em decorrência deste nasce, extingue-se ou transforma-se um determinado direito” (2011, p.208).

Celso Antônio Bandeira de Mello (2013, p.398), afirma que o “objeto do ato administrativo seria em suma o próprio ato em sua essência”, o autor em comento acrescenta em sua obra que os atos administrativos emanam de uma autorização expressa da lei, portanto, é necessário a subsunção a norma, caso contrário, assim como a contrariedade com o ato normativo, ensejaria a hipótese de ilegalidades recorrente.

A forma é o elemento do ato administrativo que representa a exteriorização do ato conforme os ditames legais, sob pena de invalidação. A forma traduz o modo pelo qual o ato administrativo aparece, assim como revela também a sua existência e atesta sua validade. Di Pietro (2011, p. 210) “defende que a obediência a forma e ao procedimento constitui uma garantia jurídica para o administrado e para a própria administração, pois a forma, possibilita o controle do ato administrativo”.

O atributo da forma não pressupõe uma subordinação intensa a preceitos rígidos e inflexíveis, a rigor deve-se adotar a forma escrita proporcionando a documentação verificável a qualquer tempo. Celso Antônio Bandeira de Mello acrescenta que “a forma pode não ser eventualmente obrigatória, isto é, ocorrerá, por vezes ausência de prescrição legal sobre uma forma determinada, exigida para a prática do ato” (2013, p.398), mas o entendimento do doutrinador em análise, é bem enfático ao afirmar que esse instituto não pode de maneira alguma ser dispensado, tendo em vista que “a forma é o meio de exteriorização do ato, sem forma não pode haver ato” (2013, p. 398).

Em apartada síntese, a finalidade diz respeito ao resultado que a administração quer alcançar com a prática do ato, ou seja, atingir o interesse público obedecendo concomitantemente aos requisitos previstos taxativamente em lei. Quanto aos motivos, Di Pietro assevera em sua obra que trata-se do pressuposto de fato e de direito que serve de fundamento ao ato administrativo (2011, p. 212), portanto depende de previsão legal, assim como necessita de um contexto que impulsione a Administração Pública a praticar determinados atos. 

1.2 MÉRITO DOS ATOS ADMINISTRATIVOS

O estudo do mérito dos atos administrativo remete-nos a reflexão sobre o poder Discricionário da Administração Pública, este poder surge da impossibilidade do Legislador Ordinário em balizar todas as condutas de um agente administrativo em forma de lei, no mundo dos fatos, não há viabilidade em se criar uma legislação que preveja todas as diversidades de condutas, desta feita, surgem as margens derivadas das leis que oferecem uma possibilidade de valoração na conduta. (CARVALHO FILHO, 2012).

A margem de discricionariedade proposta pela lei concede ao agente da administração pública “a possibilidade de avaliar a conveniência e oportunidade dos atos que vai praticar na qualidade de administrador dos interesses coletivos”. (CARVALHO FILHO, 2012, p. 49) A conveniência indica as condições pelas quais o agente vai se conduzir, enquanto a oportunidade diz respeito ao momento em que a atividade deve ser produzida. Destarte, é importante ressaltar que a atividade discricionária do agente deve sempre almejar o fim colimado em lei, ou seja, deve sempre atender o objetivo público da ação administrativa (CARVALHO FILHO, 2012).

Maria Sylvia Zanella Di Pietro (2011), aduz que os atos administrativos vinculados estão definidos expressamente em lei, enquanto no discricionário há elementos expressos em lei e outros que são deixados a cargo da Administração Pública, hipótese em que incide uma margem de liberdade no momento da apreciação da oportunidade e conveniência. Partindo desse pressuposto a referida autora defende que os atos administrativos discricionários devem ser analisados a partir da ótica da legalidade e do mérito.

