NO TEMPO DOS MILITARES
Por Renato Ladeia | 03/05/2019 | PolíticaPor força das circunstâncias, sou obrigado a comparar o atual capitão-presidente com os seus antecessores militares. Faço isso porque ele é defensor dos seus colegas de farda no cargo maior da República. O contexto é outro, mas creio que vale a pena relembrar.
O primeiro, o Marechal Humberto A. Castelo Branco, nascido no Ceará, era um homem educado e culto, leitor de bons autores da literatura nacional e que gostava de frequentar teatros para assistir peças e concertos de música erudita. Mesmo sendo um homem austero, manifestava-se de forma polida, mesmo em relação aos seus adversários. Uma frase sua que ficou famosa, foi dita para coibir abusos dos seus subordinados: “Nenhuma legislação punitiva, dá autoridade a quem não tem”. Isso não quer dizer que era bonzinho. Não há mocinhos nesta história da República.
Seu sucessor, um gaúcho, General Arthur da Costa e Silva, mesmo sendo considerado um militar da chamada linha dura, tinha horror de ser chamado de ditador e até que tentou ter um diálogo com o movimento estudantil em 1968, tendo recebido uma comitiva de estudantes no Planalto. Mas não deu em nada. O regime era autoritário e não havia possibilidade de entendimento. Pelo seu jeito bonachão e pouco interessado em livros e cultura geral, era motivo de piadas. Quando a rainha da Inglaterra esteve em visita ao Brasil, ela disse (em inglês) que estava feliz por estar em Brasília, cuja data de fundação, coincidia com o seu aniversário. Costa e Silva se antecipou ao tradutor e ergueu uma taça saudando o aniversário da rainha. Uma gafe que foi censurada nos jornais. Teve um AVC durante o mandato e o vice, um civil, foi proibido de substituí-lo. Assumiu uma junta de três militares (um Almirante, um Brigadeiro e um General).
O terceiro general, também gaúcho, Emílio Garrastazu Médici, era um típico homem da caserna, delegou aos órgãos repressivos autoridade total para eliminar a oposição. Delegava tudo, pouco se envolvendo com os problemas do dia a dia do governo. Delfin Neto deitava e rolava na economia. Era um torcedor quase fanático por futebol, mas nunca foi fotografado com a camisa do Grêmio, time gaúcho de sua preferência. Comentava-se que quis interferir na escalação da seleção para a copa de 1970 e pediu a cabeça de João Saldanha. Acho que acertou, pois o Zagalo trouxe o caneco. Ficou na história como o ditador mais temível do regime militar. Tinha histórias para assustar criancinhas.
O quarto, outro gaúcho, Ernesto Geisel, era um bem-educado filho de Pastor Luterano. Sabe-se que gostava de boas leituras e apesar de ser bastante sisudo, não transigia com a tortura e maus tratos aos presos políticos. Como filho de alemães, era rígido e disciplinado, mas era muito centralizador nos processos decisórios. Era um ditador, mas usou mão de ferro contra os desmandos na repressão contra à oposição. O episódio do jornalista Vladimir Herzog foi emblemático em sua gestão. Muito criticado pela política econômica intervencionista, mostrou-se um bom estrategista no desmonte do aparelho repressivo, evitando um golpe do seu ministro do exército.
O último general, o carioca João Batista de Oliveira Figueiredo, era da Cavalaria e admitia publicamente que preferia a companhia dos cavalos a do povo. Considera-se um intelectual por ser bom em matemática. Assumiu com a missão de conduzir a abertura política. Assinou a lei da anistia, que beneficiou a oposição e, também, militares e policiais que cometeram excessos na repressão contra os movimentos de oposição. Tudo indica que não tinha vocação para a política e encarou a presidência mais como uma missão militar. Saiu do cargo pela porta dos fundos, pois não quis passar a faixa para o José Sarney, que assumiu em razão da doença de Tancredo Neves.
Até chegar aos nossos dias, tivemos economistas, advogados, um engenheiro, um operário especializado (torneiro mecânico) e um PHD em Ciência Política, cujas histórias ainda estão frescas nas memórias