O BIO DIREITO NAS RELAÇÕES FAMILIARES

Por Lucas Ranieri Ferreira da Rocha | 17/11/2017 | Direito

O BIO DIREITO NAS RELAÇÕES FAMILIARES
O DIREITO À VIDA DO FETO ANENCÉFALO: A INTERRUPÇÃO DA GRAVIDEZ E A DECISÃO DO CASAL NO PROJETO PARENTAL.1

 

Ana Carolina de Sousa
e Lucas Ranieri2
Anna Valéria de Cabral Marques3


Sumário: Resumo; 1.Introdução; 2. Bioética e Biodireito; 2.1 O biodireito; 2.2 Dos princípios e aspectos constitucionais; 3.A tutela jurídica e o direito à vida; 3.1 O nascituro como sujeito de direitos; 4. A interrupção seletiva da gravidez no caso anencefalia; 4.1 A anencefalia e seus aspectos; 4.2 O crime de aborto e a descriminalização do aborto anencefalos pela ADPF nº54; 4.3 A ponderação do direito à vida e saúde à luz dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade; 5.Conclusão; Referências.

RESUMO
Uma das questões mais relevantes e discutidas na sociedade é a questão da a possibilidade da interrupção da gravidez quando o feto é portador de malformação que o torne incompatível com a vida extra-uterina, ou seja, quando o feto tem anencefalia. A questão se torna mais delicada pois está intimamente relacionada com princípios e valores morais envolvendo o direito fundamental à vida e também a possibilidade dos pais de optarem pela interrupção ou não da gravidez como decisão para construção do seu projeto familiar parental, e quais as consequências de tal decisão no âmbito jurídico. Dessa forma, o escopo desse estudo é o de propor uma abordagem sobre o biodoreito nas relações familiares e como a interrupção da gravidez é entendida em diversos primas. Desde do direito à vida quanto ao direito à saúde, do feto, e da gestante, de modo a compatibilizá-los quando em conflito.
Palavras-chave: BioDireito. Feto Anencefálo. Direito à Vida. Projeto Parental. Interrupção seletiva da gravidez.
1 Paper apresentado à disciplina de Direito de Família, da Unidade de Ensino Superior Dom Bosco.
2 Alunos do 6° período do Curso de Direito, Vespertino.
3 Professora. Orientadora.
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1 INTRODUÇÃO
Muito se discutia sobre o direito à vida acerca da possibilidade de aborto nos casos de fetos portadores de anencefalia no Brasil. Haja vista que, o Direito Penal brasileiro não tratava o assunto como uma possibilidade de excludente de ilicitude. A doutrina fortemente apontava que o fato do feto anencéfalo não ter possibilidade de sobrevivência, considerando que não possui a abobada craniana que é algo indispensável para a vida extrauterina, não poderia preponderar a vontade da mãe de antecipar o sofrimento permitindo a retirada do feto, ao invés de manter carregado em seu ventre, sendo que a consequência seria a mesma, a morte.
Após longas discussões acerca dessa polêmica, o Supremo Tribunal Federal decidiu na ADPF 54/DF, em 2012, que fosse permitindo a interrupção de gravidez de fetos com anencefalia, ou seja, em tais casos não poderia ser configurado como crime de aborto, considerando que o bem jurídico tutelado no tipo penal do art. 124 do CP é a vida em desenvolvimento o que não ocorre nos casos de anencefalia. Contudo, tal julgamento gerou discussões e desconfortos em parte da sociedade, pois, em alguns casos era possível notar que a criança sobrevivia por um lapso temporal razoável, tal posicionamento fora fortemente defendido pela bancada religiosa.
Mesmo após a decisão favorável ao aborto, nesse caso em específico, a sociedade ainda se encontra em um grande embate perante ao tema, proporcionados pelos grupos radicalmente contra, e pelos grupos a favor do julgamento. Os principais questionamentos são, quais implicações para o casal que opta pela não interrupção da gravidez para a construção do seu parental e se caso optaram, e viabilidade econômica do casal para manter e dar garantia do direito a saúde e dignidade da vida humana para esse nascituro. Todas essas questões resguardadas pelo direito à saúde. Dessa forma, especificaremos a influência dos avanços médicos que proporcionaram uma melhor analise e aceitação da sociedade, no tocante a temática abortiva que ainda é envolvida por uma questão patriarcal, religiosa, moralista e ética.