O mérito dos atos administrativos diz respeito à valoração da conduta que a lei conferiu ao administrador, é um ato reservado a ele, que pressupõe a eficiência da administração. Nesse intento, é válido acrescentar o entendimento de Eduardo Garcia de Enterria e Tomás Ramón Fernandez, para eles a “discricionariedade cinge-se a liberdade de escolha entre alternativas igualmente justas – indiferentes jurídicos – uma vez que a decisão a ser adotada se fundamenta em critérios extrajurídicos, não incluídos na lei e remetidos ao julgamento subjetivo da administração” (apud, PEREIRA, 2007, p. 31)

Por fim, o poder discricionário denota a administração pública uma força significativa, mas ressalta-se aqui a proibição do seu exercício de forma arbitrária, razão pelo qual Carvalho Filho defende que “a discricionariedade não é um poder absoluto e intocável, mas sim com uma alternativa outorgada ao administrador público para cumprir os objetivos que constituem as verdadeiras demandas dos administrados.” (2012, p. 50).

2 CONTROLE DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

Sobre o controle da administração pública se faz necessário de antemão explicar o porquê da necessidade de controle. Nessa senda, Hely Lopes (2011) diz que a administração pública, em todas as suas manifestações, deve atuar com legitimidade, em outras palavras, é preciso que a administração pública atue conforme as normas pertinentes a cada ato e de acordo com a finalidade e o interesse coletivo na sua realização.

Ainda sobre o assunto dispõe que, “até mesmo nos atos discricionários a conduta de quem os pratica há de ser legítima, isso é, conforme as opções permitidas em lei as exigências do bem comum”. (MEIRELLES, 2011, p. 713). Isso porque, caso infrinja as normas legais, vá de encontro com os princípios básicos da administração pública, ultrapasse sua competência, ou se desvie de sua finalidade institucional, o agente público vicia o ato tornando-o ilegítimo, sendo passível de anulação pela própria Administração Pública ou pelo Judiciário, através do instrumento adequado.

Também há casos em o ato administrativo é legítimo, mas ineficiente, inútil ou inconveniente ao interesse público. Assim, a coletividade impõe a verificação da eficiência do serviço ou a utilidade do ato administrativo, exigindo sua modificação ou supressão, ainda que legítimo. É feito somente pela Administração Pública, através da revogação. (MEIRELLES, 2011)

Assim, vimos a necessidade do controle da administração, em que os Estados de Direito, organizam a Administração, fixando competências a seus órgãos e agentes, e estabelecendo formas de controle da atuação administrativa.

O controle da Administração Pública é denominado por Carvalho Filho (2012, p. 929) como, “o conjunto de mecanismos jurídicos e administrativos por meio dos quais se exerce o poder de fiscalização e de revisão da atividade administrativa em qualquer das esferas de Poder”. A referência a um conjunto de mecanismos jurídicos e administrativos, diz respeito ao fato de que há formas jurídicas de controle, caso do controle judicial dos atos da Administração, e formas administrativas.

Já sobre fiscalização e revisão, Carvalho Filho diz ser os elementos básicos do controle. Isso porque, segundo o autor, a fiscalização é o poder de verificação que se faz sobre a atividade dos órgãos e dos agentes públicos, bem como em relação à finalidade pública que deve servir de objeto a Administração; e a revisão consiste no poder de corrigir as condutas administrativas. (CARVALHO FILHO, 2012)

E por fim, toda a atividade administrativa refere-se à abrangência do controle, que é bem ampla, alcançando todas as esferas de Poder, ou seja, todos os Poderes da República. Em razão de todos eles possuírem serviços administrativos, ainda que, sejam serviços de apoio, por esse motivo, o controle se exerce sobre todos os órgãos e agentes de caráter administrativo em todos esses Poderes, caso dos atos administrativos. Em que se pratica no Executivo, Judiciário e Legislativo, e sobre todos eles será possível exercer o controle. (CARVALHO FILHO, 2012).

A função do controle está fundamentalmente ligada com o instituto da garantia jurídica. Deve atuar em conformidade com os padrões fixados em lei e buscar o interesse da coletividade. Dessa forma, Carvalho Filho (2012, p. 931), diz que “os mecanismos de controle vão assegurar a garantia da administração e da própria Administração no sentido de ver alcançados esses objetivos e não serem vulnerados direitos subjetivos dos indivíduos nem as diretrizes administrativas. Isso constitui seu objeto. Sobre o tema Diógenes Gasparini (p. 546 apud CARVALHO, 2012, p. 930) diz que é “exatamente através do controle que os administrados e a Administração podem aferir a legitimidade ou a conveniência das condutas administradas, e por essa razão essa possibilidade espelha, sem a menor dúvida, uma garantia para ambos”.

