Nosso Gesto
Por Sergio Sant'Anna | 30/11/2008 | CrônicasQuando começou a chover Seu José já sabia que os dias não terminariam ou se terminassem acabariam debaixo d'água. Era mais um temporal que inundaria uma das várias cidades do Estado de Santa Catarina. Seu José conseguiu salvar sua família, composta de oito pessoas, a tempo; outros moradores da mesma cidade não tiveram o mesmo final, pelo contrário, não sobreviveram para contarem sua história.
E o que fazer em uma hora como esta? Não se faz. Atônitos permanecem, sem saber o que realizar. Muitos não abriram os olhos, estavam dormindo e dessa forma acabaram soterrados, depois liberados, encontrados e enterrados de novo. Muitos tentam, insistem em permanecer nas casas que ainda balançam com a terra úmida, imprópria, mas é arriscar-se, colocar em risco vidas. Seria o apego ao bem material? Não. É o resultado de muito suor. De um trabalho de anos. Naquela casa em cima do morro está rebocada uma história e de suas telhas caídas some-se com um sonho que havia se concretizado e em prazo de segundos esfacelou-se. Vida ingrata. Não. Natureza vadia. Não. Homem desmazelado, abrigado, por que foi obrigado a morar ali.
Nos rios de águas densas e escuras corre os corpos misturados aos restos de entulhos e muitas lágrimas de familiares. No peito daquela senhora bate um coração que quase foi parado pela casa cheia d'água, mas um coração solidário foi quem a salvou. Não deu para retirar sua televisão,que amparava sua solidão, mas a vida continua, hoje não mais sozinha, pois uma infinidade de pessoas se dispuseram a ajudar.
Lá mais abaixo o caminhão do corpo de bombeiros apronta-se para subir aquela montanha, é sinal de que mais uma família encontra-se ilhada. É o barro misturado à água que com ingredientes formam uma substância ainda desconhecida pela ciência, talvez mais tarde torne-se um tipo de cimento ou qualquer outra coisa que não mais prejudique os seres humanos.
Os saques acontecem, pois é a infinita rivalidade em os que têm muito com os que têm pouco e ainda foram sacrificados os poucos bens que possuíam. É contra a Lei estipulada pelos Homens, mas se tem fome e família para cuidar... Políticos por aí roubaram muito mais sem serem atingidos pelas catástrofes da natureza!
Milhares de doações estão chegando vindas das partes mais distantes do Mundo. Do Brasil, além da mão-de-obra, chegam os gestos de carinho, as palavras de conforto, destaque para as doações do sertão nordestino, onde a natureza é sempre ingrata. Mas nessa ingratidão é acordada a solidariedade do povo brasileiro, sempre disposta a socorrer, independente dos limites geográficos, pois pertencemos ao mesmo País. Somos brasileiros e não desistimos nunca. Agora não podemos. Permaneçamos unidos. A natureza provará esse nosso gesto.