O CASO ISABELLA NARDONI: ESPERANÇA DE JUSTIÇA PARA OUTRAS FAMÍLIAS BRASILEIRAS
Por Eduardo Veronese da Silva | 13/04/2010 | DireitoO CASO ISABELLA NARDONI: ESPERANÇA DE JUSTIÇA PARA OUTRAS FAMÍLIAS BRASILEIRAS
Eduardo Veronese da Silva[1]
Há muito não se via um Júri Popular que atraísse tanta atenção e comoção pública, talvez, o mais recente tenha acontecido em 1997, cinco anos após a morte da atriz Daniela Perez, crime que ocorreu no ano de 1992. Os acusados, Guilherme de Pádua e sua esposa Paula Thomaz, segundo laudo pericial, mataram a atriz com 18 golpes de tesoura. O julgamento durou aproximadamente três dias. Após o desenrolar de todo o processo de julgamento, os jurados votaram pela condenação dos réus. O juiz fixou a pena de 19 anos de prisão para ele e de 18 anos e seis meses para ela.
O julgamento de Alexandre Nardoni e Ana Carolina Jatobá, acusados de matarem a menina Isabella, pai e madrasta da menina, mobilizou praticamente toda a população brasileira a ponto de não desgrudarem os olhares da televisão. Foram cinco longos dias, sem que se quisesse perder qualquer informação, detalhe ou imagem do julgamento.
Estima-se que a esperança de muitos brasileiros que sofrem até hoje pela morte de um filho (a), em que os culpados continuam sem o devido tratamento penal conforme determina a lei, é de que com a realização deste Júri, venha despertar uma verdadeira mobilização nacional por parte do poder judiciário e, da própria sociedade, para agilizar esses processos que envolvem o cometimento de homicídios, principalmente contra crianças e adolescentes. Devendo ser dada toda a conotação necessária para descortinar e tornar público os inúmeros crimes praticados com requintes de crueldades contra estas pessoas, nos mesmos moldes que foram dispensados no caso da menina Isabella Nardoni.
Este é o caso de Élio Henrique da Silva, 54 anos, que fez questão de exibir durante todos os dias do julgamento, um cartaz com a foto da filha Ludmila, morta aos 17 anos de idade, após ser estuprada no ano de 2000. Outra família que espera pela aplicação da justiça, reside na cidade de Indiara, interior do estado de Goiás, quando sua filhinha de 1 ano e 8 meses, morreu logo após dar entrada no hospital da cidade, apresentando ferimentos profundos e indícios de ter sido abusada sexualmente. O principal suspeito do crime é o padrasto da criança, de 24 anos de idade. Segundo laudo médico, havia inchaço no tórax, lesões graves no corpo e na região anal da criança.
Outro crime assustador ocorreu no estado de Pernambuco no final de 2009. O corpo da menina Adriana, de 8 anos de idade, foi encontrado dentro de um saco plástico na margem de um rio no município de Vitória de Santo Antão. Segundo o relato da policia, a menina foi morta a pauladas, possivelmente desferida por seu padrasto, um agricultor de 24 anos, que acabou confessando o crime[2].
Na data de ontem (12/04/10), saiu uma decisão do Superior Tribunal de Justiça negando por unanimidade o pedido de habeas corpus para uma mulher que matou o próprio filho recém-nascido. Ela teria espancado a criança logo após o parto e perfurado seu corpo por diversas vezes. O crime aconteceu em outubro de 2007.
A advogada da ré recorreu da decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo que pretendia a revogação da prisão preventiva por homicídio triplamente qualificado, previsto no art. 121 do Código Penal Brasileiro. Uma das alegações apresentadas pela defesa foi o excesso de prazo para o julgamento realizado pelo Tribunal do Júri. A mulher encontra-se presa desde dezembro de 2007.
O relator do processo, ministro Arnaldo Esteves Lima, afirmou que não há constrangimento ilegal na decretação da prisão preventiva, pois a decisão está fundamentada na prova da materialidade e na existência de indícios de autoria do crime. O relator destacou também que a decisão faz menção a situações concretas e se mostra necessária para garantir a ordem pública.
Esses são alguns dos exemplos de tamanha crueldade praticada contra crianças e adolescentes no território brasileiro e, para se ter uma idéia, o "Disque 100" - serviço de denúncia nacional de abuso e exploração sexual contra crianças e adolescentes, da Secretaria Especial dos Direitos Humanos, órgão do Governo Federal, recebeu somente no ano passado 29.756 denuncias de todo tipo de agressão praticada contra crianças. Segundo a coordenadora do Disque 100, Leila Paiva: "Para nós, o aumento no número de denúncias não é um diagnostico de crescimento da violência, mas de que as pessoas estão ficando menos tolerantes a esse tipo de crime".
Portanto, oportuno esclarecer alguns pontos para a instituição do Tribunal do Júri no ordenamento penal brasileiro, onde os olhares se voltam para os jurados, pessoas comuns do povo convocadas para representar a sociedade durante a sessão de julgamento.