2.1 CONTROLE DO ATO ADMINISTRATIVO DISCRICIONÁRIO PELO PODER JUDICIÁRIO

Marcelo Alexandrino (2010, p. 821) sobre o controle judiciário, ou judicial, profere como sendo “o controle realizado pelos órgãos do Poder Judiciário, no desempenho de atividade jurisdicional, sobre os atos administrativos praticados pelo Poder Executivo, bem como sobre os atos administrativos editados, no exercício de função administrativa pelo Poder Legislativo e pelo próprio Poder Judiciário”.

É um controle a posteriori, exclusivamente de legalidade ou legitimidade dos atos administrativos, nunca o mérito administrativo, por ser restrito à verificação da conformidade do ato com a norma legal que o rege. É um controle posterior, corretivo, incide sobre o ato já praticado, assim, é sobretudo, um meio de preservação dos direitos individuais, pois visa impor a observância da lei em cada caso concreto. (ALEXANDRINO; PAULO, 2010)

Esses direitos podem ser públicos ou privados, tendo que, o Poder Judiciário, no exercício de sua função jurisdicional, sempre agir mediante provocação do interessado ou do legitimado, salvo em casos de ação popular e na ação civil pública, em que o autor defende o patrimônio da comunidade lesado pela Administração. (MEIRELLES, 2011).

A lei nº 11.417 de 2006, que regulamentou o art. 103-A da CF, disciplinando sobre a súmula vinculante, e tornou mais eficiente e rigoroso esse controle judicial. Com isso, passou a admitir-se o cabimento de reclamação ao STF contra ato administrativo, e também decisão judicial, que contrarie súmula daquela natureza, ou a aplique indevidamente. (CARVALHO FILHO, 2012). No caso de procedência da reclamação, o efeito da decisão será a anulação do ato reclamado, conforme o parágrafo 3º do art. 103-A que dispõe:

 

Art. 103-A. O Supremo Tribunal Federal poderá, de ofício ou por provocação, mediante decisão de dois terços dos seus membros, após reiteradas decisões sobre matéria constitucional, aprovar súmula que, a partir de sua publicação na imprensa oficial, terá efeito vinculante em relação aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal, bem como proceder à sua revisão ou cancelamento, na forma estabelecida em lei.

  •  Do ato administrativo ou decisão judicial que contrariar a súmula aplicável ou que indevidamente a aplicar, caberá reclamação ao Supremo Tribunal Federal que, julgando-a procedente, anulará o ato administrativo ou cassará a decisão judicial reclamada, e determinará que outra seja proferida com ou sem a aplicação da súmula, conforme o caso.

Nesse sentido, é vedado ao Judiciário apreciar o que se denomina de mérito administrativo, sendo a ele interditado o poder de reavaliar critérios de conveniência e oportunidade dos atos, que são privativos do administrador público. Isso porque, caso se admitisse essa reavaliação, estaria possibilitando que o juiz exercesse também função administrativa, o que não corresponde à sua competência. Sendo também vedada na Constituição a invasão de atribuições em face do sistema de tripartição dos Poderes. (CARVALHO FILHO, 2012).

Marcelo Alexandrino (2010) discorre sobre o tema, que não faria sentido o juiz, órgão voltado a atividade jurisdicional, substituir, pela sua, a ótica do administrador, ou seja, caso fosse dado ao juiz decidir sobre a legitimidade da valoração de oportunidade e conveniência realizada pelo administrador na prática de ato discricionários de sua competência, estaria esse juiz substituindo o administrador no exercício dessa atividade valorativa.