Portanto, na pesquisa iremos abordar primeiramente a questão do biodireito e da bioética, e os princípios constitucionais até chegar ao nascituro como sujeito de direitos. A análise reside também na perspectiva da interrupção da gravidez nos casos de anencefalia e como o STF se posiciona nestes casos. E por fim, se propõe como o operador deve analisar essa colisão de direitos através do uso da ponderação do direito à vida e saúde à luz dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade.
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2 BIOÉTICA E BIODIREITO
Para dar início ao estudo do direito à vida do anencéfalo, faz-se necessária abordagem sobre bioética e biodireito, sobre os direitos e os princípios inerentes aos anencéfalos. Neste capítulo, preliminarmente, serão feitas considerações sobre bioética e biodireito.
2.1 O Biodireito
Segundo Sauwen (2008), “o biodireito é uma nova área do direito que tem o compromisso de, com a normatização adequada, manter a real validade da principal divisão do Código Civil: direito das pessoas e das coisas”.
Por consequência disso é que o anencéfalo, por exemplo, base de pesquisa para este trabalho, não pode ser uma coisa que pode ser descartado a qualquer momento. A coisificação do anencéfalo não pode ser tolerada pelo ordenamento jurídico. Esse precisa ter direito à vida e ter seus princípios garantidores protegidos pelo jurídico.
Após longas discussões acerca dessa polêmica, o Supremo Tribunal Federal decidiu na ADPF 54/DF, em 2012, que fosse permitindo a interrupção de gravidez de fetos com anencefalia, ou seja, em tais casos não poderia ser configurado como crime de aborto, considerando que o bem jurídico tutelado no tipo penal do art. 124 do CP é a vida em desenvolvimento o que não ocorre nos casos de anencefalia. Contudo, tal julgamento gerou discussões e desconfortos em parte da sociedade, pois, em alguns casos era possível notar que a criança sobrevivia por um lapso temporal razoável, tal posicionamento fora fortemente defendido pela bancada religiosa.
Todos sabem que a medicina vive em constantes inovações. A todo momento são feitas descobertas que podem beneficiar a comunidade científica e consequentemente a humanidade. Para tanto, torna-se preciso que o direito, porém não só, mas todos os ramos sociais, jurídicos e políticos da sociedade, sejam atuais e se amoldem às inovações científicas apresentadas pela medicina.
Segundo Sauwen (2008): “o direito deve intervir no campo das técnicas biomédicas, para estimular o desenvolvimento da ciência dentro de suas fronteiras humanas e desestimulá-la quando passa a avançar os limites desumanos”.
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O que se entende deste dito de Garrafa é que o direito jamais deve inibir a evolução da ciência, não deve freá-la. Contudo, cabe ressaltar que a ciência deve trabalhar para melhorar as condições de vida da humanidade caminhando juntamente com o direito da dignidade da pessoa humana e não em detrimento dela.
2.2 Dos princípios e aspectos constitucionais
Existem vários princípios que poderiam ser abarcados nesta pesquisa, tendo íntima relação com o assunto. Porém, serão apresentados apenas quatro princípios, aqueles que podem ser considerados os mais importantes, sendo eles: princípio do respeito da autonomia, princípio da não-maleficência, princípio da beneficência e o princípio da justiça.
Primeiramente, será abordado o princípio do respeito da autonomia que, aos olhares de Sauwen (2008), “O respeito pela pessoa envolve a expressão de autonomia da vontade quer das pessoas capazes de deliberarem acerca da pesquisa, como também aqueles incapazes ou com a capacidade diminuída de tomarem uma decisão, devendo ser representados ou na impossibilidade que tal, gozarem de uma maior proteção, visando obstar abusos ou danos”.
Este princípio nada mais diz que as pessoas têm o direito de decidir sobre as questões relacionadas ao seu corpo e à sua vida. Qualquer ato médico que possa vir a ocorrer precisa ser autorizado pela paciente. Este é um princípio de suma importância para o presente caso, em relação ao ser anencéfalo.
Outro princípio, agora retratado por Jussara Ferreira, no seu artigo “Bioética e Biodireito”, é o da beneficência. Este artigo dispõe que esse princípio “resume-se no dever ético de não fazer mal - vale dizer - a não maleficência. A obrigação, neste vértice, esta orientada no sentido de maximizar benefícios e minimizar danos e prejuízos”.