Eles (os jurados) acompanham todas as provas e depoimentos apresentados na audiência (acusação feita pelo promotor de justiça, inquirição das testemunhas, dos peritos e a apresentação de defesa feita pelo advogado dos réus) e, ao final, respondem alguns quesitos do processo formulados pelo juiz-presidente, para que seja prolatada a sentença – o veredicto.
No Brasil, o surgimento do Tribunal do Júri se deu após a independência e limitava sua competência ao julgamento de crimes de imprensa. Somente a partir da Constituição Imperial de 1824 passou-se a considerar o Júri como órgão do Poder Judiciário, tendo sua competência ampliada para julgar causas cíveis e criminais.
Com o Código de Processo Criminal de 1832, o Brasil adotou um sistema misto, inglês e francês. Este atribuia aos jurados competência sobre a matéria de fato enquanto que aquele sobre a matéria de direito. Na atual Constituição Brasileira, a matéria está disciplinada no art. 5º, XXXVIII, alínea d, como direito e garantia individual: "XXXVIII - é reconhecida a instituição do Júri, com a organização que lhe der a lei, assegurados: a) a plenitude de defesa; b) o sigilo das votações; c) a soberania dos veredictos; d) a competência para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida". Entenda-se do dispositivo sublinhado, os crimes de homicídio, tentativa de homicídio, aborto e incentivo ao suicídio.
A composição do Júri se fará representada por um juiz de direito (togado) e por 25 (vinte e cinco) jurados que serão sorteados entre as pessoas alistadas; 7 (sete) das quais constituirão o Conselho de Sentença em cada sessão de julgamento.
A pessoa interessada poderá se inscrever para ser jurado ou ser indicada para exercer esta função. Importante esclarecer que, feita a inscrição o nome passa a constar numa lista elaborada anualmente pelo juiz-presidente da Comarca. No julgamento do crime cometido por Alexandre Nardoni e Ana Carolina Jatobá, foram sorteados 4 (quatro) mulheres e 3 (três) homens. Deve ser ressaltado que a escolha desses jurados não se dá pela posição social, profissão ou grau de instrução, mas, principalmente, após verificação de sua idoneidade moral e de seus antecedentes criminais.
Os crimes de competência para julgamento realizado pelo Tribunal do Júri estão relacionados aos casos de homicídio, tentativa de homicídio, aborto e incentivo ao suicídio. Devendo ser observada uma exceção, quando a pena para o crime de aborto foi igual ou inferior a um ano, não há necessidade de instituição do Júri.
Feita a convocação dos jurados, eles ficam proibidos de conversar sobre o caso em julgamento ou sobre qualquer outro processo. Entretanto, podem conversar sobre outros assuntos.No mais, pode conversar apenas com o juiz-presidente, o escrivão ou com o oficial de justiça. Durante a sessão e nos intervalos, é proibido contato com o mundo exterior, telefonar ou receber telefonemas, ler jornal, ouvir rádio ou assistir televisão. Tudo isso, para evitar algum tipo de influencia externa que possa vir a mudar o pensamento dos jurados acerca dos fatos carreados no processo e em relação aos acusados.
Ao final, proferida a sentença pelos jurados, segundo prescreve o Código de Processo Penal Brasileiro, em seu art. 593, caberá recurso: "III – das decisões do Tribunal do Júri, quando: a) ocorrer nulidade posterior a pronuncia; b) for à sentença do juiz-presidente contrária a lei expressa ou a decisão dos jurados; c) houver erro ou injustiça no tocante a aplicação da pena; d) for à decisão dos jurados manifestamente contrária a prova dos autos".
Nota-se do que foi apresentado no transcorrer do Júri Popular do casal Nardoni, aparentemente não ter sido contemplado nenhuma das alíneas do referido dispositivo processual, mas, como o nosso ordenamento jurídico está repleto de recursos, o advogado dos réus, Roberto Podval, segundo divulgado pela imprensa, ingressou com a peça recursal proclamando pela instituição de um novo Júri Popular.
Estima-se que a condenação de Alexandre Nardoni (31 anos de prisão) e Ana Carolina Jatobá (26 anos de prisão), tenha correspondido ao anseio e a expectativa de toda a sociedade brasileira, mas, como disse o criminalista Roberto Delmanto Júnior: "a verdade dos fatos, ou seja, o que realmente aconteceu no dia 29 de março de 2008, só quem sabe é Alexandre e Ana Carolina Jatobá".
EDUARDO VERONESE DA SILVA
Licenciatura Plena em Educação Física – UFES
Bacharel em Direito – FABAVI/ES
Instrutor do PROERD
Subtenente da PMES
[1] Licenciatura Plena em Educação Física – UFES. Bacharel em Direito - FABAVI/ES. Instrutor do Programa Educacional de Resistência às Drogas – PROERD; Subtenente da PMES. Email: proerdveronese@gmail.com (27) 9863.9443.
[2] Jornal Folha Universal, Domingo, 04. Abr 2010.