O Conceito de Dívida Ativa

Por Claudio de Araujo Ferreira | 06/09/2017 | Direito

Autor: Cláudio de Araújo Ferreira

Doutorando Direito PUC/SP

Artigo: Conceito de Dívida Ativa

RESUMO

O objetivo do presente artigo é tratar do conceito de dívida ativa sob as diferentes óticas do direito. No direito tributário, financeiro, publico, civil e no processo de execução.   

Palavras-chave: Dívida Ativa, Direito Público, Processo de Execução

 

Conceito de Dívida Ativa

O presente artigo trata do conceito de dívida ativa, sua materialização e formalidades necessárias. Se trata de um ativo de grande potencial de geração de valor para os entes públicos, porém, de certa forma não explorado.

I. Definição

Por Dívida Ativa de maneira ampla podemos entender como um crédito exigível, cuja prestação já se encontra vencida e não adimplida, ou seja, é uma dívida exigível. A Dívida Ativa pode ter vários conceitos.

 

II. Dívida Ativa no Direito Civil

Dentro direito civil entra no conceito do direito das obrigações. Existe um sujeito titular de um direito exigível (crédito) e um sujeito detentor de uma obrigação (pagar).

 

III. Dívida Ativa no Direito Financeiro

No que tange ao direito financeiro, a Dívida Ativa abrange apenas os créditos da Fazenda Pública e se sujeita a processos de inscrição e cobrança.  

Assim preceituam os arts. 39 e 88 da Lei 4.320/1964:

“Art. 39. Os créditos da Fazenda Pública, de natureza tributária ou não tributária, serão escriturados como receita do exercício em que forem arrecadados, nas respectivas rubricas orçamentárias.     

§ 1º - Os créditos de que trata este artigo, exigíveis pelo transcurso do prazo para pagamento, serão inscritos, na forma da legislação própria, como Dívida Ativa, em registro próprio, após apurada a sua liquidez e certeza, e a respectiva receita será escriturada a esse título.     

§ 2º - Dívida Ativa Tributária é o crédito da Fazenda Pública dessa natureza, proveniente de obrigação legal relativa a tributos e respectivos adicionais e multas, e Dívida Ativa não Tributária são os demais créditos da Fazenda Pública, tais como os provenientes de empréstimos compulsórios, contribuições estabelecidas em lei, multa de qualquer origem ou natureza, exceto as tributárias, foros, laudêmios, alugueis ou taxas de ocupação, custas processuais, preços de serviços prestados por estabelecimentos públicos, indenizações, reposições, restituições, alcances dos responsáveis definitivamente julgados, bem assim os créditos decorrentes de obrigações em moeda estrangeira, de subrogação de hipoteca, fiança, aval ou outra garantia, de contratos em geral ou de outras obrigações legais.        

§ 3º - O valor do crédito da Fazenda Nacional em moeda estrangeira será convertido ao correspondente valor na moeda nacional à taxa cambial oficial, para compra, na data da notificação ou intimação do devedor, pela autoridade administrativa, ou, à sua falta, na data da inscrição da Dívida Ativa, incidindo, a partir da conversão, a atualização monetária e os juros de mora, de acordo com preceitos legais pertinentes aos débitos tributários. 

§ 4º - A receita da Dívida Ativa abrange os créditos mencionados nos parágrafos anteriores, bem como os valores correspondentes à respectiva atualização monetária, à multa e juros de mora e ao encargo de que tratam o art. 1º do Decreto-lei nº 1.025, de 21 de outubro de 1969, e o art. 3º do Decreto-lei nº 1.645, de 11 de dezembro de 1978

§ 5º - A Dívida Ativa da União será apurada e inscrita na Procuradoria da Fazenda Nacional.

(...) 

Art. 88. Os débitos e créditos serão escriturados com individuação do devedor ou do credor e especificação da natureza, importância e data do vencimento, quando fixada.”

IV. Dívida Ativa no Direito Tributário

Para Bernardo Ribeiro de Moraes, a Dívida Ativa Tributária, conforme estabelece o Código Tributário Nacional, é proveniente de crédito tributário desta natureza, isto é, tem natureza tributária. A dívida, no caso, deve se originar de institutos que tenham natureza tributária, de créditos provenientes de obrigações legais relativas a tributos e penalidades respectivas, e.g., decorrentes de impostos, taxas, contribuições de melhoria, contribuições sociais e econômicas, empréstimos compulsórios, multas fiscais, etc., inclusive adicionais a tais exigências legais. Os acréscimos legais, como juros de mora e atualização monetária, relativos a tais tributos, passam a ter natureza tributária, vinculados à dívida principal. Para a constituição da Dívida Ativa tributária, além da natureza tributária se faz a presença dos seguintes elementos: (i) obrigação tributária pós-individualizada transforma-se em crédito tributário; (ii) inadimplemento; e (iii) inscrição no registro próprio.[1]

O art. 201 da Lei 5.172/66 define a Dívida Ativa Tributária:

Art. 201 – Constitui dívida ativa tributária a proveniente de crédito tributário dessa natureza, regularmente inscrita na repartição administrativa competente, depois de esgotado o prazo fixado para pagamento, pela lei ou por decisão final proferida em processo regular.”

