O amor é lixo ?!
Por Edson Terto da Silva | 30/09/2010 | FilosofiaEdson Silva
Antes que o leitor ache que estou maluco ou acometido de dor de cotovelo, esclareço que a frase do título ouvi como afirmação e coloquei os pontos de interrogação e exclamação para que possamos pensar nos argumentos de quem a proferiu. Só para evitar curiosidades ou especulações, não foi ninguém famoso. Aliás, alguém anônimo, que sequer conheço e que falava a um amigo recém conhecido na mesa de um bar, entre um gole e outro de cerveja, numa tarde da primavera, embora fria e chuvosa.
Não teve como não prestar atenção quando o cara, aparentemente sóbrio disse com todas as letras: "Na verdade, amor é lixo..." Notei que todos se espantaram no recinto, os burburinhos e tilintares de copos, comuns em qualquer bar, cessaram por alguns minutos. Parece que todos os ouvidos requeriam mais explicações para a aparente heresia. E o cara continuou: "Tirando amores citados na fé de cada um, principalmente na cristã e algumas situações familiares, de alguns pais para com os filhos e vice-versa ou entre irmãos, o resto do amor no mundo não passa de lixo ou metal de baixo valor..."
Parece até que ouvi o barulho do gole da cerveja tomada pelo outro cara que dividia a mesa e nitidamente ouvi ele questionar o amigo: "Você está louco ? Isso não é coisa que se diga!" E o outro com a firmeza de quem tinha conhecimento de causa disse: "Eu explico" e começou sua argumentação. Segundo ele, a maioria dos homens e mulheres passa a vida toda procurando um amor perfeito, sem saberem realmente como ele é. Todos os dias, a cada segundo, em algum lugar, segundo ele, alguém encontra o amor e ao invés de vivê-lo, deixa passar, literalmente joga fora como se fosse lixo e nem lixo reciclável é, pois amores passados raramente se aproveitam.
Antes que o amigo falasse alguma coisa ou mesmo que outro freguês qualquer desse "pitaco", o cara continuou dizendo que também nunca se sabe se um amor é verdadeiro e na verdade, o tal amor mundano, entre homens e mulheres, é metal de baixo valor, o chamado ouro dos tolos, mas também pode ser muito precioso e inútil, pois acaba não reconhecido e jogado fora, indo igualmente para o lixo, como pérolas atiradas aos porcos. O cara não aparentava ser especialista em química, mas arriscou-se pelo mundo das ligações carbônicas.
Disse que nem o mais puro carvão de qualquer amizade, seja em quais condições de pressão e temperatura, é capaz de maneira liquida e certa transformar-se em diamante resistente de amor puro e verdadeiro. Até parece que ouvi umas pessoas concordarem dizendo: "isto é verdade". Como estava atrasado e tinha parado só para um café e esquentar a alma naquela tarde de neblina que fazia minha cidade lembrar Londres ou São Paulo, sai sem saber como terminou o tratado etílico-filosófico sobre o amor, mas permaneci atento a possíveis montes de amores poéticos jogados no meio fio das ruas que começariam ser arrastados por enxurradas de chuvas e das emoções e ilusões perdidas.
Edson Silva, 48 anos, jornalista, mora em Campinas e trabalha como assessor de imprensa em Sumaré.
edsonsilvajornalista@yahoo.com.br/