O Amor dos Animais
Por Walmir Brelaz | 14/05/2009 | SociedadeO amor de Suzy por Dyana é comovente, a começar pelo nome de realeza
que lhe atribuiu. Hoje saíram às duas horas da madrugada para cortar
cuidadosamente o cabelo de Dyana, raspando-o em toda parte central e
aproveitando para pintar de azul o resto do corpo. Ela ficaria linda da
cor do céu tanto quanto Julio, a quem Fany sapecou-lhe um reluzente
lilás. Na volta Suzy passou num man shop, afinal, precisaria alimentar
sua afilhada: comprou quilos de sojas, vitaminas em comprimidos, sal,
alho, cebola, produtos transgenicamente preparados para fazerem bem a
Dyana. A saúde valia a pena. Nessa loja Dy conheceu vários de sua
espécie, deitados em confortáveis quartos pouco maiores que seus corpos
e observados por quem lhes pretendiam.
O carinho de Suzy realmente não tinha limites, queria ver Dyana sempre
mais bonita, e achou por bem decepar o seu polegar. Talvez os dois. Com
oito dedos nas mãos a aparência lhe seria bem melhor, além disso, não
sentiria dor já que o procedimento contaria com doses suficientes de
anestesia. A beleza valia a pena. O que importava é que deveria estar
preparada para comemoração de seu aniversário, onde encontraria com
suas outras amigas e amigos, em especial o Pool e seu fiel Leno. Pool
tinha verdadeira fascinação por Leno e com ele sempre dormia no quintal
de casa, sempre abraçadinhos. Quando separados Pool chegava às lágrimas
ao ver a foto de seu amigo na tela do celular. Leno era um fofinho,
calmo, falava com a voz de criança apesar de adulto, não gritava e nem
era agressivo, um gentleman. Resultado de mais uma prova de amor por
parte de Pool, que havia carinhosamente extirpado seus testículos,
porém, tudo sem dor e com muita sensibilidade. Ora – pensava Pool –
para que alguém precisa de testículos?!
Na festa compareceram os convidados esperados. Cada um mais
apresentável que outro. Sempre acompanhados, unidos, presos um ao outro
por uma simpática e rígida corrente. Mário estava com as orelhas
devidamente aparadas, seu companheiro lhe havia feito essa bela
transformação: foram só quinze centímetros a menos, poderiam ser mais.
Alguns pintados, sem roupas, sendo exibidos com orgulho por seus
respectivos companheiros. Era uma festa das mais prestigiadas.
Mas nem tudo é perfeito, havia os inoportunos protetores de humanos que
criticavam estas belas festas, quase sempre beneficentes. Diziam –
vejam só - que os seus animais companheiros - a quem taxavam de
proprietários daqueles - não respeitavam a natureza dos pequenos e
inofensivos humaninhos. Dos olhares meigos diziam serem de tristeza; os
cantos agudos, angustia; e da calma, a depressão. Que raça indigesta
desses protetores! – resmungavam as madames animais - Amamos muito
nossos humanos: raspamos e pintamos seus corpos, os mutilamos, para
ficarem mais belos e adequados aos nossos padrões. Gostamos tanto deles
que queremos que sejam nossa imagem e semelhança, por isso são
considerados nossos melhores amigos, são queridos humaninhos
domesticados. O amor valia a pena. E a festa continuou arrasando.