Com isso, entende-se que os atos discricionários podem ser amplamente controlados pelo Judiciário, mas somente no concerne a sua legalidade ou legitimidade. Assim o Poder Judiciário pode sempre, desde que provocado, anular atos administrativos, vinculados ou discricionários, que apresentem vícios de ilegalidade ou ilegitimidade. Não podendo admitir a revogação pelo Poder Judiciário, de um ato editado pelo Poder Executivo ou pelo Poder Legislativo. (ALEXANDRINO; PAULO, 2010)

3 OS POSICIONAMENTOS JURISPRUDÊNCIAS ACERCA DO CONTROLE DO ATO ADMINISTRATIVO DISCRICIONÁRIO PELO TJ- MA

Neste capítulo abordaremos a possibilidade ou não do efetivo controle pelo Poder Judiciário nos atos administrativos discricionários, para tanto, os autores realizaram uma triagem nas decisões do Tribunal de Justiça do Maranhão, no que diz respeito à atuação do Judiciário frente à realização de concursos públicos no Estado.

Inicialmente é válido tecermos algumas considerações sobre os concursos públicos, estes são atos administrativos de caráter obrigatório, previstos no art. 37, II, da Constituição Federal (1988):

Art. 37. A administração pública, direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, dos Munícipios e do Distrito Federal obedecerá aos Princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e também ao seguinte:

  • Os cargos, empregos e funções públicas são acessíveis aos brasileiros que preencham os requisitos estabelecidos em lei, assim como os estrangeiros, na forma da lei.

II- A investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos de acordo com a natureza e complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração.  

Conforme entendimento exposto acima, a admissão em cargos e empregos públicos deve se dar de maneira ampla e democrática, precedido de um procedimento impessoal onde se assegurem igualdade de oportunidades a todos os interessados em concorrer ao exercício de cargos oferecidos pelo Estado, a quem caberá à atividade de identificar e selecionar os mais adequados mediante critérios meramente objetivos.

Desta forma, pode-se concluir que os concursos públicos visam escolher, de forma democrática e isonômica, os mais competentes no intuito de proporcionar uma atuação administrativa eficiente no atendimento ao interesse público e ao cidadão, proporcionando a efetividade do Principio da Soberania do Interesse Público. Por tais motivos, as regras concernentes ao concurso devem estabelecer critérios objetivos para que a escolha funde-se nos aspectos de mérito cabíveis para que o poder público atue de forma otimizada, podendo responder aos anseios sociais. (Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão. 3ª turma, Apelação Cível 45402006. Relator: CLEONICE SILVA FREIRE)

Nessa seara o trâmite do certame é obrigatoriamente regido pelo seu respectivo Edital, o que nos remete a máxima do princípio da vinculação ao edital. O instituto em questão reveste-se dos princípios da legalidade e moralidade, contudo, necessita de tratamento próprio em razão de sua importância. Com efeito, o edital é ato normativo editado pela administração pública para disciplinar o processamento do concurso público. (Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão. 3ª turma, Apelação Cível 45402006. Relator: CLEONICE SILVA FREIRE)

Desta feita, “sendo um ato normativo editado no exercício de competência legalmente atribuída, o edital encontra-se subordinado à lei e vincula, em observância recíproca, Administração e candidatos, que dele não podem se afastar a não ser nas previsões que conflitem com regras e princípios superiores e que por isso são ilegais ou inconstitucionais”. (Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão. 3ª turma, Apelação Cível 45402006. Relator: CLEONICE SILVA FREIRE)

Por ora, essa contextualização é de suma relevância para adentrarmos ao tema da pesquisa, a doutrina moderna, defende que o Poder Judiciário controla os atos administrativos discricionários, em razão especialmente do princípio da inafastabilidade da jurisdição, consagrada no art. 5º, inciso XXXV, da Constituição Federal de 1988. Em se tratando de concursos públicos, os atos praticados no decorrer da competição, de forma lógica não escapam do controle do Poder Judiciário. Mas para isso as condições de ingresso no serviço público, dispostas no edital, por exemplo, devem violar algum dos princípios que regem a seleção dos melhores candidatos para o provimento dos cargos públicos.