Segundo este princípio, o que se pode deduzir deste é que um profissional da área médica, por exemplo, tenha um grau de informação que faca com que este apresente a melhor solução para o paciente de forma a deixa-la com saudade e não fazer com que este corra algum perigo de morte.
Por último, vem o princípio da justiça, também abordado no artigo cientifico de autoria de Jussara Ferreira. O artigo dispõe, sobre o princípio da justiça, o seguinte: “Interessante constatar que neste princípio a bioética resume, exatamente, a perspectiva da justiça distributiva, impondo a distribuição equitativa quer dos ônus, quer dos benefícios decorrentes da participação da pesquisa”.
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Este princípio dispõe que, em outras palavras, o médico deve agir com imparcialidade, evitando ao máximo aspectos culturais a sociedade em si. O paciente merece ser tratado com equidade, com respeito, de modo a ser garantido todos os seus direitos.
3 A TUTELA JURÍDICA E O DIREITO À VIDA
3.1 O nascituro como sujeito de direitos
Com a evolução da vida humana, o entendimento do ser humano como sujeito de direitos levou a uma busca intensa pela garantia dos seus direitos, sempre tendo como base o princípio da dignidade da pessoa humana. Segundo o Dicionário Aurélio, nascituro é, “ aquele que há de nascer”. Nesse sentindo, a questão que gira em torna desse conceito é a pergunta de quando de fato começa a vida humana? Dentre as diversas teorias que existem, o Código Civil, adotou a teoria natalista, em relação a personalidade jurídica do nascituro, ou seja, entendeu que o nascituro não é dotado de personalidade jurídica apenas adquirindo tal atributo caso venha a nascer com vida. No entanto, essa questão enseja interpretações confusas baseadas no “Artigo 2º do Código Civil: A personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida; mas a lei põe a salvo, desde a concepção os direitos do nascituro”. Existe a possibilidade prevista no Artigo 16.09, em seu parágrafo único do Código Civil, do nascituro ter a paternidade reconhecida: “O reconhecimento pode preceder o nascimento do filho ou ser posterior ao seu falecimento, se ele deixar descendentes.” A Lei nº 11.804/2008 estabeleceu ainda os alimentos gravídicos e conferiu legitimidade para o nascituro figurar no polo ativo da demanda. Ou seja, a própria legislação que aparentemente não reconhece a personalidade jurídica do nascituro, acaba por reconhecer que, em determinadas situações, o nascituro é titular de direitos. Silvio Rodrigues entende que: Nascituro é o ser já concebido, mas que ainda se encontra no ventre materno. A lei não lhe concede personalidade, a qual só lhe será conferida se nascer com vida. Mas, como provavelmente nascerá com vida, o ordenamento jurídico, desde logo, preserva seus interesses futuros, tomando medidas para salvaguardar os direitos que, com muita probabilidade em breve serão seus. Diante da evolução da sociedade, e a constituição como aquela que garante os direitos do ser humano, em decorrência do princípio da dignidade da pessoa humana, torna-se necessário reconhecer que feto é titular de direitos.
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Conforme Maria Helena Diniz (2011, p. 45) explica: Os direitos patrimoniais (herança, indenização, doação, por exemplo.) conferidos ao nascituro permanecem em estado potencial, sob a condição suspensiva de nascer com vida (por isso são chamados de direitos eventuais). Nascendo morto (natimorto), não chega a adquirir tais direitos, mas não perde os direitos da personalidade (vida, nome, imagem, etc.), pois, possui personalidade jurídica formal. O entendimento é que a condição de nascituro não permite a aquisição de todos os direitos. O direito aos alimentos, personalidade, somente são adquiridos com a concepção. No entanto, conforme citado no parágrafo anterior, existem os chamados direitos eventuais, que são direitos patrimoniais que pedem do nascimento com vida. Ressaltando que se na situação a criança tenha nascido, respirado e morrido em seguida, haverá incidência de toda a disciplina sucessória. Caso contrário, não vai existir consequências no direito sucessório, pois o nascituro apenas foi titular dos direitos da personalidade.
4 A INTERRUPÇÃO SELETIVA DE GRAVIDEZ NO CASO DA ANENCEFALIA
4.1 A anencefalia e seus aspectos
O feto encefálico possui uma deficiência no encéfalo. “O encéfalo é a parte do sistema nervoso central que abrange o cérebro, de modo que sua ausência implica inexistência da atividade cerebral, sem qual não se pode falar em vida”. (CAPEZ, 2014, p.163). Diante disso, um dos fundamentos para essa descriminalização do aborto nos casos de anencefalia apresentada foi que essa gestação iria trazer enormes transtornos físicos e psíquicos, pois o feto não teria nenhuma expectativa de vida extrauterina, a gravidez resultaria por fim na morte. (BUSATO, 2004).