No âmbito dos Estados temos como exemplo de Dívida Ativa os seguintes tributos: ICMS, IPVA e ITCMD, enquanto que no âmbito municipal podemos citar tributos como o IPTU e o ISS.

 

V. Dívida Ativa no Processo de Execução

No âmbito do processo de execução, o Código de Processo Civil em seu art. 585, expressamente cita a Dívida Ativa como título executivo extrajudicial, sujeito a execução:

Art. 585 – São títulos executivos extrajudiciais:

(...)

VI – a certidão de dívida ativa da Fazenda da União, Estado, Distrito Federal, Território e Município, correspondente aos créditos inscritos na forma da Lei.”

O art. 2º da Lei 6.830/1980 que trata da cobrança judicial de Dívida Ativa define que como responsável pela inscrição como Dívida Ativa o órgão competente para apurar a liquidez e certeza do crédito, senão vejamos:

“Art. 2º Constitui Dívida Ativa da Fazenda Pública aquela definida como tributária ou não tributária na Lei 4.320/1964, com as alterações posteriores, que estatui normas gerais de direito financeiro para elaboração e controle dos orçamentos e balanços da União, dos Estados, dos Municípios e do Distrito Federal.

(...)

§ 3º A inscrição, que se constitui no ato de controle administrativo da legalidade, será feita pelo órgão competente para apurar a liquidez e certeza do crédito e suspenderá a prescrição, para todos os efeitos de direito, por 180 dias ou até a distribuição da execução fiscal, se ocorrer antes de findo aquele prazo.”

Ou seja, por Dívida Ativa podemos entender como todos os créditos da Fazenda Pública, de origem tributária ou não tributária, vencidos, inscritos como Dívida Ativa, devidamente individualizados por credor e devedor, com especificação da natureza, importância e data do vencimento (quando aplicável), os quais poderão ser objeto de execução. 

A Dívida Ativa Tributária pode ser composta por: (i) impostos; (ii) taxas (taxas de polícia e taxas de serviço); (iii) contribuições de melhoria; (iv) contribuições (intervenção de domínio econômico; sociais; e de interesse das categorias profissionais); (v) adicionais de tributo; e (vi) multas tributárias.

No âmbito da Dívida Ativa Não-Tributária vale ressaltar aquelas decorrentes de: (i) contratos; (ii) decisões administrativas; (iii) contribuições não previdenciárias previstas em Lei; (iv) custas processuais; (v) preços de serviços; (vi) obrigações em moeda estrangeira; (vii) sub-rogações (hipoteca, fiança, aval e outras garantias); e (viii) outras obrigações contratuais ou legais.  

Por último, sobre o lançamento, há Dívida Ativa lançada (ex: impostos e taxas) e não sujeitas ao lançamento, como por exemplo aquelas oriundas de contratos (ex: crédito de locação de bem público).

VI. Inscrição na Dívida Ativa, Efeitos da Inscrição e Certidão de Inscrição

Podemos entender a inscrição como o ato administrativo vinculado é o responsável pelo nascimento da Dívida Ativa Tributária e Não Tributária. A inscrição é obrigatória, embora exista Dívida Ativa preexistente à inscrição. Somente créditos líquidos e certos podem ser inscritos na Dívida Ativa. Antes da inscrição a Fazenda Pública deverá realizar um exame a fim de entender se tais requisitos foram obedecidos. A legislação não estabeleceu prazo para a inscrição, dizendo apenas que deve ser inscrita após esgotado o prazo para pagamento do crédito. Porém, o Decreto Lei nº 147/1967 promulgando a Lei Orgânica da Procuradoria Geral da Fazenda Nacional estabeleceu o prazo máximo de 30 dias do término do processo administrativo ou prazo para recolhimento.

“Art.22. Dentro de trinta dias da data que se tornarem findos os processos administrativos, pelo transcurso do prazo fixado para recolhimento do débito para com a União, as repartições públicas competentes, sob pena de responsabilidade dos seus dirigentes, são obrigadas a encaminhá-los à procuradoria da Fazenda Nacional da respectiva unidade federativa, para efeito de inscrição e cobrança judicial das dívidas deles originadas.  