A seguir os entendimentos jurisprudencias que embasaram a pesquisa:

ADMINISTRATIVO - CONCURSO PÚBLICO - DELEGADO DE POLÍCIA - EDITAL - SUPOSTA OFENSA À LEGALIDADE - CANDIDATO APROVADO NA PRIMEIRA E SEGUNDA ETAPA, MAS NÃO CLASSIFICADO DENTRO DO NÚMERO DE VAGAS PARA A ETAPA SUBSEQUENTE - CONTROLE JURISDICIONAL DO MÉRITO ADMINISTRATIVO - IMPOSSIBILIDADE1 - É possível que o edital de concurso público para preenchimento de cargo de delegado de polícia estabeleça um critério classificatório de modo que só concorrerão para as fases posteriores um determinado número de candidatos, sendo que detém mera expectativa de direito de participar da etapa subsequente (exame médico, aptidão física e exame psicotécnico) o candidato que tenha ficado fora da classificação estabelecida. Inexistência de afronta aos princípios constitucionais.2 - Impossível pretender o Poder Judiciário substituir o administrador público no exercício de suas funções, vez que àquele somente é possível realizar o controle de legalidade do ato administrativo, enquanto que o controle de mérito, no qual são utilizados os critérios da oportunidade e da conveniência, apenas pode ser efetuado pela própria Administração Pública. Apelação provida. (TJ-MA - AC: 45402006 MA , Relator: CLEONICE SILVA FREIRE, Data de Julgamento: 01/07/2007, SAO LUIS)

ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. CONCURSO PÚBLICO. REPROVAÇÃO DO CANDIDATO. PROVA DISCURSIVA. DISCRICIONARIEDADE DA BANCA EXAMINADORA. AUSÊNCIA DE ILEGALIDADE. ÂMBITO DO CONTROLE JUDICIAL EM CASO DE CONCURSO PÚBLICO. AUSÊNCIA DE DIREITO LÍQUIDO E CERTO. I ? As bancas examinadoras detêm discricionariedade técnica, a qual se traduz na liberdade de adotar critérios científicos que melhor atinjam o fim almejado pelo certame, buscando a consecução do principio da eficiência administrativa. II ? Não há qualquer ilegalidade a ser expurgada pelo judiciário em matéria de concurso público, se o impetrante fora reprovado na etapa discursiva da concorrência, após resultado de recurso administrativo por ele interposto perante a Comissão de concurso, eis que logrou pontuação menor do que a exigida no edital do torneio. III ? Cabe ao Judiciário, ao ser acionado para controlar os atos de banca examinadora de qualquer concurso público, examinar tão-somente a legalidade do procedimento por ela adotado, não lhe sendo possível fazer as vezes da banca, substituindo-a, para o fim de reexaminar conteúdo de questões e critérios de correção das provas. Precedentes do STJ. IV ? Mandado de Segurança denegado. (TJ-MA - MS: 0054422012 MA 0005547-48.2012.8.10.0001, Relator: JAIME FERREIRA DE ARAÚJO, Data de Julgamento: 18/12/2012, CÂMARAS CÍVEIS REUNIDAS, Data de Publicação: 27/02/2013)

DIREITO ADMINISTRATIVO E CONSTITUCIONAL. MANDADO DE SEGURANÇA. CONCURSO PÚBLICO PARA INGRESSO NA CARREIRA DO MINISTÉRIO PÚBLICO. PROVA ORAL. PRINCÍPIOS DA LEGALIDADE E DA VINCULAÇÃO AO EDITAL. CONTROLE PELO PODER JUDICIÁRIO. POSSIBILIDADE. QUESTIONAMENTO SOBRE MATÉRIA ESTRANHA À DISCIPLINA "DIREITO CIVIL". DESAFETAÇÃO DE BENS PÚBLICOS. MATÉRIA ATINENTE AO CONTEÚDO PROGRAMÁTICO DA DISCIPLINA "DIREITO ADMINISTRATIVO". DESVINCULAÇÃO DAS QUESTÕES AO EDITAL. ILEGALIDADE. CARACTERIZAÇÃO. I - Em se tratando de concursos públicos, os atos normativos que regulam a competição não escapam do controle do Poder Judiciário. Desde que violem algum dos princípios que regem a seleção dos melhores candidatos para o provimento dos cargos públicos, os atos perpetrados pela Administração Pública podem ser objeto de exame pelo Poder Judiciário, notadamente se estiverem em confronto com os princípios da legalidade e o da vinculação ao edital. Precedentes do STJ. II - Em sede de concurso público, o examinador deve se ater ao conteúdo programático constante do Edital respectivo. Sendo a afetação e desafetação matérias do conhecimento jurídico restritas à disciplina "Direito Administrativo", por tratarem do procedimento inerente à alienação de bens públicos, ou seja, das condições necessárias para que seja viável a alienação desses bens, não poderiam ter sido questionadas como se fossem institutos vinculados à disciplina "Direito Civil". III - No âmbito do Direito Civil, a classificação dos bens públicos não tem o mesmo significado do instituto da afetação e desafetação, exatamente por representar diferentes aspectos de um mesmo tema. Há, pois, individualização da natureza jurídica dos referidos institutos como atinentes à disciplina de "Direito Administrativo", o que justifica o pleito de anulação das questões formuladas pela banca examinadora. IV - Segurança concedida. (TJ-MA - MS: 0068962010 MA 0006896-60.2010.8.10.0000, Relator: MARCELO CARVALHO SILVA, Data de Julgamento: 25/07/2012, TRIBUNAL PLENO, Data de Publicação: 24/08/2012)