As grandes lesões na saúde, risco de vida e problemas emocionais na mãe se ela levasse a gravidez até o final, possibilitando a descriminalização do aborto no caso de fetos enencéfalos, desde que com as condições de consentimento da mãe e médico capacitado para realizar o aborto. (BUSATO, 2004). No Brasil se configura morte com a morte cerebral, sendo assim não podemos nem mesmo considerar a possibilidade deste tipo de aborto como crime, pois compõe falta de elementos essenciais para o crime de aborto, que necessita que o feto esteja vivo para que ocorra a interrupção da gestação utilizando métodos abortivos, o que não ocorre no aborto nos casos de anencefalia. (BITENCOURT, 2014).
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Em mais da metade dos casos as gestações não chegam ao fim e o resto não resistem ao parto, pois os médicos afirmam que o feto só possui vida graças ao metabolismo da mãe, que fora do útero não possui quase nada de possibilidade de vida. Restando assim somente danos e sofrimento para gestante que era obrigada a continuar com a gestação sabendo que resultaria em morte. (DINIZ; VÉLEZ, 2008).
não será “condenada” a abrigar dentro de si um tormento que a aniquila, brutaliza, desumaniza e destrói emocional e psicologicamente, visto que, ao contrário de outras gestantes que se preparam para dar à luz a vida, regozijando-se com a beleza da repetição milenar da natureza, afoga-se na tristeza, no desgosto e na desilusão de ser condenada a — além da perda irreparável continuar abrigando em seu ventre um ser inanimado, disforme e sem vida, aguardando o dia para, ao invés de brindar o nascimento do filho como todas as mães sonham, convidar os vizinhos para ajudá-la a enterrar um natimorto, que nunca teve chance alguma de nascer com vida. (BITENCOURT,2014,p.175)
O CNM considerou o feto enencéfalo como um natimorto cerebral pela má-formação do encéfalo. Outro fator apresentado para a possibilidade de aborto enencéfalo é que a gestante tem risco de vida durante a gestação e principalmente durante o parto, ou então, trazendo problemas físicos e psicológicos. Dentre os problemas físicos como hemorragias, hipertensão e aumento excessivo do líquido amniótico e ainda problemas psicológicos como a depressão. Sendo assim, o objeto jurídico que deve ser resguardado é o bem da vida, saúde e integridade da mãe. (MIGATI; GÓES; COSTA, 2012). Contudo, a descriminalização do aborto seria uma a garantia dos pais de poderem escolher através de direitos fundamentais da saúde, dignidade, integridade e vida da gestante, pois considera-se o bem jurídico a gestante e não o feto, já que este não tem grande possibilidade de vida extrauterina.
4.2 O crime de aborto e a descriminalização do aborto anencefalos pela ADPF nº54
Ao analisamos a tratativa que o Código Penal profere ao crime de aborto, podemos perceber que o mesmo tipifica expressamente os casos em que o aborto é criminalizado. No art. 124 temos a figura do aborto provocado, no art. 125 o aborto sofrido e no art. 126 o aborto consentido. Além disso, o Código Penal Brasileiro prevê em seu art. 128 os casos em que a pratica do aborto é toda como lícita. (RODRIGUES, 2011, p. 230). Assim, podemos constar que os abortos nos casos de anencefalia (má formação neural), não encontram respaldo na legislação penal.