Sobre a competência para ordenar a inscrição, a Lei 6.830 em seu art. 2º par. 4º, estabelece a competência da procuradoria pública. Uma vez realizada o controle administrativo de legalidade, é realizada a inscrição por meio do registro no documento conhecido como “Termo de Inscrição”. Uma vez registrado crédito na Dívida Ativa é gerada uma certidão de Dívida Ativa.

VII. Composição da Dívida Ativa

Além da dívida originária, compõem a dívida ativa os ônus decorrentes da impontualidade, quais sejam (i) multa moratória; (ii) juros de mora; (iii) atualização monetária; e (iv) multa de ajuizamento.

A multa moratória é o equivalente do direito civil a uma multa contratual que incide pelo descumprimento da obrigação. Ou seja, uma vez em mora a multa moratória passa a incidir. Esta deve ser instituída por lei e se trata de obrigação acessória, ou seja, sua validade está subordinada à obrigação principal. Ainda, esta pode ser estabelecida proporcionalmente ao tempo de atraso e no cálculo deve-se somar o valor total do crédito tributário, incluindo multa fiscal, se houver.

Para Bernardo Ribeiro de Moraes, do ponto de vista tributário, a natureza jurídica dos juros de mora é de reparação pecuniária, em razão da impontualidade do sujeito passivo no cumprimento da obrigação, objetivando ressarcir os prejuízos da Fazenda Pública relativamente ao atraso no recolhimento da respectiva dívida; o mesmo se diga quanto à dívida não tributária.[2] Como no caso da multa moratória os juros de mora são obrigações acessórias e estes começam a correr a partir do prazo legal do pagamento, contados mês a mês sobre o valor originário da dívida. Os juros de mora são limitados a 1% ao mês e não incidem sobre juros.

Sobre a atualização monetária, esta foi criada pela Lei 4.357/1964. Basicamente esta corrige o valor inadimplente pelas variações do poder aquisitivo da moeda. Esta incide sobre o tributo e multa, conforme decisão do Supremo Tribunal Federal.[3]

Por último, é comum encontrarmos como ônus de dívida ativa a multa de ajuizamento, também conhecida como pena de ajuizamento em torno de 10% a 20% sobre o valor do débito inscrito.

VIII. Ação de Execução Fiscal e Cancelamento e Baixa de Dívida Ativa

Finalizadas as tentativas de cobrança amigável ou administrativa inicia-se a etapa da cobrança judicial. O instrumento para tal é a ação de execução fiscal.

Há os casos em que a execução será realizada com base na certidão de inscrição de Dívida Ativa e casos em que a execução será realizada com base em outros instrumentos, como por exemplo, um contrato de locação de um bem público.

Os atos da execução se sucedem através de fases procedimentais, denominadas tendo em vista os pontos mais marcantes: Propositura da Ação e Citação, Penhora, Embargos do Devedor, Expropriação Executiva e Pagamento ao Credor.[4]

A Dívida Ativa será baixada quando houver sua satisfação integral com seu pagamento. Seja durante o processo de cobrança amigável ou judicial. Ainda, observando o caráter temporário, a Dívida Ativa será cancelada na hipótese de prescrição ou decadência e, ainda, nas hipóteses de inscrição indevida e também no falecimento do devedor.

Em se falando do pagamento da Dívida Ativa, este pode ocorrer à vista ou de forma parcelada. A lei permite o parcelamento, desde que observada uma série de requisitos, como por exemplo o reconhecimento formal da dívida, o devedor deve demonstrar capacidade de quitar o parcelamento, qualquer inadimplência significa cancelamento do parcelamento, quem estiver inadimplente não poderá solicitar outro parcelamento.

IX. Conclusão

A Dívida Ativa, mais do que instrumento jurídico, constitui um patrimônio dos entes públicos, constando de seu balanço como um crédito. Sob as diferentes óticas do direito esta pode ter diversas formas de tratamento, seja como obrigação relação creditícia no direito civil ou relação de natureza tributária em se tratando de crédito tributário.

X. Bibliografia

Da Silva, MAerico Luis Martins – Ed. Revista dos Tribunais, 2ª ed. 20010

Moraes, Bernardo Ribeiro de. Dívida Ativa – São Paulo: Quartier Latam, 2004.

SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, Recurso Extraordinário nº 82.6161, de 10.06.1977; Recurso Extraordinário nº 86.977 – SP, in RTJ, vol. 82,

 

[1] Moraes, Bernardo Ribeiro de. Dívida Ativa – São Paulo: Quartier Latam, 2004.

[2] Moraes, Bernardo Ribeiro de. Dívida Ativa – São Paulo: Quartier Latam, 2004. Pg.111.

[3] SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, Recurso Extraordinário nº 82.6161, de 10.06.1977; Recurso Extraordinário nº 86.977 – SP, in RTJ, vol. 82, pág. 610.