Ou seja, o entendimento extraído a partir do levantamento feito em decisões jurisprudências do Estado do Maranhão, é que quanto ao mérito, a possibilidade de ser modificar os critérios de conveniência e oportunidade do administrador não há possibilidade de estes serem alterados, o que enseja uma participação efetiva, podendo se dizer até obrigatória do judiciário, seria a ocorrência de um ato manifestamente ilegal. A vinculação ao edital também é um critério que permite discussões no judiciário, já que em sede de concurso, a banca examinadora deve se ater ao conteúdo programático, restringindo-se aos critérios constantes no Edital do respectivo concurso, caso contrário há elementos aptos que embasem e justifiquem a possível anulação das questões formuladas pelo examinador.

Desta forma, o que se defende aqui é a impossibilidade do Poder Judiciário fazer às vezes do administrador público no exercício de suas funções, cabe ao judiciário realizar exclusivamente o controle de legalidade do ato administrativo, enquanto que o controle de mérito, no qual são utilizados os critérios da oportunidade e da conveniência, apenas pode ser efetuado pela própria Administração Pública.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A análise do mérito dos atos administrativos nos remete ao poder discricionário da Administração Pública, que surge da impossibilidade do legislador ordinário de balizar todas as condutas de um agente administrativo, na forma da lei. Uma vez que, não há viabilidade de uma legislação prever todas as condutas.

Assim, a discricionariedade prevista em lei permite ao agente da administração a possibilidade de avaliar a conveniência e oportunidade dos atos que vai praticar na qualidade de administrador dos interesses coletivos. Os atos administrativos vinculados estão definidos expressamente em lei, enquanto no discricionário há elementos expressos em lei e outros que são deixados a cargo da Administração Pública, hipótese em que incide uma margem de liberdade no momento da apreciação da oportunidade e conveniência.

Dessa maneira, é preciso haver um controle da Administração, desses atos administrativos, sendo feito através de qualquer uma das esferas de Poder. Em relação ao presente trabalho, esse controle do ato discricionário também que pode ser feito pelo Poder Judiciário, mas somente no concerne a sua legalidade ou legitimidade, podendo sempre, desde que provocado, anular atos administrativos, vinculados ou discricionários.

Por fim, o presente trabalho trás o posicionamento do ato administrativo pelo TJ-MA, entende sobre a impossibilidade do Poder Judiciário de realizar algumas funções do administrador público, cabendo ao judiciário realizar exclusivamente o controle de legalidade do ato administrativo.

REFERÊNCIAS

ALEXANDRINO, Marcelo; PAULO, Vicente. Direito administrativo descomplicado. 18º ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2010.

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988. Organização do texto: Juarez de Oliveira. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 1990. 168 p. (Série Legislação Brasileira).

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[1] Paper apresentado a disciplina de Direito Administrativo 1, da Unidade de Ensino Superior Dom Bosco – UNDB.

[2] Alunos do Curso de Direito da UNDB.

[3] Professor Mestre.

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