No entanto, devemos ter em mente que o Código Penal de 1940, o qual ainda permanece vigente, fora publicado de acordo com a conjuntura social predominantes da década de 30, o que envolve uma cultura, hábitos e costumes diferentes da realidade a qual rege a
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sociedade na atualidade. Passados exatos 75 anos, não temos apenas uma modificação de valores que permeiam a sociedade. Deve-se ressaltar principalmente a progressão que ocorreu na medicina, proporcionados pelo aprimoramento cientifico e tecnológico, o que possibilitou um maior debate acerca da permissão do aborto em casos de fetos anencefalos. (BITENCOURT, 2014, p. 129). Vejamos que o legislador brasileiro, assim com o entendimento predominante na doutrina, reconhece a morte com a tida morte cerebral, os casos de anencefalia, o Supremo Tribunal Federal não poderia deixar de estabelecer um entendimento, sobre uma matéria que encontra diferentes posicionamento em uma sociedade que tem por base o cristianismo. Por isso, o Direito Penal necessariamente precisou se adequar aos avanços sociais, médicos e científicos, encontrando na ADPF n° 54 uma possibilidade de adequação ao dinamismo social, enquanto não englobada por uma necessária reforma penal. Com isso, a Confederação Nacional dos Trabalhadores na Saúde (CNTS), no ano de 2004, propôs no Supremo Tribunal Federal a ADPF n° 54, com o intuito de conseguir a liberação pelo Supremo, da interrupção da gravidez nos casos de anencefalia, ou seja, a descriminalização da conduta nessa ocasião. A CNTS alegou que inúmeras gestantes entravam com pedidos judiciais, para obter a autorização para a antecipação do parto, ao saberem dos ricos trazidos pela gravidez, e pela morte cerebral do feto, que não possibilitaria chances de vida. Por isso, a ADPF tinha como pedido principal, que o Supremo proferisse uma decisão que as penas previstas para a crime de aborto, não fossem aplicadas as gestantes e aos médicos quando feita a opção pela antecipação do parto referente aos casos de anencefalia. (RODRIGUES, 2011, p. 51-52).
Ocorre que a aprovação da antecipação terapêutica da gestação de fetos anencefalos, com oito votos a favor e apenas dois contras, teve que enfrentar diversas questão que ultrapassaram a questão penal, envolvendo a laicidade estatal e contraposição entre os direitos da mulher e a do fato. Nessa perspectiva, aborta Busato (2004, p. [?]):
O panorama de intenso debate e os pontos de vista conflitivos, amplamente cobertos pela mídia tornaram a questão penal apenas um detalhe, submersa em meio a um emaranhado de argumentos de outras ordens, perturbando uma apreciação técnica e adequada da matéria.
Embora as grandes polêmicas que despertam a questão, o Supremo decidiu pela descriminalização da prática, fundamentada em algumas questões abordadas a seguir. O Supremo abordou a impossibilidade física de sobrevivência do feto após o nascimento, que não pode ser superior ao direito da mulher, principalmente referente aos danos psíquicos ocasionados. Outro fator favorável a descriminalização do aborto, se baseou nos possíveis
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danos ocasionados a saúde metal e física da gestante, devido à ausência de uma prolongada possibilidade de vida do feto anencefalos, após o nascimento. (CAMAGOS; OLIVEIRA, 2011, p. 123). Destarte, ainda que a nossa sociedade tenha uma forte influência religiosa, o que determina o posicionamento negativo por alguns setores da sociedade, contra a decisão proferida, o Supremo entende o direito da mulher deve ser resguardado, lhe dando a faculdade de optar ou não pela interrupção da gravidez na ocasião em questão.
4.3 A ponderação do direito à vida e saúde à luz dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade
Diante da decisão que envolve a relação pessoal e direito dos pais que resolvem proporcionar ao então feto anencéfalo a possibilidade da vida extrauterina, está intimamente ligada com o direito fundamental à vida e também a possibilidade de optar pela interrupção da gravidez e a decisão dos pais para construção do projeto parental.
Todavia, as implicações que existem quando decide-se optar pelo nascimento do afeto anencéfalo e a viabilidade econômica do casal para manter e dar garantia do direito a saúde e dignidade da vida humana para esse nascituro é o que gera uma colisão de direitos fundamentais. Quais pertencem a ambas as partes tais como os direitos decorrentes da dignidade da pessoa humana.
A questão é como resolver as questões do direito sem afetar o âmbito de proteção da família e a escolha dos pais? É necessário colocar em destaque, que acima de um desejo ou sonho de construir uma família, toda a situação é rodeada por direito de saúde, que está resguardando tanto a mãe quanto a criança que vai nascer (ou não). Por isso, é necessário que o interprete da lei faça a ponderação desses princípios de acordo com as reais condições do casal. As consequências positivas e negativas devem ser bem colocadas em questão. O apoio psicológico para a mãe e para a família tem que existir. Malformações fetais ocorrem de modo crescente à medida em que aumenta a idade materna, logo, todo tratamento e cuidado tanto na gravidez como no nascimento dessa criança exigem condições de tratamento hospitalares que em sua maioria são caros para a média salarial de um brasileiro comum. Dificilmente o plano de saúde irá cobrir todas as despesas, e o Sistema Único de Saúde – SUS é incompatível com a real necessidade de atendimento da população.
O STF mesmo sendo o tribunal de instância superior que deve julgar os temas de forma fundamentada, é notório que seus agentes ainda acabam sendo influenciados por questões
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de ordem social. Mas, já é crescente o número de pessoas que observam o aborto de fetos anencéfalos não como o aborto comum, e sim como uma maneira de resguardar o direito da gestante, de que ela decida se quer ou não continuar com uma gravidez que pode comprometer sua saúde e que resultara na morte do feto. (VIDAL, 2011).
Tomemos a seguinte situação como exemplo, na hipótese da gestação de um feto com anencefalia, cujos os médicos afirmam que ele pode até nascer, mas que, logo após o nascimento está fatidicamente condenado a morte, esse feto tem o direito à vida. Mesmo que isto implique no direito de permanecer vivo ainda que por tempo ínfimo, com dignidade. O poder de escolha é da mãe. Se ainda, não existir nenhuma ameaça para saúde da mãe, embora o risco exista, a sua saúde psíquica precisa estar resguardada. Lidar com esse breve espaço de tempo chamado morte, ainda é algo doloroso para todo ser humano. Principalmente quando essa situação gira em torno de um sonho para muitas mulheres que é a maternidade.
Nesse sentindo, a resolução para essa situação não se resolve por outro modo que não pela análise dos direitos fundamentais em conflito à luz dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade de modo a se levar em conta as peculiaridades de cada caso concreto. Não tem como generalizar. Sumular tais situações, por exemplo, seria engessar e limitar as variedades de situações semelhantes, mas com pequenas diferenças, que fazem toda a diferença e um caso para o outro. Destarte, tais situações que envolvem os direitos fundamentais não podem ser solucionadas com um simples baseamento em uma ponderação objetiva de direitos fundamentais, ou seja, o interprete da norma considerar as peculiaridades do caso concreto, e não apenas partindo da premissa de que há superioridade hierárquica de um dos direitos, para que a decisão não seja reduzida à “coisa”, retirando toda a condição humana.
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5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Podemos perceber que a interrupção da gravidez, independentemente das questões que justificam ou não a sua prática, envolve questões éticas, morais e religiosas de diferentes grupos sociais, mostram-se como um dos temas mais polêmicos e controversos na sociedade, no qual as questões propriamente jurídicas são vistas em segundo plano em detrimento das questões principalmente emocionais e religiosas. No entanto, a discussão que gira em torna da interrupção da gravidez de fetos anencefalos, encontram divergência sobre a existência ou não de vida no caso do aborto em questão. De lado, os estudos médicos revelam que a interrupção da gravidez é permitida, tendo em vista que anencefalo é um natimorto cerebral. Do outro, os setores conservadores condenam qualquer tipo de pratica abortiva, e ressaltam que mesmo que seja por um período muito curto, o feto anencéfalo possui vida.
Vale ressaltar que o STF não descriminalizou a conduta do aborto, apenas interpretou para que fosse permitido a interrupção de gravidez no caso em que o feto seja portador de anencéfalia. Ou seja, a mãe não é obrigada a interromper a gravidez, mas, se outra mulher que se encontra na mesma situação não queira continuar sofrendo, está liberada para interromper a gravidez. Nas novas configurações do direito, através do biodireito podemos destacar os direitos da gestante que tem o conhecimento das condições de seu filho, que irá falecer após o nascimento. Deve-se ter em vista todos os traumas psicológicos aos quais a mulher será submetida, assim como a preservação de sua vida, devido os riscos trazidos pela gravidez de um feto anencefalo.
Destarte, a decisão do STF entendeu que o mais adequado seria a autorização da interrupção da gravidez em casos de anencefalia, tendo como fundamento jurídico a aplicação da proporcionalidade, ao discutir a vida do feto e o direito de autonomia reprodutiva da mulher bem como o seu direito à saúde, prevalecendo-se na situação em real os direitos da mãe em ter a faculdade de escolha entre interromper ou não a sua gravidez. Conclui-se, então, que em cada situação, deve-se existe um sopesamento dos direitos fundamentais envolvidos, à luz dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade para que a decisão do casal na construção do seu projeto parental seja baseada acima de tudo, pela preservação e garantia da vida e saúde tanto da mulher quanto do nascituro.
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REFERÊNCIAS
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